Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRP00037845 | ||
Relator: | JOSÉ FERRAZ | ||
Descritores: | EXPROPRIAÇÃO POR UTILIDADE PÚBLICA TERRENO RÚSTICO | ||
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Nº do Documento: | RP200503170530769 | ||
Data do Acordão: | 03/17/2005 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO. | ||
Decisão: | ALTERADA A SENTENÇA. | ||
Área Temática: | . | ||
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Sumário: | No cálculo da indemnização por expropriação por utilidade pública de um terreno agrícola deve atender-se não apenas ao que efectivamente é produzido no terreno como também ao que é possivel nele produzir numa utilização económica normal. | ||
Reclamações: | |||
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Decisão Texto Integral: | Acordam no Tribunal da Relação do Porto I. Por Despacho do Senhor Secretário de Estado Adjunto e das Obras Públicas, de 23 de Março de 2000, publicado no DR, nº 73, II Série, de 27/03/2000, com vista à execução das obras públicas EN 224 - Variante entre Oliveira de Azeméis e Vale de Cambra - Trabalhos Complementares - Troço entre a Rotunda de Arsopi e o fim da obra”, foi declarada a utilidade pública e a urgência da expropriação das parcelas de terreno 8.6E, 8.6D e 8.6Ds, respectivamente com as áreas de 130, 00 m2, 64,00 m2 e 435,00 m2, a destacar do prédio rústico, descrito na Conservatória do Registo Predial de Vale de Cambra sob o número 00864/980623 e inscrito na matriz rústica no artigo 790-Vila Chã, de que são proprietários B.................... e mulher C...................., D................... e mulher E.................... . Efectuada a vistoria "ad perpetuam rei memoriam" (cfr. fls.27/61 e 63/66 do processo), e não tendo havido acordo sobre o montante da indemnização a pagar aos expropriados, foi efectuada a arbitragem que, considerando terem os terrenos aptidão edificativa, fixou a indemnização nos seguintes valores: A) Quanto à parcela 8.6E - valor do terreno - 1.035.735$00, - desvalorização da parte sobrante - 71.775$00 e - valor das benfeitorias - 178.000$00€ 5.150,00 - valor total - 1.285.510$00/€ 6.412,21. B) Quanto às parcelas 8.6D e 8.6Ds - valor do terreno - 462 000$00, - desvalorização da parte sobrante - 32.010$00 e - benfeitorias - 324.400$00. - valor total 818.410$00/€ 4.082,21. Adjudicada a propriedade dos bens ao expropriante ICOR - Instituto para a Construção Rodoviária (agora, I.E.P. - Instituto de Estradas de Portugal) e notificadas os acórdãos da arbitragem, veio o “ICOR”, representado pelo Ministério Público, interpor das decisões arbitrais, alegando que o solo que constitui as parcelas não tem aptidão construtiva, por integrado em área da R.E.N., e que a indemnização aos expropriados deve ser fixada nos valores globais: - valor do terreno (incluídas todas as parcelas) - 629.000$00 e - benfeitorias - 329.000$00. - Valor total - 958.000$00. Em instrução, teve lugar uma avaliação efectuada por peritos. Em laudo maioritário, os peritos nomeados pelo tribunal e dos (nomeado pelo tribunal) expropriados, avaliando os terrenos como solo para outros fins (agrícolas), concluíram: A) Quanto à parcela 8.6E - valor do terreno - € 4.785,00 e - valor das benfeitorias - € 1.250,00. - valor total - € 6.035,00. B) Quanto ás parcelas 8.6D e 8.6Ds -valor do terreno - € 2.134,00 e -benfeitorias - € 2.300,00. -valor total - € 4.434,00. O perito indicado pela expropriante, seguindo o mesmo critério, concluiu pelos seguintes valores englobantes das várias parcelas expropriadas: - valor do terreno - € 3.145,00 e - valor das benfeitorias - 1.829,00 - valor total - €4.974,00. Oportunamente foi proferida sentença que fixou a indemnização a pagar aos expropriados em € 10.469,00, a actualizar desde a data da declaração de utilidade pública de acordo com os índices médio de preços no consumidor, com exclusão da habitação, até trânsito em julgado da sentença. II. Desta sentença recorreu o expropriante que encerrou a sua alegação concluindo: “A) Não obstante se entender normalmente que o laudo apresentado pelos peritos do Tribunal e dos Expropriados, por maioritário, é o mais idóneo, sempre se dirá que o laudo elaborado nos presentes autos, e no qual se baseou a M.ma Juiz recorrida para elaborara a sua sentença, apresenta algumas deficiências; B) Aceita-se a classificação da natureza do