Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRP000 | ||
Relator: | ANA PAULA AMORIM | ||
Descritores: | CONTRATO DE ARRENDAMENTO RESOLUÇÃO REALIZAÇÃO DE OBRAS OBRAS NÃO AUTORIZADAS | ||
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Nº do Documento: | RP20120507655/07.5TJPRT.P1 | ||
Data do Acordão: | 05/07/2012 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO. | ||
Decisão: | ALTERADA A DECISÃO | ||
Indicações Eventuais: | 5ª SECÇÃO | ||
Área Temática: | . | ||
Legislação Nacional: | ARTº 1083º, Nº 2 DO CÓDIGO CIVIL | ||
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Sumário: | Face ao disposto no art. 1 083°, n. 2 do Código Civil, apesar de ter deixado de constituir fundamento autónomo de resolução do contrato de arrendamento, a realização de obras pelo arrendatário que não estão contempladas no contrato e sem autorização do senhorio constituem fundamento para resolução do contrato pelo senhorio, desde que o incumprimento pela sua gravidade ou consequências torne inexigível à outra parte a manutenção do arrendamento ou quando ocorra oposição pelo arrendatário à realização de obras ordenada por autoridade pública. | ||
Reclamações: | |||
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Decisão Texto Integral: | Desp-Obras-655-07.5TJPRT-1218-11TRP Trib Jud Porto Proc. 655-07.5TJPRT Proc. 1218-11-TRP Recorrente: B… e outros Recorrido: E…, Lda - Juiz Desembargador Relator: Ana Paula AmorimJuízes Desembargadores Adjuntos: José Alfredo Vasconcelos Soares Oliveira Ana Paula Carvalho * Acordam neste Tribunal da Relação do Porto (5ª secção – 3ª Cível)* * * * I. Relatório Na presente acção que segue a forma de processo prevista no DL 108/2006 de 08/06 em que figuram como: - AUTORES: B…, divorciado, arquitecto, residente na Rua …, …, …, Porto; C…, casada, médica, residente na Rua …, …, Porto; E…, casado, arquitecto, residente na Rua …, …, Porto; e - RÉ: E…, Lda com sede na Rua …, nº …, …, Porto pedem os Autores: - a resolução do contrato de arrendamento celebrado em 22 de Março de 1966, alterado a 07 de Julho de 1971 inerente ao prédio em causa nos autos; e - a condenação da Ré no despejo imediato do arrendado e na sua entrega livre de pessoas e coisas no estado em que o recebeu. Alegam para o efeito e em síntese, que por escritura pública de 22 de Março de 1966 o então proprietário do prédio sito na Rua …, freguesia de …, Porto, onde se encontra instalada uma Pensão Residencial cedeu o prédio para o exercício da indústria hoteleira mediante o pagamento da contrapartida anual de Esc.: 78 000$00, pagável em duodécimos de Esc.: 6 500$00. ascendendo o valor da renda devida à data da instauração da acção à quantia de € 519,72. No referido contrato ficou ainda convencionado o local de pagamento da renda, período de duração do contrato e bem assim, que são da conta do arrendatário as obras de conservação e limpeza interiores e a cargo dos senhorios as obras exteriores. No acordo celebrado foi concedida autorização ao arrendatário para montar um lavatório e bidés nos quartos de dormir dos andares, um sanitário no segundo quarto e a fazer uma divisória nos quartos de banho dos terceiros e quartos andares, para assim, isolar as bacias de banho das sanitas. Ficou, ainda, assente que o arrendatário não tinha autorização para fazer quaisquer outras obras, sem autorização por escrito dos senhorios e bem assim, que ficavam a pertencer ao prédio as obras que o arrendatário fizesse, constituíssem ou não benfeitorias, sem que este as pudesse retirar, pedir por elas indemnização ou usar de direito de retenção no fim do contrato. Mais referem, que por escritura pública de 07 de Julho de 1971 o contrato foi alterado. Alegam que em 09 de Maio de 1979 o pai dos Autores recebeu uma carta na qual a Ré comunicava a aquisição por trespasse a G… do estabelecimento comercial Pensão Residencial e a partir dessa data passou a assumir a posição de inquilino no contrato de arrendamento referenciado. A 19.04.2006 o Autor B… deslocou-se ao prédio arrendado e foi confrontado com as seguintes alterações: - ao nível do 1º piso, com a demolição de duas paredes no quarto identificado com o nº14; - com a demolição de acesso ao piso 2 e, no seu lugar, a introdução de uma copa equipada com frigorífico, fogão e pio; - introdução de uma instalação sanitária, até então equipada com banheira, sanita, lavatório e bidé; - encerramento de uma porta através da construção de uma nova parede; - construção de uma outra parede; - demolição de três paredes, junto às escadas do piso 1; - introdução de mais duas instalações sanitárias, equipadas com base de chuveiro, sanita e lavatório; - ao nível do piso 2, demolição da zona de copa, desmantelando-se parte de uma parede para rasgar uma nova passagem entre compartimentos; - demolição do acesso ao piso inferior, com introdução nesse lugar de uma instalação sanitária equipada com banheira, sanita, lavatório e bidé; - entranhou uma nova porta e outras três instalações sanitárias e roubou área aos compartimentos em que foram implantadas; - ao nível dos pisos 3 e 4, retirou área útil a outros seis compartimentos, distribuídos por aqueles dois pisos, nos quais construiu mais três instalações sanitárias. Alegam que as obras foram executadas sem autorização dos senhorios e à sua revelia. Para esse efeito, a Ré alterou a disposição dos compartimentos, aplicou cimento e tijolo na estrutura do prédio, tornando inamovíveis as divisórias, o que justifica a resolução do contrato de arrendamento. - Citada a Ré contestou, defendendo-se por excepção e por impugnação.Por excepção, invoca a caducidade do direito de acção, alegando para o efeito que em Fevereiro de 2005, o Autor B… acompanhado do cunhado H… visitaram o prédio e percorreram todo o espaço arrendado, ficando a conhecer as obras executadas. Admite que em 2006 o Autor B…, acompanhado de duas pessoas, voltou ao local