Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRP00040291 | ||
Relator: | JOSÉ PIEDADE | ||
Descritores: | ABUSO DE CONFIANÇA SEGURANÇA SOCIAL INDEMNIZAÇÃO JUROS DE MORA ISENÇÃO DE CUSTAS | ||
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Nº do Documento: | RP200705090644421 | ||
Data do Acordão: | 05/09/2007 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | REC PENAL. | ||
Decisão: | PROVIDO. | ||
Indicações Eventuais: | LIVRO 264 - FLS 106. | ||
Área Temática: | . | ||
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Sumário: | I - No caso de condenação em indemnização baseada na prática de um crime de abuso de confiança contra a Segurança Social os juros de mora são os previstos nos artºs 16º do DL nº 411/91 e 3º do DL nº 73/99. II - Para o efeito previsto no artº 14º do DL nº 324/2003, o processo criminal considera-se instaurado a partir da apresentação da participação. | ||
Reclamações: | |||
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Decisão Texto Integral: | Acordam, em Audiência, os Juízes desta 2ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto: No .º Juízo Criminal do Porto, Proc…../03.OTDPRT, foram julgados a sociedade “B……….., Lda” e C………., acusados da prática de um crime de abuso de confiança em relação à Segurança Social, p. e p., à data dos factos, pelas disposições conjugadas dos arts. 27º-B e 24º, nº 1 do DL nº 20-A/90, de 15/01, com a redacção que lhe foi dada pelos DL nº 394/93, de 24/11 e DL nº 140/95, de 14/06 (RJIFNA) e, actualmente, p. e p. pelo art. 107º, com referência ao art. 105º, nº1 do RGIT, aprovado pela Lei nº 15/2001, de 05/06, sendo a sociedade arguida criminalmente responsável por força do disposto no art. 7º do RJIFNA e do RGIT, tendo sido proferida Sentença com o seguinte dispositivo: - Condenar o arguido C………. pela prática, como autor material e na forma consumada, de um crime de abuso de confiança em relação à Segurança Social, pelas disposições conjugadas dos arts. 107º, com referência ao art. 105º, nº1 da Lei nº 15/2001, de 05/06, na pena de 120 dias de multa, à taxa diária de 2,50 €, o que perfaz 300 €; Caso tal arguido não efectue o pagamento da multa, voluntária ou coercivamente, e não requeira a sua substituição por dias de trabalho, cumprirá o arguido 80 dias de prisão subsidiária, nos termos do art. 49º, nº 1 do CP. - Declarar extinto o procedimento criminal instaurado contra a arguida B………., Lda”, nos termos dos arts. 127º e 128º, nº 1, ambos do CP (versão de 1995); - Julgar parcialmente procedente o pedido cível formulado pelo Instituto da Segurança Social, IP, e, em consequência, condenar o requerido C………., a pagar ao requerente a quantia de €10.521,71, acrescida de juros de mora contados desde o 16º dia do mês seguinte àquele a que respeita cada uma das prestações em dívida, até integral reembolso, e julgar, ainda, extinta a instância cível quanto ao pedido cível, por impossibilidade superveniente da lide, na parte respeitante à sociedade requerida; - Custas do pedido cível a cargo da requerente e do requerido, na proporção do respectivo decaimento. * Desta Sentença não recorreu o condenado.* Nos autos foram interpostos dois recursos pelo Instituto da Segurança Social, IP.* Um recurso interlocutório, do Despacho proferido a fls 339 a 341, datado de 26/04/2006, e notificado à recorrente em 27/04/2006 (o recurso foi interposto em 12/05/2006 e é tempestivo) que não admitiu a sua intervenção como Assistente, devido à falta de pagamento da Taxa de Justiça, formulando as seguintes conclusões:O ora recorrente requereu a sua intervenção como Assistente nestes autos, bem como a isenção do pagamento de custas e Taxa de Justiça, isenção essa filiada na al. g), nº 1 do art. 2º do CCJ e do art. 118º, nº 1 da Lei nº 32/2002, de 20 de Dezembro e art. 41º, 46º, 51º-A do RIJFNA e art. 522º do CPP; O ora recorrente manifesta, com todo o respeito por opinião diversa, do despacho não admite, dada a falta de pagamento da respectiva taxa de Justiça, que o requerente intervenha nos autos na posição de Assistente; Os presentes autos iniciaram-se antes de 1 de Janeiro de 2004, não se aplicando, ipso facto, as alterações constantes da actual redacção do CCJ (art. 14º do DL nº 324/2003, de 27 de Dezembro), continuando, assim, o Recorrente a beneficiar da aludida isenção subjectiva prevista e imposta pelo anterior diploma; Entende o ora recorrente que, contrariamente ao alegado no despacho ora objecto de recurso, o que importa é a data da participação criminal ou