solo das parcelas expropriadas - solo para outro fins -, o que, aliás, obteve o acordo unânime de todos os peritos; C) Deverá, pois, o valor da justa indemnização ser calculado segundo o rendimento efectivo desse terreno; D) Não obstante ter sido esse o método de avalização considerado pelos Senhores Peritos do Tribunal, entendemos que o mesmo padece de algumas incorrecções, por ter recorrido a índices e valores de cultura que não são objectivos e reais; E) Um deles, por exemplo, é o índice levado em conta quanto aos encargos com as culturas, já que os Senhores Peritos do tribunal adoptaram um valor a título de encargos com a produção muito inferior ao valor real de cerca de 60% a 65%, o qual não difere de ano para ano, antes se mantém constante; F) Por outro lado, valorizaram o rendimento fundiário médio por hectare de tal terreno segundo uma taxa de capitalização de 5%, a qual consideramos superior à taxa objectiva e real de 3% que seria de aplicar; G) Por último, discorda-se também quanto ao valor em que foram avaliadas as benfeitorias existentes nas parcelas expropriadas; H) Na verdade, o muro de alvenaria ali existente, e com cerca de 60 m2, não pode nunca ser avaliado ao preço de 50,00 EUR por cada m2, pois que este preço é o valor corrente para a construção, por m2, de muros em granito, antes se deverá levar o valor apontado pelo Perito da Expropriante, de cerca de 25,00 EUR por cada m2; I) Exagerado se mostra também o valor de cálculo das videiras em ramada ali existente, que não deve ultrapassar o valor de 12,00 EUR por cada unidade; J) Todas estas razões por que pugnamos, como é de direito, pela anulação da douta sentença recorrida e por uma nova avaliação da parcela expropriada, e de acordo com os ditames legais em vigor. Nestes termos, e com o douto suprimento, deve ser dado provimento ao presente recurso de apelação, concluindo-se pela anulação da douta sentença recorrida e pela repetição da avaliação na parte referida, ou, se assim não se entender, pela fixação do valor da indemnização de acordo com os elementos constantes dos autos que respeitem os fundamentos do recurso ora interposto, como é de INTEIRA JUSTIÇA!” Não há contra-alegações. Colhidos os vistos legais, cumpre decidir. III. O objecto do recurso é balizado pelas conclusões das alegações da recorrente, não sendo conhecidas outras questões, que não sejam do conhecimento oficioso (arts. 684º, nº 3, e 690º, nºs 1 e 3, do C.P.C., pelo que a conhecer são essencialmente as seguintes as questões: 1) valor dos encargos com a produção; 2) taxa de capitalização para cálculo do rendimento fundiário; 3) valorização das benfeitorias - muro de alvenaria e videiras existentes nas parcelas expropriadas. IV. Na sentença recorrida vem provado: 1) Conforme declaração publicada no DR, II Série, de 27/3/00, e com vista à construção da obra da via de ligação entre a EN 115 e o ICI, foram expropriadas três parcelas de terreno, com a área aproximada de 435 m2, 64 m2 e 130 m2, pertencentes a B................. e mulher C..............., D............. e mulher E................, parcelas essas a destacar do prédio rústico sito no lugar da ..........., freguesia de ........., concelho de Vale de Cambra, com a área de 0,2950 ha, inscrito na matriz predial rústica da respectiva freguesia no artigo 790º e descrito na Conservatória do Registo Predial sob o número 00864/980623, e que confronta do norte com D............... e F................., do sul com Joaquim de Pinho, de nascente com D............. e de poente com linha de água. 2) Foi efectuada vistoria ad perpetuam rei memoriam, a qual consta de fls. 58759 e 62763 dos autos, e que aqui se dá por reproduzida. 3) De acordo com o Plano de ordenamento do PDM de Vale de Cambra, publicado no DR, II Série, nº 149, de 29/6/98, as parcelas expropriadas estão inseridas em zona de Reserva ecológica Nacional. 4) As parcelas expropriadas são terrenos planos. 5) Não confinam com nenhuma via pública pavimentada e o acesso é feito através de um caminho de terra batida, de cerca de 2 m de largura. 6) O arruamento mais próximo das parcelas expropriadas é a E.N. 227, que delas dista cerca de 60 m e que está localizada a poente. 7) Essa E.N. 227 é pavimentada com revestimento betuminoso e nele tem instalada rede de abastecimento domiciliário de água e de saneamento, ligado à estação depuradora, rede de distribuição de energia eléctrica em baixa tensão e rede telefónica. 