para apurar se foram realizadas obras sem autorização dos senhorios. Refere, ainda, que as obras foram executadas pelo anterior arrendatário para o exercício da actividade prevista no contrato, por se mostrarem necessárias para o exercício da actividade e o respectivo projecto deu entrada na … em 1969. O projecto em causa foi do conhecimento e consentimento do então proprietário do prédio, pai dos Autores, há mais de 37 anos, pelo que, qualquer direito que pretendessem exercer prescreveu. O então senhorio era amigo do arrendatário G… e visita assídua do local arrendado, pelo que acompanhou e aprovou as obras que foram realizadas. Mais refere, que a alteração do contrato de arrendamento surge na sequência das obras realizadas, pois nessa alteração o senhorio limitou-se a aumentar a renda, passando o inquilino a suportar 4/5 da taxa de conservação do saneamento. Alega, ainda, que na visita efectuada pelo senhor arquitecto, a Ré esclareceu que as obras executadas são anteriores à criação da Ré e à chegada dos actuais sócios através da cessão de quotas de 1998. Conclui, assim, que depois das obras referenciadas não voltaram a ser realizadas outras da mesma natureza e por isso, as obras a que se reportam os Autores na petição não foram executadas pela Ré e nessa medida, não assiste aos Autores o direito à resolução do contrato. - Na resposta à contestação os Autores impugnam a matéria da excepção.- Elaborou-se o despacho saneador e dispensou-se a selecção da matéria de facto.- Realizou-se o julgamento, com gravação da prova.- Proferiu-se sentença e os Autores vieram interpor recurso da mesma.Nas alegações de recurso suscitaram a falta e deficiente gravação da prova, que impedia os recorrentes de requererem a reapreciação da prova e nessa conformidade, requereram a repetição do julgamento. Por despacho de fls. 216, oficiosamente, foi proferido despacho pelo Juiz do tribunal “a quo”, no sentido de se proceder à repetição da inquirição das testemunhas. - Procedeu-se à realização de novo julgamento, com a inquirição das testemunhas e junção de novos documentos e por despacho de fls. 300 foi declarada nula a anterior sentença (fls. 178 a 186) e determinou-se a elaboração de nova sentença.- Proferiu-se nova sentença que consta de fls. 324 a 333, com a decisão que se transcreve:“Por todo o exposto, considero procedente a excepção da caducidade do direito dos Autores resolverem o contrato com base na realização de obras não consentidas e, nesta conformidade, julgo improcedente a presente acção e, e, consequência, absolvo a Ré do pedido. Custas pelos Autores (art. 446º/1/2 CPC).” - Os Autores vieram interpor recurso da sentença. - Nas alegações que apresentaram, os recorrentes formularam as seguintes conclusões:1- A sentença recorrida desfocaliza e desvirtua o quadro fáctico espelhado no processo. 2- E, em parte, dá à lide uma definição que o direito rejeita e enjeita. 3- da sua decomposição, colhe-se dos factos provados estar fixado que: 3.1- Os antecessores dos AA., deram de arrendamento a G…, através de escritura pública, outorgada em 22/03/1966, as fracções correspondentes aos 1º, 2º, 3º e 4º andares do prédio urbano si to na Rua …, nº …, da freguesia de …, concelho do Porto, destinadas à indústria hoteleira, mediante o pagamento de uma renda mensal, que se cifra actualmente, em 519,72 euros (cfr. doc. junto a fls. 25 a 32 dos autos, aqui dado por inteiramente reproduzido) 3.2- do qual, os Autores são os únicos, plenos e legítimos proprietários – doc. 4 – 3.3- Através da carta de 9 de Maio de 1979, foi comunicado aos Pais dos Autores que a ré tomava de trespasse a G… o estabelecimento comercial Pensão residencial, sita no imóvel objecto da presente acção de despejo. 3.4- Daí em diante, aquela sociedade passou a figurar como inquilina e vinculou-se ao contrato de arrendamento outorgado, por escritura pública a 22 de Março de 1966 e liquida actualmente €519,72 de renda mensal – doc. 5, 3.5- No qual, foi, entre o mais, acertado que o seu destino era apenas para a indústria hoteleira; 3.6- convencionado o prazo de um ano, com início em 1 de Abril de 1966; 3.7- estipulada a renda anual de 78.000$00 – setenta e oi to mi l escudos –, pagável em duodécimos de 6.500$00 – sei s mi l e quinhentos escudos - na residência dos senhorios no primeiro dia útil do mês imediatamente anterior àquele a que respeitasse; 3.8- estabelecido ser da conta do arrendatário as obras de conservação e limpeza interiores e as exteriores a cargo dos senhorios; 3.9- ajustado que o inquilino tinha autorização para montar um lavatório e bidés nos quartos de dormi r dos andares, um sanitário no segundo andar e a fazer uma divisória nos quartos de banho dos terceiros e quartos andares, para assim, i solar as bacias de banho das retretes; 3.10- assente que o arrendatário não poderia fazer quaisquer outras obras, sem autorização por escrito dos senhorios – doc. 6, cujo o teor foi dado por integralmente reproduzido –; 3.11- convencionado que ficam a pertencer ao prédio as obras que o arrendatário faça no prédio, constituam ou não benfeitorias, sem que este as possa retirar, pedir por elas indemnização ou usar de direi to de retenção no fim do contrato – cfr. cl.11.º do doc. 6 -; 3.12- Este contrato de arrendamento foi, posteriormente alterado, por escritura pública, lavrada a 7 de Julho de 1971, no 3. º Cartório Notarial do Porto – doc. 7, cujo teor foi dado por integralmente reproduzido – 3.13- arrendado que, aliás, o arrendatário se vinculara a restitui-lo, no termo do contrato, aos senhorios no bom e perfeito estado em que o recebera, nomeadamente, tecto, paredes, canalizações, janelas, instalações eléctricas, louças sanitárias, termoacumulador e respectivos acessórios e móveis de cozinha. 3.14- Acontece que, o autor B… visitou o edifício arrendado e foi confrontado, ao nível do 1.º piso, com a demolição de duas paredes, no quarto identificado com o n.