Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRP000 | ||
Relator: | ONDINA CARMO ALVES | ||
Descritores: | ALIMENTOS PRESTAÇÃO DE ALIMENTOS AO MENOR INVERSÃO DO ÓNUS DA PROVA | ||
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Nº do Documento: | RP201111292213/09.0TMPRT.P1 | ||
Data do Acordão: | 11/29/2011 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO. | ||
Decisão: | CONFIRMADA. | ||
Indicações Eventuais: | 2ª SECÇÃO. | ||
Área Temática: | . | ||
Legislação Nacional: | ARTº 344 DO CÓDIGO CIVIL. | ||
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Sumário: | I - O absoluto desconhecimento da situação do requerido impede a fixação da prestação de alimentos ao menor. II- Igualmente impede o recurso à inversão do ónus de prova, já que tal inversão apenas ocorre, como resulta do disposto no n° 2 do artigo 344° do Código Civil, quando a parte contrária culposamente tiver tornado impossível a prova ao onerado. | ||
Reclamações: | |||
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Decisão Texto Integral: | Apelação Nº 2213/09.0TMPRT.P1 Processo em 1ª instância – 2º Juízo Tribunal Família e Menores do Porto – 2ª Secção Sumário (art.º 713º nº 7 do CPC) 1. Não obstante o legal dever parental de contribuir com alimentos para o sustento dos filhos menores, não deve o Tribunal proceder à fixação de alimentos a favor do menor, nas situações em que nada se haja apurado acerca da vida social e profissional do progenitor vinculado à prestação de alimentos. 2. O argumento da necessidade de se obter uma condenação judicial para accionar o Fundo de Garantia de Alimentos Devidos a Menor não pode ser invocado para se defender a obrigatoriedade de fixação de alimentos, já que o regime consagrado na Lei nº 75/98, de 19/11, não pretendeu afastar o critério da proporcionalidade previsto no artigo 2004º, nº 1 do Código Civil, apenas estando abrangidos por tal regime os casos em que é possível proceder à necessária e prévia correlação entre as necessidades do alimentando e as possibilidades do obrigado. 3. O desconhecimento da situação do requerido – progenitor vinculado à prestação de alimentos – impede o recurso à inversão do ónus de prova, pois esta apenas ocorre quando a parte contrária culposamente tiver tornado impossível a prova ao onerado (artigo 344º, nº 2 do C.C.). 4. A sentença que, com tais pressupostos, não fixa pensão de alimentos, não viola o princípio da igualdade consagrado na Constituição da República Portuguesa. ACORDAM OS JUÍZES DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO I. RELATÓRIO O MINISTÉRIO PÚBLICO veio instaurar contra B….., residente na Rua …., nº…, …, …, Gondomar e C….., residente na Rua …., nº…, …, …, Gondomar, progenitores da menor D….., acção de regulação do exercício das responsabilidades parentais, relativamente a esta. Fundamentou, o Ministério Público, no essencial, esta sua pretensão na circunstância de a menor se encontrar registada como filha dos requeridos, os quais não são casados, vivendo a menor com a mãe. Designado dia para a realização da conferência a que alude o artigo 175º da O.T.M., tal não foi possível por o requerido, citado editalmente, não ter comparecido (cfr. acta de fls. 72). Foi solicitada ao Instituto de Reinserção Social a realização de inquérito sobre as condições sociais e económicas da progenitora, tendo sido junto o relatório de fls. 90 a 93. O Ministério Público pronunciou-se no sentido de a residência da menor ser fixada junto da progenitora, atribuindo-se a esta e em exclusivo as responsabilidades parentais, incluindo as relativas a questões de particular importância, dado ser desconhecido o paradeiro do progenitor, de ser fixada em 100 euros a pensão mensal de alimentos a favor da menor (fls. 100). Foram juntas informações da autoridade policial, confirmando-se o desconhecimento do paradeiro do progenitor. O