Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
689/14.3TTVNG.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: ANTÓNIO JOSÉ RAMOS
Descritores: TRABALHADOR ESTUDANTE
FALTAS PARA PRESTAÇÃO DE PROVAS DE AVALIAÇÃO
VIAGEM
FALTA INJUSTIFICADA
JUSTA CAUSA DE DESPEDIMENTO
Nº do Documento: RP20150921689/14.3TTVNG.P1
Data do Acordão: 09/21/2015
Votação: UNANIMIDADE COM 1 DEC VOT
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: NEGADO PROVIMENTO
Indicações Eventuais: 4ª SECÇÃO (SOCIAL)
Área Temática: .
Sumário: I – Usufruindo a trabalhadora do estatuto de estudante e tendo a mesma provas consecutivamente nos dia 6 a 10 de Janeiro de 2014, tinha, nos termos da alínea b) do nº 1 do artigo 91.º do CT, direito a faltar justificadamente, nos 5 dias imediatamente anteriores, ou seja, no dia 1 a 5 (aqui se incluindo o sábado e o domingo por força da alínea d) do mesmo normativo legal).
II - Se assim é, poderemos afirmar que o dia 2 de Janeiro estava abrangido naquele período de tempo que a lei concede ao trabalhador-estudante para faltar justificadamente nos casos em que tem provas.
III - Contudo, deveremos ter em atenção que a finalidade da lei é permitir ao estudante descanso e tempo para se preparar para a prova e, assim, retirar aproveitamento escolar. Tais períodos não foram concedidos para o trabalhador-estudante andar a passear ou praticar outras atividades que não relacionadas com a sua condição de estudante.
IV - No caso, a trabalhadora não aproveitou o dia 2 para estudar ou descansar, mas, sim, para fazer uma viagem ao estrangeiro, que há muito tinha previsto e programado, independentemente de este dia ter coincidido, numa fase posterior, com a realização de provas.
V – Tal falta não pode ser justificada com o recurso ao estatuto de trabalhador-estudante.
VI – Tendo-se provado que em razão da ausência da trabalhadora, a Ré não sofreu qualquer prejuízo sério, nomeadamente, causando sérias dificuldades na organização do serviço com a necessidade de contratar novos colaboradores ou causando atrasos no atendimento dos doentes, designadamente, pela falta de assistentes, inexistindo qualquer prova de um passado com infrações disciplinares, a sanção de despedimento é excessiva, desmesurada e desproporcionada.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: ACÓRDÃO

PROCESSO Nº 689/14.3TTVNG.P1
RG 486

RELATOR: ANTÓNIO JOSÉ ASCENSÃO RAMOS
1º ADJUNTO: DES. JORGE LOUREIRO
2º ADJUNTO: DES. JERÓNIMO FREITAS

PARTES:
RECORRENTE: B…
RECORRIDA: C…

VALOR DA ACÇÃO: 20 637,86 €
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I – RELATÓRIO
1. B…, residente na …, .., …, Vila Nova de Gaia, intentou, ao abrigo do artigo 98º-C, do Código de Processo do Trabalho, em conjugação com o artigo 387º do Código do Trabalho, a presente acção especial de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento, contra B…, com sede na …, .., Lisboa, opondo-se ao seu despedimento.
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2. Foi realizada a audiência de partes, tendo-se frustrado a tentativa de conciliação.
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3. A Ré[1] apresentou o articulado a que alude o artigo 98-J do CPT, alegando que o despedimento da Autora é lícito, uma vez que foi despedida com justa causa, sustentando que a Autora, sem qualquer justificação ou comunicação antecipada, faltou ao serviço no dia 02.01.2014, contra as ordens e instruções da Ré que lhe havia indeferido o pedido de concessão de gozo de férias nessa data. Mais refere que apenas pelas 19 h desse dia informou a chefia que não comparecia ao serviço nem nos seis dias úteis seguintes, invocando que tal ausência se deveria à necessidade de realização de avaliações escolares.
A conduta da arguida resultou na prática grave de infração disciplinar, uma vez que se traduziu na violação da alínea a) Observar e fazer observar as instruções e orientações hierárquicas em tudo o que respeita ao planeamento, organização, execução e disciplina do trabalho, salvo na medida em que as ordens e instruções sejam contrárias aos seus direitos; b) Respeitar com civismo, urbanidade e correção no trato todos aqueles com quem profissionalmente tenha que contactar, nomeadamente colegas de trabalho, responsáveis da entidade empregadora, clientes e público em geral; d) informar os serviços competentes da entidade empregadora sobre qualquer especto relevante para a prestação da atividade laboral nomeadamente aqueles relacionados com a frequência de cursos; j) comparecer ao serviço com assiduidade e cumprir o horário de trabalho procedendo ao registo de tempos de trabalho nos termos que a entidade empregadora determinar e p) guardar lealdade à entidade empregador (…) todos da cláusula 7.ª do ACT e, concomitantemente, do disposto nas als. a), b), e) e f) do n.º 1 do art. 128.º do Código do Trabalho.
O comportamento da trabalhadora abalou de forma irreparável e definitiva o princípio da confiança recíproca que sustenta e norteia toda a relação jurídico-laboral, razão pela qual o despedimento com justa causa da Autora se afigure como a única sanção proporcionada à gravidade dos factos.
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4. A Autora respondeu ao articulado da Ré, nos termos do artigo 98º-L, nº 3 do CPT, invocando a caducidade do direito de aplicar sanção disciplinar e impugnando a factualidade que lhe é imputada na nota de culpa, alegando que em dezembro de 2013, a Ré resolveu alterar unilateralmente o horário da A. sem contato prévio da mesma.
Admite que o pedido de antecipação de férias da A. não lhe foi concedido mas que, nessa data, a trabalhadora não se encontrava ao serviço, pois estava em período de exames. Alega ainda que quando marcou as suas férias em março, referiu, nessa altura, à superiora hierárquica a necessidade do dia 2.01. para se deslocar à suíça a visita a familiares, tendo tido o consentimento daquela para o efeito e assim adquirindo a respetiva viagem, não tendo marcado no portal porquanto o programa informático não o permitia, apenas oficializando o respetivo pedido por mail em 11.12.2013. Mais refere que as faltas para os exames eram comunicadas verbalmente e que a respetiva escala de serviço já estava feita a contar com a sua falta.
Deduziu ainda reconvenção declarando pretender ser reintegrada, pedindo a condenação da Ré no pagamento das retribuições que deixou de auferir desde o seu despedimento até ao trânsito em julgado da decisão; da quantia de € 556,20 correspondente ao serviço D… que a trabalhadora tinha direito e que deixou de poder usufruir, acrescido do valor mensal de € 92,70 até ao trânsito em julgado da sentença; a quantia de € 900,00 corresponde ao valor do apoio escolar para os filhos menores que a A. deixou de auferir desde a data do despedimento até hoje, acrescido do montante de € 150 por mês até ao trânsito em julgado; a quantia de € 60 relativa a prendas de natal para os dois filhos que a requerente não recebeu; a quantia de € 1585 correspondente ao valor das colónias de férias de verão e natal que a A. teve que cancelar por força do despedimento; o valor de € 2700 correspondente ao prejuízo económico de junho a dezembro de 2014 derivado da perda do plano de saúde que beneficiava e ainda de igual montante de € 450 até ao trânsito em julgado da decisão.
Pede ainda a condenação da Ré na quantia de € 5000 por danos morais sofridos por força do despedimento e a quantia de € 360,26 correspondente aos valores que a Ré ilicitamente descontou no salário do mês de dezembro e janeiro.
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5. Respondeu a Ré pugnando pela improcedência do pedido reconvencional.
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6. Foi proferido despacho saneador, julgando-se improcedente a exceção de caducidade invocada.
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7. Foi realizada a audiência de julgamento.
