Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
53/12.9TTBRG.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: FERREIRA DA COSTA
Descritores: CESSAÇÃO DO CONTRATO DE TRABALHO
RESOLUÇÃO DO CONTRATO PELO TRABALHADOR
Nº do Documento: RP2013120953/12.9TTBRG.P1
Data do Acordão: 12/09/2013
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: NEGADO PROVIMENTO
Indicações Eventuais: 4ª SECÇÃO (SOCIAL)
Área Temática: .
Sumário: I – Sendo taxativas as formas de cessação do contrato de trabalho, provado que ele cessou através de determinada forma, não pode posteriormente pretender-se que a cessação ocorreu por forma diversa.
II – Assim, demonstrado que o contrato cessou por resolução com invocação de justa causa pelo trabalhador, não pode este posteriormente pretender que, face à celebração de acordo escrito de acerto de contas entre as partes, o contrato tenha cessado por revogação, por mútuo acordo.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Reg. N.º 1014
Proc. N.º 53/12.9TTBRG.P1

Acordam no Tribunal da Relação do Porto:

B… deduziu em 2012-01-16 contra C…, S.A. a presente ação declarativa, emergente de contrato individual de trabalho, com processo comum, pedindo que se:
I – Declare a cessação do contrato de trabalho por iniciativa da A., por justa causa;
II – Considere o acordo celebrado entre A. e R. como incumprido, não produzindo os seus efeitos;
III – Condene a R. a pagar à A.:
a) – A quantia de € 6.863,02, correspondente ao valor de retribuições em dívida e aos seus direitos pela cessação do contrato de trabalho por justa causa, a que deve ser deduzida a quantia de €1.238,55, já paga em sede de acordo;
b) – O valor das retribuições que se vencerem até trânsito em julgado da sentença, atendendo ao disposto no Art.º 390.º, n.º 1 do CT;
c) – Os subsídios de férias e de Natal que se vençam durante a pendência da ação, atendendo ao disposto no Art.º 390.º, n.º 2 do CT e
IV – Condene a R. a emitir a declaração da respetiva resolução do contrato de trabalho, para submeter junto do IEFP.
Alegou a A. que foi admitida ao serviço da R. em 2008-05-13, sob as ordens e direção desta, com a categoria de Caixeira Ajudante 1.º ano, mediante a retribuição mensal de € 515,00, acrescida de subsídios de refeição e de turno. Mais alegou que 11 de outubro de 2011 foi o seu último dia de trabalho, pois resolveu o contrato de trabalho, com fundamento em justa causa, pela falta de pagamento pontual das retribuições, sucedendo que em 2011-10-13, por iniciativa da R., assinou o acordo de pagamento por ela proposto, junto como doc. n.º 3, a fls. 22 e 23, tendo esta aí acordado pagar à A. a quantia global de € 2.477,09, em duas prestações de € 1.238,55 cada, tendo a R. pago apenas a primeira. Juntou aos autos, a fls. 24 a 26, a carta de resolução do contrato, na qual alega a falta de pagamento de retribuições por um período de 60 dias sobre a data do seu vencimento, acompanhada de cópia do respetivo registo, ambos datados de 2011-10-07, bem como do aviso de receção, estando esta datada de 2011-10-10.
Contestou a R., por impugnação e, por exceção, alegou que a falta de pagamento da 2.ª prestação do acordo de revogação do contrato celebrado entre A. e R. só não foi paga porque a A. não a foi receber, tendo comparecido uma pessoa que se apresentou como sua amiga, mas destituída de poderes para o ato.
A A. apresentou articulado de resposta.
Na data designada para julgamento não se encontravam presentes nem as partes nem seus Mandatários, pelo que o Tribunal a quo, atento o disposto no Art.º 71.º do CPT, assentou os factos que considerou provados, sem reclamações conhecidas.
Proferida sentença, o Tribunal a quo decidiu [ipsis verbis]:
“…condeno a Ré a pagar à A. a quantia de € 1.238,54 ….”.
Inconformada com o assim decidido, veio a A. interpor recurso de apelação, tendo formulado, a final, as seguintes conclusões:

