Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
0131169
Nº Convencional: JTRP00030913
Relator: LEONEL SERÔDIO
Descritores: CONTRATO DE MEDIAÇÃO
AUTORIZAÇÃO
FALTA
EFEITOS
NULIDADE
DIREITO À REMUNERAÇÃO
ÓNUS DA ALEGAÇÃO
ÓNUS DA PROVA
Nº do Documento: RP200109200131169
Data do Acordão: 09/20/2001
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recorrido: 3 J CIV MATOSINHOS
Processo no Tribunal Recorrido: 105/00
Data Dec. Recorrida: 03/02/2001
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO.
Decisão: REVOGADA.
Área Temática: DIR CIV - DIR CONTRAT / TEORIA GERAL.
Legislação Nacional: DL 285/92 DE 1992/12/19 ART3 ART10 N1 N2 N4 N6 ART18 N1 A ART2.
DL 77/99 DE 1999/03/16 ART20 N8.
CCIV66 ART294 ART220 ART342.
Sumário: I - A intervenção de um mediador não autorizado na realização de um contrato não torna este nulo, mas apenas acarreta a multa ao interveniente que, como tal, se apresenta.
II - A falta de redução a documento particular do contrato de mediação acarreta a nulidade do mesmo, mas a falta dos elementos referidos no n.2 do artigo 10 do Decreto-Lei n.285/92, de 19 de Dezembro, designadamente do seu prazo de duração, não é cominada com a nulidade do contrato. Essa nulidade só é sancionada pelo n.8 do artigo 20 do Decreto-Lei n.77/99, de 16 de Março.
III - Para o mediador ter direito à remuneração não é necessário que esteja presente até à conclusão do negócio, mas sim que a conclusão deste resulte adequadamente da sua conduta ou actividade, cabendo-lhe, nos termos do artigo 342 n.1 do Código Civil, alegar e provar o nexo de causalidade entre a sua actividade e a conclusão do negócio.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação do Porto

I............, LDA intentou, no Tribunal da comarca de .........., a presente acção declarativa com processo sumário contra MARIA ........... e marido JOSÉ ..........., pedindo que estes sejam condenados a pagar-lhe a quantia de 877 500$00, acrescida de juros à taxa legal desde a citação.
Alega, em síntese, que se dedica à mediação imobiliária e foi incumbida pela R. de arranjar comprador para o prédio identificado na petição, tendo ficado acordado que a comissão devida era de 3% sobre o valor da venda. Alega ainda que o contrato de venda foi celebrado com a pessoa que ela levou a visitar o prédio e apresentou aos RR. mas estes, apesar de interpelados, recusam-se a pagar a comissão.
Os RR. contestaram, alegando que o contrato de venda do apartamento foi celebrado sem intervenção da A.
O processo prosseguiu os seus ulteriores termos e, a final, foi a acção julgada procedente e os RR. condenados a pagar à A. a quantia de 877 500$00, acrescida de juros de mora, à taxa legal de 12% ao ano, desde a citação.
Os RR. apelaram, terminando a sua alegação com as seguintes conclusões, que se transcrevem:
“1 – Fundamentou de facto a Mma Juíza a quo a sua decisão, entre outros, no facto de a recorrida ser “uma sociedade comercial que se dedica à mediação imobiliária estando licenciada para o exercício de tal actividade”- resposta ao quesito 1º da base instrutória.
2 – A prova de tal facto carece de ser efectuada por documento uma vez que o artigo 3º do Dec.-Lei n.º 285/92 de 19/12 impõe a existência de licença a emitir pelo CMOPP, hoje IMOPPI, e a mesma prova carece de ser efectuada documentalmente, nos termos do art. 364º do Código Civil.
3 – Não é admissível prova testemunhal relativamente à detenção de tal licença.
4 – Exclusivamente em função do documento junto pela recorrida aos autos constata-se que aquela é titular de uma licença para o exercício da actividade de mediação imobiliária emitida em 21.6.99, válida até 21.6.2002 (de acordo com o n.º 2 da citada disposição legal).
5 – Isto é, em função de tal documento, única prova admissível para a resposta ao quesito 1º no que importa à existência de licença, apenas poderia a Mma Juíza a quo dar como provado que a recorrida estava licenciada para o exercício de tal actividade a partir de 21.06.1999.
6 – A recorrida não possuía licença para o exercício da actividade em 27.05.99, data em que foi assinado o contrato.
