Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
Processo: |
| ||
Nº Convencional: | JTRP00043414 | ||
Relator: | FERREIRA DA COSTA | ||
Descritores: | ACIDENTE DE TRABALHO INCAPACIDADE PERMANENTE PARCIAL PRATICANTES DESPORTIVOS | ||
![]() | ![]() | ||
Nº do Documento: | RP20100118414/08.8TTMTS.P1 | ||
Data do Acordão: | 01/18/2010 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
![]() | ![]() | ||
Meio Processual: | APELAÇÃO. | ||
Decisão: | PROVIDO. | ||
Indicações Eventuais: | 4ª SECÇÃO (SOCIAL) LIVRO 94 - FLS 190. | ||
Área Temática: | . | ||
![]() | ![]() | ||
Sumário: | I - Nos termos do art. 2º, n.º 3 da Lei 8/2003, de 12 de Maio (regime jurídico de reparação de danos emergentes de acidente de trabalho dos praticantes desportivos) “… ao grau de desvalorização resultante da aplicação da tabela nacional de incapacidades por acidentes de trabalho e doenças profissionais corresponde o grau de desvalorização previsto na tabela de comutação específica para a actividade de praticante desportivo, anexa à presente lei…”. II - Não estando especialmente contemplada na referida tabela uma IPP de 8,43%, na medida em que esta não prevê incapacidades em décimas, a correspondência deve ser feita encontrando a diferença entre as IPP comutadas, isto é: se à IPP de 8% corresponde a comutação de 8,465% à IPP de 9% a comutação de 9,76% à IPP de 8,43% deve corresponder metade da respectiva diferença isto é, 9,0219%. III - Tal regime jurídico específico, não prevendo quaisquer normas em sede de remição de pensões, remete para o regime geral, Lei 100/97, de 13 de Setembro e DL 143/99, de 30 de Abril, como expressamente o definiu o art. 6º da Lei n.º 8/2003,de 12 de Maio. IV - Estando o sinistrado afectado de uma incapacidade inferior a 30%, a pensão é “ab initio” total e obrigatoriamente remível, atento o disposto no art. 56º, 1, al. b) do DL 143/99, de 30 de Abril, irrelevando o valor da pensão. | ||
Reclamações: | |||
![]() | ![]() | ||
Decisão Texto Integral: | Reg. N.º 641 Proc. N.º 414/08.8TTMTS.P1 Acordam no Tribunal da Relação do Porto: Nestes autos emergentes de acidente de trabalho, com processo especial, cuja participação deu entrada em juízo em 2008-05-23, em que figuram, como sinistrado B………. e como entidade responsável C………. - Companhia de Seguros, S.A., tendo-se frustrado a tentativa de conciliação, unicamente por discordância com o resultado do exame médico efectuado no Instituto Nacional de Medicina Legal, abreviadamente INML, cada uma das partes requereu a realização de exame médico colegial, por Junta Médica, de ora em diante designada apenas por JM, para o que formularam os respectivos quesitos. Realizado tal exame, os Srs. Peritos entenderam que o sinistrado se encontrava afectado de uma IPP de 8,43%, que comutaram para 8,736%, porquanto este é jogador profissional de futebol[1]. Proferida sentença[2], o Tribunal a quo fixou ao sinistrado a IPP comutada de 8,465% e condenou a R. a pagar-lhe o capital de remição da pensão anual de € 58.629,62, sendo a alta reportada a 2007-05-26, para o que ordenou que oportunamente se procedesse ao respectivo cálculo. Irresignado com o assim decidido, veio o sinistrado interpor recurso de apelação, tendo formulado, a final, as seguintes conclusões: 1.º Ao sinistrado foi-lhe atribuída, por unanimidade a I.P.P. genérica de 8,43% conforme T.N.I. - Auto de fls. 133/134 - e não só, e apenas, de 8%.2.º Assim, a I.P.P. fixada de 8,465% pela sentença aqui em crise, não é correcta.3.º Comutar tal I.P.P. genérica de 8,43% para 0,08465, como se ele tivesse 8%, será prejudicar o sinistrado 0,43%, os quais corresponderão a uma perda da capacidade de ganho que não será indemnizada.4.º E, tal como já decidido no Acórdão do Tribunal da Relação do Porto datado de 18-02-2008, proferido no Processo n.º 0715860, disponível em www.dgsi.pt. a solução mais justa é precisamente encontrar a diferença entre as IPP comutadas .. », ou seja, neste caso, a diferença entre o 8% e o 9% para a idade de 32 anos. 5.