Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
0636552
Nº Convencional: JTRP00039942
Relator: MANUEL CAPELO
Descritores: CONTRATO-PROMESSA
CÔNJUGE
BENS PRÓPRIOS
VENDA
Nº do Documento: RP200701110636552
Data do Acordão: 01/11/2007
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO.
Decisão: CONFIRMADA A SENTENÇA.
Indicações Eventuais: LIVRO 700 - FLS. 83.
Área Temática: .
Sumário: I- Sempre que estando casados segundo o regime de comunhão geral de bens ou de adquiridos, o marido ou a mulher se obriguem a vender algum dos bens mencionados no artigo 1628-A do Código Civil, a obrigação, embora válida, só poderá ser cumprida com a cooperação do outro cônjuge.
II- E o promitente vendedor responderá, se não cumprir, ainda que o facto se deva pura e simplesmente à recusa ou não obtenção de consentimento do cônjuge, podendo o promitente comprador requerer judicialmente a execução específica do contrato-promessa.
III- Extintas as relações patrimoniais em consequência da dissolução do casamento já não há que aplicar a regra do artigo 1682-A do Código Civil, que não permite a venda de bens próprios por iniciativa de um dos cônjuges sem o consentimento do outro.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação do Porto

Relatório
B………….. e C………… intentaram contra Herança Aberta por Óbito de D………… a presente acção declarativa de condenação, sob a forma de processo ordinário, peticionando:
- A transmissão da propriedade do prédio objecto do contrato-promessa;
caso assim não se entenda:
- a devolução aos AA. da quantia de €24.939,89, acrescida de juros de mora à taxa legal.
Para fundamentarem os pedidos dizem que em 15 de Novembro de 2000 D…………… e os autores celebraram um acordo que denominaram de contrato promessa de compra e venda e no qual o primeiro declarou prometer vender aos segundos e estes comprar, um prédio rústico sito à Rua …….., freguesia de …….., concelho de Matosinhos.
A partir desta data os AA. tomaram posse do referido prédio.
Os autores pagaram a D................ o montante de esc. 5.000.000$00, em 12 prestações mensais, tendo sido efectuado o pagamento da última prestação em 07 de Outubro de 2001.
Aquando da morte de D................ este encontrava-se separado da cabeça de casal E.................
Como o bem prometido vender se tratava de um bem próprio do falecido D................, este consignou no referido contrato, que a escritura só seria outorgada após o divórcio do casal.
O que não aconteceu, pois, o promitente vendedor veio a falecer no estado de casado com a referida E................, tendo deixado duas filhas menores.
Na contestação a R. impugnou os factos e concluiu pela improcedência da acção.
Realizada a instrução dos autos com a elaboração de despacho saneador, especificação e questionário, procedeu-se a audiência de julgamento tendo sido proferida sentença que julgou improcedente o pedido de transmissão da propriedade do prédio objecto do contrato-promessa para os AA; condenou a Herança Aberta por óbito de D................ a pagar aos AA. a quantia de €2.078,49 (dois mil e setenta a oito euros e quarenta e nove cêntimos), acrescida de juros de mora à taxa legal cível, contados desde 15.11.00 até efectivo e integral pagamento; julgou improcedente o remanescente do pedido e absolveu a R. do mesmo.
Inconformada com esta decisão os autores interpuseram recurso concluindo que:
Deveria em sede de julgamento ter sido apreciado todo o circunstancialismo relativo à entrega dos cheques;
deveriam ter sido apuradas e esclarecidas as razões pelas quais os cheques emitidos pelo A eram a este de novo endossados pela promitente vendedor (autor da herança R), para se apurar se havia ou não pagamento das quantias acordadas;
existe uma falta ou imprecisão de fundamentação que justifique a falta de credibilidade, relativamente aos testemunhos prestados, nomeadamente os de F…………. e G…………., que afirmaram o mesmo que H………….., não tendo a credibilidade deste testemunho sido posta em causa;
a aplicação do art. 1717 para sustentar o regime da comunhão de adquiridos está feita em termos errados, e deveria o Mmo Juiz ter requerido a junção de Assento de casamento do falecido;
a Interpretação da cláusula de divórcio, como c1áusula suspensiva da execução do contrato, está errada face a todo o circunstancialismo. Nem se compreende, porque seria um caso em que a execução do contrato sujeitaria o promitente comprador apenas à vontade e desígnios do promitente vendedor, o que contraria o princípio da boa fé.
a cláusula deverá ser entendida como justificação para o contrato promessa não estar assinado pela esposa do promitente vendedor, e ser entendida no sentido de que após o divórcio ele cumpriria o contrato, porquanto não necessitaria da assinatura da esposa.
