Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
2174/04.2TJVNF.P1
Nº Convencional: JTRP00042464
Relator: JOSÉ FERRAZ
Descritores: CUSTAS
RECURSO
VALOR TRIBUTÁRIO
Nº do Documento: RP200904202174/04.2TJVNF.P1
Data do Acordão: 04/20/2009
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: AGRAVO.
Decisão: NEGADO PROVIMENTO.
Indicações Eventuais: 3ª SECÇÃO - LIVRO 794 - FLS 140.
Área Temática: .
Sumário: Nos recursos, se o valor da sucumbência não for determinável ou, sendo-o, o recorrente, no requerimento de interposição, não o indicar, o valor (tributário) do recurso é o valor da causa.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação do Porto

1) – B………. (residente na Rua ………., …, ……., ………., Famalicão) instaurou acção declarativa ordinária contra:
a) - C………., Lda,
b) – D………. e E……….,
c) – F………. e G……….,
d) – H………. e I……….,
e) – J………. e K………., pedindo:
I) - se decrete, e os Réus devem sejam condenados a reconhecer, que é simulado, fictício, o preço de seiscentos mil euros (600.000,00 €) declarado na escritura pública que formaliza o contrato de compra e venda, celebrado em 30 de Dezembro de 2003, entre os segundos demandados (vendedores) e a Ré sociedade comercial (compradora), tendo por objecto os prédios acima identificados que integram a propriedade denominada “L……….”;
II) - se decrete, e os Réus sejam condenados a reconhecer, que o A., arrendatário -agricultor autónomo, há cerca de 40 anos, de tais bens imóveis, tem o direito de preferência no sobredito contrato de compra e venda celebrado, por escritura pública, no dia 30 de Dezembro de 2003, entre os segundos demandados (vendedores) e a Ré sociedade comercial (compradora), e, assim, tem o direito de haver para si os prédios alienados, supra identificados, integrantes da propriedade designada “L……….”, mediante o preço, real, de 300.000,00 €;
Ou, subsidiariamente, caso se demonstre que o preço real da transacção foi superior àquele (300.000,00 €) todavia não excedeu 350.000,00 €,
III) - se decrete, e os Réus sejam condenados a reconhecer, que o A., arrendatário - agricultor autónomo, há cerca de 40 anos, de tais bens imóveis, tem o direito de preferência no sobredito contrato de compra e venda celebrado, por escritura pública, no dia 30 de Dezembro de 2003, entre os segundos demandados (vendedores) e a Ré sociedade comercial (compradora) e,
IV) - assim, tem o direito de haver para si os prédios alienados, supra identificados, integrantes da propriedade designada “L……….”, pelo preço, real, que venha a apurar-se, em sendo o mesmo superior àquele preço de 300.000,00 € mas não exceda o montante de 350.000,00 € e
V) - deve ordenar-se o cancelamento do registo da referida compra que, porventura, haja sido feito a favor da Ré compradora.

Os RR contestaram, fazendo-o a sociedade ré em articulado autónomo dos demais que apresentam a mesma contestação, em que estes não põem em causa a qualidade de arrendatário reivindicada pelo autor.

A final, foi a acção sentenciada nos seguintes termos:
“A) Condeno os Réus a reconhecer que o Autor é arrendatário rural dos imóveis referidos em 3.12. (“L……….”, sita e, no ………., freguesia de ………., Famalicão), há pelo menos 7 anos;
B) Absolvo os Réus dos restantes pedidos;
C) Condeno Autor e Réus nas custas desta instância, na proporção de, respectivamente 19/20 e 1/20 (art. 446°, do Cód. Proc. Civil).
Julgo improcedente o pedido de condenação como litigante de m á fé formulado pela Ré C………., Lda, condenando esta nas custas do incidente com 1 U.C. de taxa (art. 446º, do C. de Proc. Civil)”.

O autor apelou para esta Relação, tendo s RR (pessoas singulares) recorrido subordinadamente na parte da sentença que lhes foi desfavorável.
Os recursos foram recebidos.

