Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRP00035572 | ||
Relator: | SOUSA PEIXOTO | ||
Descritores: | EXECUÇÃO REINTEGRAÇÃO DE TRABALHADOR TÍTULO EXECUTIVO | ||
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Nº do Documento: | RP200403080316947 | ||
Data do Acordão: | 03/08/2004 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Tribunal Recorrido: | T TRAB V N GAIA 1J | ||
Processo no Tribunal Recorrido: | 186-C/97 | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO. | ||
Decisão: | CONFIRMADA A DECISÃO. | ||
Área Temática: | . | ||
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Sumário: | I - A sentença proferida na 1ª instância que, declarando a ilicitude do despedimento, condenou a entidade empregadora a reintegrar o trabalhador e a pagar-lhe a importância correspondente às retribuições que teria auferido até à data da sentença, constitui título executivo para o trabalhador exigir o pagamento das retribuições relativas ao período decorrido entre a data da sentença e a data do acórdão e entre a data deste e a data da reintegração. II - O efeito suspensivo do recurso interposto da sentença não interfere com a obrigação de reintegração, apenas suspenda a sua eficácia até decisão do tribunal superior a confirmar a sentença. III - A sentença assim confirmada constitui título executivo para pedir a reintegração e, consequentemente, o pagamento dos danos resultantes do incumprimento daquela obrigação. IV - Tais danos equivalem, pelo menos, ao montante de todas as prestações que o trabalhador teria auferido, sendo irrelevante que ele não tenha prestado trabalho nesse período, uma vez que tal facto é imputável ao empregador. | ||
Reclamações: | |||
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Decisão Texto Integral: | Acordam na secção social do Tribunal da Relação do Porto: 1. A.......... propôs no tribunal do trabalho de Gaia acção declarativa contra a B.........., S.A., pedindo que fosse declarada a ilicitude do seu despedimento e que a ré fosse condenada a reintegrá-la ou a indemnizá-la de acordo com a opção que ela vier a fazer e a pagar-lhe “as prestações vencidas e vincendas até decisão final.” A acção foi julgada procedente por sentença proferida em 1.10.97, condenando a ré a reintegrar a autora e a pagar-lhe a quantia de 729.528$00 de retribuições que deixou de auferir desde o 30.º dia que antecedeu a data de propositura da acção até à data da sentença (“até ao dia de hoje”). A ré interpôs recurso, com efeito suspensivo, que veio a ser julgado improcedente por acórdão desta Relação, proferido em 22.6.98. A ré reintegrou a autora em 1.7.98 e pagou-lhe a quantia de 729.528$00, mas não lhe pagou as retribuições que deixou de auferir entre a data do despedimento e o 30.º dia que antecedeu a data da propositura da acção, ou seja, desde 12.4.96 a 7.3.97, nem as que deixou de auferir desde a data da sentença até à data da reintegração, ou seja, desde 1.10.97 até 1.7.98. Por via disso, a autora veio instaurar execução contra aquela ré, para obter o pagamento daquelas retribuições que liquidou em 15.916,40 €. O Mmo Juiz indeferiu liminarmente a execução no que diz respeito às retribuições vencidas desde a data do despedimento até ao 30.º dia que antecedeu a propositura da acção declarativa, por tais retribuições terem sido deduzidas na sentença. A exequente não interpôs recurso daquele despacho e a executada veio opor-se à execução, alegando que a exequente carece de título executivo relativamente às retribuições vencidas após a data da sentença, por não ter pedido na acção declarativa o pagamento das prestações vincendas e futuras nem relativamente aos subsídios de almoço e de assiduidade pedidos na acção executiva os quais não seriam devidos porque a exequente não trabalhou na data a que os mesmos se referem. Recebidos os embargos, a exequente contestou, alegando que o facto de a sentença ter declarado ilícito o despedimento é suficiente para tornar a decisão exequível, já que a ilicitude opera “ex tunc” e tudo se passa como se o trabalhador nunca tivesse sido despedido. Seguidamente, o Mmo Juiz conheceu da oposição, começando por afirmar que a questão em apreço era restrita às retribuições referentes ao período de 1.10.97 a 1.7.98, porquanto o requerimento executivo havia sido liminarmente indeferido no que diz respeito ao período ocorrido entre a data do despedimento e o 30.