Exactamente porque o promitente vendedor morreu, está verificada a outra circunstância, ainda que por si não prevista, em que já não é necessário o consentimento da esposa, porquanto sendo aquele bem um bem próprio e tendo o proprietário falecido, a esposa agora apenas actua na qualidade de sua herdeira e não já na de co-titular de um património comum.
A ré não contra alegou.
Colhidos os vistos cumpre decidir.
……
Fundamentação
A primeira instância deu como provado que:
1) Em 15 de Novembro de 2000 D................ e os autores celebraram um acordo que denominaram de contrato promessa de compra e venda e no qual o primeiro declarou prometer vender aos segundos e estes comprar, um prédio rústico sito à Rua ……….., freguesia de ………, concelho de Matosinhos, conforme doc. junto a fls. 26 e ss.
2) O referido prédio encontra-se inscrito na matriz predial da freguesia de …….., sob o artº nº 700, conforme doc. 2 junto com a petição inicial.
3) O preço estipulado para a referida compra e venda foi de Esc. 5.000.000$00.
4) D................ faleceu em Dezembro de 2001.
5) No aludido “contrato promessa de compra e venda” o falecido promitente-vendedor declarou ter recebido esc. 416.700$00.
6) Aquando da morte de D................ este encontrava-se separado da cabeça de casal E.................
7) Como o bem prometido vender se tratava de um bem próprio do falecido D................, este consignou no referido contrato, que a escritura só seria outorgada após o divórcio do casal.
8) O que não veio a acontecer, pois o promitente vendedor veio a falecer no estado de casado com a referida E................, tendo deixado duas filhas menores.
… …
O recurso é balizado pelas conclusões das alegações, estando vedado ao tribunal apreciar e conhecer de matérias que naquelas não se encontrem incluídas, a não ser que se imponha o seu conhecimento oficioso (artºs 684º, nº 3 e 690º, nºs 1 e 3 do CPC), acrescendo que os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, sendo o seu âmbito delimitado pelo conteúdo do acto recorrido.
As questões suscitadas no presente recurso remetem para a decisão sobre a matéria de facto e sua fundamentação e para a interpretação do contrato promessa.
… …
Quanto à matéria de facto.
Das conclusões de recurso, neste domínio, resulta que os recorrentes questionam a convicção formada pelo tribunal a quo, e feita constar no despacho de resposta ao questionário, dizendo que essa convicção não está devidamente fundamentada e que por ser diminuta não convence.
Na fundamentação da decisão sobre a matéria de facto, não é suficiente a simples indicação dos meios de prova produzidos, sendo ainda necessária a explicação das razões que levaram a valorar a prova e a obter certa convicção.
A fundamentação das respostas à base instrutória, em processo civil, nos termos do disposto no art. 653 nº2 parte final do CPC deve conter, como suporte, em relação aos factos essenciais para o julgamento da causa, a análise crítica e a menção dos meios concretos de prova que levaram à formação da convicção do julgador, designadamente, os depoimentos das testemunhas, o teor dos documentos, sem esquecer a indicação, na medida do possível, das razões da credibilidade ou força decisiva reconhecida a esses meios de prova e a menção das razões justificativas da opção feita pelo julgador entre os meios probatórios de sinal oposto relativos ao mesmo facto, com possibilidade de indicação conjunta da motivação das respostas a um agrupamento de vários números da base instrutória, quando a fundamentação seja a mesma – Ac. R. L de 4.2.2003, no processo nº 3961/02.
Assim, estando indicados na fundamentação da decisão sobre a matéria de facto (vd. fls. 224 a 228) os meios de prova (v.g. testemunhal e documental) em que o julgador baseou a sua convicção, bem como a razão de ciência das testemunhas, demonstrativa do seu conhecimento dos factos, mostra-se cumprido o disposto no artigo 653 nº 2 do Código de Processo Civil, e respeitado, igualmente, o estatuído no artigo 205 nº1 da Constituição da República.
Os recorrentes concluem que “deveria ter sido em sede de julgamento apreciado todo o circunstancialismo relativo à entrega dos cheques” e “deveriam ter sido apuradas e esclarecidas as razões pelas quais os cheques emitidos pelo A eram a este de novo endossados pelo promitente vendedor (autor da herança R) para se apurar se havia ou não pagamento das quantias acordadas”.