da autuação do inquérito ser anterior à entrada em vigor do novo CCJ aprovado pelo DL nº 324/2003, de 27 de Dezembro para efeitos de isenção de custas, o que é o caso dos autos, uma vez que a participação criminal deu entrada nos Serviços de Ministério Público em 28/10/2003, e não a jurisdicionalização do processo que se inicia com o requerimento dirigido ao juiz para efeitos de substituição do Assistente, conforme se encontra plasmado no despacho recorrido; Sem prescindir, mesmo a entender-se ser de aplicar aos presentes autos a actual redacção do CCJ, o que só por mera hipótese académica se concebe, o nº1 do art. 2º do DL nº 324/2003, de 27 de Dezembro, está inserido no Título I, relativo às custas cíveis, estabelecendo, sem prejuízo do disposto em Lei especial, a isenção subjectiva dessas custas para as Entidades aí elencadas. Porém, no que se refere às custas criminais, na falta de disposição de teor semelhante, dispõe o art. 522º do CPP que “o Ministério Público está isento de custas”, o que equivale a afirmar que, na acção penal, é o próprio Estado que está isento de custas; O art. 118º, nº 1 da Lei nº 32/2002, de 20 de Dez., dispõe que “As Instituições de Segurança Social gozam das isenções reconhecidas por Lei ao Estado” e, por sua vez, o art. 29º, nº 1 do Estatuto do IGFSS, aprovado pelo DL nº 260/99, de 7 de Junho, refere que “O Instituto goza de todas as isenções reconhecidas por Lei ao Estado”; De acordo com as supra citadas normas, são atribuídas ao IGFSS “todas as isenções reconhecidas por Lei ao Estado”, incluindo-se nestas as taxas de justiça e custas devidas em processos penais; A supra referida interpretação jurídica e aplicação legislativa é perfilhada pela Jurisprudência corrente e dominante nos inúmeros processos pendentes desta natureza; Nesta conformidade, deveria o recorrente ser admitido como Assistente dada a isenção de custas de que beneficia. * O Instituto da Segurança Social, IP, recorreu, igualmente, da Sentença, na parte em que o condenou nas custas do pedido cível «na proporção do respectivo decaimento», formulando as seguintes conclusões:1- O ora recorrente deduziu no processo Pedido de Indemnização Civil, bem como requereu isenção do pagamento de custas e taxa de justiça inicial, isenção esta filiada na al. g) do nº 1 do art. 2º do CCJ, e do art. 118º, nº 1 da Lei nº 32/2002, de 20 de Dezembro e art. 41º, 46º, 51º-A do RIJFNA e art. 522º do CPP; 2- O ora recorrente foi notificado da Douta Sentença proferida pelo Tribunal a quo que julga o Pedido de Indemnização Cível formulado pelo ora recorrente parcialmente procedente, por provado, e em consequência condena o requerido C……….., a pagar ao requerente a quantia de €10.521,71, acrescida de juros de mora contados desde o 16º dia do mês seguinte àquele a que respeita cada uma das prestações em dívida, sendo os lucros calculados à taxa legal de 10% ao ano até 19.4.1999, 7% ao ano desde 20.4.1999 até 1.5.2003 e 4% ao ano, após tal data e até integral reembolso, julgando, ainda, extinta a instância cível quanto ao pedido cível, por impossibilidade superveniente da lide, na parte respeitante à sociedade requerida, ficando as custas do pedido cível a cargo da requerente e do requerido, na proporção do respectivo decaimento; 3- O ora recorrente discorda deste entendimento na parte respeitante às taxas legais aplicadas para cálculo dos juros de mora, bem como na parte respeitante à condenação em custas devidas pelo Pedido de Indemnização Cível a cargo do ora recorrente, na proporção de respectivo decaimento; 4- O MMo. Juiz a quo não fez uma correcta apreciação e criteriosa interpretação e aplicação das normas legais ao caso sub judice, designadamente ao aplicar, aos juros da condenação cível, a taxa de legal de 10% ao ano até 19.4.1999, 7% ao ano desde 20.4.1999 até 1.5.2003 e 4% ao ano, após tal data e até integral reembolso; 5- A obrigação de indemnizar resulta da responsabilidade civil por factos ilícitos (art. 483º CC); 6- No caso do pedido de indemnização civil formulado pelo demandante subjaz uma obrigação legal (a obrigação jurídica contributiva), de cujo incumprimento resulta a violação ilícita do direito das instituições de Segurança Social receberem, nos prazos fixados por Lei, os respectivos montantes descontados nos salários dos trabalhadores; 7- De acordo com o preceituado no nº 3 do art. 5º do DL nº 103/80, de 09/05, conjugado com o art. 16º do DL nº 140-D/86, de 14/06 e do art. 806º do CC, os juros de mora deverão contar-se a partir do 