Tribunal a quo proferiu decisão, constando do Dispositivo da Sentença o seguinte: Por tudo o exposto, decide-se regular o exercício das responsabilidades parentais relativas à menor D…., nos seguintes termos: 1º A menor fica a residir com a progenitora que assumirá em exclusivo as responsabilidades parentais; 2º O pai poderá visitar a menor sempre que o entender, na presença da progenitora e sem prejuízo das obrigações escolares e dos períodos de descanso da menor. Para o efeito, o progenitor deverá avisar a progenitora com 24 horas de antecedência. Inconformado com o assim decidido, o Ministério Público interpôs recurso de apelação, relativamente à sentença prolatada. São as seguintes as CONCLUSÕES do recorrente: i. Compete aos pais, no interesse dos filhos, velar pela segurança e saúde destes, prover ao seu sustento e dirigir a sua educação - artigo 1878.° n.° 1 do Código Civil. ii. Como tal, é dever dos pais esforçarem-se e diligenciarem com zelo e prontidão para proverem o sustento e manutenção dos filhos; iii. Nenhum pai pode renunciar às responsabilidades parentais, nem a qualquer direito decorrente da condição de progenitor artigo 1882°. iv. Se os pais não cumprirem com as suas obrigações, está o Estado legitimado a retirar-lhes os filhos e a entregá-los para a adopção - cfr. 1878°. v. Porque, todas as crianças, independentemente do sexo, idade, nacionalidade, origem social, raça ou outras condições especialmente valiosas, são titulares do direito à protecção da sociedade e do Estado, com vista ao seu desenvolvimento integral - artigo 69.° da mesma Lei Fundamental. vi. A obrigação de alimentos aos filhos decorre da lei e da condição de pai estando este inclusive obrigado a pagar alimentos - quando concebida a criança fora do matrimónio - à mãe do filho pelo período da gravidez e primeiro ano de vida do filho - artigo 1884° do Código Civil. vii. Porém, quando os progenitores não cumprem a sua função, cabe aos tribunais fixar o quantum de alimentos a pagar. viii. Este quantitativo há-de ter em conta todos os critérios legais, decorrentes dos artigos 2003° ss do Código Civil, como sejam as necessidades do menor e as capacidades dos pais - ambos os pais -. ix. Os pais têm o direito e o dever de educação e manutenção dos filhos, sendo certo, igualmente, que os cônjuges têm iguais direitos e deveres quanto à capacidade civil e política e à manutenção e educação dos filhos - artigo 36.° n.°s 3 e 5 da Constituição Politica da Republica Portuguesa. x. O critério - concorrente com outros - dos "meios do obrigado", para fixação da prestação de alimentos, previsto no artigo 2004° n.° 1 do Código Civil, consiste apenas um aspecto a considerar a par das necessidades do alimentando, não sendo necessário tal conhecimento para a fixação dos alimentos, cuja orientação deve obedecer ao superior interesse da criança e do menor. xi. As possibilidades dos pais para alimentarem os seus descendentes, por modestas que sejam, partirão sempre da consideração que tudo devem fazer e esforçar-se para sustentar e educar os filhos, considerando o conteúdo das responsabilidades parentais, pelo que deve ser este o ponto de partida para a fixação de alimentos nos casos de desconhecimento da situação económica. xii. Demonstrando-se que a capacidade alimentar dos pais se mostra insuficiente ou relapsa, cabe ao Estado substituir-se-lhes, garantindo aos menores as prestações existenciais que lhe proporcionem as condições indispensáveis ao seu desenvolvimento integral e a uma vida digna. xiii. Esta preocupação foi expressa na criação do Fundo de Garantia de Alimentos Devidos a Menores, pela Lei n.° 73/98, de 19 de Novembro, regulamentada pelo Decreto-Lei n.° 164/99, de 13 de Maio e Decreto-lei n.