Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRP000 | ||
Relator: | FERREIRA DA COSTA | ||
Descritores: | DENÚNCIA DO CONTRATO PELO TRABALHADOR REVOGAÇÃO DA DENÚNCIA BAIXA POR DOENÇA FÉRIAS | ||
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Nº do Documento: | RP20120326276/09.8TTVLG.P2 | ||
Data do Acordão: | 03/26/2012 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | PROVIDO PARCIALMENTE | ||
Indicações Eventuais: | 4ª SECÇÃO (SOCIAL) | ||
Área Temática: | . | ||
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Sumário: | I – Tendo o trabalhador denunciado o contrato de trabalho, pode revogar a denúncia nos termos do Art.º 402º do CT2009. II – E, tendo a denúncia sido efetuada sem concessão de aviso prévio, por identidade de razão, se não por maioria, pode o A. alterar ou aditar os respetivos termos, juntando-lhe então a cláusula do aviso prévio. III – Concedida baixa médica por doença ao trabalhador durante o cumprimento do prazo de aviso prévio, não se suspende a contagem deste, pois ainda estamos no domínio do cumprimento do contrato de trabalho. IV – Já não assim no que respeita às férias que o trabalhador afirma ter gozado, mas sem ordem ou acordo do empregador, pois é a este que compete a marcação de férias. | ||
Reclamações: | |||
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Decisão Texto Integral: | Reg. N.º 843 Proc. N.º 276/09.8TTVLG.P2 Acordam no Tribunal da Relação do Porto: B… deduziu em 2009-09-18 contra C…, Ld.ª, a presente ação declarativa, com processo comum, pedindo que se: I – Fixe a retribuição líquida mensal do A. em € 1.450,00 e II – Condene a R. a pagar ao A. a quantia líquida de: a) - € 483,33, referente a 10 dias de trabalho efetuado no mês de julho de 2009; b) - € 2.900,00, relativa a férias e respetivo subsídio vencidos em 2009-01-01; c) - € 2.900,00, relativa a férias, respetivo subsídio e subsídio de Natal, proporcionais ao trabalho prestado no ano de 2009, sendo tudo acrescido de juros legais vencidos e vincendos, até efetivo e integral pagamento, computando-se os vencidos na data da propositura da ação em € 18,59. Alegou o A. que foi admitido ao serviço da R. em abril de 1986 para, sob as suas ordens e mediante retribuição mensal, que se veio a fixar em € 1.450,00 líquidos, apesar de nos recibos constar apenas a quantia de € 800,00, exercer as funções de serralheiro encarregado, o que aconteceu até 2009-07-10, data em que entrou de baixa médica, por doença, situação que se prolongou até 2009-08-05, sendo certo que esteve em gozo de férias no período compreendido entre 5 e 26 de agosto de 2009. Alegou também que, por carta de 2009-06-23, o A. declarou à R. a denúncia do contrato e por carta de 2009-06-30 o A. informou a R. que a data de produção de efeitos da referida denúncia ocorreria 60 dias após a receção da anterior carta, isto é, em 2009-08-26. Alegou, por último, que a R. não pagou ao A. a retribuição do trabalho prestado nos 10 dias de julho de 2009, nem as férias e respetivo subsídio vencidos em 2009-01-01, nem as férias, respetivo subsídio e subsídio de Natal, proporcionais ao trabalho prestado no ano de 2009. Contestou a R., por exceção, alegando que o A. denunciou o contrato em 2009-06-26, sem conceder aviso prévio, o que lhe causou prejuízos, que descreve, sendo irrelevante a carta que posteriormente lhe enviou, pretendendo que a primeira produzisse os seus efeitos decorridos 60 dias, embora admita que o A. compareceu nas suas instalações em julho de 2009 e aí trabalhou, embora por sua iniciativa, durante - sic - “cerca de meia dúzia de dias”, tendo depois comunicado que ia entrar de baixa médica. Mais alegou que as férias que o A. refere ter gozado não obtiveram o acordo da R., nem resultaram de sua decisão, sendo certo que o subsídio de férias vencido em 2009-01-01 se encontra pago. Por outro lado, a R. deduziu reconvenção, pedindo a condenação do A. a pagar-lhe a quantia de € 39.300,00, sendo € 35.904,00 de indemnização pelo prejuízos causados com a denúncia imediata do contrato e a restante relativa a indemnização por falta de aviso prévio, a que acrescem os juros à taxa legal até efetivo e integral pagamento. O A. respondeu à contestação/reconvenção. Foi proferido despacho saneador e elaborada a MA e a BI, sem reclamações. Procedeu-se a julgamento com gravação da prova pessoal e