º dia que antecedeu a propositura da acção, tendo depois julgado improcedente a oposição e liquidado a quantia exequenda em 6.621,07 €, com o fundamento de que “a sentença que executa tem implícita a condenação da embargante no pagamento das quantias em causa, valendo, assim, como título executivo em relação às mesmas, aliás, na sequência, do entendimento da mais recente jurisprudência.” A embargante recorreu, continuando a defender a inexistência de título executivo bastante e a embargada interpôs recurso subordinado, relativamente à questão das retribuições vencidas desde o despedimento até ao 30.º dia que antecedeu a data de propositura da acção, recurso esse que não foi admitido. Nesta Relação, o Ex.mo Procurador da República que subscreveu o douto parecer de fls. 63 e seguintes pronunciou-se pela improcedência do recurso. Cumpre apreciar e decidir. 2. Os factos Os factos relevantes para conhecer do mérito do recurso são os que já foram referidos. 3. O mérito O objecto do recurso restringe-se à questão de saber se a sentença que declarou ilícito o despedimento do recorrida e condenou a recorrente a reintegrá-la e a pagar-lhe as retribuições que aquela teria auferido até à data da sentença constitui título executivo relativamente às retribuições que ela teria auferido desde a data da sentença até à data em que foi reintegrada. À primeira vista seriamos tentados a dizer que não, uma vez que o fim e os limites da acção executiva de determinam pelo título executivo que, no caso em apreço, é o acórdão do tribunal da relação que confirmou a sentença da 1.ª instância a qual se limitou a condenar a recorrente a reintegrar a recorrida e a pagar-lhe a quantia de 729.528$00 a título de “retribuições que deixou de auferir desde 30 dias antes da data de propositura da acção até ao dia de hoje.” Não tem sido esse, todavia, o entendimento da jurisprudência, nomeadamente do nosso STJ que sistematicamente tem vindo a decidir que a sentença proferida em acção de impugnação de despedimento, considerado ilícito, pode servir de base à execução, não só relativamente às retribuições vencidas entre a data do despedimento e a da sentença da 1.ª instância, como também às vencidas desde esta última data até a reintegração efectiva do trabalhador (vide, entre outros, os acórdãos do STJ de 3.2.93 (CJ - Ac. STJ -, ano I, 1993, tomo I, pág. 243), de 15.5.96, (CJ - Ac. STJ -, ano IV, 1996, tomo II, pág. 255), de 15.12.98, (BMJ, n.º 482, pág. 139), de 11.4.2000 (BMJ, n.º 496, pág. 156) e de 3.5.2000 (BMJ, n.º 497, pág. 242 e Base de dados da dgsi, processo 00S005). Trata-se de uma posição que não está isenta de críticas, face ao teor do n.º 1 do art.º 45.º do CPC, mas que tem funcionado como válvula de escape para evitar situações de gritante injustiça, nomeadamente nos casos em que a ilicitude do despedimento só viesse a ser declarada pela relação ou pelo Supremo, uma vez que nestes casos, aplicando à letra, como vinha sendo aplicado, (em sentido contrário, porém, vide o ac. do STJ, de 9.10.2002, proferido no processo n.º 3448/01, de que foi relator o Ex.mo Juiz Conselheiro Mário Torres, publicado no Prontuário de Direito do Trabalho, n.º 63, Coimbra Editora, pág. 58 e seguintes), o disposto na al. a) do n.º 1 do art. 13.º da LCCT, a entidade empregadora só seria condenada a pagar ao trabalhador ilicitamente despedido a importância correspondente ao valor das retribuições que ele deixou de auferir desde a data do despedimento até à data da sentença. De fora ficariam as retribuições que o trabalhador deixou de auferir desde a data da sentença até ao trânsito em julgado do acórdão que declarou ilícito o despedimento. A injustiça de uma tal solução levou a jurisprudência a atribuir uma especial extensão ao título executivo constituído pela sentença da 1.