I. A Requerente apresentou resolução do contrato de trabalho, com justa causa, com fundamento na falta de pagamento pontual da retribuição,
II. Juntando para tal alegação em sede de Petição Inicial, documento comprovativo,
III. O acordo que foi assinado para denúncia por parte do trabalhador, foi conseguido, já depois de a entidade empregadora ter rececionado a referida resolução,
IV. Tendo sido assinado pela Requerente apenas porque a vulnerabilidade económica em que a entidade empregadora a tinha colocado era já muito grave,
V. Bem sabia a entidade empregadora que tal acordo atentava contra todos os direitos já adquiridos pela Requerente,
VI. Pelo que se conclui que estas negociações foram tidas de forma pouco livre, visto que a condição económica da Requerente outra coisa não lhe permitia,
VII. Como se não bastasse este facto, tal acordo foi incumprido,
VIII. Sendo incumprido, deixa de vigorar, vigorando a verdadeira causa de resolução do contrato de trabalho, a justa causa, por falta de pagamento das retribuições,
IX. Para além do supra alegado, assiste-se a uma inutilidade superveniente da lide, pois os direitos dos credores estão já assegurados pelo reconhecimento dos créditos na lista de créditos devidamente reconhecidos.
X. Para além inutilidade superveniente da lide, assiste-se também a uma ilegitimidade passiva por parte da C..., S.A. posterior D..., S.A., visto que entra para essa posição a Massa Insolvente.
XI. Devendo assim, ser dada sem efeito a presente sentença.
Não consta que a R. tenha contra-alegado.
O Exm.º Sr. Procurador-Geral Adjunto, nesta Relação, emitiu douto parecer.
Recebido o recurso, elaborado o projeto de acórdão e entregues as respetivas cópias aos Exm.ºs Juízes Desembargadores Adjuntos, foram colhidos os vistos legais.

Cumpre decidir.

São os seguintes os factos dados como provados pelo Tribunal a quo:
a) A autora e a ré assinaram o contrato de trabalho no dia 13 de maio de 2008.
b) A autora foi admitida para o serviço, com a categoria de caixeira ajudante do 1º ano.
c) O seu local de trabalho seria na loja .., na superfície comercial E…, situado na …, Loja …, ficando no entanto aberta a possibilidade de alteração, se fosse de comum acordo.
d) Este contrato foi celebrado por um período inicial de 11 meses, podendo ser renovado por duas vezes, até um período máximo de trinta e três meses.
e) Para exercer estas funções, a ora autora auferia uma retribuição mensal bruta no valor de €515,00 (quinhentos e quinze euros).
f) Receberia ainda a título de refeição o valor diário de € 5,50 (cinco euros e cinquenta cêntimos) e € 35,00 (trinta e cinco euros) de subsídio de turno.
g) O horário de trabalho, que ficou estipulado no referido contrato, seria de 40 horas semanais, distribuídas de acordo com os horários de trabalho praticados na empresa, sendo cumprido diariamente das 10:00 horas às 18:30 horas, com intervalo entre as 14:00 e as 15:00 horas.
h) Em determinada altura, a Ré deixou de pagar pontualmente o vencimento da Autora.
i) Depois de várias interpelações por parte desta, para o cumprimento, no dia 11 de outubro de 2011 exerceu as suas funções de caixeira ajudante pela última vez.
j) Tendo apresentado denúncia por justa causa pela falta de pagamento pontual das retribuições.
k) Posteriormente, no dia 13 de outubro de 2011 e por iniciativa da entidade empregadora, a autora foi chamada e foi-lhe proposta a resolução extrajudicial da questão.
l) A autora como já se encontrava numa situação de fragilidade económica, decidiu assinar o acordo de pagamento proposto pela ré, cuja cópia foi junta a fls. 22 e 23, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
m) No entanto, este acordo só foi cumprido aquando da primeira prestação, não lhe tendo pago a Ré o valor da segunda prestação.
Estão também provados os seguintes factos:
n) No acordo referido em k), l) e m), datado de 2011-10-13, foi acordado que a R. pagava à A. a quantia de € 2.477,09, em duas prestações de € 1.238,55 cada, constando do ponto 3. o seguinte:
3. Com o recebimento deste montante de 2.477,09€ a Segunda Outorgante declara expressamente nada mais ter a receber da Primeira Outorgante a título de salários, remunerações em espécie, horas extraordinárias, trabalho suplementar, férias, subsídio de férias, e de Natal, subsídios de alimentação, ou qualquer outra, encontrando-se paga de todas as quantias que lhe eram devidas em virtude do referido contrato de trabalho que findou. – cfr. fls. 22 e 23.
o) Relativamente à denúncia referida na alínea j), a A. juntou aos autos, a fls. 24 a 26, uma carta dirigida à R. em que lhe declarou que comunicava a resolução do seu contrato de trabalho, com fundamento na falta de pagamento pontual das retribuições, que descreveu, por um período de 60 dias sobre a data do seu vencimento, acompanhada de cópia do respetivo registo, ambos datados de 2011-10-07, bem como do aviso de receção, estando esta datada de 2011-10-10.