respondeu-se à BI pela forma constante do despacho de fls. 250 a 253, sem reclamações. Proferida sentença, o Tribunal a quo decidiu: A – Quanto à ação: I – Fixar a retribuição líquida mensal do A. em € 1.450,00 e II – Condenar a R. a pagar ao A. a quantia de: a) - € 435,00, referente a 9 dias de trabalho efetuado no mês de julho de 2009; b) - € 2.900,00, relativa a férias e respetivo subsídio, vencidos em 2009-01-01; c) - € 2.264,38, relativa a férias, respetivo subsídio e subsídio de Natal, proporcionais ao trabalho prestado no ano de 2009, sendo tudo acrescido de juros de mora, à taxa de 4% ao ano, desde a data de vencimento de cada uma das prestações, exceto quanto à última, cuja data será a de 2009-06-23. B – Quanto à reconvenção: d) Absolver o A. dos pedidos formulados pela R. Inconformada com o assim decidido, veio a R. interpôr recurso de apelação, pedindo a revogação da sentença e a condenação do A. nos pedidos deduzidos na reconvenção, tendo formulado a final as seguintes conclusões: 1) Deve ser anulado o julgamento porquanto há impercetibilidade da gravação em partes essenciais da audiência de discussão e julgamento, que impede a correta valoração e apreciação dos depoimentos das testemunhas; 2) Deve ser alterada a resposta ao nº 1 da base instrutória para "provado que a retribuição mensal do A. é de € 800 ilíquidos mensais"; 3) Conforme se provou em audiência de discussão e julgamento, mormente dos depoimentos das testemunhas D… e E…, e também em conformidade com a fundamentação dada a essa resposta pelo Mmo Juiz "a quo", o diferencial de € 800 ilíquidos da retribuição do A., para € 1.450 líquidos trata-se de subsidio de isenção de horário, dando por reproduzidos os depoimentos das referidas testemunhas, na partes atrás transcritas; 4) Há contradição nas respostas aos nºs 3 e n° 6 da base instrutória em que no mesmo dia 10/7/2009 o A. trabalha e está simultaneamente em situação de baixa médica; 5) A resposta ao nº 3 da base instrutória deve ser alterada para "provado apenas que o A., após enviar a carta que refere a alínea B) dos factos assentes, trabalhou apenas durante alguns dias", tal como fundamenta o Mmo Juiz "a quo", ao fundamentar a resposta, no seguinte passo do despacho que decide a matéria de facto, nos termos seguintes: "... Relativamente ao quesito 3°, apenas foi feita prova de que o Autor, após enviar a carta em que informava ser sua intenção desvincular-se da R., prestou serviço apenas durante alguns dias…”. 6) Numa pequena empresa com cerca de 20 trabalhadores em que sempre desde a fundação da R. e durante mais de 20 anos o A. era o único encarregado do setor da produção da R., não pode ser espírito da lei que seja considerado legitimo que em parte do aviso prévio o A. se possa colocar em situação de baixa médica, numa parte relevante de um tal período; 7) O contrato extinguiu-se em 26/6/2009 automática e imediatamente com a receção pela R. da carta que refere a alínea B) dos factos assentes, pelo que deve logo proceder na totalidade o pedido formulado na alínea a) da reconvenção; 8) Se assim se não se entender - o que se não concede nem concebe - tendo sido pelo Mmo Juiz "a quo" respondido ao nº 9 da base instrutória "não provado", é manifesto que pelo menos a partir de 5/8/2009, o A. não trabalhou na R., não esteve em gozo de férias, nem esteve com baixa de médico. Pelo que é evidente que o A. não cumpriu o prazo de aviso prévio mesmo que este fosse apenas de 60 dias, pelo deve logo o pedido da alínea a) da reconvenção ser julgado procedente; 9) Devem as respostas aos nºs 15 e 18 da base instrutória serem alteradas para: "provado que o não cumprimento do prazo do aviso prévio pelo A. causou prejuízo à R. por atraso que acarretou nos trabalhos que se encontravam a ser efetuados no setor da produção da apelante"; 10) Trata-se com efeito de até ser facto notório e facto de conhecimento geral que, tendo desde a fundação da R. e durante mais de 20 anos, o A. sido encarregado único do setor da produção da R., a saída abrupta, pelo A. da R. ou seja sem que estivesse em efetivo serviço de funções durante pelo menos o prazo de aviso prévio, causa graves prejuízos à R., pela desarticulação que provoca na direção dos trabalhos no setor da oficina mesmo que a R. ponha outrem a substituir o A., que não será obviarnente igual e demora tempo a