º 14, 3.15- com a demolição do acesso ao piso 2 e, no seu lugar, a introdução de uma copa equipada com frigorifico, fogão e pio; 3.16- com a introdução de uma instalação sanitária, até então inexistente, equipada com banheira, sanita, lavatório e bidé; 3.17- com o encerramento de uma porta, através da construção de uma nova parede; 3.18- com a construção de uma outra parede; 3.19 com a demolição de três paredes, junto às escadas do Piso 1; 3.20- e com a introdução de mais duas instalações sanitárias, equipadas com base de chuveiro, sanita e lavatório – tudo como «melhor se descreve no auto de vistoria identificado como documento 8 e no documento 9, os quais se dão por reproduzido; 3.21- Igualmente, ao nível do Piso 2, o Autor B…, constatou que a inquilina demoliu a zona da copa e desmantelou parte de uma parede para rasgar uma nova passagem entre compartimentos, 3.22- demoliu por completo o acesso ao piso inferior e introduziu no seu lugar uma instalação sanitária equipada com banheira, sanita, lavatório e bidé; 3.23- entranhou uma nova porta e outras três instalações sanitárias e roubou área aos compartimentos em que foram implantadas – doc. 8, junto com a petição inicial-; 3.24- ao nível dos pisos 3 e 4, retirou área útil a outros seis compartimentos, distribuídos por aqueles dois pisos, nos quais erigiu mais três instalações sanitárias – doc. 8 – 3.25- nessas obras foi aplicado cimento, tijolo e outros materiais. 3.26- Esclareceu, ainda, que em Fevereiro de 2005 um dos AA, acompanhado do cunhado, visitou o arrendado, tendo percorrido todos os andares e divisões e constatou as alterações/obras - ponto 5 da fls. 3 da sentença- . 3.27- Por fim, conclui a Douta Sentença a fl.330 que “ Da análise da prova resultou adquirido que foram realizadas obras, porém não se sabe por quem e se houve ou não autorização do primitivo Senhorio Dr. I…”- fim de citação. 4- Quanto à motivação, é com pesar que constatamos que esta foi afeiçoada à prova produzida. 5- Atendam-se os respectivos depoimentos, o da testemunha J… com inicio às 14h54m36ss e fim às 15h27m,36S e o da testemunha K… com inicio às 16h04m11s e fim às 16h20m56s do dia 14.12.2010. 6- Com efeito, nos pontos identificados com o n.ºs 7 e 8, da pagina 2 da sentença recorrida, menciona o Tribunal “ a quo” que foi proferida sentença a fls.178 a 189, datada de 4/02/2009 7- e que, em função da deficiência na gravação da prova, realizou-se a reprodução da prova produzida e no decurso desta, o Tribunal decidiu declarar nula a decisão de fl s 178 a 186 -. 8- Ambas as sentenças foram proferidas pelo mesmo magistrado, foram ouvidas exactamente as mesmas testemunhas sobre a mesma matéria, excepção a uma das testemunhas arrolada pelos autores que não prestou depoimento na “segunda” audiência. 9- Assim, na acta de audiência de julgamento realizada em 29 de Janeiro de 2009 (fls 174 e ss ), constam, entre outras, como testemunhas J…, que respondeu a toda a matéria da petição inicial 10- e K…, a qual respondeu a toda a matéria da contestação. 11- Por sua vez, na acta de audiência de julgamento de 21 de Outubro de 2010 (fls. 292 ess) constam estas mesmas testemunhas e responderam à mesma matéria supra referida.-. 12- Mau grado, na senda do que hoje é verdade, amanhã é mentira, diz o Tribunal “ a quo” sobre estas duas testemunhas: 13- “– J…. Esta testemunha aludiu que em Abril de 2006 acompanhada do seu cunhado B… e do Eng.º Civil L… se deslocou ao arrendado e elaborou conjuntamente com este o documento junto a fls.39 a 42…Afirmou que os AA ficaram muito surpreendidos com as obras, dado que a casa foi concebida por um arquitecto conceituado e com muito rigor arquitectónico. Segundo a sua opinião as obras teriam cerca de 15 anos e não são obras de 30/40 anos” – 1º, 2º e 3º parágrafos de fl.182 – 14- “– K…, que é empregada de quartos da indústria hoteleira e trabalha desde 1974 na pensão objecto dos autos. A testemunha referiu que o Sr. G… conhecia o senhorio, com quem às vezes conversava e tomava café. Acrescentou que quando começou a trabalhar a pensão já estava como actualmente se encontra, à excepção de alguns canos e azulejos que arranjavam e substituíam. Mencionou que, em Fevereiro de 2005, viu duas pessoas que foram visitar a casa, uma delas referiu que tinha muitas saudades, na medida em que lá viveu até aos 8 anos. Questionada esta testemunha sobre como ainda se recorda da data disse “não sabe porquê mas que a data nunca mais lhe saiu da ideia” – fl. 182 e 183 – 15- Neste dia, para o Tribunal “a quo”, “as referidas testemunhas, à excepção desta última (K…) que prestou um depoimento relativamente apaixonado e interessado no que toca à data da visita dos AA, atentas as razões de ciência invocas, revelaram conhecimento directo dos factos…” – quinto paragrafo de fl. 183- 16- Ou seja, nas palavras do Tribunal, a testemunha J… relevou ter conhecimento directo dos factos, 17- já pelo contrário, a testemunha K… prestou um depoimento relativamente apaixonado e interessado no que toca à data da visita dos AA, repete-se, no que toca á data da vi si ta dos AA (Fevereiro de 2005) 18- Depois de uma arrojada cambalhota, a sentença recorrida refere-se a esta testemunha do seguinte modo: “ Realce-se que a última testemunha enunciada (K…) foi essencial para a decisão da matéria de facto, revelou ter boa memória, no que toca a datas e a nomes e sobre os factos fundamentais, concretamente quando é que um dos AA, acompanhado do seu cunhado, foi visitar o locado – Fevereiro de 2005-“ último parágrafo da p.6 da sentença recorrida – 19- Isto é, agora a testemunha K… foi alçada pelo Tribunal a quo a testemunha essencial para a decisão da matéria de facto, porque revelou ter boa memória no que toca a nomes (primeiro e actual patrões) e quanto a datas, pois referiu Fevereiro de 2005, como data da visita dos Autores (!!! !!), exactamente a mesma data que tinha referido no “primeiro” julgamento. 