Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
1116/14.1T8PNF.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: PAULA MARIA ROBERTO
Descritores: PRESTAÇÃO VARIÁVEL
SUBSÍDIO DE PREVENÇÃO
SUBSÍDIO DE CONDUÇÃO
PRÉMIO DE ASSIDUIDADE
Nº do Documento: RP201602151116/14.1T8PNF.P1
Data do Acordão: 02/15/2016
Votação: MAIORIA COM 1 VOT VENC
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROVIDO PARCIALMENTE
Indicações Eventuais: 4ª SECÇÃO (SOCIAL), (LIVRO DE REGISTOS N.º236,FLS.110-131)
Área Temática: .
Sumário: I - Para efeitos de integração na retribuição de férias e dos subsídios de férias e de Natal, deve atender-se apenas às prestações que hajam sido auferidas em todos os meses de atividade do período a que respeitam as remunerações em causa (11 meses).
II - O subsídio de condução tem uma causa específica, qual seja, a da condução de veículos exercida pelo trabalhador (que não é motorista), tarefa para a qual não foi contratado e, assim, não estamos perante as prestações a que aludem os artigos 87.º da LCT e 260.º, n.º 1 dos C.T. de 2003 e 2009 e, desta forma, tal subsídio integra a retribuição do A..
III - O tempo de prevenção é tempo de trabalho e, como tal, o seu pagamento pela via do respetivo abono é um pagamento do modo específico de prestação ou adstrição ao trabalho, posto que, apurada a regularidade e periodicidade, não será de excluir o abono de prevenção da natureza retributiva.
IV - O prémio de assiduidade não constitui uma contrapartida específica do modo de execução do trabalho, é independente desse modo, das funções desempenhadas, pelo que, não tem carácter retributivo.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Apelação n.º 1116/14.1T8PNF.P1
Comarca do Porto Este
Secção de Instância Central do Trabalho com sede em Penafiel

Relatora – Paula Maria Roberto
Adjuntos – Desembargadora Fernanda Soares
Desembargador Domingos Morais
______________________________________

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto:

I - Relatório

C…, casado, residente em Amarante

intentou a presente ação de processo comum, contra

C…, S.A., com sede em Lisboa

alegando, em síntese que:
- A Ré não integrou nas férias e nos subsídios de férias e de Natal os valores médios da retribuição que auferiu mensalmente, de forma regular e periódica, designadamente, o trabalho suplementar, noturno, subsídio de condução, chamada acidental, subsídio de prevenção, prémio de assiduidade, abono por risco de condução, e incentivo à produtividade, dos anos de 1989 até 2013.
- Assim, tem direito às diferenças remuneratórias existentes que computa no valor de € 38.850,20.
Termina, dizendo que a presente ação deve ser julgada procedente, por provada e, consequentemente, ser a Ré condenada a pagar ao A. as diferenças salariais apuradas como média de uma retribuição variável auferida no período de 1989 a 2013, no valor de € 38.850,20, acrescidas dos respetivos juros vencidos e vincendos até efetivo e integral pagamento.
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Realizou-se a audiência de partes e na qual não foi obtida a conciliação das mesmas.
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A Ré contestou alegando, em sinopse, que:
- O A. não alegou que as prestações que auferiu constituem contrapartida do modo específico da execução das suas tarefas, pelo que, é manifesto que a ação não poderá proceder, devendo a Ré ser absolvida da instância.
- Desde 01/12/2003 que o subsídio de Natal se resume à retribuição base e diuturnidades.
- O hipotético direito do A. aos juros anteriores a 19/12/2009, por terem decorrido mais de cinco anos, encontra-se prescrito.
- O prémio de assiduidade não tem natureza retributiva por força do disposto no artigo 260.º, do C.T..
- As prestações relativas ao trabalho suplementar, noturno, subsídio de condução, subsídio de prevenção e chamada acidental, haverá de indagar se a sua perceção constitui contrapartida do modo específico da execução do trabalho do A., o que não ocorre, desde logo, no que respeita ao subsídio de prevenção e chamada acidental que devem ser excluídos do conceito de retribuição.
- O abono de condução visava compensar o A. pela especial penosidade e risco decorrente da condução de veículos automóveis, devendo ser excluído do cálculo da média da remuneração variável.
- Quanto ao trabalho suplementar e noturno só o que foi pago de forma regular, pelo menos em onze meses do ano é passível de integrar o conceito de retribuição.
Termina dizendo que devem as exceções invocadas ser julgadas procedentes e a Ré absolvida do pedido ou da instância e, de todo o modo, deve a ação ser julgada improcedente e não provada e a Ré absolvida de todos os pedidos, incluindo o do pagamento de juros vencidos há mais de cinco anos, atenta a data da propositura da ação, com as demais consequências legais.
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O A. ofereceu resposta alegando que deve ser considerada improcedente a exceção alegada.
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Foi, então, proferido o despacho saneador de fls. 74 e segs. e no qual foi julgada procedente a exceção dilatória atípica resultante da formulação ilegal do pedido genérico e, em consequência, absolver a Ré da instância quanto ao pedido de condenação no pagamento de juros de mora vencidos e improcedente a exceção de ausência de causa de pedir invocada pela Ré.
Foi identificado o objeto do litígio e enunciado o tema de prova.
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As partes juntaram aos autos um acordo quanto à matéria de facto.
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Não foi realizada audiência de discussão e julgamento.
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De seguida, foi proferida a sentença de fls. 121 e segs. que julgou a presente ação parcialmente procedente por provada e condenou a Ré a pagar ao A. a quantia de € 30.989,05, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a data da citação e até integral pagamento.
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A Ré, notificada desta sentença, veio interpor o presente recurso que concluiu da forma seguinte:
“1. A Douta Decisão em apreço parece não ter feito aplicação conforme da lei e do direito e por isso é passível de objetiva censura.
2. Urge e é manifesta a existência de específico conceito de retribuição apenas para efeito do cômputo da média da remuneração variável.
3. Dado parecer manifesto resultar da interpretação conjugada dos artigos 258º e 264º do Código do Trabalho, que sob pena de redundância, não podem ter o mesmo escopo finalístico, a existência de específico conceito de retribuição apenas para efeito do cômputo da média da remuneração variável.
4. Dado que o conceito de retribuição fixado no primeiro, é muito mais amplo que aquele que é estabelecido no segundo e que se circunscreve aquelas prestações, que além de retributivas, constituam, de igual modo, contrapartida do modo específico da execução do trabalho.