aprendizagem e experiência de direção da oficina; e o declararam com objetividade as testemunhas D…, E… e F…, que devem os seus depoimentos ser valorados e considerados no sentido de ser dado por provado que causou graves prejuízos à R. 11) Deve pois a liquidação da indemnização formulada na alínea b) da reconvenção ser relegado para liquidação em execução de sentença, por ocorrer atrasos e desarticulações de orientação na oficina como é ato evidente, notório e de conhecimento geral, com graves prejuízos que causa para a R. reconvinte; 12) A douta sentença recorrida deve ser revogada na parte em censura e deve ser julgado procedente o pedido da alínea a) da reconvenção e quanto ao pedido da alínea b) da reconvenção deve ser julgado procedente com a liquidação de indemnização relegada para execução da sentença; 13) A douta sentença recorrida violou entre outros, o art. 401 do C.T. O Exm.º Sr. Procurador-Geral Adjunto, nesta Relação, emitiu douto parecer no sentido de que não deve ser conhecida a nulidade invocada e a apelação não merece provimento. Recebido o recurso, elaborado o projeto de acórdão e entregues as respetivas cópias aos Exm.ºs Juízes Desembargadores Adjuntos[1], foram colhidos os vistos legais. Cumpre decidir. São os seguintes os factos dados como provados pelo Tribunal a quo: 1. O Autor foi admitido ao serviço da Ré em abril de 1986, data a partir da qual passou a desempenhar as funções de Serralheiro Encarregado, no âmbito da atividade industrial de serralharia da Ré, por esta organizada e definida, segundo as respetivas ordens e mediante retribuição (Alínea A da matéria assente). 2. Por carta datada de 23/6/2009, junta a fls. 28 dos autos e que a Ré recebeu a 26/6/2009, cujo teor é “B…, BI n° …….., Segurança Social n° ………, com morada em Rua …, n° …, ….-… Valongo, funcionário desta empresa, C…, Lda., com sede em Rua …, n° …, ….-… …, Trofa, vem, por este meio, informar que, a partir da data de receção desta carta, deixará de fazer parte dos quadros efetivos desta empresa, prendendo-se esta decisão com o facto de ter concluído que a sua continuidade na empresa deixou de fazer sentido", o Autor procedeu à denúncia do respetivo contrato de trabalho (B). 3. O Autor enviou à Ré, que a recebeu, a carta datada de 30/6/2009, junta a fls. 29 dos autos e cujo teor é "na sequência da m/ carta datada de 23 do corrente, através da qual procedi à denúncia do meu contrato de trabalho, informo que devem considerar a produção de efeitos, decorridos 60 (sessenta) dias a contar da referida data, com respeito pelo aviso prévio respetivo" (C). 4. A retribuição mensal efetiva do Autor ascendia a € 1.450,00 líquidos (Resposta ao Quesito 1º da base instrutória). 5. Embora a Ré apenas fizesse constar dos respetivos recibos de vencimento o valor de €800,00 (2º). 6. O Autor trabalhou até ao dia 9/7/2009 (3º). 7. Até essa altura, a Ré deu instruções ao Autor (4º). 8. A partir do dia 10/7/2009, o Autor passou a estar na situação de baixa médica, por doença, o que durou até 5/8/2009 (6º). 9. Os certificados de incapacidade temporária para o trabalho, juntos a fls. 60 e 61 dos autos, foram entregues, sem qualquer reparo, na secção de pessoal da Ré (7º'). 10. Durante o período em que se encontrou de baixa médica, o Autor recebeu o montante devido relativo a esse período (8º). 11. O período de férias de 5 a 26/8/2009 não foi marcado pela Ré, nem teve o acordo desta (11º). 12. O Autor era o único encarregado no setor da produção da Ré (13º). 13. Aquando do descrito no ponto 2), a Ré tinha uma obra em fabrico e que se encontrava a ser executada (14º). 14. O custo da hora de trabalho na oficina do fabrico da Ré ascende a € 17,00, tratando-se do valor final imputado ao cliente (16º). 15. Encontravam-se 12 homens a efetuar esse serviço, trabalhando 8 horas por dia, num total de 96 horas diárias de trabalho (17º). 16. A obra em curso, iniciada em finais de maio, já em junho se encontrava de tal forma atrasada que os trabalhadores da Ré, incluindo-se o Autor, se encontravam a trabalhar 10 horas diárias de segunda a sexta feira e ainda aos sábados, das 8h às 19h (19º), 17. A gerência da Ré havia transmitido ao Autor a necessidade de admitirem mão de obra externa, sobretudo serralheiros e soldadores, como única forma de diminuírem o atraso já expectável na entrega do trabalho ao cliente (20º). 