20- Mais ainda, é que a testemunha K… nem no nome do seu primeiro patrão acertou, apesar de, Venerando Desembargadores, a sentença dizer que sim no último parágrafo da p.5 – “A testemunha referiu que o Sr. G…, seu patrão em 1974…”. 21- Quem foi patrão da testemunha e tomou de arrendamento durante cerca de 13 anos o imóvel foi G… – cfr. docs. 2; 6 e 7 juntos com a petição inicial- . 22- É que embora a testemunha K… tendo o mesmo apelido que o seu primeiro patrão (O…), a verdade é que nem assim acertou. Enfim, nem no ponto mais simples de analisar, o tribunal o soube fazer. 23- Quanto ao depoimento da testemunha J…, é baldeado na sentença recorrida para o descrédito do parcial e relativamente apaixonado. 24- Na verdade, o Tribunal “a quo” num dia estranha a precisão da «memória da testemunha K…, noutro entranha-o no rigor e boa memória no que toca a datas 25- e que, segundo o Tribunal “a quo”, se revela essencial na decisão da matéria de facto. 26- Testemunha esta que trabalha para a Ré desde 1974, a realizar a limpeza dos quartos da residencial. Enfim…não se compreende, nem se aceita a posição do Tribunal, rica em contradições ofensivas e insanáveis. 27- De realçar que, no imóvel está a ser explorada uma residencial, o que só por si, colide com o facto de os Senhorios se apresentarem na mesma e terem, como afirmou a testemunha K…, percorrido todos os andares e divisões a tirar fotografias, ignorando os hóspedes, a sua privacidade e os seus pertences. 28- Já a testemunha J…, num dia, revelou conhecimento directo dos factos e no outro é desvalorizada. 29- A isto advém que, independentemente da prova a produzir em audiência de julgamento, sempre foi preocupação do Tribunal “ a quo” moldar a prova ao destino da improcedência da acção traçada na primeira sentença. 30- Por isso, a fl.298 in fine, o Tribunal “a quo” indefere a junção dum documento na medida em que “não é possível admitir a requerida junção dos documentos, considerando ainda que a mesma poderia tornar inatingível a motivação e sentença proferida”. 31- Já mais adiante, a fl.299, refere quanto à junção desse mesmo documento que…”assim, o despacho supra dado na parte relativa à admissão do documento, pois proferido por manifesto lapso, pois os documentos não colidem com a sentença proferida”. 32- É de exaltar, quanto à data da visita que na comunicação, que mereceu acolhimento por parte da ré, é mencionado expressamente pelos Autores que vão visitar, no dia 19 de Abril de 2006, o imóvel de modo a verificarem se foram efectuadas obras sem a necessária autorização dos proprietários – doc. de fl. 253 -. 33- Neste mesmo sentido vai o depoimento da testemunha J… - com inicio às 14h54m36s s e fim às 15h27m,36S -, que acompanhou essa vistoria e elaborou o subsequente relatório de fls. 39 a 41 e referiu a surpresa e tristeza dos Autores quanto se depararam com a destruição arquitectónica do imóvel. 34- Com efeito, os Autores só tiveram conhecimento das obras realizadas pela Ré no dia 19/04/2006, pois, caso contrário, não necessitavam de realizar a identificada vistoria. 35- Por outro lado, no contrato de arrendamento – doc. 6, junto com a P.I. – celebrado em 1966, as partes acordaram que “o arrendatário não poderá fazer quaisquer outras obras além das referidas no artigo 4º e 5º sem a autorização dos senhorios dada por escrito” – cl. 6ª – 36- e acrescentaram “que estas obras serão feitas sob a fiscalização do senhorios” – cl. 7ª -. Este contrato veio a ser alterado em 1971 – doc. 7, junto com a P.I. -, mas, no tocante às obras, manteve as limitações supra – mencionadas. 37- Logo, conclui r como a Douta Sentença o faz a fl.330 que “ Da análise da prova resultou adquirido que foram realizadas obras, porém não se sabe por quem e se houve ou não autorização do primitivo Senhorio Dr. I…”, é desconexo do teor do contrato de arrendamento que, como vimos, define com rigor e minúcia que obras é podem ser executadas pelo inquilino, 38- limitadas à autorização para montar um lavatório e bidés nos quartos de dormi r dos andares, um sanitário no segundo andar e a fazer uma divisória nos quartos de banho dos terceiros e quartos andares, para assim, i solar as bacias de banho das retretes. 39- Logo, as obras só podem ter sido executadas pela Ré, pois é descabido considerar que o contrato contempla obras que já tivessem sido realizadas. 40- Igualmente, no contrato de arrendamento ficou assente que o arrendatário não poderia fazer quaisquer outras obras, sem autorização por escrito dos senhorios – doc. 6, cujo teor foi dado por integralmente reproduzido –. 41- a qual, até aos dias de hoje jamais apareceu, porque inexiste. 42- Tanto assim é que, a 06 de Novembro de 1991 é remetida pela Ré à mãe dos Autores uma carta, na qual aquela solicita a esta a autorização para efectuar obras – fl.158 -. 43- Esta carta mereceu resposta a 27 de Novembro do mesmo ano, na qual a mãe dos autores refere “… fico a aguardar o projecto e descrição dos trabalhos para apreciação e aprovação, condição essencial para os podermos autorizar”- fl.159 -. 44- A 19 de Dezembro seguinte, a Ré responde a esta missiva, a qual é acompanhada da planta do imóvel, que tem escrito, de forma perceptível, primeira e segunda fases – fls.165 a 170 -. A autorização a esta solicitação não foi junta aos autos pela Ré, nem o podia ser pois, inexistiu. 45- Segundo esta carta, a Ré pretendia dividir em duas fases o projecto de alteração do imóvel. Estas plantas, que foram, aliás mal, desvalorizadas e esquecidas pelo tribunal, mostram que as alterações mencionadas no relatório de vistoria ainda não tinham sido efectuadas naquela data. 46- Pois, se assim não fosse, a Ré não i ria pedir autorização para realizar obras que já estavam executadas. É a Ré que junta as plantas com a carta de 19 de Dezembro de 1991 e descreve as duas fases de execução da obra, que não foram autorizadas pelos autores. Essas plantas estão longe do encontrado no locado a 19 de Abril de 2006 - cfr. fls 39 a 42 e fl.166 a 170- 47- Por outro lado, é de destacar que a Ré junta aos autos uma memória descritiva, sem no entanto, juntar a consequente licença de obra, que teria de existir, caso o processo camarário fosse avante. 