° 70/2010 de 16.Junho. xiv. A acção de regulação das responsabilidades parentais é o meio processual adequado para assegurar o direito que toda a criança tem ao desenvolvimento integral - artigo 69° da CRP - o mesmo é dizer, a forma processual adequada para que o Estado ( através dos tribunais), que tem a obrigação de o proteger, obrigue os progenitores a cumprir. xv. Assim, a sentença que regule o exercício das responsabilidades parentais deve fixar a pensão de alimentos a cargo do progenitor com quem o menor não resida ou não foi confiado mesmo sendo desconhecido seu paradeiro/residência no estrangeiro e a sua situação económica - artigo 36.°, n.°5 e n.°3 da Constituição Politica da Republica Portuguesa, artigos 3.° e 27.° da Convenção dos Direitos da Criança, artigos 1878. °, 1905.° e 2004.° todos do Código Civil e 180.° do Regime Jurídico ou Organização Quadro da Lei Tutelar de Menores, introduzido pelo Decreto-Lei n.° 314/78 de 27 de Outubro. xvi. Porque, mesmo que fosse o caso referido em 15º não fixar a prestação de alimentos, torna as decisões ilegais pela interpretação que dão às normas, criando injustiças insustentáveis e desigualdades entre menores que se encontram em situações de carência estruturalmente idênticas, com ofensa do princípio constitucional da igualdade de tratamento - artigo 13.° da Constituição Politica da Republica Portuguesa. xvii. Havendo elementos de prova suficiente de que o pai está emigrado em França há mais de 3 anos, telefona às vezes à mãe da filha, ainda que se não saiba a morada deste naquele país para o notificar ou solicitar inquérito, deve entender-se que o mesmo exerce actividade remunerada naquele país suficiente a pagar alimentos ao filho. xviii. Se ao fim de três anos de emigrante o devedor de alimentos não regressou ao país de origem, mantendo duas viaturas em Portugal registadas em seu nome, é porque tem um modo de vida melhor do que o que tinha cá, que lhe permite inclusive pagar as despesas inerentes às mesmas viaturas. xix. Sabendo-se que o pai de uma criança é emigrante num determinado país - no caso França - o tribunal não pode dar como provado que se desconhece o paradeiro do progenitor. xx. Mas antes dar como provado que o mesmo é emigrante em França e, em consequência, presumir que pelo menos aufere o ordenado mínimo nacional para aquele país. xxi. Pelo que a decisão que agora se questiona, não obrigando o pai a pagar pensão de alimentos ao filho, alimenta-lhe a irresponsabilidade e priva o menor da protecção que o Estado lhe pode e deve proporcionar, caso se verifique que dela venha a necessitar. xxii. A interpretação perfilhada na decisão recorrida não olha à unidade do sistema jurídico, cria desigualdades constitucionalmente insustentáveis, é descontextualizada do conjunto de normas e diplomas legais que enquadram e regulam o exercício do direito de alimentos devidos a menores e não obedece ou observa as mais elementares normas da interpretação jurídica. xxiii. Apenas a interpretação defendida pelo Ministério Público, da obrigatoriedade de fixar alimentos, promove a defesa do superior interesse da criança, incapaz juridicamente de prover ao seu sustento porque o é naturalmente. xxiv. Na situação em apreço, dúvidas não temos de que a defesa do superior interesse do menor impõe que seja fixada pensão de alimentos a cargo do pai, que tem possibilidades de o fazer. xxv. Ao decidir como decidiu, o tribunal a quo violou as normas e os princípios contidos nos artigos 36.°, n.° 3 e n.° 5 e 69.° da Constituição Politica da República Portuguesa, artigo 1.° e 27.° da Convenção dos Direitos da Criança, artigo 9.° n.° 1; artigo 1878 °, n.° 1, 1905.°, 2004.°, todos do Código Civil e artigo 180.° da Regime Jurídico ou Organização Quadro da Lei Tutelar de Menores, introduzido pelo Decreto-Lei n.