15º dia do mês seguinte àquele a que as contribuições dizem respeito pois, é a partir desse momento que o devedor se constitui em mora e, é este também o momento da prática do facto ilícito, já que os 90 dias a que se refere o art. 27º-B do RJIFNA devem ser entendidos como uma condição de procedibilidade da acção criminal – neste sentido, Carlos Rodrigues de Almeida, Juiz de Direito, in “Os Crimes Contra a Segurança Social Previstos no Regime Jurídico das Infracções Fiscais Não Aduaneiras, Separata da Revista do Ministério Público, nº 72”; 8- Aplicável por força do art. 129º do CP, estabelece o art. 798º do CC: “O devedor que falta culposamente ao cumprimento da obrigação torna-se responsável pelo prejuízo que causa ao credor”; 9- Por sua vez, o art. 804º do CC prevê que: “A simples mora constitui o devedor na obrigação de reparar os danos causados ao credor”; 10- E o nº 2 do mesmo normativo dispõe que: “O devedor considera-se constituído em mora quando, por causa que lhe seja imputável, a prestação, ainda possível, não foi efectuada no tempo devido”; 11- E o nº 2 do art. 805º, estabelece, por sua vez, que: “Há mora do devedor, independentemente de interpelação: a) se a obrigação tiver prazo certo”; 12- Finalmente, o art. 806 do CC dispõe que: “Na obrigação pecuniária a indemnização corresponde aos juros a contar do dia da constituição em mora”; 13- Assim, é consabido que, pelo mero decurso de prazo de cumprimento das obrigações pecuniárias (mora), a indemnização corresponde aos juros, a contar do dia da constituição da mora, com base no princípio geral das obrigações; 14- No entanto, no caso de incumprimento da relação jurídica contributiva perante a Segurança Social, o regime indemnizatório da respectiva obrigação pecuniária, actualmente, encontra-se definido especificamente no art. 16º do DL 411/91, de 17/10; 15- Segundo o nº 1 do art. 16º do diploma legal sobredito: “Pelo não pagamento das contribuições à Segurança Social nos prazos estabelecidos são devidos juros de mora por cada mês do calendário ou fracção”; 16- Disciplinando, o nº 2 do citado artigo, que: “A taxa de juros de mora aplicável é actualmente idêntica à estabelecida para as dívidas de impostos e é aplicável da mesma forma”; 17- Havendo, portanto, remissão expressa na matéria relativa a juros de mora, para a legislação tributária; 18- Neste sentido, a Lei Geral Tributária, no nº 1 do art. 44º, prevê que: “São devidos juros de mora quando o sujeito passivo não pague o imposto devido no prazo legal”; 19- Estabelecendo o nº 3 do citado artigo o seguinte: “A taxa de juros de mora será definida na lei geral para as dívidas ao Estado e outras Entidades Públicas”; 20- A lei geral a que este nº 3 do art. 44º da LGT se refere é o DL nº 73/99, de 19/03, diploma que veio alterar o regime de juros de mora das dívidas ao Estado e outras Entidades Públicas; 21- Segundo esse diploma, a taxa de juros de mora por dívidas ao Estado ou outras Entidades Públicas, prevista no art. 3 do referido Decreto-Lei, é de 1% ao mês se o pagamento se fizer dentro do mês do calendário em que se verificou a sujeição aos mesmos juros, aumentando-se uma unidade por cada mês de calendário ou fracção se o pagamento se fizer posteriormente; 22- Não pode o recorrente conformar-se com as taxas de juro aplicadas pelo MMo Juiz a quo em relação à importância em dívida; 23- O arguido/Demandado deveria ser condenado no pagamento dos juros de mora peticionados, os quais deveriam ter sido calculados à taxa de 1% ao mês, aumentando uma unidade por cada mês de calendário ou fracção se o pagamento se fizer posteriormente ao mês a que respeitam as contribuições; 24- Quanto à condenação em custas no Pedido de Indemnização Cível por parte do ora recorrente, na proporção do respectivo decaimento, cumpre dizer o seguinte: 25- Os presentes autos iniciaram-se muito antes de 01 de Janeiro de 2004, não se aplicando, na nossa modesta opinião, ipso facto, as alterações constantes da actual redacção do Código das Custas Judiciais (art. 14º do DL nº 324/2003, de 27/12), continuando, assim, e por isso, o requerente a beneficiar da isenção subjectiva prevista e imposta pelo anterior diploma; 26- O que importa é a data da participação criminal ou da autuação do inquérito ser anterior à entrada em vigor do novo Código das Custas Judiciais, aprovado pelo DL nº 324/2003, de 27/12, para efeitos de isenção de custas, o que é o caso dos autos uma vez que a participação criminal deu entrada nos Serviços do Ministério Público em 