48- A isto acresce que, o depoimento da arquitecta J… - com inicio às 14h54m36ss e fim às 15h27m,36S - menciona que pelos materiais empregues nas obras que verificou como executadas não tinham mais de quinze anos e foi também com base nesse depoimento e nos documentos juntos aos autos , que o tribunal considerou, agora bem, que o autor B… ao visitar o edifício arrendado foi confrontado, ao nível do 1.º piso, com a demolição de duas paredes, no quarto identificado com o n.º 14, - facto provado – 49- com a demolição de acesso ao piso 2 e, no seu lugar, a introdução de uma copa equipada com frigorifico, fogão e pio - facto provado -; 50- com a introdução de uma instalação sanitária, até então inexistente, equipada com banheira, sanita, lavatório e bidé - facto provado -; 51- com o encerramento de uma porta, através da construção de uma nova parede- facto provado -; 52- com a construção de uma outra parede- facto provado -; 53- com a demolição de três paredes, junto às escadas do Piso 1- facto provado -; 54- e com a introdução de mais duas instalações sanitárias, equipadas com base de chuveiro, sanita e lavatório – tudo como melhor descreve no auto de vistoria identificado como documento 8 e no documento 9, os quais se dão por reproduzidos -- facto provado 55- Igualmente, ao nível do Piso 2, o Autor B…, constatou que a inquilina demoliu a zona da copa e desmantelou parte de uma parede para rasgar uma nova passagem entre compartimentos- facto provado -, 56- demoliu por completo o acesso ao piso inferior e introduziu no seu lugar uma instalação sanitária equipada com banheira, sanita, lavatório e bidé- facto provado -; 57- entranhou uma nova porta e outras três instalações sanitárias e roubou área aos compartimentos em que foram implantadas – doc. 8, junto com a petição inicial - - facto provado -; 58- ao nível dos pisos 3 e 4, retirou área útil a outros seis compartimentos, distribuídos por aqueles dois pisos, nos quais erigiu mais três instalações sanitárias – doc. 8, junto com a petição inicial – - facto provado – 59- nessas obras foi aplicado cimento e tijolo e outros materiais facto provado -. 60- Por tudo isto e apesar de a sentença ter concluído que foram realizadas obras, flui que, a decisão explicativa recaída sob o n.º 5 e 7.º dos factos provados dever ser substituído pelo provado integralmente da matéria constante no artigo 13.º da Petição Inicial: “a 19 de Abril de 2006, o autor B… visitou o edifício arrendado e foi confrontado…”. 61- Ao invés, no n.º 7 dos factos provados com esclarecimentos, não deverá constar que essa visita foi uma segunda visita, porque não o foi, 62- pelo que, deverá passar a mencionar que: “em Abril de 2006 o Autor B… deslocou-se ao locado…” e não “…deslocou-se novamente ao locado…”. 63- Quanto aos factos não provados e em função dos documentos juntos aos autos e da prova testemunhal gravada supra mencionada, deverá ser considerada provada a matéria constante do artigo 24º da P.I., nomeadamente que “à revelia dos Senhorios e sem a sua autorização, a Ré alterou a disposição interna do local arrendado.” 64- Até porque, ao longo de toda a Contestação a Ré não nega que as obras foram feitas, afirma que estas foram executadas pelos anteriores sócios da Ré com conhecimento e autorização, que não junta, do Senhorio. 65- Esta posição é descabida de qualquer sentido e contém no seu seio contradições insanáveis, uma vez que, o cuidado do Senhorio quanto à questão das obras no imóvel, está sobejamente espelhado nos autos, 66- quer através do contrato de arrendamento, quer através da troca de cartas ocorrida em 1991 e nas plantas que acompanharam a carta de 19 de Dezembro de 1991, 67- as quais reflectiam, de acordo com a própria Ré, o estado do imóvel à época e as alterações então pretendidas, distribuídas por duas fases distintas, que apesar de não autorizadas, vieram a ser constatadas a 19 de Abril de 2006. 68- Talqualmente, a quantidade e a (falta) qualidade das alterações verificadas e por todos constatadas no imóvel, são incompatíveis com o apreço que este merecia da parte dos Autores. 69- Daí, carecer de qualquer sentido, afirmar-se que os Autores as teriam autorizado, pois é um juízo discordante com as contrapartidas que os Autores recebem da Ré que, para além das obras estouvadas, se limitam à renda € 519,72 mensais, por quatro pisos no centro da cidade do Porto, com 122 m2/piso, o que atira o preço m2 para valor insignificantes. 70- Sem prejuízo do exposto até ao momento quanto ao desconhecimento da realização das obras por parte dos autores, a sentença considerou ainda que se um dos co-proprietários teve conhecimento das obras, os demais também. 71- Até porque, refere a decisão, “seria extremamente injusto exigir aos arrendatários que comunicassem as diversas vicissitudes a todos os senhorios”-fl.332- 72- Só que, aqui não se exige que comuniquem “as diversas vicissitudes”, mas há alterações que estão obrigados a fazê-lo, independentemente do Tribunal “ a quo” as considerar justas, injustas ou nem sequer as considerar, sob pena de incumprirmos leis e contratos. 73- É que, á mesa de qualquer café poderemos discutir se determinada lei é justa, injusta, certa ou desacertada, mas não numa decisão judicial. 74- Sem nos pronunciarmos sobre a subjectividade da argumentação, consideramos que a presunção a que chega é violenta para os senhorios. 