E com base nestas conclusões defendem que deveria ser repetido o julgamento para ser reformulada a Base Instrutória para apuramento das circunstâncias de entrega dos cheques bem como ordenada a reinquirição das testemunhas porque face à semelhança dos seus depoimentos e à ausência de fundamentação para que o tribunal tenha valorizado umas e desvalorizado outras era necessário reavaliar a credibilidade das mesmas.
Em nosso entender carecem por completo de razão estas conclusões dos recorrentes uma vez que, a matéria que foi levada à Base Instrutória respeitou o que foi articulado pelas partes com interesse para a decisão de direito, pretendendo aqueles, quanto aos cheques que menciona, que fosse ampliada a Base Instrutória com matéria que não foi sequer alegada(1).
Por outro lado, tendo sido respondida à matéria constante da Base Instrutória e tendo as respostas sido regularmente fundamentadas, quer quanto à razão de ciência das testemunhas quer quanto às razões da sua maior ou menor credibilidade, é destituído de fundamento legal pretender-se a reinquirição das testemunhas.
… …
Quanto às questões referentes ao contrato promessa celebrado.
No que se refere ao regime dos bens que vigorava entre o promitente vendedor e sua mulher, mais importante era saber se o bem prometido vender se tratava de um bem próprio do promitente vendedor e se este era casado (com E………..), e tal matéria está assente (como o reconhecem os próprios recorrentes).
Por outro lado, quanto ao entendimento da cláusula do divórcio como condição suspensiva, verificamos que da matéria de facto provada decorre que a escritura só seria outorgada após o divórcio do casal, o que não veio a acontecer, pois o promitente-vendedor veio a falecer no estado de casado com a referida E................, tendo deixado duas filhas menores.
Sendo, por definição, condição suspensiva toda aquela que determina que os efeitos do negócio de que faz parte fiquem na dependência de um acontecimento futuro e incerto, por maneira que aqueles efeitos só se produzam se o evento condicionante vier a ocorrer - artº 270ºdo CC, dizer-se no contrato promessa que a outorga do contrato definitivo só teria lugar depois do divórcio do promitente vendedor, apenas pode ser entendida dessa maneira.
É evidente que se essa cláusula suspensiva foi inserida no contrato como justificação para o contrato promessa não ser assinado pela mulher do promitente vendedor e com a finalidade de, aquando da outorga do contrato definitivo, não ser necessária a assinatura daquela, isso em nada retira a qualificação essa cláusula como sendo uma condição suspensiva, nem o seu significado jurídico de funcionar, inequivocamente, como condição suspensiva dos efeitos do contrato promessa, até à ocorrência daquele acontecimento futuro, impondo tão só que se interprete essa mesma condição para se saber o que com ela se pretendeu declarar.
Assim, o facto de o bem prometido vender ser próprio do promitente vendedor, o contrato promessa ter sido celebrado apenas por este e não pela sua mulher e a celebração do contrato definitivo ter ficado dependente do divórcio daqueles, impõe que se interprete todo esse circunstancialismo como tendo sido pretendido que a mulher do promitente vendedor não tivesse qualquer intervenção nesses contratos (quer no de promessa quer no prometido).
Como se tem por pacífico, sendo casado (segundo o regime de comunhão de adquiridos) com E……………., à data da celebração do contrato-promessa, apesar de este ter sido outorgado sem intervenção dela, não deixou de ser válido pois o promitente não alienou, apenas se obrigou a alienar.
Do contrato-promessa derivam obrigações e não a transmissão da propriedade dos bens e o marido não carece do consentimento da mulher para contrair obrigações.
Embora a promessa que o contrato-promessa materializa represente uma mera convenção de prestação de facto, integra na sua essência o compromisso assumido pelo promitente vendedor, se for casado e entre os cônjuges não vigorar o regime de separação de bens, de vir a ser celerada com autorização ou outorga do outro cônjuge a respectiva escritura.
Sempre que estando casados segundo o regime de comunhão geral de bens ou de adquiridos, o marido ou a mulher se obriguem a vender algum dos bens mencionados no artigo 1628-A do Código Civil, a obrigação, embora válida, só poderá ser cumprida com a cooperação do outro cônjuge.
E o promitente vendedor responderá, se não cumprir, ainda que o facto se deva pura e simplesmente à recusa ou não obtenção de consentimento do cônjuge, podendo o promitente comprador requerer judicialmente a execução específica do contrato-promessa.