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8. Foi proferida sentença, cuja parte decisória tem o seguinte conteúdo:
Pelo exposto:
“I. decide-se julgar totalmente procedente a presente acção que o A./Trabalhadora C… intentou contra a R./Empregadora B… e parcialmente procedente a reconvenção e, em consequência:
a) julgar ilícito o despedimento promovido pela Ré;
b) condenar a Ré a reintegrar a A. no seu posto de trabalho, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade;
c) condenar a Ré a pagar à A. as retribuições que a mesma deixou de auferir desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da decisão (à razão mensal de € 498,76), deduzido, no entanto e por força da lei, o subsídio de desemprego de que, porventura, haja beneficiado durante aquele período e que a Ré deve entregar à Segurança Social.
d) Condenar a Ré a pagar à A. a quantia de € 360,26 a título de créditos salariais absolvendo no mais peticionado.
Custas pela A e da Ré em partes iguais sem prejuízo do apoio judiciário concedido à A.
Fixa-se à causa o valor de € 20.637,86 – art.98º-P do CPT.
Registe e notifique.”
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9. Inconformada com a decisão dela recorre a Ré, assim concluindo:
A. A ora Recorrente discorda com o teor da douta sentença recorrida quanto à interpretação e enquadramento jurídico efetuado pela Douta Juiz do Tribunal de 1ª Instância;
B. Certo é que, da factualidade assente, ficou devidamente demonstrado que a Autora, após ter visto expressamente recusado pela sua entidade patronal o gozo de férias no dia 02/01, de forma consciente e premeditada, realizando o seu desígnio de não comparecer ao trabalho no dia em causa, faltou, tendo posteriormente apresentado justificação falsa para tal ausência;
C. Com o seu comportamento a Autora visou desafiar e desrespeitar uma ordem legítima da sua entidade patronal, colocando em causa os deveres de obediência às orientações legítimas da sua entidade patronal e de lealdade para com esta, a que se encontra adstrita;
D. A Autora, agindo da forma descrita, e mentindo de forma absolutamente consciente, apresentando motivo falso para a sua ausência, colocou em causa de forma irremediável o dever de lealdade para com a sua entidade patronal;
E. Como resulta do entendimento da própria Exma. Juiz a Quo, a conduta da Autora constitui violação dolosa, e de grave intensidade, do seu dever de lealdade para com a sua entidade patronal;
F. A conduta da Autora encerra elevada e reiterada intencionalidade dolosa, que afetou, necessariamente, a boa-fé e a confiança que sustenta a relação de trabalho;
G. Na verdade, não é exigível à Ré, nem a qualquer outra entidade patronal que mantenha ao seu serviço um trabalhador que deliberada e propositadamente se ausenta do serviço para gozar período de férias que lhe havia sido expressamente recusado, e que para justificar tal atuação apresenta falsas declarações à sua entidade patronal;
H. E nem se contraponha com a circunstância de que o prejuízo patrimonial causado à Ré não se revelar de monta;
I. Dado que, como é comummente aceite, o dever de lealdade constitui valor absoluto, sendo por isso, insuscetível de gradação;
J. Conclui-se assim, atenta a específica natureza do vínculo laboral, caracterizado pela sua vocação duradoura e pessoal das relações deles emergentes, que o comportamento da Autora se configura como suscetível de destruir ou abalar seriamente a confiança, tendo criado no espírito da Ré dúvidas e reservas sobre a idoneidade futura da sua conduta, na medida em que quebra a "fides" ou a base de confiança do contrato, valor absoluto e não quantificável do mesmo, preenchendo, por isso, os pressupostos para a resolução do contrato com justa causa, descritos no artigo 351º do Código do Trabalho;
K. Sendo inegável que a sanção aplicada – despedimento - é adequada e justa, à gravidade e consequências da conduta praticada, razão pela qual é lícita e inexpugnável a rescisão com justa causa do contrato de trabalho da Autora;
L. Forçoso se torna, por isso, concluir, de tudo quanto ficou exposto, que a Sentença em crise fez incorreta e desconforme, interpretação e aplicação do Art.º 351º do Código do Trabalho, impondo-se deste modo que seja revogada e substituída por outra, que dando provimento ao presente recurso, julgue a ação improcedente, por ser manifesta a existência de justa causa de despedimento e absolva a Ré de todos os pedidos.
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10. A Autora contra-alegou, pugnando pela improcedência do recurso, assim concluindo:
A) A douta sentença, ora recorrida, julgou totalmente procedente a ação intentada pela trabalhadora e julgou ilícito o despedimento promovido pela entidade patronal, condenando-a a reintegrar a Autora no seu posto de trabalho.
B) Não se conformou a entidade patronal com tal decisão e interpôs o presente recurso, discordando da subsunção do direito aplicável aos factos que resultaram provados.
C) Quanto à infração que foi imputada à trabalhadora resultou provado que:
D) No dia 11-12-2013, a A. enviou um e-mail à sua superiora hierárquica referindo que necessitava do dia 2 de janeiro por motivo de viagem ao estrangeiro a visita a familiares.
E) No mesmo dia a Drª E… informou a funcionária dos Recurso Humanos, F… do pedido da trabalhadora.
F) No dia 13.12.2013 foi transmitido à Autora que o gozo de um dia de férias no dia 02.01.2014 que havia solicitado, não tinha sido concedido.
G) Em 16.12.2013 a Autora remeteu um pedido de reapreciação da situação via email nos seguintes termos: “Por motivo de viagem ao estrangeiro, Suíça, de visita a familiares, pedi um dia de férias (2 de janeiro 2014), foi-me comunicado por mail da Drª E… que o Dr. G… não autorizava a antecipação das férias, esclareço que o pedido não é no sentido de antecipação mas o gozo de férias relativas a 2014.
Aquando na marcação no plano de férias (março 2013) nessa altura, quis guardar dois dias de férias de 2013 para janeiro de 2014, pois já sabia que iria precisar. O que me foi dito é que temos que marcar todos os dias de férias de 2013 até 31 de dezembro e que os outros dias que necessitasse teria que marcar como dias de férias do ano de 2014, mas só no final do ano poderia fazer o pedido para poder marcar esses dias, visto o portal não autorizar essa situação. Confiei e marquei a viagem. Falei várias vezes nessa situação e desde o início me foi dito que em questões de serviço não havia problema com o funcionamento normal visto que à data ninguém ter pedido esse dia de férias.
Em anexo envio comprovativo da marcação da viagem com data posteriori às marcações do plano de férias.
Visto ser uma situação de caracter excecional (gozar férias com familiares residentes no estrangeiro) gostaria que reconsiderasse a sua decisão.”.
H) No dia 17 de dezembro de 2013, a A. recebeu um mail dos recursos humanos a informá-la da alteração do horário de trabalho com data de efeitos a 01.01.2014 - de 2ª a 6ª feira das 09h.30h às 13.30h e que o pedido de autorização de férias para o dia 2.01.2014 foi indeferido também por motivos de necessidade de serviço.
I) A A. não mais questionou a entidade patronal sobre este assunto.
J) A A criou a convicção na sua entidade patronal que estaria ao serviço no dia em causa.
K) A Autora não se apresentou ao trabalho no dia 02.01.2014 na hora designada para o início da prestação da sua atividade.
L) Pelas 19h desse dia, a Autora dirigiu uma comunicação à sua chefia informando que apenas poderia comparecer ao serviço no dia 13 de janeiro por motivos de avaliações escolares.
M) A A. havia adquirido a viagem para visitar os seus familiares no estrangeiro em abril do ano anterior, tendo o respetivo regresso sido agendado para o dia 06 de janeiro de 2014.
N) Perante estes factos o Tribunal a quo entendeu que apesar da Autora ter praticado uma infração, a mesma não era suficiente para integrar o conceito de justa causa.
O) De facto, o quadro circunstancial em que os factos ocorreram demonstra que a falta ao serviço no dia em causa não foi grave nem culposa.