75- Até porque, os exemplos que a seguir a sentença refere não têm a mínima analogia com os autos e esquece os efeitos e a ratio do registo predial, cuja certidão se obtém no próprio dia e elenca e identifica os proprietários – como se vê da certidão do imóvel junta aos autos, doc.4, junto com a petição inicial-. 76- Sob pena de em situações análogas, bastar o conhecimento de um comproprietário para vincular os demais, 77- nomeadamente, na comunicação para o exercício de preferência da venda de uma das partes de um outro consorte; no pedido de autorização de obras ou no caso do comproprietário dar de arrendamento o imóvel, sem o consentimento dos demais comproprietários, em de violação dos art .ºs 1407º; 985º e n.º2 do 1024º do Código Civil-. 78- Aliás, o conhecimento da realização das obras por parte dos proprietários tem de decorrer de factos inequívocos, que inexistem nos autos. 79- E tanto é assim que, se a Ré pretender reclamar judicialmente algum direito referente ao imóvel tem de obrigatoriamente demandar os comproprietários, sejam eles três, quatro ou cinco e, em algumas delas, os cônjuges. 80- Por tudo isto, a argumentação espelhada na sentença não colhe e dai dever ser a mesma revogada, pois viola frontalmente os art.ºs 64.º , n.º1, al.d) do Rau e artigos 1074, n.º2; 1083; 1407º; 985º e n.º2 do 1024º do Código Civil, e, em consequência ser o contrato de arrendamento declarado resolvido e ordenado o despejo da Ré. Concluem os Autores por pedir a revogação da sentença recorrida. - A Ré veio apresentar contra-alegações onde, em síntese, considera que a decisão da matéria de facto não merece censura.- O recurso foi admitido como recurso de apelação.- Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.- II. Fundamentação1. Delimitação do objecto do recurso O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente não podendo este tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, sem prejuízo das de conhecimento oficioso – art. 660º/2, 684º/3, 690º/1 CPC. As questões a decidir: - reapreciação da prova, com fundamento em erro na apreciação da prova, quanto aos pontos 5 e 7 dos factos provados e art. 24º da petição; - a excepção de caducidade é oponível aos Autores pertencendo o prédio em compropriedade aos senhorios, quando apenas um dos comproprietários tomou conhecimento do facto fundamento da resolução; - se a realização de obras não autorizadas pelos senhorios, constitui fundamento para a resolução do contrato. - 2. Os factosCom relevância para a apreciação das conclusões de recurso cumpre ter presente os seguintes factos provados no tribunal da primeira instância: 1. Os antecessores dos AA., P… e G…, deram de arrendamento a G…, através de escritura pública, outorgada em 22/03/1966, as fracções correspondentes aos 1º, 2º, 3º e 4º andares do prédio urbano sito na Rua …, nº …, da freguesia de …, concelho do Porto, destinadas à indústria hoteleira, mediante o pagamento de uma renda mensal, que se cifra actualmente, em 519,72 euros (cfr. doc. junto a fls. 25 a 32 dos autos, aqui dado por inteiramente reproduzido) –resp. aos arts. 2º a 10º e 12º da petição inicial. 2. O referido contrato foi alterado por escritura pública datada de 7/07/1971 (cfr. doc. junto a fls. 33 a 38, que aqui se tem por integralmente reproduzido) – resp. ao art. 11º da petição inicial. 3. Por cartas, registadas com aviso de recepção, datadas de 8/05/1979 e de 9/05/1979 foi comunicado ao Dr. I…, o trespasse do estabelecimento comercial, instalado no imóvel supra referido, de G… à Ré, “E…, Ldª”- resp. ao art. 1º da petição inicial. 4. Os AA. registaram, em 24/02/1999, a aquisição através de partilha por morte, do imóvel atrás mencionado (cfr. certidão de fls. 21 a 23 e doc. de fls. 139 a 152, que aqui se dão por inteiramente reproduzidos) - resp. ao art. 2º da p.i. 5. Provado, com esclarecimentos: Em Fevereiro de 2005, um dos AA., acompanhado do cunhado, visitou o arrendado, tendo percorrido todos os andares e divisões, e constatou as alterações/obras que, na data referida infra em 8, foram elencadas no documento junto a fls. 39 a 41 (doc. aqui dado por inteiramente reproduzido) – resp. aos arts. 13º a 23º da petição inicial. 6. Provado apenas que foi aplicado cimento, tijolo e outros materiais naquelas obras –resp. ao art. 26 da p.i.. - Da contestação de fls. 51 a 56. 7. Provado com esclarecimentos: Em Abril de 2006, o A. B… deslocou-se novamente ao arrendado, acompanhado pela sua cunhada, Arqª J… (mulher do co-A., D…) e pelo Engº civil L…, com a finalidade de verificarem a realização de obras não autorizadas, tendo visitado/vistoriado todo o locado, tirado medidas e fotos (resp. aos arts. 10º, 11º e 12º da contestação). 8. Na sequência desta visita, foi elaborado, pela mencionada Arqª J…, o doc. junto a fls. 39 a 41, supra referido no item 5ª, com base na visita ao locado e na sua comparação com a planta do prédio, datada de 1936 e aprovada a 22 de Dezembro de 1950, doc. junto a fls. 43 (documentos aqui dados por integralmente reproduzidos). 9. Dou por inteiramente reproduzidos a planta e a memória descritiva, juntos a fls. 59 a 61, apresentadas pelo então arrendatário do locado, G…, com um carimbo aposto com a data de entrada na Direcção Geral do Turismo de 3 de Julho de 1969, bem como o doc. de fls. 154 e 155. 