Não obstante faltar a um dos cônjuges legitimidade para a venda de bens imóveis, sem o consentimento do outro, é-lhe lícito realizar a respectiva promessa de venda (Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, vol. I, 9ª ed., pág. 337; Almeida Costa, Direito das Obrigações, 5ª ed, pág. 326; Galvão Teles, Direito das Obrigações, 6ª ed., pág. 109; Pereira Coelho e Guilherme de Oliveira, Curso de Direito de Família, Vol. I, 2ª ed, pág. 389; Ac. S.T.J. de 26-10-98, Bol. 390-404).
Porém, sendo válida nos termos sobreditos a promessa de venda de bem imóvel próprio, efectuada sem intervenção da então mulher, o tribunal não poderá neste caso, decretar coercivamente o cumprimento, proferido nos termos do artigo 830, do Código Civil, uma sentença que produza os efeitos da declaração negocial do faltoso.
A venda que o promitente vendedor se obrigou a realizar tinha por objecto um imóvel que fazia parte dos seus bens próprios e, por isso, se a acção tivesse sido intentada em vida dele a execução específica não era possível uma vez que, sendo ele casado segundo o regime de comunhão de adquiridos com a identificada E................, só com o consentimento dela a alienação podia ter lugar, dado o disposto no artigo 1682-A do Código Civil.
O tribunal pode, na sentença substituir o cônjuge contraente que se escusa à celebração do contrato prometido, ou seja, aquele que manifestou a vontade de fazer o negócio para o qual se pretende a declaração negocial definitiva, mas não aquele que à promessa se não vinculou, pois não se podem impor os efeitos de uma alienação a quem tinha o direito de a impedir e não se vinculou por qualquer forma a efectuar a venda ou a dar o seu consentimento para que ela se efectuasse.
A questão é no entanto a de saber se, tendo sido dissolvido o casamento do promitente vendedor em consequência da morte deste, continuará a ser exigível a manifestação do consentimento por parte da sua viúva.
No caso que nos ocupa, perante a interpretação que fizemos da cláusula que constituía a condição suspensiva, sabemos que esta pretendia excluir da celebração do negócio o cônjuge do promitente vendedor. Mas mais, parece seguro que, no conhecimento de que o promitente vendedor seria responsável pelo incumprimento se não obtivesse o consentimento do cônjuge, para se salvaguardar dessa eventualidade, incluiu no contrato promessa a condição segundo a qual só depois da dissolução do casamento, o contrato prometido seria assinado.
O contrato prometido seria outorgado quando o consentimento deixasse de ser necessário pela dissolução do casamento com o divórcio.
Pelo exposto, o facto de o promitente vendedor ter falecido reconduz-se à mesma questão enunciada, ou seja, verificar se com o decesso, e perante a dissolução do casamento, não se pode ter por verificada a própria condição que remetia, no seu significado útil, para a dissolução do casamento.
Com a morte cessam as relações patrimoniais a que o casamento deu origem (artigo 1688, do Código Civil) recebendo os cônjuges ou os seus herdeiros os seus bens próprios e a sua meação no património comum (artigo 1689, do Código Civil).
Extintas as relações patrimoniais em consequência da dissolução do casamento já não há que aplicar a regra do artigo 1682-A do Código Civil, que não permite a venda de bens próprios por iniciativa de um dos cônjuges sem o consentimento do outro.
A necessidade do consentimento perdeu toda a sua razão de ser a partir do momento em que cessam as relações patrimoniais entre os cônjuges. Os bens próprios do falecido transmitiram-se logo após a morte deste aos seus herdeiros e, por isso, perderam toda a importância que até então podiam ter na economia do casal.
O fundamento da autorização para a alienação dos bens imóveis reside no interesse que, ainda que próprios de um dos cônjuges, podem ter para a economia familiar mas, como é evidente, enquanto o casamento se mantiver.
A decisão recorrida considerou que mesmo no caso de falecimento do promitente vendedor a execução específica não seria admissível pelas mesmas razões que não o seriam no caso de os bens prometidos vender serem bens comuns e isto porque, fazendo apelo ao artº 1682º-A, nº 1, a), a lei não distingue o consentimento para os bens próprios e os comuns, especificando, claramente, que é exigível o consentimento do outro cônjuge para a alienação de bens próprios.
Por outro lado, refere a decisão recorrida, que a realização do contrato prometido não pode ser entendido como um encargo da herança, nos termos do artº 2068º, o qual terá de ser interpretado e conjugado com o preceituado no artº 1682º-A, nº 1, a). E o artº 2068º fala em pagamento de dívidas do falecido, isto é, terá de ser entendido como relativo a uma eventual indemnização a que haja lugar, como é o caso da devolução do sinal, coisa distinta da realização do contrato prometido/execução específica, sob pena de se esvaziar a exigência do consentimento do artº 1682º-A-nº 1, a).