5. Donde, tudo o que, por decorrência da lei ou atividade do intérprete, não encerrar natureza retributiva e ou não revestir esse sinalagma, não poderá ser considerado para efeitos do cômputo da média da remuneração variável, independentemente da sua regularidade ou cadência.
6. Tal assentimento, sob pena de incoerência, deverá ter como consequência, a imposição ao demandante do ónus de alegação e prova desse facto constitutivo da sua pretensão.
7. Conclusão, que contrariamente ao que se possa pensar, é a única logicamente possível, uma vez que não faz sentido que se exija ao demandante que, por exemplo, prove ter direito à perceção de trabalho suplementar ou de abono de condução e seja dispensado desse ónus quando está em causa um acréscimo decorrente dessa mesma realidade.
8. Subsumindo a tese propugnada às prestações em análise, a saber, trabalho suplementar, trabalho noturno, prémio de assiduidade, abono de prevenção e abono de condução, prémio por objetivos e abono de chamada acidental, concluir-se-á, desde logo, que com exceção das duas primeiras e da última, nenhuma das outras deverá ser considerada para cômputo da média da remuneração variável, mesmo que alguma delas, num qualquer ano civil, tenha sido recebida em todos os seus meses.
9. O abono de condução, mesmo que se admitisse a sua natureza retributiva, não comunga, contudo, do requisito de constituir contrapartida do modo específico da execução do trabalho, a não ser nos casos em que o trabalhador seja motorista de profissão.
10. Se assim fosse, o Autor tê-lo-ia percebido, pelo menos em onze meses, dos seus VINTE E SEIS anos de antiguidade, o que não se verificou em CATORZE deles, com a agravante de ter deixado de o perceber desde 2013.
11. O que significa, como sublinha a Senhora Desembargadora Maria João Romba, no Acórdão citado, que a atribuição do abono de condução procede de uma causa específica própria, que impede que possa constituir contrapartida da prestação de trabalho.
12. Também o Abono de Prevenção jamais poderia ser elegível para cômputo da média da remuneração variável, dado o seu pagamento pressupor que o Autor não tenha executado qualquer tarefa, mas apenas a compensá-lo por ficar disponível para executar a sua atividade, após o terminus da jornada de trabalho, donde não poder ser contrapartida da prestação de trabalho, pois não existe prestação de trabalho, como, de resto, tem sido unânime e uniformemente decidido pelo Supremo Tribunal.
13. O Prémio de Assiduidade jamais poderia ser elegível para cômputo da média da remuneração variável, por constituir prestação que a lei exclui do conceito de retribuição (artigo 260º, do Cód. do Trabalho) como, de resto, foi já, e bem, por várias vezes decidido pela Relação de Lisboa.
14. A última das quais, no transacto mês de setembro, onde a Senhora Desembargadora Maria João Romba, concluiu e bem, não poder considerar-se “que constitua verdadeiramente contrapartida do trabalho.”
15. De qualquer modo, ainda que assim se não entenda, jamais se poderá aceitar o critério de ser suficiente para o computo da media da remuneração variável, as prestações que sejam pagas em pelo menos seis meses do ano, incluindo nesta sede, tanto o trabalho suplementar, como o trabalho noturno e ainda o abono de chamada acidental.
16. Uma vez que apenas em relação às prestações que forem auferidas em todos os meses do ano, poderá existir uma forte probabilidade de poderem constituir contrapartida do modo específico da execução do trabalho, estribada na circunstância do Autor ter que executar tarefas que implicam a sua perceção, em todos os meses do ano.
17. Como é, de resto, o entendimento sufragado no supra citado Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, motivo pelo qual, se não vingarem as precedentes questões, apenas poderão ser consideradas no cômputo da média da remuneração variável na remuneração de Férias e nos Subsídios de Férias e de Natal, as prestações que forem pagas, pelo menos, onze meses no ano.
18. Tudo visto, impõe-se que seja dado provimento ao presente recurso, dado a Decisão em crise ter infringido o disposto nos artigos 258º, 260º, 261º e 264º, do Cód. do Trabalho, devendo em consequência ser revogada e substituída por outra que absolva a Recorrente do pagamento do prémio de assiduidade, do abono de prevenção e do abono de condução na remuneração de Férias, Subsídio de Férias e de Natal (anteriormente a 1 de Dezembro de 2003) ou quando assim se não entenda, apenas nas situações em que alguma delas e também do trabalho suplementar, do trabalho noturno e do abono de chamada acidental, tenha sido paga pelo menos onze meses no ano, pois só assim se fará aplicação conforme do Direito e poderá haver fundado motivo para se clamar ter sido feita J U S T I Ç A!”
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O A respondeu ao recurso interposto pela Ré nos seguintes termos:
1 – A fixação do pagamento de um abono pelo menos 6 vezes por ano preenche o critério da regularidade que a Lei exige.
2 – Não tem qualquer base legal exigir-se o pagamento do abono 11 vezes por ano, que é injusto.
3 – Deve, neste ponto também, ser confirmada a Douta Sentença em crise.
4 – A prestação paga com o nome de Prémio de Assiduidade foi criada pela Recorrente para todos os trabalhadores que prestem pelo menos 3 horas de trabalho por dia,
5 – Foi pago, pelo menos, durante todos os meses, durante 7 anos, sendo, manifestamente uma das excepções constantes do nº. 2 do Artº. 260 do Código do Trabalho,
6 – devendo confirmar-se a condenação do pagamento pela Recorrente da verba nas Férias e nos Subsídios de Férias e de Natal.
7 – O Abono ou Subsidio de Prevenção era devido pela forma como era executado o trabalho do Recorrido que se disponibilizava a ir trabalhar nos seus períodos de não trabalho desde que para tal fosse chamado.
8 – Sendo uma prestação devida pela forma especifica como o Recorrido prestava trabalho e visto que a mesma lhe foi paga pelo menos 6 vezes por ano, deve a sua média entrar no cálculo das verbas retributivas para o pagamento das Férias e Subsídios de Férias e de Natal.
9 – Também o Subsidio de Condução é pago por cada dia em que o Recorrido conduza um veículo da Recorrente para se dirigir ao local onde procede à reparação.
10 – É uma forma de executar o seu serviço e o mesmo subsídio é contratual, desde que preste um número mínimo de horas, dado não ser motorista.
11 – Bem andou a Sentença nesta questão, pelo que deve ser mantida.
Termos em que deve ser dado o Douto Recurso como improcedente confirmando-se a Sentença em crise, como é de JUSTIÇA!”