28/10/2003, e não a jurisdicionalização do processo que se inicia com o requerimento de Pedido de Indemnização Civil dirigido ao Juiz; 27- Sem prescindir, mesmo a entender-se ser de aplicar aos presentes autos a actual redacção do CCJ, o que só por mera hipótese académica se concede, o nº 1 do art. 2º do DL nº 324/2003, de 27/12, está inserido no Título I, relativo às custas cíveis, estabelecendo, sem prejuízo do disposto em Lei especial, a isenção subjectiva dessas custas para as Entidades aí elencadas; 28- O art. 118º, nº 1 da Lei 32/2002, de 20/12, dispõe que: “As instituições de Segurança Social gozam das isenções reconhecidas por lei ao Estado” e, por sua vez, o art. 29º, nº 1 do Estatuto do IGFSS, aprovado pelo DL nº 260/99, de 07/07, refere que “O Instituto goza de todas as isenções reconhecidas por lei ao Estado”; 29- Pelo que, de acordo com as supra citadas normas, são atribuídas ao IGFSS “todas as isenções reconhecidas por lei ao Estado”, incluindo-se nestas as taxas de Justiça e custas devidas em processos penais e civis; 30- Em abundância, não será irrelevante o facto de a supra referida interpretação jurídica e aplicação legislativa ser perfilhada/adoptada pela Jurisprudência corrente e dominante nos inúmeros processos pendentes desta natureza. * Em 1ª Instância, o MºPº defende a improcedência do recurso interlocutório e a procedência do recurso da Sentença, na parte em que condenou o recorrente em custas, dizendo, em síntese:«Recurso de fls. 369: A constituição de assistente está por exigência do art. 519º, nº 1 do CPP ligada ao pagamento da taxa de Justiça ou à sua isenção. Estando a questão do pagamento da taxa de Justiça no que respeita à constituição de assistente já definida pelo despacho de fls. 262, de que não houve recurso admitido (fls. 334) entendemos que está por esta razão já definida a obrigatoriedade do pagamento da taxa de justiça para o efeito. Não assistindo razão à recorrente no que respeita a este recurso. Recurso de fls. 375: Nesta questão somos do entender que não se deverá restringir isenção de custas tendo em conta a data do requerimento dirigido ao juiz para efeitos de constituição de assistente ou a distribuição do processo nos juízos. A disposição legal refere-se apenas aos processos instaurados e neste sentido nada obstará a que seja a data de instauração dos processos de inquérito que determine o momento a partir do qual se tenha em conta a entrada em vigor da supra mencionada disposição. E verificando-se que o processo ora objecto do presente recurso foi instaurado com inquérito em 22/10/2003, deverá gozar da referida isenção por ser anterior à entrada em vigor da nova redacção do CC Judiciais.» * Nesta Relação, o Sr. Procurador-Geral Adjunto subscreve a resposta do MºPº, em 1ª Instância, mas afirma que o último dos recursos deve ser rejeitado, por ter sido interposto fora de tempo.* Com interesse para a decisão a proferir, é o seguinte o teor da Sentença recorrida:Factos provados. 1º) A sociedade arguida iniciou a sua actividade de publicidade exterior, em veículos automóveis e em meios mecanicamente regulados, em 1993; 2º) Foi declarada falida em 12-04-2000, no âmbito do Processo de Falência nº …/99, do .º Juízo do Tribunal de Comércio de V. N. de Gaia, tendo a decisão transitado em julgado em 01-06-2000; 3º) O arguido, C………., foi sócio gerente da sociedade arguida, desde a sua criação e o único responsável pelos actos de gestão da mesma, decidindo autonomamente de todos os assuntos ligados à respectiva gestão comercial e financeira, bem como do destino a dar às receitas de empresa e dos pagamentos a efectuar por esta; 4º) No período compreendido entre Janeiro de 1998 e Abril de 2000, a sociedade arguida, através do arguido seu representante, procedeu a descontos nos salários dos seus trabalhadores e dos membros dos órgãos estatutários, a título de contribuições devidas à Segurança Social, no montante global de 10 521,71 Euros, repartido pelos meses e valores descriminados no mapa de fls. 21 a 24, cujo teor se dá por integralmente reproduzido; 5º) Face às disposições conjugadas dos artigos 5º, nº 2 e 3 e 6º do DL 103/80, de 9/5, 1º e 18º do DL 140-D/86, de 14/6, 3º do DL nº 327/93, de 25/9 e 5º do DL 103/94, de 20/4, deveriam tais quantias ser entregues nos Serviços do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social (Delegação do Porto) até ao dia 15 do mês seguinte àquele a que dizem respeito as contribuições; 6º) Porém, o arguido não o fez, nem regularizou a situação