7 – Por outro lado, o contrato em causa não estabelece o seu prazo de duração, requisito obrigatório do mesmo que deve entender-se como parte integrante da forma escrita a que o contrato está sujeito – n.ºs 1º e 2º do Dec.Lei n.º 285/92 de 19/12.
8 – Tal contrato é assim nulo, nulidade que expressamente se invoca, nos termos do disposto nos artigos 294º do Código Civil e n.º 6 do art.10º do Dec.-Lei n.º 285/92 e 19/12.
9 - A nulidade do contrato ora invocada não é susceptível de ser sanada por confirmação - artigo 288º do C.C. a contrario.
10 – Por outro lado, da matéria dada como provada não consta a data de concretização do negócio, que certamente ocorreu depois do último anúncio (26.7.99), nem a da visita à fracção por parte dos compradores, nem a quem se devem as “negociações diversas”, na “sequência” das quais se acordou o negócio, isto é, não existe matéria de facto provada que leve à conclusão que a recorrida conseguiu, com a sua actividade, um interessado no negócio.
11 – Apenas vem provado que a recorrida levou a Dª Ana ........ a visitar a fracção a vender – A) da matéria assente.
12 – Mas incumbia aos recorridos, por se tratar de matéria constitutiva do direito que invocavam, a alegação e prova que, da sua actividade, tinha resultado directamente a obtenção de um interessado para a compra da fracção em causa nos autos, como impõe o artigo 342º do C.C..
13 – Ora, não há prova de que a recorrida tenha conseguido “interessado para a compra do bem “como é requisito necessário para a prova do exercício da actividade – art.2º do Dec.Lei n.º 285/92 de 19/12.
14 – A Mma Juíza a quo ao dar como provado o quesito 1º da base instrutória da forma como o fez e ao concluir pela existência de um contrato de mediação imobiliária válido e eficaz entre as partes e que foi da actividade da recorrida que resultou a conclusão daquele, violou o disposto no art. 659º do C.P.C., artigos 3º e 10º do Dec. Lei n.º 285/92, de 19/12 e artigos 288º, 294º, 342º e 364º do Código Civil e artigo 6º do Código das Sociedades Comerciais.
15 – Com efeito, a Mma Juíza a quo deveria dar apenas como provado que a recorrida estava licenciada desde 21.6.99 e que, como o contrato fora celebrado em 27.5.99, o fora em violação de normas legais imperativas, acima referenciadas, pelo que o mesmo deveria ter-se por nulo.
16 – E por outro lado, mesmo que por mera hipótese académica não fosse essa a conclusão, sempre inexistia matéria de facto provada susceptível de integrar o conceito de desempenho da actividade de mediação por parte da recorrida, pelo que não poderia ser atendido o seu pedido de condenação dos recorrentes no pagamento da remuneração peticionada por inexistência de causa para tal.”
A A. contra-alegou, pugnando pela confirmação da sentença recorrida.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
Factos dados como provados na 1ª instância (indicando entre parênteses a alínea dos factos assentes e artigo da base instrutória):
1 – A A. é uma sociedade comercial que se dedica à mediação imobiliária estando licenciada para o exercício de tal actividade (1º).
2 – No exercício de tal actividade foi contratada pela R. que, em 27.5.99, a incumbiu de arranjar comprador para uma fracção autónoma T3 propriedade dos RR. (2º).
3 – Para o efeito assinaram o contrato junto a fls. 6 dos autos, onde se estabeleceu que a venda devia ser tentada por 29 000 000$00 (sendo este preço negociável) e que pelo seu trabalho a A. receberia uma comissão de 3% sobre o valor da venda, pagável aos RR., com o recebimento do sinal (3º).
4 – A R. anuiu a que a A. pudesse tentar a angariação de potenciais compradores, uma vez que o regime era “não exclusivo” (9º).
5 – A A. levou a Sr.ª D. Ana ....... a visitar a fracção que os RR. Decidiram vender, sita na R. das ............ (A).
6 – Na sequência de negociações diversas acabaram os RR. e a compradora Sr.ª D. Ana .......... e marido Ricardo .........., por acordar na compra e venda do apartamento correspondente ao T3 e garagem pelo preço global de 25.000.000$00 (4º, 12º e 13º).
7 – O R., a fim de vender o imóvel referido em 2), tomou a iniciativa de mandar publicar na página de classificados do Jornal de Notícias em 11 e 12 de Abril de 1999, sob a rubrica “vende-se”, o anúncio constante do documento de fls. 53 (6º).