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O Exm.ª Procuradora-Geral Adjunta emitiu o douto parecer de fls. 169 e segs., no sentido de ser negado provimento ao recurso.
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Colhidos os vistos, cumpre, agora, apreciar e decidir.
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II – Saneamento
A instância mantém inteira regularidade por nada ter entretanto sobrevindo que a invalidasse.
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III – Fundamentação
a-) Factos provados
O tribunal a quo considerou provados os seguintes factos:
1º. Em 1988 o autor foi admitido para trabalhar, sob autoridade e direção da Ré, para exercer as funções de Eletrotécnico.
2º. Tendo em 1988 sido admitido como efetivo, ficando colocado no departamento C1… – com instalações em Penafiel.
3º. Atualmente, o Autor detém a categoria profissional de Técnico Especialista 5 e encontra-se colocado no departamento C2…, também com instalações em Penafiel.
4º. Em virtude das suas funções e do horário de trabalho que praticava ao serviço da Ré, o Autor vinha auferindo mensalmente as quantias abaixo descritas: (quadros)

























5º. O prémio de assiduidade instituído em 1996 e incorporado no subsídio de refeição em 2003, através do Protocolo anexo à revisão do Acordo de Empresa publicada no BTE nº. 13, de 08/04/03, constituía uma prestação que era paga a todos os trabalhadores da Empresa, independentemente da categoria que detinham ou das funções que executavam e cujo único pressuposto era comparecerem ao trabalho durante pelo menos três horas de um dos períodos de trabalho.
6º. O subsídio ou abono de prevenção, destina-se a compensar o Autor para que esteja disponível no seu domicílio para prestar trabalho, como decorre da respetiva norma convencional (clausula 50º AE): “… embora em repouso na sua residência, se encontra à disposição da empresa para eventual execução de serviços exclusivamente no âmbito da reparação inadiável de avarias…”.
7º. O Autor era integrado numa escala e em situação de prevenção só recebe esse abono quando está disponível para intervir, mas não tem necessidade de prestar atividade.
8º. Quando há intervenção ou prestação de atividade, o Autor não recebe abono de prevenção, mas o montante relativo ao trabalho suplementar e ou noturno, respeitante a esse período.
9º. A chamada acidental, cujos pressupostos de atribuição constam da cláusula 51º. do IRCT, comunga dos mesmos requisitos do abono de prevenção, com uma única diferença, enquanto nesta situação o trabalhador está previamente escalado para ficar de prevenção, naquela, como o nome propriamente sugere, o abono é pago em virtude do trabalhador não estar escalado para estar disponível depois de terminada a jornada de trabalho.
10º. O abono de condução, visava compensar o Autor pela especial penosidade e risco decorrentes da condução de veículos automóveis.
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b) - Discussão
Como é sabido, a apreciação e a decisão dos recursos são delimitadas pelas conclusões da alegação do recorrente (art.º 639.º, n.º 1, do C.P.C. - redação da Lei n.º 41/2013 de 26/06), com exceção das questões de conhecimento oficioso.
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Cumpre, então, apreciar as questões suscitadas pela recorrente quais sejam:
1ª – Se deve apenas considerar-se regular e periódica uma prestação paga durante onze meses do ano.
2ª – Se as prestações complementares abono de condução, abono de prevenção e prémio de assiduidade não integram o conceito de retribuição e não são devidas nas férias nem nos subsídios de férias e de Natal.
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Antes de mais, cumpre concretizar qual o regime jurídico aplicável.
Considerando o período temporal em causa, eram aplicáveis:
a) Até novembro de 2003, a LCT, aprovada pelo Decreto Lei 49.408, de 24/11/1969, o Decreto Lei n.º 874/76, de 28/12 (quanto à remuneração de férias e respetivo subsídio) e o Decreto Lei n.º 88/96, de 03.07 (quanto ao subsídio de Natal);
b) A partir de 01/12/2003 o Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 99/2003, de 27/08;
c) E, a partir de 17/02/2009, o Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12/02.
d) É também aplicável o AE celebrado pela Ré recorrente, publicado no BTE 24/1981 e suas alterações posteriores (publicadas nos BTE 37/83, 44/85, 45/88, 48/89, 13/90, 12/91, 39/91, 39/92, 8/93, 5/95, 21/96, 28/99, 30/2000, 29/2002, 29/2004, 27/2006, 14/2008, 25/2009 e 34/2010).
Por outro lado, como se sabe, a retribuição é um conjunto de valores expressos ou não em moeda, a que o trabalhador tem direito, por título contratual ou normativo, correspondente a um dever da entidade patronal e que se destina a integrar o orçamento normal do trabalhador, conferindo-lhe a justa expetativa do seu recebimento, dada a sua regularidade e continuidade periódicas.
O artigo 249.º do Código do Trabalho de 2003, nos seus n.º s 1 a 3, refere que “só se considera retribuição aquilo a que, nos termos do contrato, das normas que o regem ou dos usos, o trabalhador tem direito como contrapartida do seu trabalho” (n.º 1); “na contrapartida do trabalho incluem-se a retribuição base e todas as prestações regulares e periódicas feitas, directa ou indirectamente, em dinheiro ou em espécie” (n.º 2) e “até prova em contrário, presume-se constituir retribuição toda e qualquer prestação do empregador ao trabalhador” (n.º 3) - do que resulta, tendo em conta os princípios de repartição do ónus da prova, e, especificadamente, o disposto no n.º 1 do art. 344.º do Cód. Civil que, sobre o empregador impende o ónus de provar que certa prestação que o mesmo fez ao seu trabalhador não tem a natureza de retribuição.
O art.º 249.º do Cód. do Trabalho de 2003 corresponde, com alterações sem significado relevante ao caso presente, aos n.ºs 1 a 3 do artigo 82.º da LCT, sendo aplicável o preceituado neste diploma legal até à entrada em vigor do Código do Trabalho (01.12.2003).
Por sua vez, o Código de Trabalho de 2009, não introduziu alterações em termos desse regime, agora consagrado nos artigos 258.º a 269.º.
Por regularidade, deve entender-se que a prestação não é arbitrária, mas sim constante.
A periodicidade determina que a prestação seja paga em períodos certos no tempo ou aproximadamente certos, inserindo-se na própria ideia de periodicidade típica do contrato de trabalho.
Assim, em primeira linha, a retribuição é determinada pelo clausulado do contrato e pelos usos laborais, e eventualmente por certos critérios normativos (o salário mínimo, a igualdade retributiva, etc.). No entanto, num segundo momento, ao montante global da retribuição poderão acrescer certas prestações que preencham os requisitos de periodicidade e regularidade.