Em conhecimento dos recursos, a Relação
a) julgou improcedente a apelação do autor;
b) julgou improcedente o recurso subordinado;
c) decidiu que as custas de 1/20 fixados na sentença, por conta dos RR, são apenas da responsabilidade da 1º ré (a sociedade “C………., Lda”) e
d) condenou os apelantes nas respectivas custas.

Elaborada a conta (relativa aos recursos), foram calculadas as custas a pagar pelos RR/recorrentes em € 5.664,00 (valor da taxa de justiça) e, como já se encontrava paga a quantia de € 2.220,00, foram notificados para pagar o excedente (€ 3.444,00).

Reclamam estes da conta, pretendendo que apenas devem suportar 1/20 das custas totais.

A reclamação foi indeferida, entendendo-se que a conta foi correctamente elaborada de acordo com o disposto na lei.

2) - Inconformados com esta decisão agravam os mesmos RR.
Alegando doutamente, concluem:

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Não foi apresentada contra-alegação.
O despacho recorrido foi sustentado.
Corridos os vistos legais, cumpre decidir.

3) - Está em causa apreciar se as custas (do recurso de apelação – subordinado), devidas pelos agravantes, devem ser calculadas sobre o valor tributário da acção ou apenas sobre 1/20 desse valor tributário.

4) – Os factos a atender são os que se descrevem em 1).

5) – Não está em causa o valor da taxa de justiça ou a sua redução (1/2 – artigo 18º do CCJ) considerada na conta, mas apenas o valor tributário do recurso (que serve apenas para se determinar o montante das custas a pagar pelos agravantes que nele decaíram).

5.1) – O valor da causa, como decorre do artigo 305º/1 do CPC, e em regra geral, deve corresponde à utilidade económica imediata do pedido, aquela que a parte pretende alcançar com a causa e que se afere, essencialmente, pelo efeito jurídico perseguido. Trata-se do chamado valor processual (pelo qual se determinam a competência do tribunal, a forma do processo comum e a relação da causa com a alçada do tribunal) e, estando em questão bens de ordem material ou económica, o valor da causa corresponde à quantia (ou soma das quantias) em dinheiro pedida ou à quantia pecuniária equivalente ao benefício pedido (artigo 306º/1 do CPC).
O autor deve dar um valor à causa que, não sendo impugnado, é esse o valor (processual) a considerar, a não ser que outro seja fixado pelo juiz (arts. 314º, 317º e 467º/1, alínea f), do CPC).
Na espécie, por não ter sido impugnado e não ter sido modificado pelo tribunal, o valor da causa fixou-se no indicado pelo autor na petição (€ 600.000,00).

5.2) – Para efeitos de custas, o valor da causa é determinado pelas normas do código das custas judiciais, não tendo de ser idênticos o valor processual e o valor tributário, obedecendo regras diversas. Mas determina o artigo 5º do CCJ (versão aplicável) que “nos casos não expressamente previstos atende-se, para efeitos de custas, ao valor resultante da aplicação da lei de processo” e, para efeito de custas, “o valor declarado pelas partes é atendido quando não seja inferior ao que resultar dos critérios legais”. Por isso, e como regra geral, também o valor declarado pelas partes (se não contrariar as normas especiais do código de custas) é atendido para calcular as custas a pagar, e estas são calculadas pelo valor do pedido inicial.
No caso, por não contrariar os critérios fixados na lei de custas (e de processo), o valor da acção, também para efeitos de custas, é o indicado na petição (atrás referido).
É esse o valor tributário da causa.
É por esse valor que são calculadas as custas.

5.3) – Só pode recorrer quem, sendo parte principal na causa, tenha ficado vencido (ou as pessoas directa e efectivamente prejudicadas com a decisão – o que não é a situação dos autos) – artigo 680º/1 do CPC (na versão em vigor à data da proposição da acção).
Como decorre do artigo 684º/2 desse código, quando o dispositivo da sentença contém decisões distintas, pode o recorrente restringir o recurso a qualquer delas, especificando no requerimento a decisão de que recorre.
Mas as partes só podem recorrer da parte da decisão que lhes for desfavorável.
Os (ora) agravantes interpuseram recurso subordinado da sentença proferida (artigo 682º do mesmo código) e, no seu requerimento de interposição de recurso (fls. 421), expressam interpor recurso da sentença “na parte em que esta lhes foi desfavorável”.
Seguro é que também não poderiam recorrer de qualquer outra parte da sentença. Não restringem o recurso a qualquer das partes da sentença desfavorável, mas em tudo o que nesta lhes foi desfavorável. Aquela “aparente” limitação do âmbito do recurso, no domínio processual, não produz efeitos no domínio tributário, isto é, não basta para, a partir dessa “delimitação” do objecto do recurso, se fixar o seu valor tributário.