nos 90 dias volvidos sobre aquelas datas, apropriando-se das quantias referidas nos montantes e períodos acima indicados, que totalizam 10 521,71 Euros; 7º) Reteve as referidas quantias com intenção de se apropriar das mesmas, o que fez, bem sabendo que era sua obrigação proceder à sua entrega nos Serviços da Segurança Social, nos períodos aludidos; 8º) O arguido agiu sempre livre e voluntariamente, em nome e no interesse da sociedade arguida, na qualidade de seu representante legal; 9º) Bem sabia que a sua conduta era proibida por lei; 10º) O arguido actuou do sobredito modo por motivos de problemas financeiros, os quais começaram a se repercutir na sociedade arguida desde 1996/1997; 11º) O arguido, ainda, não regularizou a sua situação perante a Segurança Social; 12º) O arguido confessou os factos e mostra-se arrependido; 13º) Actualmente, a sociedade arguida não existe; 14º) É casado, vive com a esposa e, actualmente, está desempregado, e 15º) Ao arguido não são conhecidos antecedentes criminais. * Do pedido de indemnização civil:«O ofendido, “O Instituto da Segurança Social, I.P.“, peticionou o pagamento da importância de 18.048,94 €, acrescida dos juros vincendos. Nos termos do art. 129º do C.P. "a indemnização de perdas e danos emergente de um crime é regulada pela lei civil". Assim, é às disposições do C.C. – arts. 483º e ss. e 562º e ss. - que se têm de ir buscar não só os pressupostos da responsabilidade, como também as regras de determinação dos danos a indemnizar (cfr. Ac. S.T.J. de 26/10/1989, in A.J., nº 2, pág. 4). Ora, dispõe o art. 483º do C.Civil que “aquele que, com dolo ou mera culpa, violar ilicitamente o direito de outrem ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios fica obrigado a indemnizar o lesado pelos danos resultantes da violação”. Ora, o arguido ao proceder pela forma descrita preencheu os pressupostos de que depende a constituição da obrigação de indemnizar. No cálculo da mesma, atender-se-á aos danos patrimoniais sofridos pelo ofendido, consubstanciados pelas contribuições retidas e não pagas, referentes a Janeiro de 1998 até Abril de 2000 e respectivos juros (arts. 562º, 563º e 566º, nº 2, todos do C.Civil). No que toca aos juros, desde quando são devidos? Vejamos. Nas obrigações pecuniárias a indemnização corresponde aos juros a contar do dia da constituição em mora – art. 806º, nº 1 do CC. O art. 805º, nº 1 estabelece uma regra geral: o devedor só fica constituído em mora depois de ter sido judicial ou extrajudicialmente interpelado para cumprir. Porém, a seguir, o nº 2 do mesmo artigo estabelece algumas excepções a esta regra. Entre estas, na al. b), figura a hipótese de a obrigação provir de «facto ilícito». Finalmente, a regra do nº 3 trata dos casos em que o crédito não é «líquido», estabelecendo que, no que à responsabilidade por facto ilícito interessa, quando o crédito for ilíquido o devedor apenas se constitui em mora desde a citação, salvo se a falta for imputável ao devedor. A norma deste nº 3 não é aplicável, porque estamos perante quantias líquidas. As prestações devidas à Segurança Social, cuja entrega está na génese da responsabilidade criminal, estão e sempre estiveram perfeitamente quantificadas. Temos, pois, que por força do art. 805º, nº 2, al. b) do CC, não foi necessária a interpelação, judicial ou extrajudicial, para que o arguido/demandado se tivesse constituído em mora. As entregas deveriam ter sido feitas até ao 15º dia do mês seguinte a que respeitava cada uma das contribuições – art. 5º, nºs 2 e 3 do D.L. nº 103/80 e 10º, nº 2 do D.L. nº 199/99, de 8/6 – pelo que a mora teve início no dia seguinte. E quanto à taxa de juros devida? Como se referiu, o que está em causa nestes autos é apenas uma indemnização decorrente de responsabilidade civil por factos ilícitos, ou seja, a indemnização destes autos não se destina a liquidar uma obrigação tributária para com a Segurança Social (para a qual a lei estabelece mecanismos próprios), devendo, antes, ser fixada segundo os critérios da lei civil. Os nºs 1 e 2 do art. 806º do CC estabelecem que “na obrigação pecuniária a indemnização corresponde aos juros a contar do dia da constituição em mora “ e que “os juros devidos são os legais ...”