º Seguindo tal raciocínio e a fórmula aí encontrada, e como o grau de IPP da TNI é de 8,43%, 6.º à IPP de 8% (em termos de TNI) corresponde a comutação de 8,465% e à IPP de 9% corresponde em termos de comutação a IPP de 9,76%, encontrámos entre ambos uma diferença de 1,295% (9,76-8,465); como o grau de IPP da TNI é de 8,43% há que encontrar o correspondente a 43% da respectiva diferença de 1,295%, ou seja, 0,5569% e somar aos 8,465% de I.P.P. comutada relativamente aos 8%; logo, a IPP em termos de comutação para o caso concreto será a de 9,0219%. 7.º Este valor de 9,0219% de I.P.P. será o que mais respeita os princípios da justa reparação previsto no art. 59.º n.º 1 al. f) da Constituição da República Portuguesa e da igualdade previsto no art. 13.º do mesmo diploma legal - art. 10° nº 3 do C. P. Civil. 8.º A sentença recorrida violou, entre outras disposições legais, o artigo 59.° n.º 1 al. f) da Constituição da República Portuguesa e o princípio da igualdade previsto no art. 13.º do mesmo diploma legal, e a Lei 8/2003 de 12 de Maio.Irresignada também a seguradora com o decidido, veio interpor recurso de apelação, tendo formulado, a final, as seguintes conclusões: 1 - O Apelado é um jogador profissional de futebol, da equipe sénior do D………., jogando na ………. (antiga 1ª divisão, ou seja, o escalão máximo do futebol nacional). 2 - Trata-se, por isso, de um praticante desportivo profissional, obedecendo a reparação do presente acidente de trabalho ao regime específico consagrado na Lei 8/2003 de 12 de Maio. 3 - Auferia à data do acidente a retribuição anual de € 989.445,91, pelo que, face à sua IPP de 8,465% lhe é devida, até perfazer 35 anos de idade, a pensão anual de € 58.629,62. 4 - Dado que tal pensão só lhe é devida até 11/02/2010, data em que completa 35 anos de idade, deverá a partir daí calcular-se qual o valor da sua pensão, em obediência ao estatuído na alínea b) do nº 2 do Art. 2º da Lei 8/2003. 5 - Ou seja, ao contrário do que se afirma na Douta decisão em crise, não existe sequer uma pensão vitalícia de € 58.629,62, pelo que não pode a mesma ser remida, sob pena de se violar, como fez tal decisão, o Art. 17º nº 1 d) da Lei 100/97. 6 - Da alínea b) do nº 2 do Art. 2º da Lei 8/2003 resulta que a pensão do Apelado, como a de qualquer outro desportista profissional, está sujeita aos limites de 14 vezes o SMN multiplicado por 15 até à data em que perfizer 35 anos de idade sofrendo uma redução de até 50% a partir de tal idade, pois que o seu limite máximo baixa para 8 vezes o SMN multiplicado por 15 dos 35 anos de idade em diante. 7 - A pensão do sinistrado excede o limite máximo legal da alínea b) do nº 2 do Art. 2º Lei 8/2003 quando completar o seu 35º aniversário, o que sucederá já em 11/02/2010 pois que nasceu no dia 11/02/1975. 8 - Tal é um dado inequívoco que o Tribunal não pode ignorar. 9 - Dado que a lei é omissa quanto à forma de conjugar a aplicação de tais limites máximos para pensões de desportistas profissionais com o nº 1 d) do Art. 17º da LAT e com o nº 1 do Art. 56º RLAT estamos perante uma lacuna da lei. 10 - De facto, o legislador estabeleceu limites máximos para as pensões dos desportistas profissionais, muito mais gravosos para idades superiores a 35 anos sem contemplar minimamente o grau de IPP ou mesmo de eventual lPATH. 11 - Relevando apenas a idade e o valor da pensão. 12 - Dado que não há casos análogos, há que criar norma que complete a lacuna legislativa existente respeitando o espírito do sistema - cfr. Art. 10º CCiv. 13 - O espírito do sistema de reparação de acidentes de trabalho de que sejam vítimas desportistas profissionais caracteriza-se essencialmente por majorar as suas IPP's e por estabelecer limites máximos ao montante das suas pensões, sem curar de saber qual a sua retribuição nem a gravidade da lesão sofrida - morte, IPA, IPATH ou IPP até aos 35 anos de idade - 14 x (SMN x 15) e, para as IPATH e IPP após os 35 anos 14 x (SMN x 8). 