Fundamentação.
Sendo pelas conclusões do recurso que se delimita o respetivo objeto[1], salvo tratando-se de matérias de conhecimento oficioso de que o Tribunal ad quem pode conhecer por sua iniciativa, são cinco as questões a decidir nesta apelação, a saber:
I – Desentranhamento de documentos juntos com as alegações
II – Resolução do contrato de trabalho
III – Revogação do contrato de trabalho
IV – Inutilidade superveniente da lide e
V – Ilegitimidade da R.
A 1.ª questão.
Trata-se de saber se os documentos apresentados pela A., ora apelante, com as alegações de recurso devem ser desentranhados e entregues à parte, como entende o Exm.º Sr. Procurador-Geral Adjunto, nesta Relação, em seu douto parecer.
Vejamos.
Dispõe o CPC:
Artigo 524.º
(Apresentação em momento posterior)
1. Depois do encerramento da discussão só são admitidos, no caso de recurso, os documentos cuja apresentação não tenha sido possível até àquele momento.
Artigo 543.º
(Documentos indevidamente recebidos ou tardiamente apresentados)
1. Juntos os documentos e cumprido pela secretaria o disposto no artigo 526.º, o juiz, logo que o processo lhe seja concluso, se não tiver ordenado a junção e verificar que os documentos são impertinentes ou desnecessários, mandará retirá-los do processo e restituí-los ao apresentante, condenando este ao pagamento de multa nos termos do Regulamento das Custas Processuais.
Artigo 693.º-B
Junção de documentos
As partes apenas podem juntar documentos às alegações nas situações excecionais a que se refere o artigo 524.º, no caso de a junção se ter tornado necessária em virtude do julgamento proferido na 1.ª instância e nos casos previstos nas alíneas a) a g) e i) a n) do n.º 2 do artigo 691.º.
No nosso caso estão em causa os documentos de fls. 132 a 134, que são cópia da carta, do registo e do aviso de receção, já juntos com a petição inicial e de fls. 135 a 141, que consistem em peças do processo de insolvência em que a sucessora da R. é parte. A junção de tais documentos é desnecessária, pois quanto ao primeiro ele é mera repetição de outro já existente nos autos, junto com a petição inicial, a fls. 24 a 26 e quanto ao segundo ele também é desnecessário uma vez que, como melhor se dirá à frente, a inutilidade superveniente da presente lide em consequência da declaração de insolvência – ainda – não foi objeto de qualquer decisão neste processo, sendo uma questão nova que aqui não cabe tratar, por extravasar o objeto do presente recurso e, por outro lado, tal documento é formado por peças com datas anteriores ao encerramento da audiência em 1.ª instância, que ocorreu em 2013-03-05.
Assim, devem os documentos de fls. 132 a 134 e de fls. 135 a 141 ser desentranhados dos autos e entregues à apelante, a qual vai condenada em multa, atento o disposto no Art.º 27.º, n.º 1 do Regulamento das Custas Processuais, cujo montante se fixa em 1 UC.