P) Como consta dos factos provados, a Autora adquiriu a viagem para se deslocar à Suíça em abril de 2013.Nesta data ainda não sabia qual a época de exames e por isso solicitou o dia 2 de janeiro de 2014 para férias. Por e-mail no dia 13-12-2013, a entidade patronal informou que o pedido de antecipação férias para o dia 2 de janeiro de 2014 formulado pela Autora não foi concedido. A Autora voltou a pedir reapreciação do pedido expondo os motivos, o que fez no dia 16-12-2013.
Q) A trabalhadora nunca teve intenção de não acatar ordens, mas já tinha pedido autorização verbal para a viagem e já tinha o bilhete e por isso já que a entidade patronal não concedeu o gozo de férias, esta sabendo que tinha direito a esse dia também por estar em exames, usou essa prerrogativa.
R) A única questão que é colocada no presente recurso é saber se a falta em causa integra o conceito de justa causa previsto no artigo 351º do Código do Trabalho que: Constitui justa causa de despedimento o comportamento culposo do trabalhador que, pela sua gravidade e consequências, torne imediata e praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho.
S) Dispõe, por sua vez, o artº 330º n.º 1 do mesmo Código que: «A sanção disciplinar deve ser proporcional à gravidade da infração e à culpabilidade do infrator, não podendo aplicar-se mais de uma sanção pela mesma infração.»
T) A licitude de um despedimento do trabalhador com justa causa pressupõe um comportamento ilícito e culposo que, pela sua gravidade, torne imediata e praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho.
U) Apreciação a levar a cabo, como se deixa entendido, à luz do princípio da proporcionalidade.
V) In casu, partindo do quadro fáctico já referido supra parece evidente que a conduta da trabalhadora não põe em causa a subsistência imediata e praticamente impossível da relação de trabalho à luz do princípio da proporcionalidade.
W) De facto, o grau de culpa da Autora face aos factos provados é diminuta, pois esta sabia que não estava escalada para o dia que faltou ao serviço e se não estivesse de férias sempre estaria em exames.
X) Não causou prejuízo à entidade patronal, pois não ficou provado que o número de funcionários fosse reduzido.
Y) Aliás consta da douta sentença que mostra-se claro pela posição da Autora que a mesma não se apresentou ao serviço no dia 02.01.2011 mantendo esta a convicção que a sua ausência está justificada!
Z) A tudo acresce que a Autora, à data dos factos, trabalhava na Ré há 18 anos, sem registo disciplinar.
AA) A opção pela sanção mais gravosa é sem dúvida desproporcional à gravidade da infração.
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11. O Ex.º Sr.º Procurador-Geral Adjunto deu o seu parecer no sentido da revogação da sentença recorrida, bem como da anulação da decisão de facto e termos subsequentes daquela dependente, em ordem à ampliação da materialidade a ajuizar.
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12. Respondeu ao aludido parecer a recorrida insurgindo-se contra a solução nele defendida.
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13. Dado cumprimento ao disposto na primeira parte do nº 2 do artigo 657º do Código de Processo Civil foi o processo submetido à conferência para julgamento.
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II - QUESTÕES A DECIDIR
Tendo em conta que o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações da recorrente - artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, ex vi do artigo 87.º, n.º 1, do Código de Processo do Trabalho -, ressalvadas as questões do conhecimento oficioso que ainda não tenham sido conhecidas com trânsito em julgado, a questão a decidir consiste em saber se a factualidade apurada é suficiente para amparar a licitude do despedimento da trabalhadora.
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III – FUNDAMENTOS
1. A SENTENÇA RECORRIDA CONSIDEROU PROVADOS OS SEGUINTES FACTOS:
1. A Autora presta serviço na B… desde 1996, encontrando-se à data do despedimento afeta ao B1…, onde exercia funções (artigo 1º do articulado do empregador)
2. Em 2009, a Autora requereu o estatuto de trabalhador estudante, que lhe foi concedido, tendo optado pela atribuição do seguinte horário de 20 horas semanais, a saber: 4h à 2.ª, 3.ª e 4.ª e 8h à 5.ª (artigo 2º do articulado do empregador)
3. Que se manteve até meados de Dezembro, quando foi comunicado à Autora que o seu horário de trabalho seria alterado, a partir de 01.01.2014, ficando obrigada à prestação de 4 horas de trabalho por dia, de 2ª a 6ª Feira (artigo 3º do articulado do empregador)
4. No dia 11-12-2013, a A. enviou um e-mail à sua superiora hierárquica referindo que necessitava do dia 2 de janeiro por motivo de viagem ao estrangeiro a visita a familiares (artigo 17º da contestação)
5. No mesmo dia a Dr.ª E… informou a funcionária dos Recursos Humanos, F… do pedido da trabalhadora (artigo 18º da contestação)
6. No dia 13.12.2013 foi transmitido à Autora que o gozo de um dia de férias no dia 02.01.2014 que havia solicitado, não tinha sido concedido (artigo 4º do articulado do empregador)
7. Em 16.12.2013 a Autora remeteu um pedido de reapreciação da situação via email nos seguintes termos:
“Por motivo de viagem ao estrangeiro, Suíça, de visita a familiares, pedi um dia de férias (2 de janeiro 2014), foi-me comunicado por mail da Dr.ª E… que o Dr. G… não autorizava a antecipação das férias, esclareço que o pedido não é no sentido de antecipação mas o gozo de férias relativas a 2014.
Aquando na marcação no plano de férias (março 2013) nessa altura, quis guardar dois dias de férias de 2013 para janeiro de 2014, pois já sabia que iria precisar.
O que me foi dito é que temos que marcar todos os dias de férias de 2013 até 31 de dezembro e que os outros dias que necessitasse teria que marcar como dias de férias do ano de 2014, mas só no final do ano poderia fazer o pedido para poder marcar esses dias, visto o portal não autorizar essa situação. Confiei e marquei a viagem.
Falei várias vezes nessa situação e desde o início me foi dito que em questões de serviço não havia problema com o funcionamento normal visto que à data ninguém ter pedido esse dia de férias.
Em anexo envio comprovativo da marcação da viagem com data posteriori às marcações do plano de férias.
Visto ser uma situação de caracter excecional (gozar férias com familiares residentes no estrangeiro) gostaria que reconsiderasse a sua decisão.”
8. No dia 17 de dezembro de 2013, a A. recebeu um mail dos recursos humanos a informá-la da alteração do horário de trabalho com data de efeitos a 01.01.2014 – de 2ª a 6ª feira das 09h.30h às 13.30h e que o pedido de autorização de férias para o dia 2.01.2014 foi indeferido também por motivos de necessidade de serviço (artigo 6º do articulado do empregador).
9. A A. não mais questionou a entidade patronal sobre este assunto (artigo 6º do articulado do empregador).
10. A A criou a convicção na sua entidade patronal que estaria ao serviço no dia em causa (artigo 7º do articulado do empregador)
11. A não se apresentou ao trabalho no dia 02.01.2014 na hora designada para o início da prestação da sua atividade (artigo 9º do articulado do empregador)
12. Pelas 19h desse dia, a Autora dirigiu uma comunicação à sua chefia informando que apenas poderia comparecer ao serviço no dia 13 de janeiro por motivos de avaliações escolares (artigos 10º e 11º do articulado do empregador)
13. A A. havia adquirido a viagem para visitar os seus familiares no estrangeiro em abril do ano anterior, tendo o respetivo regresso sido agendado para o dia 06 de janeiro de 2014 (artigo 16º da contestação)
14. A A. foi suspensa no dia 09 de janeiro (artigo 61º da contestação)
15. A Ré descontou no salário da A. do mês de dezembro de 2013 a quantia de € 222,14 e no de janeiro, o valor de € 360,26 (artigo 68º da contestação)
16. Tais faltas foram justificadas pela trabalhadora por ter estado presente em exames, tendo enviado os respetivos comprovativos à entidade patronal emitidos pela universidade (artigo 69º da contestação)
17. À data do despedimento, a A. auferia a retribuição base de € 411.88 acrescido do montante de € 86,88 de diuturnidades.