18. E no período entre 26/6/2009 e 10/7/2009, o gerente da Ré solicitou a G… que passasse a desempenhar as funções do Autor, depois da saída deste, o que aquele fez (21º). Fundamentação. Sendo pelas conclusões do recurso que se delimita o respetivo objeto[2], como decorre do disposto nos Art.ºs 684.º, n.º 3 e 685.º-A, n.º 1, ambos do Cód. Proc. Civil, na redação que lhe foi dada pelo diploma referido na nota(1), ex vi do disposto no Art.º 87.º, n.º 1 do Cód. Proc. do Trabalho[3], salvo tratando-se de matérias de conhecimento oficioso de que o Tribunal ad quem pode conhecer por sua iniciativa, são três as questões a decidir neste recurso de apelação, a saber: I – Anulação do julgamento, II – Alteração da mtéria de facto e III – Pedidos da reconvenção. A 1.ª questão. Trata-se de saber se o julgamento deve ser anulado. A R., ora apelante, alegou na 1.ª conclusão do recurso, o seguinte: “1) Deve ser anulado o julgamento porquanto há impercetibilidade da gravação em partes essenciais da audiência de discussão e julgamento, que impede a correta valoração e apreciação dos depoimentos das testemunhas;”. Vejamos. Foram ouvidas em audiência de discussão e julgamento 7 testemunhas. Apesar de a R., no recurso, ter invocado o depoimento de apenas 6 testemunhas, procedemos à audição do depoimento das referidas 7, os quais constam de dois CDR.s. A gravação contém um ruído permanente de fundo que não facilita a audição dos depoimentos, por um lado; pior, há uma ou outra palavra, esparsa no curso da gravação, que não são entendíveis, do que dá conta a transcrição dos depoimentos das 7 testemunhas, que a R. juntou com a sua alegação de recurso. No entanto, também há uma ou outra omissão de expressões ou de palavras na transcrição que são percetíveis. Lamenta-se, naturalmente, que o Tribunal a quo não tenha tomado medidas concretas no sentido de obviar a tais dificuldades, embora se deva reconhecer que o Sr. Juiz e os Srs. Advogados tenham insistido com as testemunhas no sentido de falarem alto e de evitarem a linguagem gestual, pois os depoimentos estavam a ser gravados. No entanto, tais deficiências, embora dificultem, não impossibilitam a compreensão da totalidade de cada um dos depoimentos gravados, como se constata pela gravação, bem como pela transcrição dos depoimentos, pelo que tal questão não deve ser atendida. Improcede, assim, a 1.ª questão do recurso. A 2.ª questão. Trata-se de saber se, como pretende a R., ora apelante, nas conclusões 2 a 5, 9 e 10 do recurso, devem ser alteradas as respostas dadas aos quesitos 1, 3, 6, 15 e 18. Vejamos. Dispõe adrede o Art.º 685.º-B[4], n.ºs 1 e 2 do Cód. Proc. Civil, o seguinte: 1 — Quando se impugne a decisão proferida sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição: a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados; b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida. 2 — No caso previsto na alínea b) do número anterior, quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados e seja possível a identificação precisa e separada dos depoimentos, nos termos do disposto no n.º 2 do artigo 522.º-C, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso no que se refere à impugnação da matéria de facto, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda, sem prejuízo da possibilidade de, por sua iniciativa, proceder à respetiva transcrição. Por sua vez, estabelece o n.º 2 do Art.º 522.º-C do mesmo diploma, o seguinte: Quando haja lugar a registo áudio ou vídeo, devem ser assinalados na ata o início e o termo da gravação de cada depoimento, informação ou esclarecimento, de forma a ser possível uma identificação precisa e separada dos mesmos. Por último e ainda do mesmo diploma, dispõe o Art.º 712.º, n.º 1: 1 — A decisão do tribunal de 1.ª instância sobre a matéria de facto pode ser alterada pela Relação: a) Se do processo constarem todos os elementos de prova que serviram de base à decisão sobre os pontos da matéria de facto em causa ou se, tendo ocorrido gravação dos depoimentos prestados, tiver sido impugnada, nos termos do artigo 685.