A 2.ª questão.
Trata-se de saber se o contrato de trabalho dos autos terminou por resolução.
Vejamos.
Ao caso é aplicável o CT2009, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, uma vez que tendo ele entrado em vigor em 2009-02-17, nos termos gerais, é de aplicar aos contratos de trabalho existentes nessa data, relativamente aos efeitos de factos ou situações coevos ou futuros, como a contrario sensu decorre do disposto no Art.º 7.º, n.º 1 da referida Lei. Ora, tendo a resolução do contrato ocorrido em 2011-10-10, data da receção da respetiva carta, pela R., encontrava-se em vigor o referido diploma.
Dispõe, adrede, o CT2009:
Artigo 394.º
Justa causa de resolução
1. Ocorrendo justa causa, pode o trabalhador fazer cessar imediatamente o contrato.
2. Constituem justa causa de resolução do contrato pelo trabalhador, nomeadamente, os seguintes comportamentos do empregador:
a) Falta culposa de pagamento pontual da retribuição;
(…)
5. Considera-se culposa a falta de pagamento pontual da retribuição que se prolongue por período de 60 dias...
Artigo 395.º
Procedimento para resolução do contrato pelo trabalhador
1. O trabalhador deve comunicar a resolução do contrato ao empregador, por escrito, com indicação sucinta dos factos que a justificam, nos 30 dias subsequentes ao conhecimento dos factos.
2. No caso a que se refere o n.º 5 do artigo anterior, o prazo para resolução conta-se a partir do termo do período de 60 dias ou da declaração do empregador.

Ora, para conseguir o efeito de resolver o contrato de trabalho, impõe-se que o trabalhador faça uma comunicação escrita ao empregador donde constem, de forma sucinta, os factos que fundamentam a resolução, como dispõem as normas acabadas de transcrever.
Tratando-se de falta de pagamento pontual da retribuição que se prolongue por período de 60 dias, nos termos do disposto no Art.º 394.º, n.º 5 do CT2009, acima transcrito, presume-se a culpa do empregador, sendo certo que se trata de presunção juris et de jure, isto é, que não admite prova do contrário, pelo que o trabalhador não tem, nesta matéria, ónus da prova a cumprir.
Mostram-se adrede provados os seguintes factos:
i) Depois de várias interpelações por parte desta, para o cumprimento, no dia 11 de outubro de 2011 exerceu as suas funções de caixeira ajudante pela última vez.
j) Tendo apresentado denúncia por justa causa pela falta de pagamento pontual das retribuições.
o) Relativamente à denúncia referida na alínea j), a A. juntou aos autos, a fls. 24 a 26, uma carta dirigida à R. em que lhe declarou que comunicava a resolução do seu contrato de trabalho, com fundamento na falta de pagamento pontual das retribuições, que descreveu, por um período de 60 dias sobre a data do seu vencimento, acompanhada de cópia do respetivo registo, ambos datados de 2011-10-07, bem como do aviso de receção, estando esta datada de 2011-10-10.
Perante esta factualidade, é patente a vontade extintiva do contrato de trabalho por iniciativa da A., cujo efeito se produziu inelutavelmente na esfera jurídica da R., desde o dia 2011-10-10, mesmo que se pudesse entender que não teria ocorrido justa causa. Na verdade, para o trabalhador, a denúncia do contrato de trabalho é livre, apenas tendo de observar o prazo de aviso prévio e, mesmo que não o observe, apenas fica sujeito ao pagamento da correspondente indemnização ao empregador e, havendo justa causa, pode fazer cessar imediatamente o contrato, tendo direito a receber uma indemnização do empregador, como tudo resulta do disposto nos Art.ºs 394.º, 396.º, 400.º e 401.º do CT2009. Por isso, recebida pela R. a declaração de vontade da A., pela forma legalmente prevista e nada se tendo provado em sede de revogação da denúncia, devemos considerar que o efeito extintivo do contrato se produziu, parecendo estar reunidos os pressupostos da resolução do contrato com justa causa.
Procedem, destarte, as duas primeiras conclusões do recurso.