14 - Tais limites visam respeitar o facto público e notório de que dificilmente um desportista profissional de desgaste rápido - se mantém como profissional a partir dos 35 anos de idade, sofrendo por isso a inerente quebra da sua retribuição - evitando por isso o seu locupletamento indevido à custa do responsável pela reparação do seu acidente de trabalho. 15 - O limite em causa - b) do nº 2 Art. 2º Lei 8/2003 - tem ainda na sua génese razões de justiça abstracta, de equidade social ou de respeito pela ordem pública, pelos valores morais e éticos dominantes na nossa sociedade. 16 - De facto, trata-se de um limite que, ainda assim, atribui ao desportista sinistrado com mais de 35 anos 112 vezes o salário mínimo nacional pelo que, num país com um salário medio de cerca de € 600,00/mês e dois milhões de pobres chocaria o sentido de justiça conferir pensões superiores a desportistas que, de todo o modo, já teriam acabado a sua carreira. 17 - A norma que um intérprete deveria criar para preencher a presente lacuna deveria ter o seguinte sentido: NA REMIÇÃO DE PENSÕES ARBITRADAS A SINISTRADOS DESPORTISTAS PROFISSIONAIS NÃO PODE, EM CASO ALGUM, SER CONSIDERADA UMA PENSÃO ANUAL DE VALOR SUPERIOR AO DO LIMITE MÁXIMO ESTABELECIDO NA AlÍNEA B) DO Nº 2 DO ARTIGO 2º DO PRESENTE DIPLOMA. 18 - Não entender assim implica fazer tábua rasa do limite máximo estabelecido na lei para pensões anuais de desportistas com mais de 35 anos de idade, pois a quase totalidade dos mesmos termina a sua carreira muito antes de tal idade, pelo que beneficiaria de remição de pensões com que se defraudaria em absoluto o limite máximo legal para as suas pensões a partir dos 35 anos. 19 - Implicando ainda sustentar uma interpretação do nosso ordenamento jurídico pela qual se admitem gritantes injustiças relativas, pois que os desportistas sinistrados carecidos de maior protecção, por serem os afectados com maior grau de incapacidade (os de IPP superior a 30%) seriam extremamente lesados face aos desportistas de menor incapacidade (IPP inferior a 30%) pois que, ao contrário destes, jamais conseguiriam remir as suas pensões e, como tal, furtar-se à diminuição das mesmas que a lei lhes impõe aos 35 anos. 20 - Ao decidir como decidiu, a Mma. Juíza "a quo" interpretou erradamente e com isso violou não só o estatuído na alínea b) do nº 2 do Art. 2º da Lei 8/2003 como ainda o Art. 10º nº 3 CCiv. e o espírito do sistema e ordenamento jurídico em que tais preceitos se incluem. Cada uma das partes contra-alegou relativamente ao recurso da outra, pedindo a final a respectiva improcedência. O Exm.º Sr. Procurador-Geral Adjunto, nesta Relação, emitiu douto parecer no sentido de que o recurso do sinistrado merece provimento e o da seguradora não deve ser provido. Recebidos os recursos, elaborado o projecto de acórdão e entregues as respectivas cópias aos Exm.ºs Juízes Desembargadores Adjuntos[3], foram colhidos os vistos legais. Cumpre decidir. São os seguintes os factos dados como provados pelo Tribunal a quo: 1) No dia 12/08/2006, quando trabalhava sob as ordens, direcção e fiscalização da D1……….. S.A.D., o autor quando estava a jogar futebol, no contacto com um adversário, ao apoiar o pé esquerdo, sofreu as lesões e sequelas descritas no auto de fls. 133/134, cujo teor se reproduz. 2) À data da alta, que foi fixada em 26/05/2007 o autor auferia a remuneração anual de €989.445,91. 3) A entidade empregadora do autor, mediante contrato de seguro titulado pela apólice n.º AT…….., tinha transferido a sua responsabilidade emergente de acidente de trabalho para a Seguradora, ora Ré. 4) O A. encontra-se afectado de incapacidade para o trabalho, com um coeficiente de 0,08465, a partir de 27/05/2007, dia imediato ao da alta definitiva, em consequência das lesões que lhe resultaram do acidente dos autos. 