2. A SENTENÇA RECORRIDA CONSIDEROU NÃO PROVADOS OS SEGUINTES FACTOS:
a) Que no período em causa o número de recursos humanos na área de … era reduzido e que a A. disso tivesse conhecimento (artigo 8º do articulado do empregador)
b) No dia 2.01.2014, a trabalhadora não estava ao serviço, pois encontrava-se em período de exames (artigo 10º da contestação)
c) a marcação de férias na entidade patronal, B… era feita da seguinte forma: Em primeiro lugar, os funcionários tinham que se coordenar entre si para que o serviço ficasse assegurado, o que era articulado pela responsável das escalas de serviço. Depois de se chegar a um consenso, a responsável pelas escalas entregava o mapa à chefia do Porto, a saber Drª E…, que aprovava o mapa e envia depois disso os funcionários poderiam marcar as férias no portal da entidade patronal (artigo 12º da contestação)
d) Aquando da marcação das férias em março, a trabalhadora tenha referido à Dr.ª E…, sua superiora hierárquica, que necessitava do dia 2 de janeiro de 2014, para se deslocar à Suíça em visita a familiares, o que fazia de dois em dois anos na altura do Natal e regressava a seguir ao Ano Novo (artigo 13º da contestação)
e) A Dr.ª E… referiu-lhe que marcasse os dias do ano corrente no portal, pois o programa informático não permitia marcar férias para o ano seguinte, mas depois podia mais tarde fazer-se a alteração (artigo 14º da contestação)
f) Só depois do consentimento da sua superiora é que a Autora fez a marcação da viagem (artigo 15º da contestação)
g) A A. tinha direito a faltar ao serviço no dia 2. também por estar em exames, tendo usado dessa prorrogativa e a entidade patronal disso tinha conhecimento (artigo 26º da contestação).
h) a Requerente como funcionária da requerida tinha direito ao serviço D… que por mês tem um custo de 92,70 euros (artigo 52º da contestação) desde Junho até ao presente teve um prejuízo de € 556,20 (artigo 53º da contestação)
i) a Requerente beneficiava também de apoio escolar para os filhos menores estudantes no montante anual de 1.800,00 euros, correspondente a um montante mensal de 150,00 euros (artigo 54º da contestação)
j) a requerente tinha ainda direito a prendas de natal para os dois filhos, que esta ano não receberam no montante de 60,00 euros, 30 euros para cada um deles (artigo 55º da contestação)
k) os filhos da Requerente tinham ainda direito a colónia de férias proporcionadas pela entidade patronal e quando a requerente foi despedida já tinha sido aprovadas as férias e que teve que cancelar:
Férias de verão internas 450,00€ x 2= 900,00€ Férias de verão externas 105,00€ x 2 = 210,00€.
Férias de verão externas 110,00€.
Férias de verão externas 125,00€ (artigo 56º da contestação)
l) tinham ainda direito a participar em colónia de férias pelo Natal e que este ano não participaram e que as mesmas têm um custo de 240,00 euros (artigo 57º da contestação)
m) que a falta do plano de saúde para si e para o seu agregado familiar desde junho traduziu-se num prejuízo de € 2.700,00 de junho até dezembro de 2014 (artigo 59º da contestação)
n) o despedimento tenha motivado na requerente um grande sentimento de revolta e injustiça (artigo 60º da contestação)
o) a apresentação da requerente ao trabalho passados 30 dias e o impedimento de trabalhar pelos colegas causou-lhe de vergonha e perturbação psicológica (artigo 61º da contestação)
p) Durante o período em que decorreu o processo disciplinar a requerente viveu sobre ansiedade e stress (artigo 65º da contestação)
q) O cancelamento das férias aos seus filhos depois de terem sido confirmadas causou transtorno a toda a família (artigo 66º da contestação).
3. Porque se encontram provados, quer por confissão, quer por documentos, e se mostram relevantes para a decisão, aditam-se os seguintes factos[2]:
- A Autora no dia 2 de Janeiro de 2014 deslocou-se à Suíça em visita a familiares (facto admitido pela autora).
- Nos dias 6, 7, 8, 9 e 10 de Janeiro de 2014, a Autora esteve presente na Universidade Fernando Pessoa a realizar frequências (facto comprovado pelos documentos de fls 99 a 101).
4. DO OBJECTO DO RECURSO
Analisemos então as questões que nos foram trazidas pela recorrente, ou seja, saber se o despedimento da Autora é lícito.

4.1. Defende a recorrente que o despedimento da trabalhadora foi lícito, uma vez que, no seu entender, no presente caso resultou plenamente comprovado, que o comportamento culposo da trabalhadora constitui justa causa de despedimento quando se conclua que determina a impossibilidade prática da subsistência do vínculo laboral, sendo requisito de tal justa causa que se conclua que nenhuma outra sanção se apresenta como suscetível de permitir a restauração do vínculo de confiança entre as partes. Isto porque, continua, sabia a trabalhadora que não tinha autorização da sua entidade patronal para a sua ausência no dia em questão, uma vez que fora recusado expressamente por duas vezes o pedido de dia de férias realizado por esta, bem sabendo igualmente a Autora que a empresa contava consigo para desempenhar as suas funções no dia 02/01.
No entanto, de forma premeditada e plenamente intencional, a Autora, mantendo silêncio sobre a atuação que já havia cogitado levar a cabo, concretizou a sua ausência, apenas apresentando justificação no fim do dia.
Justificação esta que, como devidamente provado em juízo, correspondia a uma mentira, porquanto os motivos invocados nada tinham de relação com os verdadeiros motivos para a ausência em questão.
Vejamos:
4.2. A sentença recorrida quanto a esta questão exarou o seguinte:
“(…) perante a matéria de facto provada constante dos pontos 4 a 13 e que aqui se dá por inteiramente reproduzida, não há dúvida que a Autora faltou no dia 02.01 ao trabalho, não obstante lhe ter sido negado por duas vezes no mês antecedente pela entidade patronal a possibilidade de nesse dia gozar férias. Saliente-se o facto de não nos merecer dúvidas que a trabalhadora sempre teve a intenção, mesmo antes de solicitar o gozo de férias no dia 02.01, de não comparecer ao serviço nesse dia, independentemente da posição que pudesse ser adotada pela entidade empregadora. Tal resulta designadamente do facto de já em abril ter adquirido a passagem área para a Suíça com data de regresso em 06.01. Acresce ainda o facto de, não obstante a sua intenção, não o demonstrou antecipadamente à sua entidade patronal, remetendo-se ao silêncio após ter-lhe sido negado o seu pedido, ao que acresce a circunstância de ter justificado a falta posteriormente com o fundamento em motivos de avaliações escolares, quando, nessa data, se encontrava fora do país em visita a familiares.
Não olvidamos o facto da trabalhadora ser estudante e portanto ter direito a faltar justificadamente ao serviço por motivo de prestação de provas de avaliação nos períodos definidos no artigo 91º do CT. E, independentemente da respetiva falta, nesse dia, poder estar a coberto de tal regime e, nessa medida, poder ser considerada justificada - já que muito embora não seja alegado expressamente nos autos, do documento juntos a fls. 99 resulta que a A. teria tido frequências nos dias 06.01 e 07.01, o que lhe teria permitido faltar justificadamente nos dois dias imediatamente anteriores [al. b) e c) do nº 1 do citado normativo], ou seja, nos dias 02.01 e 03.01, já que 04.01 e 05.01 (fim-de-semana) e, portanto de descanso semanal – cfr. ponto 3 – o certo é que o comportamento da A. constitui uma violação do dever de lealdade, obediência e respeito para com a entidade empregadora e que se mostram previstos, nomeadamente, nas alíneas a), e), f) do nº 1 e nº 2 do artigo 128º do CT, tendo a mesma ainda prestado falsas declarações no que respeita à justificação da falta na medida em que pretendeu o gozo do dia em questão para poder visitar familiares no estrangeiro, motivando, posteriormente, a sua falta por motivos escolares.