5.4) – Nos recursos, o valor (tributário) da causa é fixado de acordo com as regras plasmadas no artigo 11º do CCJ, que dispõe:
1. Nos recursos, o valor da causa é o da sucumbência quando esta for determinável, devendo o recorrente indicar o seu valor no requerimento de interposição do recurso.
2. Se o valor da sucumbência não for determinável ou na falta da sua indicação, o valor do recurso é igual ao valor da acção”.
O valor do recurso é o da sucumbência se esta for determinável, mas deve o recorrente indicar o seu valor no requerimento de interposição do recurso.
Já vimos que, nesse requerimento, os (ora) agravantes não fizeram tal indicação.
Para efeitos de custas, a norma traça um regime especial que dispensa a intervenção do juiz na sua fixação quando o valor da sucumbência não for determinável ou não se indicar esse valor na interposição. Nesse caso, o valor do recurso é o valor da acção.
Deste modo, o valor da sucumbência (na sentença) é ou não determinável.
Neste caso, o valor do recurso é o valor da acção.
Na primeira situação, o valor do recurso é o da sucumbência, desde que o recorrente indique esse valor no requerimento de interposição, caso contrário, esse valor é o valor da causa.

5.5) – Foram interpostos dois recursos, um deles subordinado, sendo julgados ambos improcedentes. Os apelantes foram, por isso, condenados nas respectivas custas (na situação, segundo a regra da causalidade – paga as custas quem lhes dá causa), sem qualquer atenuação ou distribuição.
Sendo dois os recursos – com objectos diversos – e ambos improcedentes, cada um dos recorrentes é integralmente responsável pelas custas do recurso que interpôs (sem qualquer divisão, dado o decaimento ser total).
Para esse efeito é indiferente que, na sentença, que julga a acção parcialmente procedente e, nessa medida, condenou ambas as partes nas custas do respectivo decaimento (atento o princípio da causalidade – artigo 446º do CPC), a parte tenha sido condenado apenas no pagamento de determinada quota das custas (1/20).
Se a parte apenas decaiu em parte, deve responder apenas por parte das custas, pois só nessa medida deu causa à acção.
Mas não é o que se passa (em concreto) no recurso, pois que os (ora) recorrentes decaíram totalmente no seu recurso e as custas forma colocadas inteiramente a seu cargo. Portanto, respondem pela totalidade das custas do seu recurso.
Por outro lado, não tendo feito a indicação de qualquer valor da causa para efeitos de recurso, não tendo limitado o valor da acção no recurso (atente-se que os recorrentes argúem a sentença de nula – por excesso de pronúncia e condenação em quantidade superior ou objecto diverso do pedido) o valor para efeito de cálculo das custas (do recurso) é o valor da acção.
Os agravantes respondem – sem discussão já, por trânsito do acórdão condenatório – pela totalidade das custas do “seu” recurso de apelação (e não por 1/20 das custas do recurso). E por outro lado, não tendo sido feita indicação de valor diferente, o valor para efeitos de cálculo das custas é o da acção. É perante esse valor (€ 600.000,00) que as custas são contadas.
O despacho recorrido não incorre em errada interpretação da lei.

Em conclusão - nos recursos, se o valor da sucumbência não for determinável ou, sendo-o, o recorrente, no requerimento de interposição, não o indicar, o valor (tributário) do recurso é o valor da causa.

6) - Pelo exposto, acorda-se neste tribunal da Relação do Porto em negar provimento ao agravo e manter o despacho recorrido.
Custas pelos agravantes.

Porto, 20 de Abril de 2009
José Manuel Carvalho Ferraz
António do Amaral Ferreira
Ana Paula Fonseca Lobo