° 314/78 de 27 de Outubro. xxvi. Em consequência, na declaração da sua ilegalidade, deve a decisão recorrida ser revogada e substituída por outra que condene o pai do menor a satisfazer as necessidades de educação do filho na quota parte da sua responsabilidade e fixe a prestação de alimentos mensal em montante que acautele aqueles superiores interesses acima sugerido (€=100,00=) bem como, a forma de os prestar, julgando-se integralmente provida esta apelação e procedente o presente recurso. Não foram apresentadas contra-alegações. Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir. *** II. ÂMBITO DO RECURSO DE APELAÇÃOImporta ter em consideração que, de acordo com o disposto no artigo 684º, nº 3 do Código de Processo Civil, é pelas conclusões da alegação do recorrente que se define o objecto e se delimita o âmbito do recurso, sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, apenas estando este tribunal adstrito à apreciação das questões suscitadas que sejam relevantes para conhecimento do objecto do recurso. Assim, e face ao teor das conclusões formuladas, a única questão controvertida a resolver consiste em apurar: - DA OBRIGATORIEDADE DE FIXAÇÃO, NAS DECISÕES QUE REGULAM O EXERCÍCIO DAS RESPONSABILIDADES PARENTAIS, DE UMA PENSÃO DE ALIMENTOS, NÃO OBSTANTE O DESCONHECIMENTO DA SITUAÇÃO ECONÓMICA DO PROGENITOR LEGALMENTE OBRIGADO A PRESTAR TAL PENSÃO. *** III . FUNDAMENTAÇÃOA - OS FACTOS Foram dados como provados na sentença recorrida os seguintes factos: 1. A menor D…. nasceu a 26.12.2008 e é filha dos requeridos; 2. Os progenitores da menor viveram juntos, encontrando-se separados desde meados de 2009; 3. A menor vive com a progenitora e três irmãs, numa casa, de tipologia 4, com razoáveis condições habitacionais; 4. A progenitora encontra-se desempregada, sendo os rendimentos do agregado provenientes do subsídio de desemprego e das prestações familiares das menores, no montante global de 854,52 euros; 5. O progenitor contacta esporadicamente, por telefone, com a menor; 6. O progenitor não contribui para o sustento da menor; 7. Desconhece-se o paradeiro do progenitor; 8. A menor apresenta um desenvolvimento adequado à respectiva faixa etária, encontrando-se, durante o dia, ao cuidado de uma ama particular. *** B - O DIREITO Insurge-se o recorrente contra a decisão proferida pelo Tribunal a quo, propugnando pela necessária fixação de alimentos à menor, assente basicamente em dois fundamentos: Um, na defesa do superior interesse do menor que impõe que a sentença que regula o exercício das responsabilidades parentais fixe a pensão de alimentos a cargo do progenitor com quem a menor não resida ou não foi confiada, mesmo sendo desconhecido seu paradeiro/residência no estrangeiro e a sua situação económica. Outro, porque considera que o pai da menor tem possibilidades de prestar alimentos, por estar emigrado em França há mais de 3 anos, telefona às vezes à mãe da filha, e, por isso, entende que o mesmo exerce actividade remunerada naquele país, suficiente para pagar alimentos ao filho. Como é sabido, não tem sido unívoco o entendimento jurisprudencial quanto à questão de saber se o legal dever parental de contribuir com alimentos para o sustento dos filhos menores deve sempre ser fixado pelo Tribunal, mesmo nas situações em que nada se haja apurado acerca da vida social e profissional do progenitor vinculado à prestação de alimentos. Para uma corrente jurisprudencial, a fixação da pensão de alimentos não é obrigatória nas decisões que regulam o exercício das responsabilidades parentais, sempre que o obrigado não tiver quaisquer meios para cumprir esse dever de prestar alimentos. E, nestas circunstâncias, o Tribunal deverá abster-se de fixar qualquer pensão de alimentos, por forma a dar cumprimento ao critério da proporcionalidade plasmado no artigo 2004º, nº 1 do Código Civil – v. neste sentido e a título meramente exemplificativo, Acs. R.Lx. de 18.01.2007 (Pº 10081/2007-2), de 04.12.2008 (Pº 8155/2008-6 ), de 05-05-2011 (Pº 4393/08.3TBAMD.L1-2), e Ac. R.P. de 