Parece-nos não nos merecer qualquer dúvida que a atuação da trabalhadora é dolosa, sendo a sua culpa grave, na medida em que sempre teve a intenção de agir em conformidade com a sua vontade, faltando ao trabalho, independentemente da posição da entidade patronal, demonstrando um total desrespeito e indiferença pela mesma, sendo as respetivas violações das suas obrigações suscetíveis de enquadrar, em abstrato, uma justa causa do despedimento.
E dizemos “em abstrato”, porque a noção de justa causa de despedimento não se basta com um comportamento culposo, ainda que a culpa se considere grave.
Para além disso, importa atender-se às consequências do comportamento da trabalhadora e as repercussões destas na relação de trabalho estabelecida. A gravidade da culpa e as consequências da mesma deverão tornar imediata e praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho.
A “impossibilidade de subsistência da relação laboral” a que alude a lei (nº 1 do art. 351º do C.T.) há-se aferir-se em função da repercussão do comportamento do trabalhador no futuro da relação (vd. Ac. do S.T.J. de 22.05.05, in C.J., t. I, pág. 281, onde se defende, para este efeito, “um juízo de prognose sobre a viabilidade da relação laboral, a realizar segundo um padrão essencialmente psicológico – o das condições mínimas de suporte de uma vinculação duradoura que implica frequentes e intensos contacto entre os sujeitos”). A mesma deve reconduzir-se à ideia de inexigibilidade da manutenção do contrato por parte do empregador, tem que ser uma impossibilidade prática, no sentido de que deve relacionar-se com o caso em concreto, e deve ser imediata, no sentido de comprometer, desde logo, o futuro do vínculo. Verifica-se a impossibilidade prática e imediata de subsistência da relação laboral quando ocorra uma situação de absoluta quebra de confiança entre o empregador e o trabalhador, suscetível de criar no espírito da primeira a dúvida sobre a idoneidade futura da conduta do último, deixando de existir o suporte psicológico mínimo para o desenvolvimento dessa relação laboral. Como assinala a propósito Monteiro Fernandes (Direito do Trabalho, 13.ª Edição, Almedina, pág. 55), «[n]ão se trata, evidentemente, de uma impossibilidade material, mas de uma inexigibilidade, determinada mediante um balanço in concreto dos interesses em presença – fundamentalmente o da urgência da desvinculação e o da conservação do vínculo(...). Basicamente, preenche-se a justa causa com situações que, em concreto (isto é, perante a realidade das relações de trabalho em que incidam e as circunstâncias específicas que rodeiem tais situações), tornem inexigível ao contraente interessado na desvinculação o respeito pelas garantias de estabilidade do vínculo (termo aposto ao contrato, sanções disciplinares conservatórias)”. No dizer do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 06-02-2008 (disponível em www.dgsi.pt, sob doc. 07S3906), «[a] aferição da não exigibilidade para o empregador da manutenção da relação de trabalho, deve, aquando da colocação do problema em termos contenciosos, ser perspetivada pelo tribunal com recurso a diversos tópicos e com o devido balanceamento entre os interesse na manutenção do trabalho, que decorre até do postulado constitucional ínsito no art. 53.º do Diploma Básico, e da entidade empregadora, o grau de lesão de interesses do empregador (que não deverão ser só de carácter patrimonial) no quadro da gestão da empresa (o que inculca também um apuramento, se possível, da prática disciplinar do empregador, em termos de se aquilatar também da proporcionalidade da medida sancionatória imposta, principalmente num prisma de um tanto quanto possível tratamento sancionatório igualitário), o carácter das relações entre esta e o trabalhador e as circunstâncias concretas – quer depoentes a favor do infrator, quer as depoentes em seu desfavor – que rodearam o comportamento infraccional». Importa ter presente, volta-se a acentuar, que se deverá proceder a uma apreciação em concreto da situação de facto, selecionando os factos e circunstâncias a atender e valorando-os de acordo com critérios de muito diferente natureza – éticos, organizacionais, técnico-económicos, gestionários, de ordem sociocultural e até afetiva -, designadamente atendendo, no quadro da gestão da empresa, ao grau de lesão dos interesses do empregador, ao carácter das relações entre as partes ou entre o trabalhador e seus companheiros e às demais circunstâncias que no caso se mostre relevantes, e aferindo a culpa e a gravidade do comportamento do trabalhador e o juízo de prognose sobre a impossibilidade de subsistência da relação laboral em consonância com o entendimento de “um bom pai de família” ou de um empregador normal ou médio, em face do caso concreto, segundo critérios de objetividade e de razoabilidade (cfr. n.º 3 do artigo 351.º).
Conforme já dissemos, a trabalhadora desobedeceu a uma ordem, faltando no dia em causa e mentindo, apresentando um justificação diversa do verdadeiro motivo que originou a respetiva falta, assumindo assim um comportamento culposo, sendo a sua culpa grave, na forma de dolo direto e premeditado.
Porém, não obstante entendermos que tal comportamento deveria ser passível de uma sanção (não se bastando com uma mera repreensão dada a gravidade do comportamento adotado), não cremos que justificasse o seu despedimento.
Desde logo, não decorre da matéria de facto (nem consta da decisão disciplinar) que em razão da ausência da trabalhadora, a Ré tenha sofrido qualquer prejuízo sério, nomeadamente, causando sérias dificuldades na organização do serviço (muito embora tal tenha sido aventado na audiência de julgamento) com a necessidade de contratar novos colaboradores ou causando atrasos no atendimento dos doentes, designadamente, pela falta de assistentes.
A impossibilidade prática de subsistência da relação de trabalho tem de se aferir de modo objetivo, atendendo a um “empregador médio”, e verificar se perante o caso concreto o vínculo laboral ficou comprometido.
Não podemos assim concluir pela existência de quaisquer consequências gravosas da conduta da trabalhadora, uma vez que a empregadora não extraiu daquela quaisquer consequências em termos de (in)cumprimento da prestação de trabalho.
Por isso, entende-se que no concreto circunstancialismo, a desobediência da trabalhadora à ordem que lhe foi dada e a deslealdade demonstrada, nomeadamente, pela mentira apresentada, embora sejam passíveis da aplicação de uma sanção na medida em que o seu comportamento é inadmissível, não conduz, em termos objetivos, a uma absoluta quebra de confiança entre as partes, suscetível de criar no espírito da empregadora a dúvida sobre a idoneidade futura da conduta da trabalhadora, deixando de existir o suporte psicológico mínimo para o desenvolvimento dessa relação laboral: a ponderação entre, por um lado, o princípio constitucional da segurança no emprego (artigo 53.º da CRP) e, por outro, a lesão dos interesses da empregadora, não permite concluir que estes se devam sobrepor àquele.
Nesta sequência, embora a conduta da trabalhadora seja censurável, a mesma não justifica a aplicação da sanção disciplinar mais gravosa de despedimento, pelo que deve este ser declarado ilícito [cfr. artigo 381.º b), do Código do Trabalho].”

4.3. Concordamos com a solução preconizada, embora a sentença recorrida nos mereça algumas considerações que iremos tentar explicitar.

4.4. Como é sabido, no elenco das sanções disciplinares (artigo 328º do Código do Trabalho) o despedimento é a mais gravosa.
O artigo 53º da Constituição da República Portuguesa consagra o princípio da estabilidade no emprego proibindo os despedimentos sem justa causa. Princípio este que cede quando a permanência do trabalhador na empresa ponha em causa a existência ou a eficácia da estrutura produtiva, fruto de um seu comportamento culposo ou ilícito.
Na aplicação das sanções disciplinares, face ao princípio da proporcionalidade estatuído no artigo 330º do CT, é necessário ponderar a gravidade da infração e a culpa do infrator.