8 – O R. marido mandou publicar anúncios para tal fim, no mesmo jornal, em 2, 5, 9, 13, 15, 17, 22 e 29 de Maio e 12, 19, 21, 26 e 27 de Junho de 1999 (7º).
9 – O R. marido continuou a publicar no Jornal de Notícias em 22, 24 e 26 de Julho de 1999 e sob a rubrica “vende-se” os anúncios juntos a fls. 62 dos autos (11º).
10 – A A. não conhece os termos do contrato promessa de compra e venda celebrado entre os RR (e pelo R. marido elaborado) e os compradores nem a data da sua celebração (14º).
11 – A A. instou, por diversas vezes, os RR para procederem ao pagamento da quantia de 750 000$00 a título de comissão) e os mesmos vêm recusando o pagamento da mesma (5º).
FUNDAMENTAÇÃO:
Os apelantes sustentam que atenta a prova documental existente nos autos deveria ter-se dado como provado, na resposta ao quesito 1º, que a recorrida estava licenciada para o exercício de mediação imobiliária, desde 21.6.99.
Dado que se trata de facto que só pode ser provado por documento, não se nos afigura a técnica mais correcta incluí-lo na base instrutória.
Para se responder ao mencionado quesito apenas é relevante o que consta do documento emitido pelo Conselho de Mercados de Obras Públicas e Particulares – CMOPP - entidade com competência para licenciar o exercício da actividade de mediação imobiliária, nos termos do artigo 3º do DL n.º 285/92 de 19/12 (diploma que regulamentava o exercício da referida actividade na altura da celebração do contrato em causa).
Assim e atento o documento de fls. 76 dos autos, emitido pelo CMOPP, constata-se efectivamente que à A. só foi concedida licença a partir de 21.06.99.
Tendo sido o contrato em apreço celebrado em 27.05.99, a questão que se coloca é a de saber qual a consequência de o mesmo ter sido celebrado antes da A. estar licenciada para o exercício da actividade de mediação.
Os apelantes defendem que a sanção é a nulidade.
A apelada sustenta que uma vez que a questão não foi colocada na 1ª instância, este Tribunal não pode sequer conhecer dela.
Como é entendimento unânime [cfr. entre outros, o acórdão do S.T.J. de 6.2.87, B.M.J. n.º 364 pág. 719. Na doutrina é também este o entendimento, conforme se constata da lição de Castro Mendes, “Recursos”, 1980, pág. 27 e, mais recentemente, Armindo Ribeiro Mendes, “Recursos em Processo Civil”, 1992, págs.140 e 175], os recursos visam modificar decisões e não criar soluções sobre matéria nova.
Assim, em princípio, não tendo os RR. suscitado tal questão na 1ª instância estaria este Tribunal impedido de a conhecer.
No entanto, considerando que os apelantes sustentam que estamos perante uma nulidade que pode ser declarada oficiosamente (artigo 286º do C.C.), o tribunal recorrido, se entendesse que a mesma se verificava, podia e devia tê-la conhecido, apesar de não arguida pelos RR.. Por isso, entendemos que deve ser conhecida por este Tribunal. [cfr., neste sentido, acórdãos do S.T.J. de, 7.1.93 e 27.01.93, B.M.J. n.º 423 pág. 504 e 539, respectivamente].
Sobre a questão estipula o DL n.º 285/92, no seu artigo 3º: “1- O exercício da actividade de mediação imobiliária apenas pode ser efectuado por pessoas singulares ou colectivas licenciadas exclusivamente para o efeito pelo Conselho de Mercados de Obras Públicas e Particulares, abreviadamente designado por CMOPP.
2 – A licença é emitida pelo prazo de três anos.”
Por outro lado, o artigo 18º n.º1 al. a) sanciona com coima a violação do disposto no citado artigo 3º n.º1.
Os apelantes sustentam que a nulidade do contrato em apreço se infere do disposto no artigo 294º do Código Civil que comina com tal nulidade o negócio jurídico que for celebrado contra disposição legal de carácter imperativo, salvo nos casos em que outra solução resulte da lei.
No entanto, não se nos afigura que este entendimento seja o mais correcto.
Como escreve Heinrich Hoster [A parte geral do Código Civil Português, Almedina, 1992, pág. 520] : “Como decorre da ressalva feita no artigo 294º, nem todas as violações de normas imperativas acarretam a nulidade do negócio jurídico. (...) Na falta de uma solução expressa (cf. p. ex., o art.º 280º que prevê a nulidade), cada proibição legal ou cada norma imperativa, deve ser interpretada e interrogada sobre a finalidade legislativa que lhe subjaz. Normas imperativas que não se dirigem contra o conteúdo do próprio negócio, mas que visam outros fins (=fins ulteriores), não conduzem necessariamente à nulidade”.