O primeiro critério sublinha a ideia de correspetividade ou contrapartida negocial: é retribuição tudo o que as partes contratarem (ou resultar dos usos ou da lei para o tipo de relação laboral em causa) como contrapartida da disponibilidade da força de trabalho. O segundo critério assenta numa presunção: considera-se que as prestações que sejam realizadas regular e periodicamente pressupõem uma vinculação prévia do empregador e suscitam uma expetativa de ganho por parte do trabalhador, ainda que tais prestações se não encontrem expressamente consignadas no contrato (vide, Monteiro Fernandes, Direito do Trabalho, 11.ª edição, Coimbra, págs. 440-441).
Da conjugação das citadas normas resulta muito sumariamente que, a retribuição do trabalho é “o conjunto de valores (pecuniários ou não) que a entidade patronal está obrigada a pagar regular e periodicamente ao trabalhador em razão da actividade por ele desempenhada (ou, mais rigorosamente, da disponibilidade da força de trabalho por ele oferecida)”[1], integrando a mesma não só a remuneração de base como ainda outras prestações regulares e periódicas, feitas direta ou indiretamente, incluindo as remunerações por trabalho extraordinário, quando as mesmas, sendo de carácter regular e periódico, criem no trabalhador a convicção de que elas constituem um complemento do seu salário – neste sentido, Monteiro Fernandes, ob. cit., pág. 449; Bernardo Lobo Xavier in Curso de Direito do Trabalho, 2.ª ed., pág. 382.
Por seu lado, o direito a férias pagas tem consagração constitucional (artigo 59.º da CRP) e mostra-se igualmente consagrado no Código do Trabalho (artigo 255.º e actualmente 264.º) tal como aí se encontra a previsão relativa ao subsídio de Natal (artigo 254.º e no presente 263.º).
O Código do Trabalho de 2003, como se referiu, só tem aplicação depois de 01.12.2003, valendo, em relação ao período precedente, as estipulações constantes do Decreto – Lei n.º 874/76, de 28 de Dezembro[2] e do Decreto – Lei n.º 88/96, de 3 de Julho[3], sendo aplicável o CT (aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro) a partir de 17 de fevereiro de 2009.
Importa, por outro lado, atentar no direito convencionado, nomeadamente as cláusulas 162.ª e 143.ª do AE/CTT de 2000/2001 (anteriores cláusulas 150ª e 151ª do AE de 1981): a primeira, no seu n.º 1, consagra a retribuição do período de férias, que em caso algum pode ser inferior ao que o trabalhador receberia se estivesse em serviço normal e acrescenta que o mesmo é credor de um subsídio de igual montante; a cláusula 143.ª, igualmente no seu n.º 1, estabelece que os trabalhadores abrangidos pelo AE têm direito a receber um subsídio correspondente à sua remuneração mensal, a ser pago com a remuneração do mês de dezembro.
Como decorre do já citado artigo 82.º da LCT, que os CT (2003 e 2009) repercutiram, a retribuição do trabalhador é a contrapartida pela prestação de trabalho efetuada pelo trabalhador e liga-se indelevelmente à regularidade e periodicidade do seu pagamento; a regularidade e periodicidade, com efeito, se vincam a legítima expetativa – do trabalhador – ao seu recebimento, igualmente contribuem para a presunção do inerente dever de pagamento.
A interpretação das normas do AE não pode ser feita em dissonância com as disposições legais que vieram prever o pagamento de férias, acrescentado do respetivo subsídio e, bem assim, o pagamento de subsídio de Natal.
A referência ao recebimento do valor não inferior ao recebido quando em serviço normal só pode ter o sentido interpretativo plausível de significar o valor “como se se estivesse num mês normal”, “como se fosse um mês normal”, “como se não estivesse em férias”.
Regressando às questões concretas:
1ª questão
Se deve apenas considerar-se regular e periódica uma prestação paga durante onze meses do ano.
A sentença recorrida entendeu “ser adequada a utilização do critério do pagamento da retribuição em, pelo menos, metade do ano para que se possa considerar preenchido o requisito da regularidade previsto pelo legislador para a consideração de determinada prestação como retribuição”.
A Ré recorrente alega que apenas poderão ser consideradas no cômputo da média da remuneração variável, as prestações que forem pagas, pelo menos, em onze meses do ano, para efeitos de cálculo da retribuição de férias e dos subsídios de férias e de Natal.
Vejamos, então, se lhe assiste razão.
Era nosso entendimento, como aliás o da maioria da jurisprudência dos Tribunais da Relação, que para que uma prestação fosse considerada regular e periódica não necessitava de ser paga em todos os meses do ano, com exceção do de férias, pois uma prestação paga ao trabalhador durante pelo menos seis meses do ano não podia deixar de se considerar regular e periódica, criando no trabalhador a convicção ou legítima expetativa de que a mesma constituía um complemento do seu salário e, como tal, integrava a sua retribuição.
Acontece que, face ao Acórdão do STJ nº 14/2015, de 01.10.2015, proferido no Proc. 4156/10.6TTLSB.L1.S1[4], publicado no DR 1ª série, de 29.10.2015, entendemos ser agora de rever tal posição.
Na verdade, este Acórdão do STJ, com valor ampliado de revista (artigos 186.º do CPT e 686.º, n.º 1, do CPC), fixou à cláusula 12.ª do Regulamento de Remunerações, Reformas e Garantias Sociais da TAP, integrado no AE de 2006, a seguinte interpretação:
«No cálculo das retribuições de férias e de subsídio de férias do tripulante de cabina deve atender-se à média das quantias auferidas pelo mesmo, a título de prestação retributiva especial a que alude a cláusula 5.ª do Regulamento de Remunerações, Reformas e Garantias Sociais, nos doze meses que antecedem aquele em que é devido o seu pagamento, desde que, nesse período, o tripulante tenha auferido tal prestação em, pelo menos, onze meses».
Como se decidiu nos acórdãos desta secção de 16/11/2015[5]:
<<O julgamento ampliado de revista tem lugar quando o Presidente do STJ entenda que tal se revela “necessário ou conveniente para assegurar a uniformidade da jurisprudência” (artigo 686.º, nº 1, do CPC), sendo este precisamente o objetivo de tal julgamento, o que justifica também a publicação do acórdão na 1.ª série do DR.