De acordo com o disposto no artigo 351º, nº 1, do C. T. constitui justa causa de despedimento “o comportamento culposo do trabalhador que, pela sua gravidade e consequências, torne imediata e praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho”.
A definição de justa causa assenta assim num particular juízo de censura sobre um comportamento culposo do trabalhador, violador dos respetivos deveres laborais[3].
Entendido o despedimento como a pena de morte das sanções disciplinares, a sua aplicação só é legítima e válida quando a gravidade da falta cometida o justifica.
A gravidade calcula-se pela infração em si, pelo grau de culpabilidade do trabalhador e pelas consequências em que ocorreu a sua prática.
A existência de justa causa pressupõe a verificação cumulativa de três requisitos:
1º-um comportamento ilícito, grave, em si mesmo ou pelas suas consequências, e culposo do trabalhador – é o elemento subjetivo da justa causa;
2º-a impossibilidade prática e imediata de subsistência do vínculo laboral – é o elemento objetivo da justa causa;
3º-a verificação de um nexo de causalidade entre os dois elementos anteriores, no sentido em que a impossibilidade de subsistência do contrato tem que decorrer, efetivamente, do comportamento do trabalhador, configurado na existência de nexo de causalidade entre aquele comportamento e esta impossibilidade.[4]
No que concerne ao primeiro dos elementos – o subjetivo – convém esclarecer, conforme refere Maria do Rosário Palma Ramalho,[5] “A exigência de ilicitude do comportamento do trabalhador não resulta expressamente do art. 351º, nº 1, mas constituiu um pressuposto geral do conceito de justa causa para despedimento[6], uma vez que, se a atuação for lícita, ele não incorre em infração que possa justificar o despedimento.”
O ato ilícito e culposo há-de corresponder a uma violação grave, por parte do trabalhador, dos seus deveres contratuais (seja dos deveres principais, secundários ou acessórios), por acção ou omissão, não sendo necessário que essa violação ocorra no local de trabalho[7], podendo essa violação revestir qualquer uma das três modalidades de incumprimento das obrigações: o não cumprimento definitivo, a simples mora e o cumprimento defeituoso.
A culpa do trabalhador (a título de dolo ou negligência) há-de ser apreciada segundo um critério objetivo, isto é, pela diligência que um bom pai de família teria adotado, em face das circunstâncias do caso (art.º 487.º, n.º 2, do Código Civil), e não segundo os critérios subjetivos do empregador[8]. Neste contexto, também devem ser relevadas e valoradas as circunstâncias atenuantes e as causas de exclusão da culpa que possam ter existido[9], nomeadamente, o estado de necessidade desculpante, o erro, a falta de consciência da ilicitude do facto, a anomalia psíquica ou obediência desculpante[10].
Para que se verifique a justa causa, não é suficiente um qualquer incumprimento dos deveres contratuais, por parte do trabalhador. É necessário, ainda, que se trate de um comportamento que, pela sua gravidade[11] e consequências, leve a concluir que a subsistência da relação de trabalho se tornou imediata e praticamente impossível.
No entanto, a impossibilidade em questão não é uma impossibilidade de ordem material, correspondendo, antes, a uma situação de inexigibilidade reportada a um padrão essencialmente psicológico, qual seja o das condições mínimas de suporte de uma vinculação duradoura, implicando mais ou menos frequentes e intensos contactos entre os sujeitos[12], e que, na apreciação dessa inexigibilidade, há que atender, no quadro da gestão da empresa, ao grau de lesão dos interesses da entidade empregadora, ao carácter das relações entre as partes ou entre o trabalhador e os seus companheiros e às demais circunstâncias que no caso sejam relevantes (art.º 351º, n.º 3, do CT), tudo à luz dos critérios de um bonus paterfamilias, ou seja, de um empregador normal, e não à luz da sensibilidade do real empregador.
O conceito de justa causa é assim um conceito indeterminado, pois não facultando uma ideia precisa quanto ao seu conteúdo, aponta para modelos de decisão a elaborar em concreto e, constituindo a mais grave das sanções disciplinares, visa o sancionamento da conduta do trabalhador que, pela sua gravidade objetiva e pela imputação subjetiva, torna impossível a subsistência das relações que o contrato de trabalho supõe[13].
A inexigibilidade há de, pois, ser aferida através de um juízo de probabilidade, de prognose, sobre a viabilidade da relação de trabalho, sendo de concluir pela existência de justa causa quando, sopesando os interesses em presença, se verifique que a continuidade da vinculação representaria, objetivamente, uma insuportável e injusta imposição ao empregador, isto é, quando, nas circunstâncias concretas, a permanência do contrato e das relações (pessoais e patrimoniais) que ele supõe seriam de molde a ferir de modo desmesurado e violento a sensibilidade e a liberdade psicológica de uma pessoa normal colocada na posição do empregador[14].

4.5. O que está em causa, como fundamento da justa causa de despedimento, é a falta ao trabalho, por parte da Autora, do dia 2 de Janeiro de 2014. Resulta inequivocamente da matéria de facto que a trabalhadora no dia referido não compareceu ao trabalho. Defende a recorrente que a Autora faltou tendo posteriormente apresentado justificação falsa para tal ausência. O mesmo defende a sentença recorrida.
Estamos de acordo com esta asserção. Se é verdade que a Autora em Dezembro de 2013 (11 e 16) pediu à Ré que lhe fosse concedido o dia 2 de Janeiro de 2014, por motivo de viagem ao estrangeiro a visita a familiares, também não deixa de ser verdade que esta (a Ré), por duas, vezes, lhe negou essa possibilidade.
Chegados ao dia 2 de Janeiro de 2014 a autora não compareceu ao trabalho, tendo, nesse mesmo dia, pelas 19 horas, dirigido uma comunicação à sua chefia informando que apenas poderia comparecer ao serviço no dia 13 de janeiro por motivos de avaliações escolares.
Todavia, essa falta, ou melhor, essa sua não comparência ao serviço no dia 2, não foi devida às avaliações escolares, mas, sim, por se ter deslocado ao estrangeiro onde foi visitar familiares. E, como é salientado na sentença recorrida «a trabalhadora sempre teve a intenção, mesmo antes de solicitar o gozo de férias no dia 02.01, de não comparecer ao serviço nesse dia, independentemente da posição que pudesse ser adotada pela entidade empregadora. Tal resulta designadamente do facto de já em abril ter adquirido a passagem área para a Suíça com data de regresso em 06.01. Acresce ainda o facto de, não obstante a sua intenção, não o demonstrou antecipadamente à sua entidade patronal, remetendo-se ao silêncio após ter-lhe sido negado o seu pedido, ao que acresce a circunstância de ter justificado a falta posteriormente com o fundamento em motivos de avaliações escolares, quando, nessa data, se encontrava fora do país em visita a familiares».
Defende a Autora que a falta no dia 2 de Janeiro de 2014 estava justificada pelo facto de ter exames consecutivos do dia 6 a 10 de Janeiro.
Vejamos:
Em 2009, a Autora requereu o estatuto de trabalhador-estudante, que lhe foi concedido. Usufruindo do estatuto de trabalhador-estudante a Autora, nos termos do artigo 91º, nº 1 do Código do Trabalho, pode faltar justificadamente por motivo de prestação de prova de avaliação, nos seguintes termos:
a) No dia da prova e no imediatamente anterior;
b) No caso de provas em dias consecutivos ou de mais de uma prova no mesmo dia, os dias imediatamente anteriores são tantos quantas as provas a prestar;
c) Os dias imediatamente anteriores referidos nas alíneas anteriores incluem dias de descanso semanal e feriados;
d) As faltas dadas ao abrigo das alíneas anteriores não podem exceder quatro dias por disciplina em cada ano letivo.
No caso em apreço, tendo a trabalhadora provas consecutivamente nos dia 6 a 10 de Janeiro de 2014, tinha, nos termos da alínea b) do nº 1 do aludido normativo, direito a faltar justificadamente, nos 5 dias imediatamente anteriores, ou seja, no dia 1 a 5 (aqui se incluindo o sábado e o domingo por força da alínea d) do mesmo normativo legal).