ª instância que, julgando ilícito o despedimento, condena a entidade empregadora a reintegrar o trabalhador e a pagar-lhe as retribuições que deixou de auferir desde a data do despedimento (ou desde o 30 dia que antecedeu a data da propositura da acção, se esta não for proposta dentro dos 30 dias subsequentes ao despedimento) até à data da sentença, de modo a abranger também as retribuições que deixou de auferir desde a data da sentença até à data da reintegração. A tal propósito escreveu-se no acórdão do STJ de 14.1.98 (BMJ, n.º 473, pág. 270): «A declaração de ilicitude do despedimento tem como consequência que o contrato de trabalho subsiste na plenitude dos seus efeitos, tal como se não tivesse existido o despedimento. Daqui resulta que no período anterior à sentença e até esta o trabalhador tem direito a receber as prestações pecuniárias que deixou de auferir desde a data do despedimento até à da sentença, como se tivesse estado sempre ao serviço da sua entidade patronal. E no período subsequente àquela sentença tem o direito a ser reintegrado, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade, desde que não opte pela indemnização(...) A declaração de ilicitude do despedimento tem eficácia retroactiva, tudo se passando como se a relação laboral jamais tivesse sido interrompida (com o despedimento) – cfr. n.º 1 do artigo 289.º do Código Civil. Por esse motivo, trabalhador e empregador devem ser colocados na posição em que estariam se não fosse o despedimento, de modo que a situação seja reposta na sua anterior (...). Deste modo, quando se diz que a reintegração equivale à declaração judicial da manutenção do contrato de trabalho, haverá ainda que acrescentar que essa declaração leva consigo implícita uma condenação do empregador no cumprimento das prestações que se vão vencendo após a declaração de invalidade do despedimento, de tal forma que, se a entidade patronal não cumprir voluntariamente as suas obrigações, o trabalhador poderá intentar directamente uma acção executiva.” - (sublinhado nosso)-. No mesmo sentido, vide na doutrina, Pedro Furtado Martins, Despedimento ilícito e reintegração do trabalhador, RDES,1989, n.º 3-4, pág. 517 e em Cessação do Contrato de Trabalho, Principia, pág. 156; Bernardo Lobo Xavier, Curso de Direito do Trabalho, 1992, 2.ª edição, pág. 539). Como se disse no citado acórdão do STJ, de 9.10.2002, “independentemente das críticas que esta orientação possa suscitar em estritos termos processuais (...), sempre se poderá dizer que, através dela, se deixa entrar pela janela (da acção executiva) o que não se deixou entrar pela porta (da acção declarativa), isto é, o reconhecimento de que a construção dogmática da declaração judicial da ilicitude do despedimento como eliminação ex tunc dessa causa de cessação do contrato de trabalho implica necessariamente a proclamação da relevância, quer para efeitos de antiguidade, quer para efeitos de proclamação das retribuições que normalmente teriam sido recebidas, de todo o tempo decorrido desde o despedimento até à data da decisão judicial final.” O recente acórdão de uniformização de jurisprudência n.º 1/2004, de 20.11.2003, publicado na I-A Série do D.R. de 9.1.2004 veio simplificar o problema, ao decidir que “declarada a ilicitude do despedimento, o momento a atender, como limite temporal final, para a definição dos direitos conferidos ao trabalhador pelo artigo 13.º, n.ºs 1, alínea a), e 3, do regime jurídico aprovado pelo Decreto-Lei n.º 64-A/89, de 27 de Fevereiro, é, não necessariamente a data da sentença da 1.ª instância, mas a data da decisão final, sentença ou acórdão que haja declarado ou confirmado aquela ilicitude.” Nos termos daquele acórdão, ficou agora claro que os chamados salários de tramitação são devidos não só até à data da sentença proferida na 1.