10. Dou por inteiramente reproduzidos os documentos juntos a fls. 24, 153, 156 a 157, 158, 159 e 165 a 171 e 253. - 3. O direito- Reapreciação da prova - Nas conclusões de recurso sob os pontos 1 a 69 os recorrentes requerem a reapreciação da prova, com fundamento em erro na apreciação da prova, quanto aos pontos 5 e 7 dos factos provados e art. 24º da petição. - Nos termos do art. 712º/1 a) CPC a decisão do tribunal de 1ª instância sobre a matéria de facto pode ser alterada pela Relação:“Se do processo constarem todos os elementos de prova, que serviram de base à decisão sobre os pontos da matéria de facto em causa ou se, tendo ocorrido gravação dos depoimentos prestados, tiver sido impugnada, nos termos do art. 690º-A, a decisão com base neles proferida.” O art. 690º-A CPC estabelece os ónus a cargo do recorrente que impugna a decisão da matéria de facto, nos seguintes termos: “1. Quando se impugne a decisão proferida sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição: a) Quais os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados; b) Quais os concretos meios probatórios constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida. 2. No caso referido na alínea b) do número anterior, quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ainda ao recorrente, sob pena de rejeição do recurso, indicar os depoimentos em que se funda, por referência ao assinalado na acta, nos termos do disposto no nº2 do art. 522º-C. 3. Na hipótese prevista no número anterior, incumbe à parte contrária proceder, na contra-alegação que apresente, à indicação dos depoimentos gravados que infirme as conclusões do recorrente, também por referência ao assinalado na acta, ao abrigo do disposto no nº2 do art. 522º-C. (…) 5. Nos casos referidos nos nº 2 a 4, o tribunal de recurso procederá à audição ou visualização dos depoimento indicados pelas partes, excepto se o juiz relator considerar necessária a sua transcrição, a qual será realizada por entidades externas para tanto contratadas pelo tribunal. “ No caso concreto realizou-se o julgamento com gravação dos depoimentos prestados em audiência e os recorrentes indicam os pontos de facto impugnados, bem como, os depoimentos das testemunhas e documentos em que fundamentam a sua oposição. Verifica-se, assim, nos termos do art. 712º/1 CPC e do art. 690º-A do mesmo diploma, na redacção do DL 183/2000 de 18/08 que estão reunidos os pressupostos de ordem formal para proceder à reapreciação da matéria de facto. - A respeito da gravação da prova e sua reapreciação cumpre considerar, como refere Abrantes Geraldes, que funcionando o Tribunal da Relação como órgão jurisdicional com competência própria em matéria de facto: “ deve fazer uma apreciação crítica das provas que motivaram a nova decisão, de acordo com o preceituado no art. 653º/2, especificando, tal como o tribunal de 1ª instância, os fundamentos que foram decisivos para a convicção do julgador. “ (Temas da Reforma de Processo Civil, vol. II, pag.270).Nessa apreciação, cumpre ainda, ao Tribunal da Relação, nos termos do art. 712º/2 CPC: “reapreciar as provas em que assentou a parte impugnada da decisão, tendo em atenção o conteúdo das alegações de recorrente e recorrido, sem prejuízo de oficiosamente atender a quaisquer outros elementos probatórios que hajam servido de fundamento à decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados.” Decorre deste regime que o Tribunal da Relação tem acesso directo à gravação oportunamente efectuada, mesmo para além dos concretos meios probatórios que tenham sido indicados pelo recorrente e por este transcritos nas alegações. Refere Abrantes Geraldes que: “Constitui esta uma forma de atenuar a quebra dos princípios da imediação e da oralidade susceptíveis de exercer influência sobre a convicção do julgador, ao mesmo tempo que corresponderá a uma solução justificada por razões de economia e celeridade processuais.” (ob. cit., pag. 272). Cumpre ainda considerar a respeito da reapreciação da prova, em particular quando se trata de reapreciar a força probatória dos depoimentos das testemunhas, que neste âmbito vigora o princípio da livre apreciação, conforme decorre do disposto no art. 396º CC e art. 655º CPC. Como bem ensinou Alberto dos Reis: “… prova (…) livre, quer dizer prova apreciada pelo julgador segundo a sua experiência e a sua prudência, sem subordinação a regras ou critérios formais preestabelecidos, isto é, ditados pela lei.” (Código de Processo Civil Anotado, vol IV, pag. 569). Daí impor-se ao julgador o dever de fundamentação das respostas à matéria de facto – factos provados e factos não provados (art. 653 CPC). Acresce que está em causa reapreciar os fundamentos do despacho que se pronunciou sobre a matéria de facto e apurar em que medida ocorreu erro na apreciação da prova, o que apenas é possível aferir se do despacho constarem os argumentos que motivaram a decisão do Juiz. Afigura-se-nos relevante citar a este respeito o Ac. Rel. de Guimarães onde se refere: “… esta exigência de especificar os fundamentos decisivos para a convicção quanto a toda a matéria de facto é essencial para o Tribunal da Relação, nos casos em que há recurso sobre a decisão da matéria de facto, poder alterar ou confirmar essa decisão. É através dos fundamentos constantes do despacho em que se respondeu à matéria da base instrutória que este Tribunal vai controlar, através das regras da lógica e da experiência, a razoabilidade da convicção do juiz do Tribunal de 1ª instância (Ac. Rel. Guimarães 20.04.2005 - www. dgsi.pt). A este respeito sublinha-se no Ac. STJ 28.05.2009: “Devendo, porém, a reapreciação da prova na Relação, de acordo com o regime legal aqui em vigor, e sem, por isso, em si mesmo, se subverter o princípio da livre apreciação das provas estabelecido no art. 655°, nº 1 (10), ponderar que, na formação da convicção do julgador de 1ª instância, poderão ter entrado elementos que, em princípio, no sistema da gravação sonora dos meios probatórios oralmente prestados, não podem ser importados para a gravação, como sejam aqueles elementos intraduzíveis e subtis, como a mímica e todo o processo exterior do depoente que influem, quase tanto como as suas palavras, no crédito a prestar-lhe, existindo, assim, actos comportamentais ou reacções dos depoentes que apenas podem ser percepcionados, apreendidos, interiorizados e valorados por quem os presencia e que não podem ficar gravados ou registados para aproveitamento posterior por outro tribunal, que vá reapreciar o modo como no primeiro se formou a convicção do julgador (12).” (Proc. 115/1997.5.1 – www. dgsi.pt) Atenta