º-B, a decisão com base neles proferida; b) Se os elementos fornecidos pelo processo impuserem decisão diversa, insuscetível de ser destruída por quaisquer outras provas; c) Se o recorrente apresentar documento novo superveniente e que, por si só, seja suficiente para destruir a prova em que a decisão assentou. In casu, a R., ora apelante, indicou quais os concretos pontos de facto que pretende que sejam alterados e que são as respostas dadas aos quesitos acima indicados: 1, 3, 6, 15 e 18. Por outro lado, indicou os meios de prova em que se funda para sustentar a sua pretensão e que são, para além de documentos que menciona, os depoimentos das testemunhas, ouvidas em audiência de julgamento, D…, E… e F…, embora também tenha indicado, mas apenas na alegação do recurso, os depoimentos das testemunhas H…, I… e J…, sendo certo que apesar de não ter invocado o depoimento da testemunha G…, também o transcreveu, como fez com os restantes. Por outro lado, tendo havido gravação da prova testemunhal em CDR e fundando-se nela o recurso de impugnação da decisão da matéria de facto, a apelante indicou os nomes das testemunhas, mas não os passos da gravação com menção dos respetivos início e fim, donde constam os depoimentos que devem conduzir a diferente decisão daquela que foi proferida no respetivo despacho. No entanto, transcreveu os depoimentos de todas as testemunhas ouvidas em audiência e, para além disso, fez transcrição de parte de depoimentos na alegação do recurso, com menção dos passos da transcrição onde eles se inserem. Tal prática supre aquela falta de indicação, atento o disposto no Art.º 685.º-B, n.º 2, in fine do Cód. Proc. Civil: “sem prejuízo da possibilidade de, por sua iniciativa, proceder à respetiva transcrição”. O acabado de expor significa que se encontram reunidos os pressupostos formais do recurso de impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto, pelo que dele devemos tomar conhecimento. Ora, a Relação pode alterar a matéria de facto, nos termos do disposto no Art.º 712.º, n.ºs 1 e 2 do Cód. Proc. Civil. Importa, no entanto, que o faça com a parcimónia devida. Na verdade, o contacto direto com os depoentes em audiência permite colher impressões do comportamento de cada um deles que habilitam o Juiz a concluir pela veracidade ou não dos respetivos depoimentos, o que é impossível de transmitir através da reprodução dos registos sonoros. E, mesmo relativamente ao registo vídeo, a sua reprodução não possibilita a interação da pergunta-resposta, típica do diálogo da audiência, ficando os Juízes numa posição passiva ou estática, tendo de se conformar com o material que lhes é dado, pois não podem pedir esclarecimentos, por exemplo. De qualquer forma, sendo os nossos registos apenas sonoros, a sua falibilidade é muito maior. É por isso que se tem entendido que o Tribunal da Relação só deve alterar a matéria de facto nos casos de manifesta e clamorosa desconformidade dos factos assentes com os meios de prova disponibilizados nos autos, dando assim prevalência ao princípio da oralidade, da prova livre e da imediação[5]. In casu, a R., ora apelante, discorda da decisão proferida sobre a matéria de facto, nomeadamente, das respostas dadas aos quesitos 1, 3, 6, 15 e 18. Têm a seguinte redação: 1. A retribuição mensal efetiva do A. ascendia a € 1.450,00, líquidos? 3. O A. trabalhou até ao dia 2009-07-10? 6. A partir do dia 2009-07-10, o A. passou a estar na situação de baixa médica, por doença, o que durou até 2009-08-05? 15. A atuação do A. gerou atraso de um mês na execução dessa obra que estava a ser efetuada no setor da produção, até porque se tratava do único encarregado que orientava e coordenava todo o setor da produção da R.? 18. A R. sofreu ainda atrasos na execução de outros serviços? Os quesitos 1, 3 e 6 receberam respostas positivas e os quesitos 15 e 18 receberam respostas negativas – cfr. despacho de fls. 250 – apesar de na sentença se ter dado como provado, no ponto 6, que “6. O Autor trabalhou até ao dia 9/7/2009 (3º).” . Pretende a apelante que a tais quesitos sejam dadas as seguintes respostas, conforme refere nas respetivas conclusões do recurso: 2) Deve ser alterada a resposta ao nº 1 da base instrutória para "provado que a retribuição mensal do A. é de € 800 ilíquidos mensais"; 5) A resposta ao nº 3 da base instrutória deve ser alterada para "provado apenas que o A., após enviar a carta que refere a alínea B) dos factos assentes, trabalhou apenas durante alguns dias". 