Ainda que o citado aresto se reporte à interpretação de cláusula constante de instrumento de regulamentação coletiva de trabalho que não é aplicável ao caso dos autos, afigura-se-nos, todavia, que não se deverá, face ao valor reforçado desse acórdão e à uniformização de jurisprudência que dele decorre e à similitude de situações a demandar tratamento análogo, deixar de se aplicar à situação em apreço nos autos a doutrina que decorre da interpretação sufragada em tal aresto.
Com efeito, o que estava em causa no referido Acórdão, tal como nos autos, é a mesma questão jurídica, qual seja a interpretação do conceito de retribuição previsto na lei geral, conceito este que tem natureza indeterminada e sendo as considerações nele tecidas transponíveis para o caso dos CTT por identidade ou analogia de situações. Tanto num caso, como no outro, há que interpretar o que se deve considerar como regular e periódico para preenchimento do conceito de retribuição para os mesmos efeitos (integração da retribuição de férias e subsídios de férias e de Natal). Ou seja, as considerações tecidas no ponto 6 do acórdão e vertidas na interpretação uniformizadora são, por identidade ou analogia, transponíveis para o caso dos CTT.>>
E, como se escreveu no acórdão desta secção de 30/11/2015, disponível, em www.dgsi.pt :
<<Assim, em face da doutrina que emerge deste acórdão no sentido da densificação dos conceitos indeterminados de regularidade e periodicidade previstos sucessivamente nos artigos 82.º da LCT, 249.º do Código do Trabalho de 2003 e 258.º do Código do Trabalho de 2009, através da fixação de um critério uniforme[6], e tendo em consideração o disposto no artigo 8.º, n.º 3, do Código Civil – segundo o qual “[n]as decisões que proferir, o julgador terá em consideração todos os casos que mereçam tratamento análogo, a fim de obter uma interpretação e aplicação uniformes do direito” –, entendemos dever rever a posição que até agora adoptamos quanto à densificação daqueles conceitos indeterminados para efeitos de qualificação retributiva das prestações do empregador ao trabalhador.
Razão por que no caso sub judice se aplicará o critério orientador do cariz regular e periódico das atribuições patrimoniais preconizado no citado Acórdão n.º 14/2015, atendendo-se apenas às prestações que hajam sido auferidas em todos os meses de actividade (11 meses) do período anual a atender para o cálculo da retribuição de férias e dos subsídios de férias e de Natal.>>
Assim sendo, e revendo a nossa posição anterior, entendemos que para efeitos de integração na retribuição de férias e dos subsídios de férias e de Natal, deve atender-se apenas às prestações que hajam sido auferidas em todos os meses de atividade do período a que respeitam as remunerações em causa (11 meses).
Em conclusão, os valores pagos ao A. ora recorrido e considerados na sentença recorrida como fazendo parte da sua retribuição apenas o serão quando tiverem atingido o mínimo de 11 meses no período de um ano e não de seis meses conforme resulta da mesma decisão.
Procede, assim, esta conclusão da recorrente.

2ª questão
Se as prestações complementares abono de condução, abono de prevenção e prémio de assiduidade não integram o conceito de retribuição e não são devidas nas férias nem nos subsídios de férias e de Natal.
Como já referimos, a recorrente entende que estas prestações complementares não integram o conceito de retribuição.
Vejamos, então, se lhe assiste razão:
Abono de condução
Nos termos da cláusula 146.ª do AE supra citado “os trabalhadores não motoristas que exerçam a tarefa de condução de veículos automóveis ou motociclos ao serviço da empresa têm direito a um subsídio por cada dia de condução, no montante previsto no Anexo IX nº 3.1”.
Acresce que, resulta da matéria de facto apurada que o abono de condução visava compensar o Autor pela especial penosidade e risco decorrentes da condução de veículos automóveis.
Como se decidiu no acórdão desta Relação de 16/12/2015, disponível em www.dgsi.pt[7]:
<<(…) quanto ao abono de condução, a sua previsão encontrava-se na cláusula 66ª do AE 2001, nos seguintes termos: “1—Os trabalhadores que, para o exercício da sua actividade profissional, conduzam ou operem em serviço as viaturas, tractores, transportadoras de bobinas, empilhadoras e gruas da empresa e que não sejam da categoria profissional motorista, receberão por cada dia em que conduzam, tendo a viatura sob a sua responsabilidade pelo menos três horas, o abono pelo risco de condução fixado no anexo V deste acordo.
2—Desde que a actividade diária de condução em serviço de viaturas da empresa seja relevante para o desempenho de funções da categoria do trabalhador, este auferirá o abono previsto na presente cláusula ainda que não complete o período de tempo referido no número anterior.
3—Os trabalhadores da categoria profissional motorista que operem gruas da empresa, receberão este abono, nas condições dos números anteriores.
(…)
Este regime manteve-se até 2013, data em que o Acordo, na cláusula 100ª, estabeleceu a integração do abono na retribuição base mensal dos trabalhadores que o viessem auferindo nos últimos doze meses.
A recorrente defende que este abono só constitui retribuição se o modo específico de prestação do trabalho for precisamente a actividade de motorista. De novo com o maior respeito, é a distinção feita nos números 1 a 3 que estabelece a irrelevância de ser motorista profissional, acautelando e pagando o risco de condução que outros trabalhadores, com outras categorias, tenham de suportar por, no exercício dessas suas outras funções, terem de conduzir viaturas como as mencionadas. Por outro lado, não se trata de um aspecto acessório, pois que o nº 2 previne que o pagamento do abono só é devido se a actividade de condução diária for relevante para o exercício das funções. Trata-se pois do modo específico de prestação de funções que relevantemente passa pela condução de veículos, com o seu acrescido risco, e por isso trata-se duma contrapartida específica do modo concreto de prestação do trabalho. E tanto é que, posto que regular e periódico, tem natureza retributiva, que não pode ser entendida de outro modo a vontade das partes em fazerem integrar o abono precisamente na retribuição base.>>
Assim sendo, facilmente se conclui que este subsídio tem uma causa específica, qual seja, a da condução de veículos exercida pelo trabalhador (que não é motorista), tarefa para a qual não foi contratado e, assim, não estamos perante as prestações a que aludem os artigos 87.º da LCT e 260.º, n.º 1 dos C.T. de 2003 e 2009 e, desta forma, tal subsídio integra a retribuição do A. como se decidiu na sentença recorrida mas apenas quando auferido de forma regular e periódica, ou seja, em 11 meses do ano e, como tal, deve ser considerado nas respetivas férias e subsídios de férias e de Natal[8].
Abono de prevenção
No que concerne a esta prestação, a sentença recorrida decidiu que a mesma assumia natureza retributiva.