5) O autor encontra-se pago de todas as quantias devidas a título de indemnização pelos períodos de incapacidades temporárias. Estão também provados os seguintes factos: 6) Realizado o exame por JM, os Srs. Peritos entenderam que o sinistrado se encontrava afectado de uma IPP de 8,43%, que comutaram para 8,736% - cfr. fls. 133-4. 7) O sinistrado nasceu em 1975-02-11 – cfr. fls. 121. O Direito. Sendo pelas conclusões do recurso que se delimita o respectivo objecto[4], como decorre do disposto nos Art.ºs 684.º, n.º 3 e 685.º-A, n.º 1, ambos do Cód. Proc. Civil, na redacção que lhe foi dada pelo diploma referido na nota (3), ex vi do disposto no Art.º 87.º, n.º 1 do Cód. Proc. do Trabalho de 2000, salvo tratando-se de matérias de conhecimento oficioso de que o Tribunal ad quem pode conhecer por sua iniciativa, o que não ocorre in casu, são duas as questões a decidir nesta apelação, a saber: I – Na apelação do sinistrado, se o grau de incapacidade comutado deve ser fixado em 9,0219% e II – Na apelação da seguradora, se a pensão só deve ser remida quando o sinistrado completar 35 anos de idade, respeitando-se o limite estabelecido no Art.º 2.º, n.º 2, alínea b) da Lei n.º 8/2003, de 12 de Maio. A 1.ª questão. Previamente, conforme se mencionou anteriormente, deve referir-se que ao presente recurso é aplicável o Cód. Proc. Civil, na redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 303/2007, de 24 de Agosto, atento o disposto nos seus Art.ºs 11.º, n.º 1 e 12.º, n.º 1, uma vez que o acidente foi participado ao Tribunal do Trabalho em 2008-05-23. Quanto à questão colocada, entende o sinistrado que o grau de incapacidade comutado deve ser fixado em 9,0219%. Acontece que, conforme vem dado como provado, o Tribunal a quo fixou a incapacidade do sinistrado para o trabalho, com um coeficiente desvalorização comutado de 8,465% e que, realizado o exame por Junta Médica, os Srs. Peritos entenderam que o sinistrado se encontrava afectado de uma IPP de 8,43%, que comutaram para 8,736%. Ora, se o acidente dos autos fosse um comum acidente de trabalho, considerar-se-ia que o sinistrado se encontra afectado de uma IPP de 8,43%, sem mais. Sendo o sinistrado, porém, um praticante desportivo profissional, tal actividade implica um desgaste rápido, sendo a carreira dos jogadores normalmente curta, tendencialmente até aos 35 anos de idade, mas tendo como correspectivo, também normalmente, uma retribuição muito superior à média. Parecendo que as prestações das partes são, destarte, equilibradas, pois o praticante desportivo profissional acabará por receber dos clubes, durante a sua vida desportiva profissional activa, de curta duração, uma retribuição tendencialmente igual àquela que um trabalhador normal recebe durante os longos anos da sua carreira profissional completa, entendeu o legislador criar um regime específico relativo à reparação dos danos emergentes de acidentes de trabalho dos praticantes desportivos profissionais, como decorre do disposto no Art.º 1.º da Lei n.º 8/2003, de 12 de Maio. Ora, tratando-se de profissão de desgaste rápido, importa em caso de verificação de acidente de trabalho, majorar o grau de incapacidade fixado para os trabalhadores em geral na Tabela Nacional de Incapacidades[5], através da aplicação adicional da tabele anexa, a que se reporta o n.º 3 do Art.º 2.º da Lei n.º 8/2003, de 12 de Maio e, auferindo tais profissionais retribuições muito superiores à média, tudo aconselha o estabelecimento de limites máximos de reparação, pois normalmente a um curto período de vida activa segue-se um resto de vida tendencialmente longo, durante o qual as pensões são pagas, dado o seu carácter vitalício. Daí o disposto no Art.º 2.º da referida Lei, na parte que ora interessa considerar: 1 — Para efeitos de reparação dos danos emergentes de acidentes de trabalho dos praticantes desportivos profissionais dos quais resulte morte ou incapacidade permanente absoluta para todo e qualquer trabalho, as pensões anuais calculadas nos termos da Lei n.