9) Devem as respostas aos nºs 15 e 18 da base instrutória serem alteradas para: "provado que o não cumprimento do prazo do aviso prévio pelo A. causou prejuízo à R. por atraso que acarretou nos trabalhos que se encontravam a ser efetuados no setor da produção da apelante";. Com atenção, procedemos à audição dos depoimentos de todas as testemunhas ouvidas em audiência de julgamento e não apenas daqueles que foram indicados pela R., ora apelante, quer nas conclusões, quer na alegação, bem como da testemunha G…. Vejamos, pois, ponto por ponto. Quesito 1.º. O Tribunal a quo deu como provado que o A. auferia a retribuição mensal de € 1.450,00, pretendendo a R. que ele auferia apenas a de € 800,00. A prova testemunhal produzida sobre a matéria referiu que o A. auferia a retribuição mensal de € 1.450,00, embora mencionasse que a parte que superava a quantia de € 800,00 se destinava a compensar o trabalhor pelas horas extras ou pela isenção do horário de trabalho, uma vez que ele trabalhava conforme as necessidades do serviço, muitas vezes para além do horário normal de trabalho, sem que recebesse qualquer outra retribuição a esse título. Responderam acerca desta matéria várias testemunhas, sendo de relevar, pela sua importância, o depoimento de D…, responsável do setor de pessoal da R. e H…, ex-sócio gerente da R. os quais depuseram com conhecimento da matéria e de forma convincente. Quanto à prova documental deve dizer-se que dos recibosa de vencimento consta a quantia ilíquida mensal de € 800,00, mas dos extratos da conta bancária do A., onde a R. depositava a retribuição mensal do A., consta a quantia de € 1.4500,00, por exemplo, nos meses de outubro de 2008 a maio de 2009, sem qualquer alteração ou interrupção, como se vê de fls. 16 a 27; quanto aos recibos, cfr. fls. 10 a 15. Ora, estando em consonância a prova testemunhal com a prova documental, cremos que tendo o Tribunal a quo respondido positivamente ao quesito, decidiu de acordo com a prova produzida em audiência, isto é, não decidiu sem prova ou contra a prova produzida, bem pelo contrário, pelo que a decisão deve ser confirmada. Quesitos 3.º e 6.º. Afirma a apelante que há contradição entre as respostas dadas a estes dois quesitos pois, ou se está a trabalhar ou se está de baixa médica por doença, quando o Tribunal a quo, respondendo provado a ambos, colocou o A. a, simultaneamente, trabalhar e de baixa médica, no mesmo dia, 2009-07-10. Ora, não há dúvida que, de acordo com o documento de fls. 60, foi concedida baixa médica ao A., com início no dia referido. Por outro lado, apesar de no despacho em que se respondeu à BI, o Tribunal a quo ter dado resposta positiva ao quesito 3.º, dando como provado que o A. esteve a trabalhar até ao dia 2009-07-10, certo é que, na sentença, deu como provado no ponto 6 que tal aconteceu até ao dia 2009-07-09. Acontece, no entanto, que a prova testemunhal, a nosso ver, foi claramente no sentido de que o A. trabalhou até ao dia 2009-07-10. Na verdade, a testemunha I… afirmou que se desvinculou da R. por carta da mesma data, tal como o fez o A., que este trabalhou até ao dia 2009-07-10 [embora tenha referido também o dia anterior, 9], data do aniversário do A., que ocorreu numa 6.ª feira, e que no domingo, dia 12 seguinte, o A. foi a casa da testemunha e entregou-lhe os boletins de baixa, juntos a fls. 60 e 61, bem como o veículo automóvel da R., que o A. usava em serviço desta para se fazer transportar de e para o trabalho, consigo transportando outros trabalhadores da R. No mesmo sentido, depôs a testemunha J… que referiu, nomeadamente, que no dia referido, 2009-07-10, o A. pagou uma rodada de cervejas aos colegas, “nos anos”, como era costume entre o pessoal da R. Do exposto, resulta, a nosso ver, que foi concedida baixa ao A., com início em 2009-07-10, o que é diferente de ele se encontrar doente e impossibilitado de trabalhar. Por outro lado, o A. esteve a trabalhar até ao dia 2009-07-10, dia do seu aniversário natalício, uma 6.ª feira, o que corresponde ao calendário. Daqui não resulta qualquer contradição, como a apelante pretende pois, embora o termo da atividade do A. coincida com o início da atribuição da baixa, certo é que os acontecimentos desenrolaram-se desta forma, atenta a prova testemunhal produzida, não tendo sido explicada a razão pela qual a baixa foi atribuída com início no referido dia. No entanto, atribuir baixa por doença e estar doente não são conceitos coincidentes, embora se admita que possa ter existido alguma irregularidade na sua atribuição, mas nenhuma prova foi produzida em tal sentido. De qualquer modo e em função da prova produzida, quer testemunhal, quer documental, devem as respostas dadas aos quesitos 3.