. Na lei civil, os juros legais são os que são fixados por Portaria nos termos do art. 559º, nº 1 do CC. No caso em apreço, importa atender ao disposto nas Portarias nº 1171/95, de 25/9, nº 263/99, de 12/4 e nº 291/2003, de 8/4 e não ao D.L. nº 73/99, de 19/3, invocado pelo requerente. No que toca à sociedade arguida, atenta a referida extinção do procedimento criminal instaurado contra a mesma, nesta parte, importa julgar extinta a instância cível, por impossibilidade superveniente da lide (art. 287º, al. e) do CPC).» * Colhidos os Vistos, efectuada a Audiência, cumpre apreciar e decidir.* * * Questão prévia:A Sentença foi depositada na secretaria em 04/05/2006. O recurso foi interposto em 15/05/2006. Foi interposto em tempo, pelo que o Sr. Procurador-Geral Adjunto não tem razão ao invocar a sua intempestividade. * Das conclusões, delimitadoras do respectivo objecto, extrai-se que sob apreciação deste Tribunal estão as seguintes questões:Recurso interlocutório. - se o recorrente, Instituto da Segurança Social, IP, beneficia, nos autos, de isenção do pagamento da Taxa de Justiça devida pela sua constituição como Assistente. Recurso da Sentença. - qual a taxa legal aplicável aos juros de mora da quantia em cujo pagamento o demandado foi condenado. - se o recorrente, Instituto da Segurança Social, IP, beneficia, nos autos, da isenção do pagamento de custas que por ele sejam devidas. * Recurso interlocutório.No Despacho recorrido entende-se que o Instituto da Segurança Social, IP, não goza «da isenção subjectiva do pagamento de custas que existia antes da entrada em vigor do DL nº 324/2003, de 27/12 (art. 2º, nº 1 al. g) do CCJ». «Com a entrada em vigor em 1 de Janeiro de 2004 do novo CCJ, aprovado pelo referido DL. nº 324/2003, que prevê nos seus arts. 2º (custas cíveis) e 75º (custas criminais), as isenções subjectivas quanto a custas, deixaram de estar isentos, designadamente, o Estado e as instituições de Segurança Social (cfr. nesse sentido, CCJ, Anotado e Comentado, Salvador da Costa, 8ª Edição, 2005, pág. 66).» «Segundo o art. 14º, nº 1, do DL nº 324/2003, de 27/12, as alterações introduzidas ao CCJ apenas se aplicam “aos processos instaurados após a sua entrada em vigor”», mas, embora o processo de Inquérito se tenha iniciado em 28/10/2003 (data da entrada da participação criminal nos Serviços do MºPº), «quando no art. 14º, nº 1, do DL nº 324/2003, de 27/12, se refere que as alterações efectuadas ao CCJ apenas se aplicam “aos processos instaurados após a sua entrada em vigor”, deve restringir-se a isenção aos processos nos quais tenha dado entrada o requerimento solicitando a constituição de Assistente, antes da entrada em vigor da nova Lei.» Discorda o recorrente, afirmando «o que importa é a data da participação criminal ou da autuação do inquérito ser anterior à entrada em vigor do novo CCJ aprovado pelo DL nº 324/2003, de 27 de Dezembro para efeitos de isenção de custas, o que é o caso dos autos». O MºPº, em 1ª Instância, aborda a questão por outra vertente, defendendo que «Estando a questão do pagamento da taxa de Justiça, no que respeita à constituição de assistente, já definida pelo despacho de fls. 262, de que não houve recurso admitido (fls. 334) entendemos que está por esta razão já definida a obrigatoriedade do pagamento da taxa de justiça para o efeito.» A fls. 321, encontra-se um requerimento de recurso da «notificação para, em 5 dias, pagar a sanção prevista no art. 80º, nº 2, do CCJ, por não ter apresentado o documento comprovativo da autoliquidação da taxa de Justiça». Esse recurso não foi admitido porque «o recorrente não recorreu de qualquer Despacho proferido por este Tribunal, mas, sim, da notificação que lhe foi feita para vir, em 5 dias, pagar a sanção prevista no art. 80º, nº 2, do CCJ». Dessa não admissão do recurso, não houve reclamação. Porém, em momento anterior, no Despacho de recebimento da acusação, foi indeferido o pedido de isenção do pagamento de taxa de Justiça formulado pelo Instituto da Segurança Social, IP, tendo sido proferida a seguinte decisão: «atento o disposto no art. 2º do CCJ (actual versão), indefiro o requerido, no que toca à isenção de custas e de taxa de Justiça». O MºPº tem razão, esse Despacho transitou em julgado. A questão está decidida (mal decidida, como se irá ver a seguir, mas decidida). Consequentemente, o recurso interlocutório tem de ser rejeitado por se verificar uma causa de não admissibilidade (irrecorribilidade da decisão, devido ao trânsito em julgado da mesma). Se assim não fosse, colocar-se-ia, aliás, a questão da utilidade de um recurso que tem como objectivo último a admissão como assistente, nos autos, a ser decidido após ter sida efectuada a Audiência e proferida Sentença condenatória de que o condenado não recorreu. Isto é, a