A 3.ª questão.
Trata-se de saber se o contrato de trabalho dos autos terminou por revogação.
Vejamos.
Vêm adrede provados os seguintes factos:
k) Posteriormente, no dia 13 de outubro de 2011 e por iniciativa da entidade empregadora, a autora foi chamada e foi-lhe proposta a resolução extrajudicial da questão.
l) A autora como já se encontrava numa situação de fragilidade económica, decidiu assinar o acordo de pagamento proposto pela ré, cuja cópia foi junta a fls. 22 e 23, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
m) No entanto, este acordo só foi cumprido aquando da primeira prestação, não lhe tendo pago a Ré o valor da segunda prestação.
n) No acordo referido em k), l) e m), datado de 2011-10-13, foi acordado a R. pagar à A. a quantia de € 2.477,09, em duas prestações de € 1.238,55 cada, constando do ponto 3. o seguinte:
3. Com o recebimento deste montante 2.477,09€ a Segunda Outorgante declara expressamente nada mais ter a receber da Primeira Outorgante a título de salários, remunerações em espécie, horas extraordinárias, trabalho suplementar, férias, subsídio de férias, e de Natal, subsídios de alimentação, ou qualquer outra encontrando-se paga de todas as quantias que lhe eram devidas em virtude do referido contrato de trabalho que findou. – cfr. fls. 22 e 23.
Das conclusões III a VIII do recurso parece que a apelante entende que, celebrado o acordo, o contrato cessou, agora, por revogação mas, como não foi cumprido, face à falta de pagamento da 2.ª prestação, deverá revivescer a cessação por resolução, com as suas consequências.
Cremos, salvo o devido respeito, que a apelante incorre em equívoco.
Na verdade, uma coisa é a forma de cessação do contrato de trabalho outra, bem diferente, é se a A. podia acordar com a R. receber menos do que aquilo a que se julgava com direito.
Quanto à primeira, cremos que o contrato de trabalho só pode terminar por uma das formas, de maneira que in casu tendo terminado por resolução em 2011-10-10, não podia terminar por revogação no dia 13 seguinte. Exercido o direito potestativo, os seus efeitos produzem-se inelutavelmente na esfera jurídica da contraparte.
Quanto à segunda, trata-se apenas de saber, in casu, se os direitos da A. eram disponíveis, em termos de legalmente poder aceitar receber menos do que aquilo a que tinha direito.
Ora, terminado o contrato, deixando o trabalhador de estar subordinado, jurídica e economicamente, ao empregador, estando restituído à sua liberdade, os direitos emergentes do contrato, seja da sua execução, seja da sua cessação, são considerados disponíveis. É que nestes casos não existe um interesse público que importa fazer atuar, como se se tratasse de indemnização por acidente de trabalho, por exemplo[2].
Assim, o acordo celebrado entre as partes, datado de 2011-10-13, é, quanto a nós, válido, tanto mais que não se provou que, na sua celebração, tenham ocorrido quaisquer vícios da vontade.
Daí decorre que ele deve ser pontualmente cumprido, atento o disposto no Art.º 406.º do Cód. Civil, devendo ser paga a prestação em dívida, como refere a sentença, sem que se possa regredir aos direitos emergentes da resolução do contrato, pois a cessação deste, por esta forma, foi válida, mas válida também foi a redução acordada dos direitos da A. em relação à R.
Improcedem, destarte, as conclusões III a VIII da apelação.