8) As parcelas expropriadas confinam com o rio Viges pelo poente. 9) A parcela de 435 m2, na data da tomada de posse administrativa, tinha erva para pastagem, um muro de suporte de alvenaria de pedra seca, com a superfície de 19 m2 e 15 videiras dispostas em bardo, com fios de arame apoiados em esteios de pedra. 10) As parcelas de 60 m2 e 30 m2, na data da tomada de posse administrativa, não tinham culturas e tinham 6 videiras dispostas em ramadas e 6 videiras dispostas em latada, um muro de suporte de alvenaria de pedra seca com a superfície de 41,2 m2. 11) A parcela de terreno com a área de 435 m2 tem uma configuração sensivelmente trapezoidal irregular e é constituída por terreno plano, de cultivo, com videiras em bardo e acesso à E.N. por caminho de terra batida, com a largura de dois metros e insere-se na R.E.N. 12) As parcelas de 64 m2 e 130 m2 têm uma ligeira pendente no sentido noroeste e o acesso às mesmas é feito pelo referido caminho rural e constituem terra de cultivo. Atento o auto de vistoria ad perpetuam rei memoriam, os acórdão da arbitragem e os relatórios da avaliação, considera-se assente ainda: 13) Na data da vistoria, os terrenos estavam sem culturas. 14) Os solos das parcelas apresentam topografia plana, boa acessibilidade, água de rega e são de boa qualidade. 15) O terreno das parcelas apresenta uma aptidão agrícola, sendo usual a cultura em rotação de batata e erva. V. Estabelece o artigo 62º, nº2, da C.R.P., que a expropriação só pode ser efectuada mediante o pagamento de justa indemnização. Ao consagrar o direito à propriedade privada, a Lei Fundamental definiu os princípios que limitam e condicionam a expropriação - previsão legal e prossecução de um fim de utilidade pública. Deles decorre que a expropriação constitui sempre o expropriante na obrigação de compensar o expropriado pelo desvalor que dela lhe adveio, de pagar uma justa indemnização. Não obstante impor o princípio da justa indemnização, a lei constitucional deixou para o legislador ordinário a definição dos critérios concretos que permitem realizar ou concretizar o conceito de "justa indemnização". Porém, esses critérios têm de ‘respeitar os princípios materiais da Constituição (igualdade, proporcionalidade), não podendo conduzir a indemnizações irrisórias ou manifestamente desproporcionadas à perda do bem requisitado ou expropriado’ (cfr. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição Anotada, 2ª Ed./1/337. A Constituição não impõe determinado critério de avaliação do bem expropriado, apenas que a indemnização a atribuir seja justa. Em caso de expropriação, o direito de propriedade transforma-se no direito ao respectivo valor. É pelas normas do Código das Expropriações, aprovado pela Lei nº 168/99, de 18/9, que se determina qual seja o valor da "justa indemnização" a atribuir aos expropriados, em causa neste recurso. Os bens imóveis podem ser expropriados por causa de utilidade pública, mediante o pagamento contemporâneo de uma justa indemnização, a calcular com referência à data da declaração da utilidade pública (DUP) - arts. 1º e 24º, nº 1, do CE/99. “A justa indemnização não visa compensar o benefício alcançado pelo expropriante, mas ressarcir o prejuízo que para o expropriado advém da expropriação, correspondente ao valor real e corrente do bem do bem de acordo com o seu destino efectivo ou possível numa utilização económica normal” (artigo 23º, nº 1, desse código) tendo em consideração as circunstâncias e condições de facto existentes na data da publicação da declaração de utilidade pública. Para efeitos de avaliação e determinação do valor da justa indemnização, os solos classificam-se como ‘solos aptos para construção’ e ‘solos para outros fins’, sendo esse diferente enquadramento decisivo na valorização dos terrenos expropriados. Com a classificação dos solos feita pela lei (art. 25º do CE) procura-se estabelecer critérios orientadores (indicativos) para a avaliação, evitando-se as disparidades injustificadas das avaliações por aplicação de critérios não uniformes, ao menos tendencialmente, reduzindo a inevitável subjectividade dos avaliadores e garantindo, no possível, uma maior igualdade no tratamento das várias situações. Com os critérios previstos (arts 25º, 26º e 27º do CE) visa-se dar referências à determinação objectiva