25.03.2010 (Pº 1390/07.0TMPRT-A.P1), todos acessíveis na Internet, no sítio www.dgsi.pt . Para outra corrente jurisprudencial, o Tribunal deve sempre proceder à fixação de alimentos a favor do menor, ainda que desconheça a concreta situação da vida do obrigado a alimentos, visto que o interesse do menor sobreleva a questão da indeterminação ou do não conhecimento dos meios de subsistência do obrigado a alimentos, cabendo a este o ónus de prova da impossibilidade total ou parcial de prestação de alimentos – v. neste sentido, e a título meramente exemplificativo, Ac. R.P. de 22.04.2004 (Pº 0432181), Acs. R.Lx. de 26.06.2007 (Pº 5797/2007-7) e de 09.11.2010 (Pº 6140/07.8TBAMD.L1-1), todos acessíveis na Internet, no sítio www.dgsi.pt. A decisão recorrida seguiu a primeira das supra identificadas correntes jurisprudenciais, o recorrente defende o segundo entendimento. A decisão recorrida mostra-se correcta, já que a fixação de uma prestação de alimentos, na quantia aleatória de € 100,00 mensais, não tem suporte factual, visto apenas se ter apurado que o progenitor telefona às vezes à mãe da filha, desconhecendo-se o seu paradeiro – v. Nºs 5 e 7 da Fundamentação de Facto. A ausência de qualquer informação sobre a real situação económica e social do requerido, impede, desde logo, a necessária ponderação do imprescindível critério da proporcionalidade consagrado no artigo 2004º, nº 1 do Código Civil. E, não é possível defender-se, como se propugna na alegação de recurso do MºPº, que o requerido reúne condições para contribuir para o sustento da filha, com base no entendimento de que aquele estará emigrado em França há mais de 3 anos, daí se conjecturando que o mesmo exerce actividade remunerada naquele país suficiente a pagar alimentos à filha e que se não regressou ao país de origem, é porque tem um modo de vida melhor do que o tinha cá. Ora, estas ilações, mesmo à luz da experiência comum e da lógica corrente, não se revelam inequívocas, pelo que extravasam o âmbito do preceituado no artigo 349º do Código Civil. Não se desconhece que a questão em apreciação reveste de acuidade porquanto, para fazer accionar a intervenção do Fundo de Garantia dos Alimentos Devidos a Menor, necessário se torna a verificação de uma condenação judicial. Daí o recorrente invocar, nas suas alegações de recurso, a Lei nº 73/98, de 19 de Novembro e a circunstância de a interpretação perfilhada na sentença recorrida privar o menor da protecção que o Estado lhe pode e deve proporcionar. É certo, que a Lei nº 75/98, de 19 de Novembro e o Decreto-Lei nº 164/99, de 12 de Maio atribuem ao Estado, através do aludido Fundo gerido pelo Instituto de Gestão Financeira, a obrigação de garantia do pagamento dos alimentos devidos ao menor, sempre que os mesmos não possam ser cobrados nos termos previstos no artigo 189º da OTM. Mas, este importante aspecto de natureza pragmática não pode ser o pressuposto para se defender a obrigatoriedade de fixação de alimentos, já que tendo em consideração os requisitos cumulativos consagrados no artigo 1º da Lei nº 75/98, de 19/11, sempre se terá de entender que este regime não pretendeu afastar o critério da proporcionalidade consagrado no artigo 2004º, nº 1 do Código Civil, pelo que apenas estão abrangidos por tal regime os casos em que é possível proceder à necessária e prévia correlação entre as necessidades do alimentando e as possibilidades do obrigado – v. neste sentido Ac. R. Lx. de 17.09.2009 (Pº 5659/04.7TBSXL.L1-2), acessível no mesmo sítio da Internet e de que foi relatora a aqui também relatora. Acresce que, no caso vertente, nem sequer é possível concluir, com a necessária segurança – como se entendeu no supra citado Ac. R. Lx. de 26.06.2007 - que o requerido está em condições de exercer uma profissão que, no mínimo, lhe garanta o salário mínimo nacional, já que se ignora totalmente