º 100/97, de 13 de Setembro, têm como limite global máximo o valor de 14 vezes o montante correspondente a 15 vezes o salário mínimo nacional mais elevado garantido para os trabalhadores por conta de outrem em vigor à data da fixação da pensão. 2 — Para efeitos de reparação dos danos emergentes de acidente de trabalho dos praticantes desportivos profissionais dos quais resulte uma incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual ou uma incapacidade permanente parcial, as pensões anuais calculadas nos termos da Lei n.º 100/97, de 13 de Setembro, obedecem aos seguintes limites máximos: a) 14 vezes o montante correspondente a 15 vezes o salário mínimo nacional mais elevado garantido para os trabalhadores por conta de outrem em vigor à data da fixação da pensão, até à data em que o praticante desportivo profissional complete 35 anos de idade; b) 14 vezes o montante correspondente a oito vezes o salário mínimo nacional mais elevado garantido para os trabalhadores por conta de outrem em vigor à data da alteração da pensão, após a data referida na alínea anterior. 3 — Nos casos previstos nos números anteriores, ao grau de desvalorização resultante da aplicação da tabela nacional de incapacidades por acidente de trabalho e doenças profissionais corresponde o grau de desvalorização previsto na tabela de comutação específica para a actividade de praticante desportivo profissional, anexa à presente lei e que dela faz parte integrante, salvo se da aplicação da primeira resultar valor superior. Sendo este basicamente o regime específico aplicável aos praticantes desportivos profissionais na reparação de acidentes de trabalho, em tudo o mais são aplicáveis as normas do regime jurídico geral dos acidentes de trabalho, aprovado pela Lei n.º 100/97, de 13 de Setembro, bem como toda a legislação regulamentar, como estatui o Art.º 6.º da referida Lei. Ora, in casu, trata-se de fazer a aplicação do disposto no Art.º 2.º, n.º 3, acima transcrito e respectiva tabela anexa. Sendo a alta reportada a 2007-05-27 e tendo o sinistrado nascido em 1975-02-11, como vem provado, é de atender à idade de 32 anos. Tendo a JM fixado a IPP de 8,43% e não prevendo a coluna x da tabela anexa à Lei n.º 8/2003, de 12 de Maio, incapacidades em décimas, deveremos atender à média das incapacidades comutadas previstas para as incapacidades de 8% e de 9% que, atendendo à idade de 32 anos e à respectiva coluna do quadro y, da mesma tabela, que são respectivamente de 8,465 e 9,76. Obtida a diferença destes graus de incapacidades comutados, que é de 1,295 e multiplicada pela fracção que supera o grau de 8%, 0,43%, obtemos o resultado 0,55685, que somado ao grau de incapacidade comutado da incapacidade geral de 8%, que é 8,465, perfaz a incapacidade específica comutada final a atender, 9,02185, que arredondando perfaz 9,0219%. Tal critério é a forma concreta e razoável de preencher a lacuna constante da tabela, tal como esta Relação[6] já teve a oportunidade de decidir, com a concordância do Ministério Público, nenhuma razão existindo para dele nos afastarmos, bem pelo contrário[7]. Vindo provado em 2) que o sinistrado auferia a remuneração anual de € 989.445,91, atendendo á incapacidade ora fixada de 9,0219% e ao disposto no Art.º 17.º, n.º 1, alínea d) da Lei n.º 100/97, de 13 de Setembro, é-lhe devida a pensão anual de € 62.486,77 [989.445,91 x 0,090219 x 0,7 = 62.486,77]. Tal significa que a sentença deve ser revogada nesta parte, substituindo-se o montante da pensão aí fixado pelo ora encontrado. Procedem, destarte, as conclusões da apelação do sinistrado. A 2.ª questão. Trata-se de saber, na apelação da seguradora, se a pensão só deve ser remida quando o sinistrado completar 35 anos de idade, respeitando-se o limite estabelecido no Art.