ª instância, mas também até à data da decisão final que haja declarado ou confirmado a declaração de ilicitude e, naturalmente, a condenação que vier a ser proferida nesses termos constituirá título executivo para obter o pagamento dessas retribuições, sem necessidade de fazer apelo à solução jurisprudencial que vem sendo referida. Como será, todavia, relativamente às retribuições que se vencerem entre a data daquela decisão e a data da reintegração? Em nossa opinião, o problema mantém-se nessa parte, uma vez que aquelas retribuições não estarão incluídas na decisão condenatória. Quanto a elas, poderemos continuar a socorrermo-nos da solução jurisprudencial a que temos vindo a fazer referência, embora nos pareça que não haja necessidade disso, por entendermos que aquelas retribuições mais não são do que a indemnização devida ao trabalhador pelo incumprimento da obrigação de reintegração, indemnização essa que pode ser reclamada directamente na acção executiva, nos termos dos artigos 933.º e 934.º do CPC, dado que a decisão condenatória, constituindo título executivo para obter a reintegração, também constituirá título executivo para obter (pela via da conversão da execução) a indemnização pelo dano resultante do incumprimento daquela obrigação. No caso em apreço, a recorrente foi condenada na 1.ª instância a reintegrar a recorrida e a pagar-lhe as retribuições vencidas até à data da sentença, no montante de 729.528$00. A recorrente recorreu, com efeito suspensivo, mas a relação confirmou a sentença, por acórdão de 22 de Junho de 1998. A recorrente procedeu, então, em 1 de Julho de 1998, à reintegração da recorrida e pagou-lhe aquela importância de 729.528$00. Em causa no presente recurso estão as retribuições relativas ao período que decorreu entre a data da sentença (1.10.97) e a data da reintegração. Será que a sentença condenatória constitui título executivo para reclamar o pagamento coercivo das mesmas? Face ao que ficou dito, a resposta só pode ser afirmativa e, em nossa opinião, sem necessidade até de recorrer à extensão do título executivo. Com efeito, tendo a ré sido condenada a reintegrar a recorrida logo na sentença proferida na 1.ª instância e tendo essa sentença sido confirmada na relação, os efeitos daquela condenação retroagem à data da sentença da 1.ª instância. Como se disse no acórdão do STJ de 15.12.98 (BMJ, n.º 482, pág. 141): «A circunstância de ao recurso ter sido fixado o efeito suspensivo só tem o significado de ter ficado suspensa essa obrigação até decisão do tribunal superior, mantendo-se, porém, tal obrigação no caso de a sentença vir a ser confirmada, o que aconteceu. Assim, o direito à reintegração nasceu com a sentença que o reconheceu e não com o acórdão que o confirmou. Dizendo por outras palavras, a pronúncia da 1.ª instância, sob recurso, não é uma mera possibilidade de sentença, é antes um verdadeiro comando com carácter obrigatoriedade. Embora pendente de recurso, e seja por isso uma decisão provisória, já é eficaz na medida em que vale como declaração do direito. Apenas os seus efeitos ficam suspensos por haver possibilidade de uma nova decisão, convertendo-se em definitivo logo que confirmada pelo tribunal superior.» Tendo a recorrida sido reintegrada apenas em 1.7.98, é óbvio que tem direito à indemnização pelos prejuízos sofridos por não ter sido reintegrada imediatamente após a prolacção da sentença, nos termos do já referido n.º 1 do art. 933.º do CPC, correspondendo o montante desses prejuízos ao valor dos salários não recebidos desde a data da sentença até á da reintegração, neles se incluindo naturalmente todas as prestações que por lei devam ser consideradas como tal, nomeadamente os reclamados subsídio de alimentação e de assiduidade (cuja natureza remuneratória a recorrente, aliás, não contesta), sendo irrelevante que a recorrida não tenha prestado trabalho nesse período, uma vez que tal aconteceu, por culpa da recorrente. 4. Decisão Nos termos expostos, decide-se negar provimento ao recurso. Custas pela recorrente. PORTO, 8 de Março de 2004 Manuel Joaquim Sousa Peixoto João Cipriano Silva José Carlos Dinis Machado da Silva |