do valor dos bens, evitar a subjectividade (nomeadamente dos peritos avaliadores) no tratamento de situações normais (que os critérios previstos reflectem) e idênticas e garantir a igualdade dos cidadãos (pelo tratamento igual de situações idênticas). Os critérios da justa indemnização devem ser vistos em concreto e à luz dos diferentes interesses a conjugar, devendo o expropriado receber aquilo que conseguiria obter pelos seus bens se não tivesse havido expropriação, ou seja, a indemnização deve corresponder ao valor de mercado (que, normalmente, reflecte o valor real e corrente dos bens) do bem expropriado, de modo a ser reposto no património do expropriado o valor equivalente ao dos bens de que ficou privado. A indemnização por expropriação tem uma função compensatória, daí resulta que o dano patrimonial suportado pelo expropriado é ressarcido de uma forma integral e justa se a indemnização corresponder ao valor real e corrente, que será o valor de mercado, ou seja, a quantia que teria sido paga pelo bem expropriado se tivesse sido objecto de um contrato de compra e venda, em mercado livre, não influenciado por factores conjunturais ou meramente especulativos. Ao contrário dos Senhores Árbitros que calcularam o montante da indemnização aos expropriados, classificando o solo das parcelas expropriadas como solo apto para construção, os peritos avaliaram esses terrenos como solo para outros fins, o que foi sancionado na sentença recorrida, e bem, não só por nas parcelas não ser possível construir, pois se integram em área de Reserva Ecológica Nacional (sem que dos autos resultem elementos que, de alguma forma, permitam considerar-se reunidas as condições da edificabilidade nas restritas situações da sua admissibilidade), como também não se poderia classificar as parcelas expropriadas como solo apto para construção por não se integrarem nas previsões várias que o artigo 25º, nº 2, do CE/99 contempla. As parcelas, agora sem controvérsia, foram avaliadas segundo a sua aptidão agrícola, e com essa afectação foi na sentença fixado o valor da indemnização. E era em função duma afectação dessa natureza que se poderia determinar o valor real e corrente do bem, aquele que os expropriados poderiam obter de um comprador médio, prudente e avisado, que não deixa de ponderar o benefício que pode obter em concreto e não na perspectiva duma hipotética afectação construtiva do bem que, de facto, não tem nem poderia ter. O valor da indemnização deve corresponder ao valor real e corrente dos bens, numa situação de funcionamento normal do mercado (artigo 23º, nº 5, do CE). É este valor de mercado, quando não influenciado por factores que o distorçam, o que compensará integralmente o sacrifício patrimonial sofrido pelo expropriado e, ao mesmo tempo, garante-lhe, em comparação com os demais cidadãos não expropriados, um tratamento igual. O valor dos solos para outros fins, que não a construção, é determinado de acordo com os critérios definidos no artigo 27º do CE/99. Não sendo possível recorrer ao estabelecido no nº 1 desse preceito, o valor do solo é calculado “tendo em atenção os seus rendimentos efectivo ou possível no estado existente à data da declaração de utilidade pública, a natureza do solo e do subsolo, a configuração do terreno e as condições de acesso, as culturas predominantes e o clima da região, os frutos pendentes e outras circunstâncias objectivas susceptíveis de influir no respectivo cálculo” (nº 3), tendo em consideração as circunstâncias e condições de facto existentes à data da publicação da DUP. No cálculo da indemnização é de atender não apenas ao que efectivamente é produzido nos terrenos como ao que é possível produzir (numa utilização económica normal). Como se verifica do auto de vistoriam ad perpetuam rei memoriam, os terrenos expropriados são terrenos agrícolas e, à data daquela, não havia culturas. Foram, pelos peritos, avaliados de acordo com a sua afectação efectiva e normal, o aproveitamento predominante, ou seja, agricultura, para o atenderam às culturas usuais e possíveis nessas parcelas. Se as culturas efectivamente produzidas nos solos não conduzirem ao valor real e corrente dos bens, deve atender-se às culturas possíveis tendo em conta, entre outros factos, as características agrológicas do solo, a configuração do terreno, as facilidades de acesso bem como o clima. Como factores