Ainda, os herdeiros gozam do direito de preferência, nos termos do artº 2130º, além de nos termos do artº 2099º qualquer co-herdeiro poder pedir a remição sobre direitos de terceiro.
Cremos no entanto, quando faleça o promitente, antes da celebração do contrato prometido, não haver razões para distinguir entre os casos em que o bem próprio de um dos cônjuges foi prometido vender, vigorando entre o casal o regime da separação geral de bens, daqueles outros, em que o bem é próprio mas o regime de bens, por não ser o da separação, obriga ao consentimento do cônjuge a quem o bem não pertença. E isto porque, se a razão de ser da autorização para a alienação dos bens imóveis reside em salvaguardar, enquanto o casamento se mantiver, o interesse que, ainda que próprios de um dos cônjuges, os bens podem ter para a economia familiar, tal imperativo desaparece com a dissolução do casamento.
Se, em vez de ser um bem próprio do promitente vendedor, o prédio pertencesse aos bens comuns do casal, já seria necessário o consentimento da viúva para a venda e, nesse caso, manter-se-ia a comunhão até à partilha pois só esta lhe poria termo- vd. ac STJ de no proc. 083507/ JSTJ00020844, in dgsi.pt.
Em resumo, in casu, não é a circunstância de a condição suspensiva (a ocorrência do divórcio do promitente vendedor) se não ter verificado, nem o facto de, sendo o bem prometido vender próprio do promitente vendedor, a promessa não ter sido celebrada também pelo cônjuge daquele, que impede a execução específica.
São requisitos da execução específica de contrato-promessa, ao abrigo do art.830, nº1, C.Civ.: a) - que a natureza da obrigação assumida pela promessa não seja incompatível com a substituição da declaração negocial; b) - que não exista convenção em contrário; c) - que se verifique incumprimento por parte do demandado da obrigação de celebrar o contrato prometido, acrescentando o nº2 deste preceito que se entende haver convenção em contrário se existir sinal.
A presunção de que a existência de sinal importa ou significa convenção contrária à execução específica estabelecida no nº2º do art.830º C.Civ. é uma presunção relativa, iuris tantum, ilidível por prova do contrário, e expressamente afastada na hipótese regulada no seguinte nº3º, ou seja, nas promessas relativas a edifícios ou fracções autónomas já construídos, em construção, ou a construir.
No caso em estudo, o objecto do contrato foi um prédio rústico e tendo ficado provado que “ no aludido contrato promessa de compra e venda o falecido promitente-vendedor declarou ter recebido esc. 416.700$00”, esta quantia, nos termos do art. 441 do CC deve ser entendida como sinal.
Ora, não tendo sido afastada a presunção do mencionado art. 830 nº2 e tendo havido sinal, concluímos pois que a execução específica peticionada tem de improceder.
Por último, quanto ao pedido de devolução aos AA. da quantia de € 24.939,89, acrescida de juros de mora à taxa legal, tal pedido, como se afirmou na sentença recorrida, apenas procederá parcialmente pois apenas se provou que no aludido “contrato promessa de compra e venda” o falecido promitente-vendedor declarou ter recebido esc. 416.700$00, não se tendo provado mais nenhum pagamento.
Assim sendo, a herança apenas responde pelo pagamento de tal quantia de esc. 416.700$00, acrescido dos juros de mora cíveis contados desde 15.11.00.
Acresce que, carece de fundamento legal a conclusão de recurso dos recorrentes quando, aí, solicita que lhe seja pago o valor do sinal em dobro pois o pedido que formulou na petição inicial, para o caso de se entendesse não ser admissível a execução específica, foi o de ser restituído da importância que havia entregue e não de ser pago no dobro do sinal, não podendo o Tribunal da Relação pronunciar-se sobre questões que não hajam sido levadas à apreciação do tribunal a quo, a menos que fossem de conhecimento oficioso.
Nesta conformidade, improcedem as conclusões de recurso.
… …
Decisão
Pelo exposto, acorda-se em julgar improcedente a Apelação e, em consequência, confirmar nos termos sobre expostos a decisão recorrida.
Custas pelos apelantes.

Porto, 11 de Janeiro de 2007
Manuel José Pires Capelo
Ana Paula Fonseca Lobo
Deolinda Maria Fazendas Borges Varão
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(1) Veja-se que os recorrentes na sua petição inicial não alegaram ter emitido quaisquer cheques e menos ainda que tais cheques tivessem sido endossados a si de novo.