º e 6.º ficar com a seguinte redação: 3. O A. trabalhou até ao dia 2009-07-10. 6. A partir do dia 2009-07-10, ao A. foi concedida baixa médica, por doença, o que durou até 2009-08-05. Quanto aos quesitos 15.º e 18.º. Receberam respostas negativas. Cremos que do conjunto da prova testemunhal produzida se poderá concluir como o fez o Tribunal a quo. Na verdade, os depoimentos foram condizentes no sentido de que a obra em curso foi adjudicada à R. com um prazo de execução exíguo, se não impossível de cumprir, o que motivou a contratação pela R. de novos trabalhadores e a necessidade de que os restantes prestassem trabalho suplementar, quer duas horas diárias, nos dias úteis, quer aos sábados, na tentativa de cumprir o prazo previsto para a conclusão da obra, que se destinava a pontes em autoestradas. Daí que apesar da longa experiência do A. como encarregado da R. e apesar de se admitir que a sua saída tenha causado alguma perturbação, como foi referido pelas testemunhas ouvidas, a verdade é que o A. foi substituído nas suas funções pela testemunha G…, que anteriormente não era trabalhador permanente da R. Do exposto resulta, a nosso ver, que as respostas negativas a tais quesitos estão suportadas pelos depoimentos das testemunhas, pelo que o Tribunal a quo não decidiu sem prova ou contra a prova produzida em audiência, antes pelo contrário, pelo que deverá ser confirmada a sua decisão. Nestes termos e procedendo-se à alteração indicada das respostas dadas aos quesitos 3.º e 6.º da BI, são de manter inalteradas as respostas dadas aos restantes quesitos invocados no recurso pelo que, nessa medida, improcedem as referidas conclusões da apelação. A 3.ª questão. Trata-se de saber se devem proceder os pedidos formulados na reconvenção. Na verdade e recordando o referido no antecedente relatório, a R. deduziu reconvenção, pedindo a condenação do A. a pagar-lhe a quantia de € 39.300,00, sendo € 35.904,00 de indemnização pelos prejuízos causados com a denúncia imediata do contrato e a restante relativa a indemnização por falta de aviso prévio, para além dos juros. Vejamos. Tendo a denúncia do contrato de trabalho ocorrido em junho de 2009, ao caso é aplicável o CT2009, uma vez que ele entrou em vigor, nos termos gerais e para a generalidade das matérias, em 2009-02-17. Dispõe ele, a propósito: Artigo 400.º 1 — O trabalhador pode denunciar o contrato independentemente de justa causa, mediante comunicação ao empregador, por escrito, com a antecedência mínima de 30 ou 60 dias, conforme tenha, respetivamente, até dois anos ou mais de dois anos de antiguidade.Denúncia com aviso prévio 5 — É aplicável à denúncia o disposto no n.º 4 do artigo 395.º Artigo 401.º O trabalhador que não cumpra, total ou parcialmente, o prazo de aviso prévio estabelecido no artigo anterior deve pagar ao empregador uma indemnização de valor igual à retribuição base e diuturnidades correspondentes ao período em falta, sem prejuízo de indemnização por danos causados pela inobservância do prazo de aviso prévio ou de obrigação assumida em pacto de permanência.Denúncia sem aviso prévio Artigo 402.º 1 — O trabalhador pode revogar a denúncia do contrato, caso a sua assinatura constante desta não tenha reconhecimento notarial presencial, até ao sétimo dia seguinte à data em que a mesma chegar ao poder do empregador, mediante comunicação escrita dirigida a este.Revogação da denúncia 2 — É aplicável à revogação o disposto nos n.ºs 2 ou 3 do artigo 350.º. Como se vê dos pontos 2 e 3 dos factos provados, o A. denunciou o contrato por carta que a R. recebeu em 2009-06-26, sem conceder aviso prévio, o que alterou pela carta do dia 30 seguinte, declarando conceder o aviso prévio de 60 dias, reportando a produção de efeitos àquela data. Cremos que podendo o A. revogar a denúncia nos termos do referido Art.