º 2.º, n.º 2, alínea b) da Lei n.º 8/2003, de 12 de Maio. Vejamos. Como se deixou referido na questão anterior, a especificidade do regime jurídico da reparação dos acidentes de trabalho sofridos pelos praticantes desportivos profissionais abrange apenas a majoração da incapacidade e os limites máximos das pensões, ambos previstos no Art.º 2.º da Lei n.º 8/2003, de 12 de Maio. No entanto, nada vem especificamente regulado em sede de remição das pensões. Entende a seguradora, ora apelante, que existe lacuna legislativa, pelo que o seu preenchimento deve ser efectuado com a elaboração de norma que apenas autorize a remição depois de o sinistrado perfazer 35 anos de idade, de forma que a pensão a atender no respectivo cálculo considere apenas o valor de 14 vezes o montante correspondente a 8 vezes o salário mínimo nacional mais elevado garantido para os trabalhadores por conta de outrem, previsto na alínea b) do n.º 2 do Art.º 2.º da Lei n.º 8/2003, de 12 de Maio e não o valor de 14 vezes o montante correspondente a 15 vezes o mesmo salário mínimo, previsto na alínea a) do mesmo número e artigo. Cremos, no entanto, que a ora apelante não tem razão. Pretendendo o legislador estabelecer um regime específico de remição para os praticantes desportivos, tê-lo-ia dito, como dispôs no Art.º 5.º para os praticantes desportivos estrangeiros que pretendam deixar Portugal. É do seguinte teor tal Art.º 5.º: Em caso de acidente de trabalho sofrido por um praticante desportivo profissional de nacionalidade estrangeira do qual resulte a incapacidade permanente ou morte, a pensão anual vitalícia devida pode ser remida[8] em capital, por acordo entre a empresa de seguros e o beneficiário da pensão, se este optar por deixar Portugal. Portanto, tendo regulado especificamente a remição para aquele conjunto de casos e nada tendo estabelecido para os restantes, apenas se pode aplicar subsidiariamente a Lei n.º 100/97, de 13 de Setembro e o Decreto-Lei n.º 143/99, de 30 de Abril, como expressamente o definiu o Art.º 6.º da mesma Lei n.º 8/2003, de 12 de Maio. Ora, segundo esta – lei geral – a remição ordenada pelo Tribunal a quo está prevista no Art.º 56.º, n.º 1, alínea b) do Decreto-Lei n.º 143/99, de 30 de Abril, pois o caso dos autos respeita a um acidente de que derivou uma incapacidade inferior a 30%, irrelevando o valor da pensão. Na verdade, as duas alíneas do n.º 1 do referido Art.º 56.º são de aplicação alternativa pois, preenchida uma das hipóteses, nada mais é necessário para que a remição deva ser obrigatoriamente ordenada. Por outro lado e como refere o Sr. Procurador-Geral Adjunto, em seu douto parecer, a redução [de 14 vezes] do montante da pensão de 15 para 8 salários mínimos, quando o sinistrado perfaz 35 anos de idade, atento o disposto nas alíneas a) e b) do n.º 2 do Art.º 2.º da Lei n.º 8/2003, de 12 de Maio, respeita apenas às pensões derivadas de incapacidade permanente absoluta para todo e qualquer trabalho, de incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual e de incapacidade permanente parcial igual ou superior a 30%, casos em que a remição é facultativa e parcial, quando o caso dos autos corresponde a uma remição obrigatória e total, imposta por lei. Tais diferenças são facilmente entendíveis, pois as remições obrigatórias correspondem a pensões de diminuto montante, não nos devendo impressionar os montantes atingidos nos casos respeitantes aos praticantes desportivos profissionais, pois se uma pensão de diminuta incapacidade puder ser considerada elevada, imagine-se o montante que atingiria uma pensão se o sinistrado tivesse ficado com uma incapacidade de 100%. Cremos, por fim, que o sistema jurídico no seu todo ou a Constituição da República, nomeadamente o princípio da igualdade, ínsito no seu Art.º 13.