valorizadores, por influírem na produção e nos encargos de exploração, ocorre que se trata de solos de topografia plana, com boa acessibilidade, com água de rega e boa qualidade, possibilitando uma boa produção e sem encargos anormais. Os peritos avaliadores consideraram uma rotação de culturas (como tipo de agricultura usual). Não coincidem nas culturas possíveis e nos valores de produção, o que desde logo tem reflexos no valor final proposto para indemnização. Consideram os peritos (nomeados pelo tribunal, incluído o que intervém pelos expropriados) a cultura de batata e erva (esta a cultura que existia à data da vistoria) e em função destas - 30 000 Ks de batata, com um valor de € 8000 e um encargo de produção de 50%, e 40 000 kg de erva, com um valor de € 400 e um encargo de produção de 10%, aceitando-se esta diferença de encargos de produção, na medida em que a produção de erva importa despesas muito inferiores às necessárias á produção de batata. Consideram ainda, como possível e alternativa, uma produção de flores, que determina maiores encargos, mas que levaria a um valor final igual como rendimento fundiário. Por sua vez, a senhora perita indicada pelo expropriante considera outras produções - milho e feijão, no primeiro ano, com uma produção de € 1100 e um encargo de produção de 60%, e batata e hortaliças, no segundo ano, com uma produção de € 4800 e um encargo de produção de 60%. Divergem, pois, no tipo de culturas (em parte), no valor de produção e no preço da batata. Como se verifica, não é muito diferente o valor afirmado como encargos de produção, a não ser no que toca à produção de erva (cultura não considerada por esta perita). No processo de expropriação, a decisão assenta em factores de natureza essencialmente técnica e, por essa razão, a grande relevância do parecer dos peritos. Há divergência nos valores conseguidos pelos peritos. Não se vendo preterido nenhum critério legal de determinação do valor dos bens, não poderá deixar de ter-se em consideração que quatro peritos indicam determinados valores, enquanto outro defende outros, sem que, pelo fundamentação exposta, seja forçoso concluir a falta de fundamento do parecer do laudo maioritário, ou mais convincente se mostre a fundamentação do laudo minoritário. Havendo disparidade de pareceres entre os peritos, a não ser que essas diferenças resultem de diferentes interpretações legais ou de afastamento de critérios legais, que se revelem sem qualquer justificação ou manifestamente desproporcionados ao bem expropriado, porque o tribunal não dispõe de conhecimento técnico para aferir da melhor qualidade desses pareceres (nomeadamente quando se reportam aos melhores aproveitamentos agrícolas, culturas melhor adaptadas, possibilidades de produção), é de considerar a avaliação do laudo maioritário, sobretudo quando neste se incluem os laudos dos peritos nomeados tribunal, pois dada a distanciação em relação às partes, oferecem, em princípio, maiores garantias de imparcialidade (cfr., entre muitos, Acs. da Relação do Porto de 27/05/1980, na CJ/1980/III/82, e de 23/02/1989, na CJ/1989/I/138), da RE, de 25/6/92, CJ/III/343), suposto que não está em causa a idoneidade técnica e cívica dos mesmos, o que não significa que o tribunal fique vinculado ao laudo daqueles peritos ou ao laudo maioritário, nada impedindo o tribunal de recorrer a outrso critérios de forma a alcançar o montante justo para indemnizar os expropriados. E, como se referiu, no cálculo da indemnização é de atender não apenas ao que efectivamente é produzido nos terrenos, que até podem encontrar-se incultos, como ao que é possível produzir (numa utilização económica normal), com um aproveitamento adequado e diligente dos solos. Assim, não vemos razão para não se aceitar como usuais, na zona, as culturas afirmadas por aqueles peritos nas parcelas expropriadas ou o valor de produção, não só a produção global como o valor/kg das culturas produzidas. Acresce que, como alternativa, e num aproveitamento, possível, fizeram a comparação com outra cultura (flores), com que chegaram a valores idênticos, propostos para o rendimento agrícola. Deve atender-se às culturas que for possível produzir, tendo em conta factores como as características agrológicas do solo, a sua configuração, as condições de acesso e características climatológicas da área. Consideraram os peritos que os