Sentença transitou em julgado, no que respeita a todo o seu dispositivo, excepto na parte referente à fixação da taxa dos juros de mora. A isto acresce o facto de o não admitido assistente ter intervindo neste processo como demandante cível, recorrendo, até, da Sentença final. * Recurso da decisão final.Qual a taxa legal aplicável aos juros de mora da quantia em cujo pagamento o demandado foi condenado. Na Sentença decide-se, no respeitante ao pedido cível, «condenar o C………., a pagar ao recorrente a quantia de €10.521,71, acrescida de juros de mora contados desde o 16º dia do mês seguinte àquele a que respeita cada uma das prestações em dívida, até integral reembolso». Na fundamentação refere-se: «o que está em causa nestes autos é apenas uma indemnização decorrente de responsabilidade civil por factos ilícitos, ou seja, a indemnização destes autos não se destina a liquidar uma obrigação tributária para com a Segurança Social (para a qual a lei estabelece mecanismos próprios), devendo, antes, ser fixada segundo os critérios da lei civil. Os nºs 1 e 2 do art. 806º do CC estabelecem que “na obrigação pecuniária a indemnização corresponde aos juros a contar do dia da constituição em mora “ e que “os juros devidos são os legais ...”. Na Lei civil, os juros legais são os que são fixados por Portaria, nos termos do art. 559º, nº 1 do CC. No caso em apreço, importa atender ao disposto nas Portarias nº 1171/95, de 25/9, nº 263/99, de 12/4 e nº 291/2003, de 8/4 e não ao D.L. nº 73/99, de 19/3, invocado pelo requerente». O recorrente afirma que o demandado «deveria ser condenado no pagamento dos juros de mora peticionados, os quais deveriam ter sido calculados à taxa de 1% ao mês, aumentando uma unidade por cada mês de calendário ou fracção se o pagamento se fizer posteriormente ao mês a que respeitam as contribuições». Os juros peticionados são os «calculados nos termos do art. 16º do DL nº 411/91, de 17/10 e art. 3º do DL nº 73/99, de 16/03, até efectivo e integral pagamento». Analisemos o tema: No DL nº 411/91, de 17/10 – entre outras matérias respeitantes às contribuições à Segurança Social –, actualiza-se a taxa de juro de mora no pagamento das contribuições em dívida à Segurança Social. Assim, no seu art. 16º estabelece-se: Nº 1 – Pelo não pagamento das contribuições à segurança social nos prazos estabelecidos são devidos juros de mora por cada mês de calendário ou fracção. Nº 2 – A taxa de juros de mora é igual à estabelecida para as dívidas de impostos ao Estado e é aplicada da mesma forma. No DL nº 73/99, de 16/03, legisla-se, em matéria de taxas de juros de mora aplicáveis às dívidas ao Estado e outras entidades públicas, numa perspectiva de «garantir adequadamente os créditos do Estado e de outras entidades públicas». No seu art. 3º estabelece-se: Nº 1 – A taxa de juros de mora é de 1%, se o pagamento se fizer dentro do mês de calendário em que se verificou a sujeição aos mesmos juros, aumentando-se uma unidade por cada mês de calendário ou fracção se o pagamento se fizer posteriormente. Na Sentença recorrida fixam-se os juros de mora de acordo com a Lei Civil, aplicando-se o art. 806º do CC, e as sucessivas Portarias que fixaram a taxa anual dos juros legais, no período em causa. O facto ilícito típico culposo, gerador da obrigação de indemnizar, consiste na não entrega à Segurança Social, do valor das deduções das contribuições devidas pelos trabalhadores, efectuadas no valor das remunerações destes, e na subsequente apropriação desse valor. Logo, a relação jurídica subjacente tem como objecto imediato (ou conteúdo) a obrigação de entrega, por parte da entidade empregadora – de que o condenado era gerente - daquelas contribuições à Segurança Social. Assim sendo, os juros de mora aplicáveis são os fixados nos diplomas acima transcritos, e não os “civis” aplicados na Sentença. Aqui aplica-se o Princípio Geral do Direito de que Lei Especial revoga Lei Geral. O recorrente tem razão, a Sentença deve ser alterada nessa parte do seu dispositivo. * Se o recorrente, Instituto da Segurança Social, IP, beneficia, nos autos, da isenção do pagamento de custas que por ele sejam devidas.Afirma o recorrente que «Os presentes autos iniciaram-se muito antes de 01 de Janeiro de 2004, não se aplicando as alterações constantes da actual redacção do Código das Custas Judiciais (art. 14º do DL nº 324/2003, de 27/12), continuando, assim, e por isso, o requerente a beneficiar da isenção subjectiva prevista e imposta pelo anterior diploma». «O