º, não impõe uma solução diferente para o caso concreto. Tanto assim é que, apesar de muito se comentar o nível das retribuições dos praticantes desportivos profissionais, certo é que ninguém veio invocar a violação, por esse motivo, dos mais altos valores do nosso sistema jurídico. Improcedem, destarte, todas as conclusões do recurso da seguradora. Decisão. Termos em que se acorda em: a) Conceder provimento à apelação do sinistrado, alterando o valor da IPP para 9,0219% e o valor da pensão anual para € 62.486,77, nessa parte revogando a sentença e b) Negar provimento à apelação da seguradora, assim confirmando a sentença recorrida, nessa parte. Custas pela seguradora, em ambas as apelações. Porto, 2010-01-18 Manuel Joaquim Ferreira da Costa António José Fernandes Isidoro Paula Alexandra Pinheiro Gaspar Leal Sotto Mayor de Carvalho _____________________ [1] Cfr. fls. 133 e 134. [2] Cfr. fls. 135 a 139. [3] Atento o disposto no Art.º 707.º, n.º 2 do CPC, na redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 303/2007, de 24 de Agosto, ex vi do disposto nos Art.ºs 11.º, n.º 1 – a contrario sensu – e 12.º, n.º 1, ambos deste diploma. [4] Cfr. Alberto dos Reis, in Código de Processo Civil Anotado, volume V, reimpressão, 1981, págs. 308 a 310 e os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 1986-07-25 e de 1986-10-14, in Boletim do Ministério da Justiça, respectivamente, n.º 359, págs. 522 a 531 e n.º 360, págs. 526 a 532. [5] Aprovada pelo Decreto-Lei n.º 341/93, de 30 de Setembro, uma vez que a aprovada pelo Decreto-Lei n.º 352/2007, de 23 de Outubro, apenas entrou em vigor em 2008-01-21, como dispõe o seu Art.º 7.º e o acidente de trabalho dos autos ocorreu em 2006-08-12. [6] Cfr. o Acórdão da Relação do Porto de 2008-02-18, Processo 0715860, in www.dgsi.pt, junto por fotocópia na apelação do sinistrado e citado no douto parecer do Ministério Público. [7] Veja-se, a propósito, o seguinte passo de tal aresto que se transcreve ipsis verbis: “…Logo à partida rejeitámos a “aproximação” da incapacidade por excesso (de 12,5% para 13%), na medida em que tal critério conduz a tratamentos injustos (o sinistrado a quem foi atribuída a IPP de 13% pela TNI teria igual valor de comutação que o sinistrado a quem apenas foi atribuída a IPP de 12,5%). E também conduz a tratamento injusto atribuir ao sinistrado com a IPP de 12,5% o mesmo valor de comutação que é de atribuir a sinistrado com a IPP de apenas 12%...”. [8] Atenta a Declaração de Rectificação n.º 9-E/2003, de 7 de Julho, in DIÁRIO DA REPÚBLICA – I SÉRIE-A, N.º 156, _____________________ S U M Á R I O I – Nos termos do Art.º 2.º, n.º 3 da Lei n.º 8/2003, de 12 de Maio [regime jurídico de reparação dos danos emergentes de acidente de trabalho dos praticantes desportivos profissionais], “…ao grau de desvalorização resultante da aplicação da tabela nacional de incapacidades por acidentes de trabalho e doenças profissionais corresponde o grau de desvalorização previsto na tabela de comutação específica para a actividade de praticante desportivo, anexa à presente lei …”. II – Não estando especialmente contemplada na referida tabela uma IPP de 8,43%, na medida em que esta não prevê incapacidades em décimas, a correspondência deve ser feita encontrando a diferença entre as IPP comutadas, isto é: se à IPP de 8% corresponde a comutação de 8,465% e à IPP de 9% a comutação de 9,76%, à IPP de 8,43% deve corresponder metade da respectiva diferença, isto é, 9,0219%. III – Tal regime jurídico específico, não prevendo quaisquer normas em sede de remição de pensões, remete para o regime geral, Lei n.º 100/97, de 13 de Setembro e Decreto-Lei n.º 143/99, de 30 de Abril, como expressamente o definiu o Art.º 6.º da Lei n.º 8/2003, de 12 de Maio. IV – Estando o sinistrado afectado de uma incapacidade inferior a 30%, a pensão é ab initio total e obrigatoriamente remível, atento o disposto no Art.º 56.º, n.º 1, alínea b) do Decreto-Lei n.º 143/99, de 30 de Abril, irrelevando o valor da pensão. |