Igual entendimento defendia o Prof. Manuel de Andrade [Teoria Geral da Relação Jurídica, vol. II, pág. 520] na vigência do Código de Seabra ao escrever : “O próprio artigo 10º (que corresponde ao actual 294º) ressalva a possibilidade de a lei estatuir diversamente. Ora a este propósito convém recordar que não é indispensável ser a lei explícita no sentido de proscrever a nulidade. Basta que nos respectivos termos ou de quaisquer outros factores atendíveis na sua interpretação se possa concluir com suficiente probabilidade ter sido esse o intuito da lei. Nesta ordem de ideias é claro que reveste particular importância a consideração dos interesses em presença e do escopo presumivelmente visado pelo legislador. Se postas as coisas neste plano, a nulidade do negócio se mostrar sanção pouco adequada, até somente por aí deverá julgar-se excluída. Os negócios
contrários a uma proibição legal poderão, portanto, deixar de ser nulos, mesmo sem texto que assim o declare.”
Como resulta do citado artigo 18º do DL n.º 285/92, a sanção aplicável ao mediador que exerça a actividade sem licença, não interfere com a validade do acto celebrado nem com a marcha do processo, apenas existe no plano do mediador de facto- Estado.
Por isso, entendemos que a lei não comina com a nulidade o contrato de mediação outorgado pelo mediador profissional não autorizado.
Este entendimento é uniforme na jurisprudência publicada, como é exemplo o acórdão do S.T.J. de 18.3.97 [CJ (STJ) ano V, tomo 2, pág. 158] onde, apesar de se entender que a norma que proíbe o exercício da actividade de mediação sem licença é uma norma imperativa, se decidiu que: “a intervenção de um mediador não autorizado na realização de um contrato não torna este nulo, mas apenas acarreta a multa ao interventor que, como tal se apresenta.” [cfr. ainda os acórdãos deste Tribunal de 22.2.74, BMJ 234/342 e o proferido no processo n.º 1323/95 da 2ª secção, em 21.5.96, não publicado, o da Relação de Lisboa de 16.11.89, CJ, tomo v, 117 e o do STJ de 5.11.74, BMJ 234/343]
É, pois, de concluir que o facto de a A. não estar autorizada a exercer a actividade de mediadora, em 27.05.99, não torna nulo o contrato celebrado com a R..
Sustentam também os apelantes que o contrato é nulo por dele não constar o seu prazo de duração.
Sobre a questão estipula o artigo 10º do citado DL n.º 285/92: “1 – O contrato de mediação imobiliária está sujeito à forma escrita.
2 – Do contrato constam obrigatoriamente as seguintes menções:
a) Identificação das partes;
b) Objecto e condições do exercício da mediação;
c) Forma de remuneração;
d) Prazo de duração do contrato.
(...)
4 – Tratando-se de contratos com uso de cláusulas contratuais gerais, o mediador imobiliário deve enviar cópia dos respectivos projectos ao CMOPP e ao Instituto Nacional de Defesa do Consumidor.
(...)
6 – A omissão da forma legalmente prescrita, bem como do disposto no n.º4, gera a nulidade do contrato, não podendo esta, contudo ser invocada pela entidade mediadora.”
Deste normativo resulta que a falta de redução a documento particular do contrato de mediação acarreta a nulidade do mesmo.
Tal resultaria também do artigo 220º do Código Civil que estipula que a declaração negocial que carece da forma legalmente prescrita é nula.
Contudo, o citado DL n.º 285/92 não comina com nulidade a falta nos contratos de mediação dos elementos referidos no n.º 2 do artigo 10º.
Por isso, carece de fundamento legal a pretensão dos apelantes de que se declare a nulidade do contrato em apreço, por dele não constar o seu prazo de duração.
De referir que o actual DL n.º 77/99 de 16.3, passou a sancionar a falta de estipulação de prazo de duração dos contratos de mediação, bem como dos outros elementos que obrigatoriamente têm de neles constar com a nulidade, como expressamente passou a estipular o n.º 8º do artigo 20º.