A recorrente alega que a mesma não assume tal natureza dado que o seu pagamento pressupõe que o A. não tenha executado qualquer tarefa, visando compensá-lo por ficar disponível para executar a sua atividade, donde não pode ser contrapartida da prestação do trabalho.
Vejamos:
O abono de prevenção encontrava-se previsto na cláusula 54.ª do Acordo de 2001, nos seguintes termos:
“1 - Considera-se prevenção a situação em que o trabalhador, embora em repouso na sua residência, se encontra à disposição da empresa para eventual execução de serviços exclusivamente no âmbito da reparação inadiável de avarias notificadas durante o período de prevenção. O trabalhador só poderá ausentar-se para outro local desde que o serviço esteja informado da sua localização e seja possível contactá-lo com facilidade.
(…) 13 - O tempo de trabalho prestado em cada intervenção é pago com os acréscimos remuneratórios previstos para o trabalho suplementar, no n.º 2 da cláusula 52.ª e, sendo caso disso, com os previstos para o trabalho nocturno, com as seguintes especificidades:
(…)”.
Esta cláusula só foi alterada em 2013, passando a constar da mesma, agora a 57ª, o seguinte:
1 - Os trabalhadores poderão exercer a sua actividade em regime de disponibilidade e de prevenção, considerando-se como tal o período em que o trabalhador, embora em repouso, se encontre disponível para eventual execução de serviços exclusivamente no âmbito da intervenção inadiável, de ocorrências ou avarias notificadas durante esse período e que, por natureza, não possam aguardar por resolução no período normal de trabalho.
2 - O trabalhador em situação de prevenção deve manter-se permanentemente contactável e em local que assegure qualquer intervenção com facilidade e celeridade.(…)”.
Por outro lado, provou-se que o subsídio ou abono de prevenção, destina-se a compensar o Autor para que esteja disponível no seu domicílio para prestar trabalho; o A. era integrado numa escala e em situação de prevenção só recebe esse abono quando está disponível para intervir, mas não tem necessidade de prestar atividade e quando há intervenção ou prestação de atividade, o Autor não recebe abono de prevenção, mas o montante relativo ao trabalho suplementar e ou noturno, respeitante a esse período.
Conforme se decidiu no acórdão deste Tribunal de 16/12/2015[9]:
“Como resulta do próprio modo de pagamento deste abono, o trabalho prestado numa intervenção não é pago pelo abono, e portanto este abono paga exclusivamente a disponibilidade que consiste em, estando em repouso, não se poder ausentar ou apenas poder ausentar-se para local onde esteja contactável (e do qual obviamente possa vir atender à intervenção pedida).
Evidentemente, o trabalhador que está de prevenção não está a trabalhar. Porém, o essencial da colocação da sua força de trabalho à ordem de outrem, núcleo da obrigação contratual laboral, o que determina é que o trabalhador perde a livre disponibilidade do seu tempo para a vida pessoal, para todas as opções que pudesse nesta tomar. Tal como não se discute que nem todos os trabalhadores executam as mesmas funções e nem todos os trabalhadores, quando estão a trabalhar, têm o mesmo ritmo de trabalho – e nada disto desmerece que o seu tempo há-de ser pago mediante retribuição – pense-se na balconista de uma loja em que durante todo um dia não recebe nenhum cliente – também não discutirá que o trabalhador com disponibilidade limitada por força de estar de prevenção assim está por força do seu contrato, e que essa menor disponibilidade tem de ser paga. Não se tratando duma contrapartida do modo específico da prestação de trabalho, trata-se duma contrapartida do modo específico de indisponibilidade com a mesma fonte obrigacional.
De resto, é a própria lei que distingue entre trabalho e tempo de trabalho, especificando os tempos de não trabalho que equipara a tempo de trabalho com as restantes consequências legais – veja-se o artigo 197º do actual Código do Trabalho, em que se considera tempo de trabalho não só aquele em que o trabalhador trabalha, mas aquele em que permanece adstrito à prestação do trabalho. Deste modo, o tempo de prevenção é tempo de trabalho – veja-se Francisco Liberal Fernandes, in “O Tempo de Trabalho”, pg. 17 e seguintes – e como tal o seu pagamento, pela via do abono, é um pagamento do modo específico de prestação ou adstrição ao trabalho.
Entendemos por isso que, posto que apurada a regularidade e periodicidade, não será de excluir o abono de prevenção da natureza retributiva.”
Desta forma, improcede esta conclusão da recorrente.
Prémio de assiduidade
A sentença recorrida entendeu que este prémio integrava a retribuição do A..
Por outro lado, resultou provado que o prémio de assiduidade instituído em 1996 e incorporado no subsídio de refeição em 2003, constituía uma prestação que era paga a todos os trabalhadores da empresa, independentemente da categoria que detinham ou das funções que executavam e cujo único pressuposto era comparecerem ao trabalho durante pelo menos três horas de um dos períodos de trabalho.
Como se decidiu no acórdão desta Relação de 16/12/2015, disponível em www.dgs.i.pt e no qual a ora relatora interveio como 1ª adjunta:
<<Não há dúvida que a prestação em causa, mesmo afirmando-se como prémio, apenas está ligada à prestação de trabalho, ou seja, uma medida de combate à falta de assiduidade, e neste sentido, por ser geral, não é propriamente uma contrapartida específica do modo de execução do trabalho, justamente porque é independente desse modo, das funções desempenhadas. Por outro lado, não deixa de ser relevante a integração do mesmo prémio no subsídio de refeição, prestação que claramente não tem carácter retributivo. Isto é, a vontade das partes terá assentado no reconhecimento da natureza não retributiva do prémio.
Ora bem, apesar da LCT excluir expressamente do conceito de retribuição as ajudas de custo e abonos equivalentes - artigo 87º - também no artigo 88º prevenia a exclusão das gratificações extraordinárias concedidas pela entidade patronal como recompensa ou prémio pelos bons serviços do trabalhador. A assiduidade é um bom serviço do trabalhador e por isso um prémio de assiduidade, instituído nos moldes apurados, ainda que não personalizados, dirige-se mesmo à obtenção desse bom serviço por parte de todos os trabalhadores.
Entendemos assim que a LCT já excluía o prémio de assiduidade da natureza retributiva, salvo as excepções previstas no nº 2 do artigo 88º, que, salvo o devido respeito, não lograram ser provadas pelo recorrido, pois, não obstante os valores auferidos não serem dispiciendos, e no caso concreto do recorrido documentarem anos de assiduidade plenamente atingida e outros não, a verdade é que o prémio não decorria do contrato individual de trabalho nem está provado que decorresse dos usos.