que importa é a data da participação criminal ou da autuação do inquérito ser anterior à entrada em vigor do novo Código das Custas Judiciais, aprovado pelo DL nº 324/2003, de 27/12, para efeitos de isenção de custas». Na Sentença recorrida, tendo sido julgado parcialmente procedente o pedido cível (o que implica uma parcial improcedência), no que respeita às custas deste pedido, condena-se demandante e demandado no seu pagamento «na proporção do respectivo decaimento.» As alterações ao Código das Custas Judiciais, introduzidas pelo DL. nº 324/2003, de 27/12, entraram em vigor em 01/01/2004. No art. 14º, nº 1, sob a epígrafe “Aplicação no tempo”, estabelece-se: «Sem prejuízo do disposto no número seguinte, as alterações ao Código das Custas Judiciais constantes deste diploma só se aplicam aos processos instaurados após a sua entrada em vigor». O número seguinte ocupa-se da específica matéria do “montante dos pagamentos prévios de taxa de Justiça inicial e subsequente a efectuar nos processos pendentes”, a ser determinado de acordo com a tabela anexada. Em matéria de sucessão das leis no tempo, a regra geral é a de que a Lei antiga regula o passado, a Lei nova regula o futuro. É essa mesma regra que vem estabelecida no art. 12º, nº 1, do CC, que estabelece os princípios gerais nessa matéria aplicáveis em todo o nosso Ordenamento Jurídico. Estreitamente ligada a esta regra está o princípio da não retroactividade das leis, segundo o qual a Lei nova não pode regular, de modo mais desfavorável aos interessados, factos ocorridos ou relações iniciadas durante a vigência da Lei antiga. No entanto, admitem-se excepções a este princípio, quando estabelecidas em Lei expressa, isto é, se a própria Lei impuser a sua retroactividade. No caso, temos precisamente o contrário, a Lei nova estabelece expressamente a sua não retroactividade. O presente processo foi instaurado em 28/10/2003 com a participação da delegação do Porto do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social. Logo, a este processo não são aplicáveis as alterações ao CCJ, introduzidas pelo DL. nº 324/2003, de 27/12, entradas em vigor em 01/01/2004 (só são aplicáveis aos processos instaurados após a sua entrada em vigor). É aplicável o regime em vigor à data da sua instauração, aprovado pelo DL nº 224-A/96, de 26/11, que estabelecia no seu art. 2º, nº 1, al. g), estarem isentos de custas «as instituições de segurança social e as instituições de previdência social de inscrição obrigatória». Na Sentença, não é explicada a razão da condenação do demandante em custas, mas deduz-se que a razão do decidido é a mesma que levou à não admissão do recorrente como assistente por falta de pagamento da taxa de Justiça: “o requerimento de dedução do pedido deu entrada depois da entrada em vigor da nova Lei e do art. 14º, nº 1, do DL. nº 324/2003, de 27/12, deve fazer-se uma interpretação restritiva”. Interpretação restritiva é o processo interpretativo que leva à conclusão de que a letra da Lei é mais ampla do que o seu espírito. Não se vislumbra donde resulta, no DL. nº 324/2003, de 27/12, ter sido intenção do legislador considerar que a expressão “processos instaurados” se restringisse a processos em que a intervenção do Juiz tivesse sido solicitada. Nem o elemento literal, nem o elemento lógico, nem o elemento histórico a tal interpretação conduzem. Consequentemente, também nesta parte tem o recorrente razão. O recurso da Sentença final deve proceder. * Nos termos relatados, decide-se:- rejeitar, por inadmissível, o recurso interlocutório interposto; - julgar totalmente procedente o recurso da decisão final e, em consequência, alterar a Sentença nas seguintes partes do dispositivo: - Julgar parcialmente procedente o pedido cível formulado pelo Instituto da Segurança Social, IP, e, em consequência, condenar o requerido C………., a pagar ao requerente a quantia de €10.521,71, acrescida de juros de mora contados nos termos do art. 16º do DL nº 411/91, de 17/10 e art. 3º do DL nº 73/99, de 16/03, até efectivo e integral pagamento, tal como peticionado. - Custas do pedido cível pelo demandado, na proporção do seu decaimento; - não se condena o demandante nas custas decorrentes da parte do pedido cível em que decaiu, por delas se encontrar isento. Mantém-se, em toda a parte restante, a Sentença recorrida. * Sem custas, por não serem devidas.Porto, 09 de Maio de 2007 José Joaquim Aniceto Piedade Airisa Maurício Antunes Caldinho António Luís T. Cravo Roxo Arlindo Manuel Teixeira Pinto |