No entanto, como é sabido, nos termos do artigo 12º n.º 2, 1ª parte, do Código Civil, a lei quando dispõe sobre as condições de validade substancial ou formal de determinados tipos de contrato só visa os celebrados depois da sua entrada em vigor e, por isso, está afastada a aplicabilidade deste novo regime ao contrato em causa, celebrado ainda na vigência do DL n.º 285/92 de 19/12.
É, pois, de concluir que a falta de estipulação de prazo no contrato celebrado entre A. e R. não o torna nulo.
A última questão que se coloca é a de saber se a matéria de facto apurada permite ou não estabelecer um nexo de causalidade entre a actividade da A. e a venda do prédio em causa.
O problema da relação de causalidade que deve intercorrer entre a actividade desenvolvida pelo mediador e a conclusão do negócio constitui a questão mais melindrosa do contrato de mediação.
O artigo 2º do citado DL n.º 285/92, de 19/12, definia a mediação imobiliária como “a actividade comercial em que, por contrato, a entidade mediadora se obriga a conseguir interessado para a compra e venda de bens imobiliários ou para a constituição de quaisquer direitos reais sobre os mesmos, para o seu arrendamento, bem como na prestação de serviços conexos.”
Esta noção corresponde, no essencial, às diversas definições que até à sua entrada em vigor eram apresentadas pela doutrina e jurisprudência.
Assim, Vaz Serra [RLJ ano 100º, pág. 343] define-o como o contrato “pelo qual uma das partes se obriga a conseguir interessado para certo negócio e a aproximar esse interessado da outra parte”. Manuel Salvador [Contrato de Mediação, pág. 31] “como a interferência feliz de um terceiro, feita sobre promessa de recompensa, entre duas ou mais pessoas, levando-as a concluir determinado negócio”.
Pessoa Jorge [O Mandato Sem Representação, pág. 231 e 232] refere que o mediador se limita a procurar pôr em contacto possíveis contraentes e colaborar na fase preliminar das negociações.
Na jurisprudência, o acórdão do S.T.J. de 28.2.78 [BMJ n.º 274, pág. 229],
afirma: “o contrato de mediação supõe, na sua essência, a incumbência, a uma pessoa de conseguir interessado para certo negócio, a aproximação feita pelo mediador entre o terceiro e o comitente e a conclusão do negócio entre este e o terceiro em consequência da actividade do intermediário, sendo, porém, necessário que a actividade por ele desenvolvida constitua causa adequada à conclusão do negócio.” Como se constata deste acórdão, para além da definição, que é uniforme, o que é relevante é saber que tipo de nexo tem de existir entre a actividade do mediador e a celebração do negócio para este ter direito à remuneração.
Sobre esta questão é entendimento uniforme que não é necessário que o mediador esteja presente até à conclusão do negócio, mas é necessário que a conclusão deste resulte adequadamente da sua conduta ou actividade. [cfr., neste sentido, acórdão do STJ de 9.3.78, BMJ n.º 275, pág. 188, onde se afirma: “Nos contratos de mediação, o direito à remuneração nasce da conclusão dos negócios objecto da mediação, mas a conclusão, para o mediador – isto resulta da essência do contrato – surge quando tais negócios se consideram aproximados entre o comitente e terceiros e consegue a adesão destes haja ou não execução posterior. Deve, porém haver um nexo de causalidade entre a actividade do mediador e a conclusão do negócio.”]
Temos, assim, que o direito do mediador à remuneração depende de a conclusão do negócio ser efeito da sua intervenção.
A este propósito, o acórdão do S.T.J. de 31.3.98 [BMJ n.º 475, pág. 686], citando doutrina e jurisprudência a que adere, escreve: “o juízo positivo a formular sobre esta relação de causa e efeito deve assentar na verificação de um nexo de causalidade adequada, é preciso que a actividade do mediador, embora não sendo a única causa do resultado produzido, se integre de forma idoneamente determinante na cadeia de factos que deram lugar ao negócio pretendido pelo comitente.
Mais adiante esclarece: “não excluirá o nexo de causalidade adequada, nem a correspondente retribuição do mediador, a circunstância das negociações encetadas com a colaboração deste serem rompidas e, mais tarde, retomadas com sucesso, já sem a sua participação, desde que o seu desenvolvimento subsequente possa ser reconduzido, face a um critério de continuidade lógica, à anterior actividade do mediador”.
Competia à A., como elemento constitutivo do seu direito à remuneração, nos termos do artigo 342º n.º 1 do Código Civil, alegar e provar esse nexo de causalidade entre a sua actividade e a conclusão do negócio.