º 402º, por identidade de razão, se não por maioria, pode o A. alterar ou aditar os termos da denúncia, juntando-lhe então a cláusula do aviso prévio, pois quem pode o mais, pode o menos. Parece, inclusive, que a A. aceitou, quer a denúncia, quer o aditamento do aviso prévio, uma vez que aceitou o trabalho do A. até ao dia 2009-07-10. Tendo a carta sido recebida pela R. em 2009-06-26 e sendo reportada a produção de efeitos do prazo de aviso prévio de 60 dias a tal data, esta constitui o termo inicial de tal prazo. Cremos que o período de baixa médica, operando a suspensão do contrato, briga apenas com a prestação efetiva do trabalho, mas sem repercussões sobre o prazo de aviso prévio pois, deste ponto de vista, ainda constitui cumprimento do contrato, sendo certo que há total liberdade de desvinculação do trabalhador, a qual opera os seus efeitos, mesmo quando ele não adotou o procedimento previsto na lei.[6] Já não assim no que respeita às férias que o trabalhador afirma ter gozado, mas sem ordem ou acordo da R. Sendo a esta que compete a marcação de férias, por acordo com o trabalhador ou por deliberação sua, não pode considerar-se cumprimento do contrato o gozo de férias do trabalhador, feito por seu livre alvedrio e à revelia do empregador. Considerando estes pressupostos e os factos provados, o A. cumpriu o aviso prévio de 2009-06-26 até 2009-08-05, data esta em que cessou a situação de baixa médica por doença, a significar que o A. concedeu 40 dias de aviso prévio, devendo indemnizar a R. pelos 20 dias em falta, no montante de € 966,70. Já quanto ao pedido de indemnização pelos prejuízos causados, não tendo a apelante tido sucesso na questão anterior, relativamente às respostas dadas aos quesitos 15 e 18, igual sorte deverá ter este pedido de indemnização. Daí que proceda parcialmente o pedido de indemnização por falta de aviso prévio e improceda o pedido de indemnização pelos prejuízos causados. Decisão. Termos em que se acorda em dar provimento parcial à apelação, assim condenando o A. a pagar à R. a quantia de € 966,70, a título de indemnização por falta de aviso prévio e absolvendo-o quanto ao mais pedido na reconvenção, assim revogando parcialmente a sentença que, quanto ao mais, se confirma. Custas da reconvenção, por A. e R., na respetiva proporção. Porto, 2012-03-26 Manuel Joaquim Ferreira da Costa António José Fernandes Isidoro Paula Alexandra Pinheiro Gaspar Leal Sotto Mayor de Carvalho _________________ [1] Atento o disposto no Art.º 707.º, n.º 2 do CPC, na redação que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 303/2007, de 24 de agosto, ex vi do disposto nos Art.ºs 11.º, n.º 1 – a contrario sensu – e 12.º, n.º 1, ambos deste diploma. [2] Cfr. Alberto dos Reis, in Código de Processo Civil Anotado, volume V, reimpressão, 1981, págs. 308 a 310 e os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 1986-07-25 e de 1986-10-14, in Boletim do Ministério da Justiça, respetivamente, n.º 359, págs. 522 a 531 e n.º 360, págs. 526 a 532. [3] Aprovado pelo Decreto-Lei n.º 480/99, de 9 de novembro. [4] Nova numeração do artigo – anterior 690.º-A – introduzida pelo diploma referido na nota (1) e aplicável in casu. [5] Cfr. António Santos Abrantes Geraldes, in TEMAS DA REFORMA DO PROCESSO CIVIL, II VOLUME, 4.ª EDIÇÃO, 2004, págs. 266 e 267 e o Acórdão da Relação do Porto, de 2003-01-09, in www.dgsi.pt, JTRP00035485 e o Acórdão da Relação de Lisboa, de 2001-03-27, in Coletânea de Jurisprudência, Ano XXVI-2001, Tomo II, págs. 86 a 88. [6] Cfr. Júlio Manuel Vieira Gomes, in Direito do Trabalho, volume I, Relações Individuais de Trabalho, Coimbra Editora, 2007, nomeadamente, a págs. 1064 ss. e o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 2010-09-15, Processo 293/07.2TTSNT.L1.S1, in www.dgsi.pt. ______________ S U M Á R I O I – Tendo o trabalhador denunciado o contrato de trabalho, pode revogar a denúncia nos termos do Art.º 402º do CT2009. II – E, tendo a denúncia sido efetuada sem concessão de aviso prévio, por identidade de razão, se não por maioria, pode o A. alterar ou aditar os respetivos termos, juntando-lhe então a cláusula do aviso prévio. III – Concedida baixa médica por doença ao trabalhador durante o cumprimento do prazo de aviso prévio, não se suspende a contagem deste, pois ainda estamos no domínio do cumprimento do contrato de trabalho. IV – Já não assim no que respeita às férias que o trabalhador afirma ter gozado, mas sem ordem ou acordo do empregador, pois é a este que compete a marcação de férias. Manuel Joaquim Ferreira da Costa Texto escrito conforme o Acordo Ortográfico. |