Se assim é, poderemos afirmar que o dia 2 de Janeiro estava abrangido naquele período de tempo que a lei concede ao trabalhador-estudante para faltar justificadamente nos casos em que tem provas. Contudo, deveremos ter em atenção que a finalidade da lei é permitir ao estudante descanso e tempo para se preparar para a prova e, assim, retirar aproveitamento escolar. Como é salientado no Acórdão do Tribunal Constitucional nº 454/97, de 25 de Junho, «[a] concessão de tal período relaciona-se com a preparação final de um exame (revisão da matéria estudada, esclarecimento de dúvidas, sempre necessários no estudo de qualquer disciplina), presumindo-se, iniludivelmente, que os períodos de dois dias por exame e de quatro dias por disciplina constituem os mínimos indispensáveis para tal preparação». Tais períodos não foram concedidos para o trabalhador-estudante andar a passear ou praticar outras atividades que não relacionadas com a sua condição de estudante. Ora, foi precisamente o que aconteceu no caso, pois a trabalhadora não aproveitou este dia para estudar ou descansar, mas, sim, para fazer uma viagem ao estrangeiro, que há muito tinha previsto e programado, independentemente de este dia ter coincidido, numa fase posterior, com a realização de provas. Assim, entendemos, que a falta ao serviço da Autora no dia 2 de Janeiro de 2014, não pode ser justificada com o recurso ao estatuto de trabalhador-estudante, nos termos acima aludidos.
Além do mais, apesar de isso não ter sido precisado devidamente pela Ré, sempre diremos que, mesmo nas situações de faltas dadas ao abrigo do estatuto de trabalhador-estudante, é que a falta, sendo previsível (como era o caso), teria de ser comunicada com a antecedência prevista no artigo 253º, nº 1 do Código do Trabalho).
Assente que a trabalhadora faltou no dia 2 de Janeiro de 2014 e que a justificação dada – por motivos de provas a realizar nos dia 6 a 10 de Janeiro de 2014), não é a verdadeira, pois, o motivo foi a ausência da trabalhadora para o estrangeiro, a questão que se nos coloca é tão só saber se esta única falta constitui justa causa de despedimento.
Como já deixamos assente constitui justa causa de despedimento o comportamento culposo do trabalhador que, pela sua gravidade e consequências, torne imediata e praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho (artigo 351º, nº 1 do CT), sendo que, de acordo com o nº 2, constitui, nomeadamente, justa causa de despedimento as falsas declarações relativas à justificação de faltas (alínea f)).
E aqui concordamos em pleno os fundamentos da sentença recorrida quando afirma que «não decorre da matéria de facto (nem consta da decisão disciplinar) que em razão da ausência da trabalhadora, a Ré tenha sofrido qualquer prejuízo sério, nomeadamente, causando sérias dificuldades na organização do serviço (muito embora tal tenha sido aventado na audiência de julgamento) com a necessidade de contratar novos colaboradores ou causando atrasos no atendimento dos doentes, designadamente, pela falta de assistentes.
A impossibilidade prática de subsistência da relação de trabalho tem de se ferir de modo objetivo, atendendo a um “empregador médio”, e verificar se perante o caso concreto o vínculo laboral ficou comprometido.
Não podemos assim concluir pela existência de quaisquer consequências gravosas da conduta da trabalhadora, uma vez que a empregadora não extraiu daquela quaisquer consequências em termos de (in)cumprimento da prestação de trabalho.
Por isso, entende-se que no concreto circunstancialismo, (…) deslealdade demonstrada, nomeadamente, pela mentira apresentada, embora sejam passíveis da aplicação de uma sanção na medida em que o seu comportamento é inadmissível, não conduz, em termos objetivos, a uma absoluta quebra de confiança entre as partes, suscetível de criar no espírito da empregadora a dúvida sobre a idoneidade futura da conduta da trabalhadora, deixando de existir o suporte psicológico mínimo para o desenvolvimento dessa relação laboral: a ponderação entre, por um lado, o princípio constitucional da segurança no emprego (artigo 53.º da CRP) e, por outro, a lesão dos interesses da empregadora, não permite concluir que estes se devam sobrepor àquele.
Nesta sequência, embora a conduta da trabalhadora seja censurável, a mesma não justifica a aplicação da sanção disciplinar mais gravosa de despedimento, pelo que deve este ser declarado ilícito [cfr. artigo 381.º b), do Código do Trabalho].».

Não deixa de ser verdade que a doutrina e a jurisprudência vêm sublinhando o papel da confiança no vínculo laboral, acentuando a forte componente fiduciária da respetiva relação.
Reiteradamente o Supremo Tribunal de Justiça tem mencionado que ao quebrar-se a confiança entre o empregador e o trabalhador, deixa de existir o suporte mínimo para a manutenção dessa relação: porque o contrato de trabalho assenta numa base de recíproca confiança entre as partes, se o comportamento do trabalhador de algum modo abala e destrói essa confiança, o empregador interioriza legitimamente a dúvida sobre a idoneidade futura da sua conduta[15].
No mesmo sentido temos Batista Machado[16] ao referir que […] o núcleo mais importante de violações do contrato, capazes de fornecer justa causa à resolução, é constituído por violações do princípio da leal colaboração imposto pelo ditame da boa fé. Em termos gerais, diz-se que se trata de uma quebra da “fider” ou da base de confiança do contrato (…). Esta é afetada quando se infringe o dever de leal colaboração, cujo respeito é necessário ao correto implemento dos fins prático-económicos a que se subordina o contrato.
O mesmo acontece com Lobo Xavier ao salientar o relevo da confiança mútua, afirmando que integra justa causa, o […] comportamento que vulnera o pressuposto fiduciário do contrato[17].
No caso, mais do que falta ao trabalho no dia 2 de Janeiro de 2014, o comportamento da trabalhadora que assume toda a relevância é sem dúvida a falsidade da justificação. Com este comportamento a trabalhadora violou o princípio da mútua confiança e da lealdade que caracterizam o contrato de trabalho, associado ao dever de assiduidade.
Subjacente ao dever de lealdade, está o valor absoluto da honestidade e, porque assim é, não está dependente da verificação de prejuízos, nem da existência de culpa grave do trabalhador. Todavia, isso não implica que não se tenha de apreciar o comportamento da trabalhadora e respetiva justa causa, enquadrado no circunstancialismo que esteve na sua génese, bem como, nas palavras da lei, «no quadro de gestão da empresa, ao grau de lesão dos interesses do empregador, ao caráter das relações entre as partes ou entre o trabalhador e os seus companheiros e às demais circunstâncias que no caso sejam relevantes» - artigo 351º, nº 3 do CT.
Ora, se o comportamento da trabalhadora é culposo, não vislumbramos que os factos revistam a gravidade suficiente para serem enquadrados no conceito de justa causa de despedimento. Se é certo que o comportamento da recorrente não é exemplar, a verdade é que a mesma presta serviço para a Ré desde 1996 sem que haja conhecimento (pelo menos não está provado) da existência de quaisquer sanções disciplinares. Por outro lado, o motivo que esteve na base da falta - visita a familiares ao estrangeiro – é compreensível e, como tal atenuante da sua culpa, além de que há muito a trabalhadora tinha adquirido a viagem. Sendo ainda certo que, caso a trabalhadora não realizasse a dita viagem ao estrangeiro, sempre ela poderia faltar no dia 2 de Janeiro justificadamente, tendo em conta o estatuto de trabalhador-estudante. Por outro lado, a justificação dada para a falta não sofreu adulteração, nem a declaração apresentada – exame – não era verdadeira. Estamos perante uma falta que sempre poderia ser dada à luz da lei, mas que a trabalhadora «desviou» para a realização de um interesse pessoal, que não o estudantil. Mais do que uma falsificação é uma utilização diversa do fim visado.