Sobre este elemento a A. limitou-se a alegar, no artigo 4º da petição, que dois dias depois da assinatura do contrato de fls. 6 (ocorrida em 27.5.99), levou Ana ....... a visitar o apartamento, apresentando-a aos Réus.
E, no artigo 5º, que “na sequência de negociações diversas acabaram os RR. e a compradora por acordar na compra e venda do apartamento pelo preço de 25.000.000$00.”
Os RR. aceitaram que a A. levou a Ana ......... a visitar o apartamento, no dia 29.5.99 e, por isso, esse facto ficou a constar da única alínea da especificação.
O alegado no 5º da petição ficou a constar do artigo 4º da base instrutória que obteve resposta afirmativa, mas o mesmo nada esclarece sobre qual o papel da A., se é que teve algum, nessas negociações.
Assim, da actividade desenvolvida pela A. temos apenas como assente que, em 29.5.99, levou a referida Ana ........... a visitar o apartamento que os RR. decidiram vender.
Apesar de não constar da al. a) da especificação, pode considerar-se assente por não ter sido impugnado pelos RR, que estes foram na altura apresentados àquela.
Como atrás se referiu, não é essencial que o mediador esteja presente até á conclusão do negócio.
No entanto, é necessário que se demonstre que a sua actividade foi determinante na cadeia de factos que deram lugar ao negócio pretendido pelo comitente.
No caso em apreço, a A. não alegou factos donde resultasse que teve influência na conclusão do negócio, não referiu se e como procurou aproximar as partes e/ou se teve alguma colaboração na fase preliminar das negociações.
De realçar que a A. não alegou sequer o que ocorreu na data em que a Ana....... foi visitar o apartamento dos RR., designadamente se esta se mostrou ou não interessada em comprá-lo e, na hipótese afirmativa, em que condições.
Entendemos que, em regra, o mediador tem de demonstrar não só que pôs em contacto as partes (comitente e potencial comprador) mas ainda que, de alguma forma, participou nas discussões e negociações preliminares, pois só assim se pode afirmar que a conclusão do negócio resultou adequadamente da sua actividade.
O simples facto de ter posto as partes em contacto apenas pode ser considerado suficiente quando se constata que as negociações preliminares decorreram com resultados satisfatórios nesse encontro ou que dele resulte que a conclusão do negócio é previsível se nada de anormal ocorrer.
Ora, nada permite presumir que tal tenha acontecido no caso em apreço, sendo certo que se provou que, após a visita da referida Ana ........., o R. marido continuou a publicar anúncios no Jornal de Notícias para venda do referido apartamento, o que ocorreu em 12, 19, 21, 26 e 27 de Junho de 1999 e em 22, 24 e 26 de Julho de 1999 (respostas aos artigos 7º e 11º da base instrutória ).
Por outro lado, provou-se que a A. não conhece os termos do contrato promessa de compra e venda celebrado entre os RR (e pelo R. marido elaborado) e os compradores, nem a data da sua celebração (resposta ao quesito 14º), apesar de ter ficado acordado que a comissão era devida a partir do recebimento do sinal (resposta ao quesito 3º).
Assim e considerando ainda que ficou estipulado o regime de “não exclusividade” (resposta ao quesito 9º) do qual resulta que o negócio se podia realizar por interferência de outro mediador ou directamente pelos RR, temos de concluir que a A. não alegou factos suficientes que permitam deduzir que a sua intervenção foi decisiva para a realização do negócio ou que nele teve intervenção directa.[cfr. neste sentido o acórdão do S.T.J. de 9.12.93, BMJ n.º 432, pág. 332]
Para além disso, a A. também não alegou que diligências efectuou, designadamente, se efectuou publicações em jornais, outras visitas ao apartamento com potenciais interessados, recolha de informação, etc. para que se concluísse que despendeu actividade relevante em execução do contrato celebrado com a R. e para, com base no princípio da boa fé, se puder defender que teria direito à remuneração acordada.
Em resumo e conclusão: dado que a A. não provou, como lhe competia, que a sua actividade contribuiu, de forma determinante, para a conclusão do negócio, não tem direito à comissão.
DECISÃO:
Pelo exposto, julga-se a apelação procedente e revoga-se a sentença recorrida, absolvendo os RR. do pedido.
Custas, em ambas as instâncias, pela A.
Porto, 20 de Setembro de 2001
Leonel Gentil Marado Serôdio
Norberto Inácio Brandão
Manuel Dias Ramos Pereira Ramalho