encargos de exploração seriam de 50%, no que respeita á produção de batata, e 20%º, no que toca ao cultivo de erva (que, apesar disso, não foram considerados na determinação do rendimento fundiário). Temos como correcta os encargos referentes a esta produção, que são reduzidos, limitados, no essencial à recolha e transporte do produto. Já não assim no que se refere à produção de batata. Aponta-se no laudo maioritário uma percentagem para encargos de 50%, apesar de uma boa produção. Uma óptima produção implicará, seguramente, despesas de exploração correspondentes, em “semente” para a plantação, estrumação ou adubação, rega, recolha, escolha e transporte. E é do conhecimento geral a dificuldade por que passa a lavoura, também pelos enormes custos de produção, que normalmente superam 50% do valor da produção bruta, não sendo de todo normal que o rendimento líquido do agricultor se cifre nos 50%, o que seria uma actividade lucrativa, bem longe da situação da agricultura. Daí se mostrar melhor ajustados os encargos de 60%, considerados pela senhora perita indicada pelo expropriante. Assim, o rendimento fundiário a capitalizar é de - [8000€/ha x (100%-60%) para a cultura de batata + 400€ x (100%-20%) para a cultura de erva] = 3520€. Quanto à taxa de capitalização utilizada pelos peritos - os peritos maioritários utilizaram a taxa de 4%, entendendo o recorrente dever ser usada a taxa de 3%, mais objectiva e real. Não se vê que a taxa de 4% seja desadequada, que, aliás, proporciona um resultado final inferior ao que seria obtido se, em sua substituição, se recorresse à taxa de 3%. O cálculo do valor do prédio faz-se através de considerações de cálculo financeiro, determina-se pela capitalização do rendimento anual (ou do rendimento fundiário médio) a determinada taxa de juro, que exprime o período de tempo necessário para que o rendimento líquido anual amortize o valor global do prédio e que para os solos agrícolas variará entre os 4% e 5%. O rendimento a capitalizar é o rendimento da propriedade, correspondente ao saldo da produção bruta deduzido do montante da soma das despesas de exploração. Quanto mais elevada for a taxa mais baixo é resultado da capitalização. Nenhum reparo há a fazer à taxa de capitalização usada pelos peritos, que fizeram uso da taxa média usualmente aplicado em relação a solos de aplicação agrícola. Não procede, nesta parte o recurso. Quanto às benfeitorias. No que concerne aos muros em alvenaria, os peritos atribuíram o valor de 50 €/m2. Discorda o recorrente do valor atribuído, por entender que o valor atribuído é o correspondente a muros de granito. Como se verifica dos autos de vistoria ad perpetuam rei memoriam, os muros são em “alvenaria de pedra seca”aquela cujas pedras são travadas entre si pelo modo como se dispõem. Não se revela que o material utilizado nos muros não seja o granito nem, analisando o relatório da senhora perita indicada pelo expropriante, algo seja mencionado ou explicação fornecida que leve a afastar o laudo maioritário para se optar por o daquela. O mesmo acontece quanto à valorização das videiras existentes nas parcelas expropriadas. Nenhum elemento fornece o processo que revele excesso ou desadequação do valor atribuído pelos peritos nomeados pelo tribunal, pelo que se mantém esses valores. Nenhuma referência se faz à qualidade, ao valor da produção, à idade dessas plantas, que indiciem excessivo o valor encontrado no laudo maioritário, razão porque se atende a esse valor. Improcede, nesta, parte o recurso. Valor da indemnização - 3520€ (rendimento fundiário médio): 0,04 (taxa de capitalização): 10000 x 629 m2 = 5535,20€, a que acresce o valor das benfeitorias, nos termos constantes da douta sentença, o que perfaz o global de 9085,20 euros. VI. Pelo exposto acorda-se nesta Secção Cível do tribunal da Relação do Porto em julgar parcialmente procedente a apelação e fixar a indemnização a atribuir aos expropriados no valor global de 9085,20 euros (nove mil e oitenta e cinco euros e vinte cêntimos), a actualizar desde a DUP até à data da decisão final, de acordo com a evolução do índice de preços no consumidor, com exclusão da habitação. Custas pelos expropriados, na medida do decaimento, estando o expropriante isento de custas (atenta a data da instauração da acção). Porto, 17/03/2005 José Manuel Carvalho Ferraz Nuno Ângelo Rainho Ataíde das Neves |