A 4.ª questão.
Trata-se de saber se se verifica a inutilidade superveniente da lide, como a apelante refere na conclusão IX do recurso.
Vejamos.
Como se referiu na 1.ª questão, a inutilidade superveniente da presente lide em consequência da declaração de insolvência – ainda – não foi objeto de qualquer decisão neste processo, sendo uma questão nova, que aqui não cabe tratar, por extravasar o objeto do presente recurso como, no mesmo sentido, se pronunciou o Exm.º Sr. Procurador-Geral Adjunto, em seu douto parecer.
Ora, para que a Relação pudesse apreciar a questão, invocada no presente recurso de apelação, deveria a A. suscitá-la de forma a conduzir a que o Tribunal a quo sobre ela se tivesse pronunciado.
Porém, não o tendo feito, está este Tribunal da Relação impossibilitado de conhecer tal questão, pois os recursos destinam-se a proceder ao reexame de questões já apreciadas pelos tribunais - hierarquicamente - inferiores e não a conhecer de matérias novas, não submetidas à decisão do Tribunal a quo, salvo tratando-se de questões de conhecimento oficioso[3], o que não acontece in casu.
Improcede, assim, a conclusão IX da apelação.

A 5.ª questão.
Trata-se de saber se se verifica a ilegitimidade da R., como a apelante refere na conclusão X do recurso, que se transcreve de novo:
”X. Para além inutilidade superveniente da lide, assiste-se também a uma ilegitimidade passiva por parte da C..., S.A. posterior D..., S.A., visto que entra para essa posição a Massa Insolvente.”
Vejamos.
Estando a decisão desta questão dependente do sucesso da anterior, sendo ela mesma também uma matéria que não foi submetida à apreciação do Tribunal a quo e sendo, por isso, também uma questão nova, dela não se pode igualmente tomar conhecimento.
Improcede, assim, a conclusão X da apelação.

Decisão.
Termos em que se acorda em:
1) – Ordenar o desentranhamento dos autos e a entrega à apelante dos documentos de fls. 132 a 141, a qual vai condenada em multa, atento o disposto no Art.º 27.º, n.º 1 do Regulamento das Custas Processuais, cujo montante se fixa em 1 UC.
2) – Negar provimento à apelação, assim confirmando a sentença recorrida.
Custas pela A., sem prejuízo do que se encontrar decidido em sede de apoio judiciário.

Porto, 2013-12-09
Ferreira da Costa
Paula Leal de Carvalho
Maria José Costa Pinto
____________
[1] Cfr. Alberto dos Reis, in Código de Processo Civil Anotado, volume V, reimpressão, 1981, págs. 308 a 310 e os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 1986-07-25 e de 1986-10-14, in Boletim do Ministério da Justiça, respetivamente, n.º 359, págs. 522 a 531 e n.º 360, págs. 526 a 532.
[2] Cfr. Alberto Leite Ferreira, in Código de Processo do Trabalho Anotado, Coimbra Editora, 2.ª edição, 1972, págs. 250 a 254 e 1989, págs. 293 a 297, Albino Mendes Baptista, in Código de Processo do Trabalho Anotado, Quid Juris, 2000, págs. 146 a 148, José António Mesquita, in Princípios gerais do direito processual do trabalho, REVISTA DE DIREITO E DE ESTUDOS SOCIAIS, julho-dezembro – 2006, Ano XLVII (XX da 2.ª Série) N.ºs 3 e 4, Verbo, págs. 209 ss., nomeadamente, 215 a 217, Paulo Sousa Pinheiro, in A Condenação Extra Vel Ultra Petitum no Código de Processo do Trabalho, Revista de Ciências Empresariais e Jurídicas, Instituto Superior de Contabilidade e Administração do Porto, Instituto Politécnico do Porto, 2007, N.º 12, págs. 211 ss., nomeadamente, págs. 226 a 228 e o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 1999-02-10, in Coletânea de Jurisprudência, Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, Ano VII-1999, Tomo I, págs. 278 a 280.
[3] Cfr. João de Castro Mendes, in Direito Processual Civil, Recursos, edição AAFDL 1980, págs. 27 a 34, Fernando Amâncio Ferreira, in Manual dos Recursos em Processo Civil, 4.ª edição, 2003, págs. 136 a 140 e 8.ª edição, 2008, págs. 145 a 149, António Santos Abrantes Geraldes, in Recursos em Processo Civil, Novo Regime, 2007, págs. 90 e 91 e os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 1998-11-25 e de 1999-10-26, in Boletim do Ministério da Justiça, n.ºs e págs., respetivamente, 481/430-436 e 490/250-255.