E, se é certo que merece censura o seu comportamento, o mesmo não reveste, salvo o devido respeito, tal gravidade, sendo a culpa atenuada, que comprometa de forma definitiva a relação laboral. Podemos, pois, afirmar, que, no presente caso, a sanção de despedimento é excessiva, desmesurada e desproporcionada, tendo em conta que a sanção deve ser proporcional à gravidade da infração e à culpabilidade do infrator, conforme dispõe o nº 1 do artigo 330º do mesmo Código, não sendo os factos, apesar de revestirem alguma gravidade, suscetíveis de criarem uma situação geradora de uma absoluta necessidade de fazer fraturar a relação laboral.
Sendo assim, os factos não integram causa que justifica o despedimento, sendo o mesmo ilícito (artigo 381º, nº 1, alínea b) do CT).
Improcede, por esta razão, o recurso.
◊◊◊
4. RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA
As custas do recurso ficam a cargo da Recorrente [artigos 527º, nºs 1 e 2 do Código de Processo Civil].
◊◊◊
◊◊◊
IV – DECISÃO
Em face do exposto, acordam os juízes que compõem esta Secção Social do Tribunal da Relação do Porto em:
I – Julgar improcedente o recurso interposto por B… e consequentemente manter a sentença recorrida.
II – Condenar a Recorrente no pagamento das custas do recurso [artigos 527º, nºs 1 e 2 do Código de Processo Civil].
◊◊◊
Anexa-se o sumário do Acórdão – artigo 663º, nº 7 do CPC.
◊◊◊
(Processado e revisto com recurso a meios informáticos (artº 138º nº 5 do Código de Processo Civil).

Porto, 21 de Setembro de 2015
António José Ramos
Jorge Loureiro – (com a seguinte declaração de voto:
"Concordo com a decisão, mas não acompanho integralmente a fundamentação, designadamente na parte em que, ao meu ver, nela se sustenta que a falta da autora do dia 2/1/2014 não poderia considerar-se justificada ao abrigo do art. 91º/1 do CT/09 porque “…a trabalhadora não aproveitou este dia para estudar ou descansar, mas, sim, para fazer uma viagem ao estrangeiro,...".
Com efeito, é meu entendimento que dos factos provados não resulta que a autora não aproveitou o dia 2/1/2014, ao menos parcialmente, para estudar e/ou para descansar, sendo que nesta matéria o ónus de alegação e prova impendia sobre a ré que, justamente, despediu a autora com fundamento na referida falta e na fundamentação apresentada pela autora para a sua justificação.”.)
Jerónimo Freitas
________________
[1] Iremos chamar “Ré” à entidade patronal e “ Autor” ao trabalhador. Isto porque o legislador nos normativos em que regulou a acção de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento, não chama “autor” ao trabalhador, nem “ Ré” à entidade patronal. Na verdade, podemos constatar pela análise dos vários normativos que o legislador dispensou a utilização dos termos “autor” e “ ré”, utilizando as expressões “trabalhador “e “empregador” (artigos 98ºF, 98º-G, 98ºH, 98º-I, 98º-J, 98º-L, 98º-N do CPT). A única referência que constatamos em que o legislador apelida o trabalhador de “ autor” é no preâmbulo do Decreto-Lei n.º 295/2009 de 13 de Outubro, que aprovou as alterações ao actual CPT, ao referir que “A recusa, pela secretaria, de recebimento do formulário apresentado pelo autor é sempre passível de reclamação nos termos do Código de Processo Civil (CPC).”
[2] E assim fica prejudicada a «questão» colocada pelo Exº Sr.º Procurador-geral Adjunto no seu parecer, inexistindo qualquer motivo para anulação do julgamento.
[3] GUILHERME MACHADO DRAY, Justa Causa e Esfera Privada, Estudos do Instituto de Direito do trabalho, Vol. II, Justa causa de Despedimento, pág. 66.
[4] Cfr. MARIA DO ROSÁRIO PALMA RAMALHO, Direito do Trabalho, Parte II – Situações Laborais Individuais, 3ª edição, pág. 899/900 e a jurisprudência aí mencionada na nota 239.
[5] In obr. Citada, pág. 900/901.
[6] No mesmo sentido o acórdão do STJ de 25/02/2009, processo 08S2461, www.dgsi.pt; PEDRO ROMANO MARTINEZ, Direito do Trabalho, Abril 2002, p. 851-852 e ANTÓNIO MENEZES CORDEIRO, Manual de Direito do Trabalho, 1994, pág. 820/821. Sobre o assunto ver ainda NUNO ABRANCHES PINTO, Instituto Disciplinar Laboral, pág.71/75.
[7] Cfr. LUÍS MANUEL TELES DE MENEZES LEITÃO, Direito do Trabalho, 2ª edição, pág. 481.
[8] ANTÓNIO MENEZES CORDEIRO, obr. citada, pág. 821/822 e MARIA DO ROSÁRIO PALMA RAMALHO, obr. citada, pág. 901.
[9] MARIA DO ROSÁRIO PALMA RAMALHO, obr. citada, pág. 901.
[10] Cfr. NUNO ABRANCHES PINTO, Instituto Disciplinar Laboral, pág.76.
[11] Como diz MARIA DO ROSÁRIO PALMA RAMALHO, obr. citada, pág. 902, a gravidade pode ser reportada ao comportamento em si mesmo ou às consequências que dele decorram para o vínculo laboral.
[12] Cfr. MONTEIRO FERNANDES, in Direito do Trabalho, 15.ª edição, p. 592/598.
[13] Cfr. ANTÓNIO MENEZES CORDEIRO, ob. cit. pág. 819.
[14] Cfr. MONTEIRO FERNANDES, obr. cit. pág. 595.
[15] Acórdãos do STJ de 30/09/2009, processo 09S623, e de 12/01/2011, processo 1104/08.7TTSTB.E1.S1, ambos in www.dgsi.pt.
[16] in R.L.J., 118º, 330 e ss.
[17] in “Da justa causa de despedimento no contrato de trabalho”, 1965, página 162
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SUMÁRIO – a que alude o artigo 663, nº 7 do CPC.
I – Usufruindo a trabalhadora do estatuto de estudante e tendo a mesma provas consecutivamente nos dia 6 a 10 de Janeiro de 2014, tinha, nos termos da alínea b) do nº 1 do artigo 91.º do CT, direito a faltar justificadamente, nos 5 dias imediatamente anteriores, ou seja, no dia 1 a 5 (aqui se incluindo o sábado e o domingo por força da alínea d) do mesmo normativo legal).
II - Se assim é, poderemos afirmar que o dia 2 de Janeiro estava abrangido naquele período de tempo que a lei concede ao trabalhador-estudante para faltar justificadamente nos casos em que tem provas.
III - Contudo, deveremos ter em atenção que a finalidade da lei é permitir ao estudante descanso e tempo para se preparar para a prova e, assim, retirar aproveitamento escolar. Tais períodos não foram concedidos para o trabalhador-estudante andar a passear ou praticar outras atividades que não relacionadas com a sua condição de estudante.
IV - No caso, a trabalhadora não aproveitou o dia 2 para estudar ou descansar, mas, sim, para fazer uma viagem ao estrangeiro, que há muito tinha previsto e programado, independentemente de este dia ter coincidido, numa fase posterior, com a realização de provas.
V – Tal falta não pode ser justificada com o recurso ao estatuto de trabalhador-estudante.
VI – Tendo-se provado que em razão da ausência da trabalhadora, a Ré não sofreu qualquer prejuízo sério, nomeadamente, causando sérias dificuldades na organização do serviço com a necessidade de contratar novos colaboradores ou causando atrasos no atendimento dos doentes, designadamente, pela falta de assistentes, inexistindo qualquer prova de um passado com infrações disciplinares, a sanção de despedimento é excessiva, desmesurada e desproporcionada.

António José Ramos