Nesta parte, pois, procede o recurso.>>
E o mesmo ocorre no caso dos autos, razão pela qual, tal prémio não pode considerar-se como fazendo parte da retribuição do trabalhador.
Procede, assim, esta conclusão da recorrente.
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Face ao que ficou dito, cumpre apurar os montantes a que o A. tem direito.
Desta forma, tendo em conta a matéria de facto apurada (nomeadamente os valores em causa constantes dos respetivos quadros), cumpre proceder ao cálculo das quantias que devem integrar a retribuição de férias bem como os subsídios de férias e de Natal dos anos de 1989 a 2013:
Como ficou decidido supra, o A. não tem direito a receber qualquer quantia a título de prémio de assiduidade e no que respeita às prestações complementares de trabalho suplementar, trabalho noturno, chamada acidental, subsídio de condução e subsídio/abono de prevenção apenas tem direito a receber as seguintes quantias:
No ano de 1993, a título de abono de prevenção, a média mensal de € 100,28 x 3 = € 300,84.
No ano de 1994, a título de abono de prevenção, a média mensal de € 107,28 x 3 = € 321,84.
No ano de 1995, a título de subsídio de condução, a média mensal de € 18,40 x 3 = € 55,20 e a título de abono de prevenção, a média mensal de € 369,48 x 3 = € 1.108,44.
No ano de 1996, a título de subsídio de condução, a média mensal de € 20,40 x 3 = € 61,20 e a título de abono de prevenção, a média mensal de € 393,71 x 3 = € 1.181,13.
No ano de 1997, a título de abono de prevenção, a média mensal de € 390,42 x 3 = € 1.171,26.
No ano de 1998, a título de trabalho suplementar, a média mensal de € 317,35 x 3 = € 952,05 e a título de abono de prevenção, a média mensal de € 428,23 x 3 = € 1.284,69.
No ano de 1999, a título de trabalho suplementar, noturno e subsídio de condução, a média mensal de € 308,54 x 3 = € 925,62 e a título de abono de prevenção, a média mensal de € 341,06 x 3 = € 1.023,18.
No ano de 2000, a título de trabalho suplementar e de subsídio de condução, a média mensal de € 321,96 x 3 = € 965,88 e a título de abono de prevenção, a média mensal de € 313,84 x 3 = € 941,52.
No ano de 2001, a título de trabalho suplementar e de subsídio de condução, a média mensal de € 327,32x 3 = € 981,96 e a título de abono de prevenção, a média mensal de € 291,41 x 3 = € 874,23.
No ano de 2002, a título de trabalho suplementar e de subsídio de condução, a média mensal de € 222,19 x 3 = € 666,57 e a título de abono de prevenção, a média mensal de € 258,15 x 3 = € 774,45.

No ano de 2003, a título de trabalho suplementar e de subsídio de condução, a média mensal de € 211,34 x 3 = € 634,02.
No ano de 2004, a título de trabalho suplementar, noturno e subsídio de condução, a média mensal de € 356,01 x 2 = € 712,02.
No ano de 2005, a título de abono de prevenção, a média mensal de € 159,61 x 2 = € 319,22.
No ano de 2006, a título de trabalho suplementar, noturno, e subsídio de condução, a média mensal de € 399,73 x 2 = € 799,46.
No ano de 2007, a título de trabalho suplementar, a média mensal de € 468,77 x 2 = € 937,54.
No ano de 2008, a título de trabalho suplementar e noturno, a média mensal de € 962,03 x 2 = € 1.924,06 e a título de abono de prevenção, a média mensal de € 216,72 x 2 = € 433,44.
No ano de 2009, a título de trabalho suplementar, noturno e subsídio de condução, a média mensal de € 714,84 x 2 = € 1.429,68.
No ano de 2010, a título de trabalho suplementar, a média mensal de € 462,62 x 2 = € 925,24.
No ano de 2011, a título de trabalho suplementar, noturno, chamada acidental e subsídio de condução, a média mensal de € 680,49 x 2 = € 1.360,98.
No ano de 2012, a título de trabalho suplementar e noturno, a média mensal de € 296,14 x 2 = € 592,28.
No ano de 2013, a título de trabalho suplementar, noturno e chamada acidental, a média mensal de € 354,48 x 2 = € 708,96.
Desta forma, o A. tem direito a receber a título de prestações complementares não pagas na retribuição de férias e nos subsídios de férias e de Natal (este até ao ano de 2003), a quantia global de € 24.366,96.
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A Ré deve, então, ao A. a quantias supra discriminadas no valor total de € 24.366,96, a título de retribuições não pagas nas férias, subsídios de férias e de Natal, acrescidas de juros de mora nos termos fixados na sentença recorrida.
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Procedem, assim, em parte, as alegações da recorrente, impondo-se a revogação e manutenção da sentença recorrida em conformidade.
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IV – Sumário[10]
1. Para efeitos de integração na retribuição de férias e dos subsídios de férias e de Natal, deve atender-se apenas às prestações que hajam sido auferidas em todos os meses de atividade do período a que respeitam as remunerações em causa (11 meses).
2. O subsídio de condução tem uma causa específica, qual seja, a da condução de veículos exercida pelo trabalhador (que não é motorista), tarefa para a qual não foi contratado e, assim, não estamos perante as prestações a que aludem os artigos 87.º da LCT e 260.º, n.º 1 dos C.T. de 2003 e 2009 e, desta forma, tal subsídio integra a retribuição do A..
3. O tempo de prevenção é tempo de trabalho e, como tal, o seu pagamento pela via do respetivo abono é um pagamento do modo específico de prestação ou adstrição ao trabalho, posto que, apurada a regularidade e periodicidade, não será de excluir o abono de prevenção da natureza retributiva.
4. O prémio de assiduidade não constitui uma contrapartida específica do modo de execução do trabalho, é independente desse modo, das funções desempenhadas, pelo que, não tem carácter retributivo.
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V – DECISÃO
Nestes termos, sem outras considerações acorda-se em julgar parcialmente procedente a apelação e, consequentemente:
- em revogar a sentença recorrida na parte que condenou a Ré a pagar ao A. a quantia de € 30.989,05, condenando-se a Ré C…, S.A. a pagar ao A. B…, a quantia total de € 24.366,96 (vinte e quatro mil trezentos e sessenta e seis euros e noventa e seis cêntimos) e
- no mais, em manter a sentença recorrida.
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Custas a cargo da Ré recorrente e do A. recorrido, na proporção ½ para cada uma das partes.