o paradeiro do requerido, bem como a sua situação económica e financeira. Ora, caso o Tribunal optasse pela fixação de uma prestação de alimentos em quantia meramente aleatória – in casu de € 100,00 mensais, como propugna o recorrente - sem qualquer suporte factual, sempre constituiria, como bem se salientou no mencionado Ac. R. Lx. de 18.01.2007, uma decisão violadora do disposto nos artigos 664º e 1410º do CPC, pois não obstante neste tipo de decisões o Tribunal não esteja sujeito a critérios de legalidade, mas antes de conveniência e oportunidade, isso não quer dizer que lhe seja permitido decidir sem factos e que ignore em absoluto as normas em vigor. Rejeita-se que o entendimento assim sufragado implique qualquer medida de violação do princípio da igualdade, consagrado no art.º 13º da Constituição da República Portuguesa, dado que a situação de incumprimento da prestação original de alimentos motivadora da intervenção do FGAM, é diferente da situação de não ter sido fixada a prestação alimentar (obrigação originária) - v. a este propósito, Ac. R.P. de 25.03.2010 (Pº 1390/07.0TMPRT-A.P1) e no supra referido Ac. R. Lx de 05.05.2011. Corrobora-se, de resto, o entendimento plasmado no citado Ac. R.P. de 25.03.2010 quando ali se refere que: Fixar pensão de alimentos a pagar pelo progenitor sem a prova de rendimentos deste que justifiquem tal fixação (…) para que, posteriormente, possa ser lançada mão do incidente de incumprimento e fixação de alimentos a pagar pelo Fundo de Garanta de Alimentos Devidos a Menores, nos termos da Lei nº 75/98, de 19.11 e D.L.nº 164/99 de 13.05, é subverter as regras do direito e pretender realizar política social que cabe ao poder executivo definir e não ao poder judicial, ao qual cabe aplicar a lei existente – v. também no mesmo sentido Ac. R.P. de 28.10.2003 (Pº 0324797 ). Acresce que o absoluto desconhecimento da situação do requerido igualmente impede o recurso à inversão do ónus de prova, como preconiza alguma jurisprudência, já que tal inversão apenas ocorre, como resulta do disposto no nº 2 do artigo 344º do Código Civil, quando a parte contrária culposamente tiver tornado impossível a prova ao onerado. Bem andou, pois, o Tribunal a quo ao não fixar qualquer prestação alimentar a cargo do progenitor, sendo certo que nada obsta a que, logo que conhecidas as condições de vida do requerido, bem como a sua situação económico-financeira seja, de imediato, e se for caso disso, fixado o valor da prestação alimentar devida à menor. Improcede, por isso, o recurso de apelação. * Não são devidas custas, por delas o recorrente estar isento – v. artigo 446º, nº 1 do CPC e artigo 4º, nº 1, alínea a) do R.C.P.*** IV. DECISÃOPelo exposto, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação do Porto em julgar improcedente o recurso, confirmando-se a decisão recorrida. Sem custas. Porto, 29 de Novembro de 2011 Ondina Carmo Alves - Relatora Maria de Jesus Pereira João Ramos Lopes - Vencido. ____________ Julgaria procedente o recurso por defender a orientação jurisprudencial que entende dever ser fixada (quantificada) a pensão de alimentos a favor do menor nos casos em que o progenitor se tenha ausentado para parte incerta e, por via disso, tenha sido impossível apurar a sua situação económica. Como referido no acórdão, a questão objecto da presente apelação vem dividindo a jurisprudência, estando publicadas diversas decisões que explanam os argumentos em que se estriba cada uma das orientações. Não se justifica, por isso, que neste voto de vencido se explanem os fundamentos em defesa da corrente que entendo dever ser seguida, pelo que me limito a remeter para os fundamentos aduzidos no Acórdão da Relação do Porto de 26/06/2011, relatado pelo Exmº Sr. Desembargador Pinto dos Santos, no qual tive intervenção como segundo adjunto, publicado no sítio www.dgsi.pt/jtrp. |