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Porto, 2016/02/15
Paula Maria Roberto (vencida conforme declaração anexa)
Fernanda Soares
Domingos Morais
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[1] - Cfr. Monteiro Fernandes, in Direito do Trabalho, 11ª, Ed., Almedina, 2002, pág. 439.
[2] - Nos termos do artigo 6.º do aludido Decreto – Lei, a retribuição correspondente ao período de férias não pode ser inferior à que os trabalhadores receberiam se estivessem em serviço efectivo e igualmente os trabalhadores tinham direito a um subsídio de férias de montante igual ao daquela retribuição.
[3] - Diploma que, no n.º 1 do seu artigo 2.º, determinava que os trabalhadores tinham direito a um subsídio de natal de valor igual a um mês de retribuição, a ser pago até 15 de dezembro de cada ano.
[4] Disponível em www.dgsi.pt.
[5] Disponível em www.dgsi.pt o proferido no processo n.º 548/12.4TTGDM.P1 e nos com os n.ºs 160/14.3TTPNF.P1 e 1569/13.6TTPNF.P1. No mesmo sentido o acórdão desta Relação de 16/11/2015, processo n.º 1529/13.6TTPNF.P1 também disponível em www.dgsi.pt.
[6] Que, aliás, o Supremo Tribunal de Justiça vinha já acolhendo, como se verifica dos Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 23 de Junho de 2010 (proc. nº 607/07.5TTLSB.L1.S1), de 15 de Setembro de 2010 (proc. nº 469/09.4), de 16 de Dezembro de 2010 (proc. nº 2065/07.5TTLSB.L1.S1) e de 5 de Junho de 2012 (proc. nº 2131/08.0TTLSB.L1.S1), todos in www.dgsi.pt.
[7] No qual a ora relatora interveio como adjunta.
[8] Neste sentido, entre outros, o acórdão supra citado desta Relação, de 16/11/2015, proferido no processo n.º 160/14.3TTPNF.P1.
[9] Disponível em www.dgsi.pt e no qual a ora relatora interveio como adjunta, tendo ficado vencida quanto a esta questão concreta.
[10] O sumário é da responsabilidade exclusiva do relator.
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Voto (n.º 4, do artigo 663.º, do C.P.C.).
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Vencida no que respeita à questão da natureza retributiva do abono/subsídio de prevenção e pelas seguintes razões:
Tendo em conta o disposto na cláusula 57ª do AE aplicável, os trabalhadores podem exercer a sua atividade em regime de disponibilidade e de prevenção e o tempo de trabalho prestado em cada intervenção é pago com os acréscimos remuneratórios previstos para o trabalho suplementar e, sendo caso disso, para o trabalho noturno.
Certo é que, por se encontrar de prevenção, na disponibilidade do empregador, o trabalhador não pode dispor livremente do seu tempo, tem de estar contactável. No entanto, encontra-se em tempo de repouso e é este tempo que é remunerado com o respetivo abono de prevenção.
Assim sendo, entendo que esta prestação não constitui uma contrapartida do modo específico da prestação do trabalho e, como tal, não tem natureza retributiva.
Neste sentido, o acórdão do STJ de 14/05/2015, disponível em www.dgsi.pt., no qual se decidiu: «(...) Equacionou o STJ, aí, a questão de saber se o subsídio especial, de disponibilidade, atribuído onze meses em cada ano, em compensação da sujeição às disponibilidades exigidas pela operação e face às irregularidades de início e de termo da prestação de trabalho, «se destinava a compensar o incómodo de o Autor ter que interromper o seu período de descanso a fim de prestar a sua actividade ou se, ao invés, se destinava, (....) a retribuir a disponibilidade para esta prestação».
Da resposta a dar, considerou-se no aresto sob citação, que dependia a qualificação de tal subsídio de disponibilidade como constituindo (ou não) retribuição (stricto sensu).
(…)
Superou tal tensão, consignando: «Na primeira vertente, a atribuição patrimonial não assume
o carácter de contrapartida da prestação da atividade a que o trabalhador se obrigou (compreendendo tal obrigação, não apenas a prestação efetiva, mas também o estar disponível para a executar, num quadro temporal e espacial controlado pelo empregador previamente definido no contrato), pois do que se trata é de remunerar uma disponibilidade para trabalhar na emergência de situações, em que é afetada a liberdade de o trabalhador utilizar como e onde entender o seu tempo de repouso, ou seja, de compensar a perturbação dessa liberdade e os consequentes incómodos.
Na segunda vertente - a de compensação por ter que permanecer adstrito à prestação de funções, devido a Irregularidades de início e prestação de trabalho -, se a atribuição patrimonial em causa fosse a única remuneração percebida por trabalho prestado quando ocorressem as ditas irregularidades, então seria contrapartida da actividade prestada.»
Tomando em mãos a situação concreta nos autos, dúvidas não subsistem, em face da definição emprestada pelas partes ao questionado Abono /subsídio de Prevenção _ «Abono pago ao trabalhador para estar disponível para uma eventual chamada, fora das horas normais de serviço, Com valor fixo, à hora, (atualizável) pago mensalmente» - que o mesmo não pode ser considerado retributivo stritcto sensu), na justa medida em que, pelo mesmo, visa-se compensar, não o trabalho prestado, mas a especial penosidade que decorre do facto do trabalhador estar disponível para interromper o gozo do seu direito ao descanso para ir prestar trabalho, ou dizer ainda, visa mitigar incómodos ou transtornos para a vida pessoal do trabalhador que resultam dessa situação, de "estar de prevenção", não se reportando à disponibilidade do trabalhador durante o tempo de trabalho.
Repetindo o aresto que se vem seguindo, também no caso sub iudicio «a atribuição patrimonial não assume o caráter de contrapartida da prestação da atividade a que o trabalhador se obrigou (compreendendo tal obrigação, não apenas a prestação efetivo, mas também o estar disponível para a executar, num quadro temporal e espacial controlado pelo empregador previamente definido no contrato)», ([19]).» - fim de citação.
Significa isto que o abono em causa visa compensar/remunerar a disponibilidade e inerentes incómodos do trabalhador que tem de responder às situações que lhe são comunicadas durante o período de prevenção e não retribuir a efetiva prestação do trabalho pois esta é remunerada nos termos supra descritos.
Em suma, o abono/subsídio de prevenção não constitui uma contrapartida da prestação efetiva de trabalho e, como tal, não assume carácter retributivo, razão pela qual consideraria procedente esta conclusão da recorrente.
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Paula Maria Roberto