a posição expressa na doutrina e na jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, quando o Tribunal da Relação é chamado a pronunciar-se sobre a reapreciação da prova, no caso de se mostrarem gravados os depoimentos, deve considerar os meios de prova indicados pela partes e confrontá-los com outros meios de prova que se mostrem acessíveis, a fim de verificar se foi cometido ou não erro de apreciação que deva ser corrigido (Abrantes Geraldes “Recursos em Processo Civil – Novo Regime, pag. 299 e Ac. STJ 20.09.2007 CJSTJ, XV, III, 58, Ac STJ 28.02.2008 CJSTJXVI, I, 126, Ac. STJ 03.11.2009 – Proc. 3931/03.2TVPRT.S1; Ac. STJ 01.07.2010 – Proc. 4740/04.7 TBVFX-A.L1.S1 – ambos em www.dgsi.pt). Ponderando estes aspectos cumpre reapreciar a prova – testemunhal, documental -, face aos argumentos apresentados pelos recorrentes e recorrida, tendo presente o despacho que se pronunciou sobre as respostas à matéria de facto. Procedeu-se à audição do CD que contém a prova gravada na audiência de julgamento do dia 14.12.2010 e analisados os depoimentos prestados, bem como, os documentos juntos aos autos, conclui-se que a decisão sobre a matéria de facto, quanto aos pontos 5 dos factos provados e art. 24º da petição não merecem censura, justificando-se a alteração quanto ao ponto 7 dos factos provados pelos motivos que a seguir se expõem. - Na petição os Autores alegaram os seguintes factos:“- art. 13º: A 19 de Abril de 2006, o Autor B… visitou o edifício arrendado e foi confrontado, ao nível do 1º piso, com a demolição de duas paredes, no quarto identificado com o n.° 14; - art. 14º: com a demolição de acesso ao piso 2 e, no seu lugar, a introdução de uma copa equipada com frigorifico, fogão e pio; - art. 15º: com a introdução de uma instalação sanitária, até então inexistente, equipada com banheira, sanita, lavatório e bidé; - art. 16°: com o encerramento de uma porta, através da construção de uma nova parede; - art. 17°: com a construção de uma outra parede; - art. 18°: com a demolição de três paredes, junto às escadas do Piso 1; - art. 19º: com a introdução de mais duas instalações sanitárias, equipadas com base de chuveiro, sanita e lavatório — tudo como melhor descreve no auto de vistoria identificado como documento 8 e no documento 9, os quais se dão por reproduzidos – - art. 20º: ao nível do Piso 2, o Autor B…, constatou que a inquilina demoliu a zona da copa e desmantelou parte de uma parede para rasgar uma nova passagem entre compartimentos, - art. 21°: demoliu por completo o acesso ao piso inferior e introduziu no seu lugar uma instalação sanitária equipada com banheira, sanita, lavatório e bidé; - art. 22°: entranhou uma nova porta e outras três instalação sanitária e roubou área aos compartimento em que foram implantadas — doc. 8 -; - art. 23° : ao nível dos pisos 3 e 4, retirou área útil a outros seis compartimentos, distribuídos por aqueles dois pisos, nos quais erigiu mais três instalações sanitárias — doc. 8 — “ A matéria em causa mereceu a seguinte resposta: “5. Provado, com esclarecimentos: Em Fevereiro de 2005, um dos AA., acompanhado do cunhado, visitou o arrendado, tendo percorrido todos os andares e divisões, e constatou as alterações/obras que, na data referida infra em 8, foram elencadas no documento junto a fls. 39 a 41 (doc. aqui dado por inteiramente reproduzido) – resp. aos arts. 13º a 23º da petição inicial.” - “- Art. 24º: à revelia dos senhorios e sem a sua autorização, a Ré alterou a disposição interna do local arrendado. “A matéria em causa mereceu a resposta: “Não provado.” - Na Contestação, a Ré alegou os seguintes factos:“- art. 10°: Mercê dessa sua simpática atitude foi com surpresa que A R. recebeu em inícios de 2006 o mesmo A. Sr. Arquitecto B… agora acompanhado de duas pessoas que referiu como o “Sr. Engenheiro” e a “Senhora Arquitecta”. - art. 11°: Destinando-se tal visita — ao que disse o Sr. Arquitecto — a verificar se a R. tinha feito obras sem autorização dos senhorios. - art. 12°: Tirando, então, medidas e fotos a todos os pisos e instalações que o Sr. Arquitecto no ano antecedente vira e visitara. “ A matéria mereceu a seguinte resposta: “- Da contestação de fls. 51 a 56. 7. Provado com esclarecimentos: Em Abril de 2006, o A. B… deslocou-se novamente ao arrendado, acompanhado pela sua cunhada, Arqª J… (mulher do co-A., D…) e pelo Engº civil L…, com a finalidade de verificarem a realização de obras não autorizadas, tendo visitado/vistoriado todo o locado, tirado medidas e fotos (resp. aos arts. 10º, 11º e 12º da contestação). “ - O Juiz do tribunal “a quo” fundamentou a decisão nos termos que se transcrevem:“O tribunal firmou a sua convicção relativamente às respostas antecedentes, numa apreciação global e crítica de toda a prova produzida, nomeadamente: - No depoimento das testemunhas: 1º) J…, que é arquitecta de profissão e mulher do co-A., D…. Esta testemunha aludiu que em Abril de 2006 acompanhada do seu cunhado B… e do eng. Civil L… se deslocou ao arrendado e elaborou conjuntamente com este o documento junto a fls. 39 a 42, documento esse executado com recurso à visita feita e à comparação com a planta de fls. 43. Afirmou que os AA. ficaram muito surpreendidos com as obras, dado que a casa foi concebida por um arquitecto conceituado e com muito rigor arquitectónico. Segundo a sua opinião as obras teriam cerca de 15 anos e não são obras com 30/40 anos *** 2º) Q…, que declarou conhecer o legal representante da Ré, pois foi sócio “fundador” da firma Ré e proprietário da pensão em discussão nos autos, tendo comunicado a constituição da sociedade ao senhorio em meados de 1979.Relatou que “recebeu a pensão por trespasse” do Sr. G…, que esteve lá durante cerca de 9/10 meses, e que se deslocou recentemente ao imóvel, o qual se encontra no mesmo estado, não tendo encontrado alterações/diferenças. Referiu que não conheceu pessoalmente o Dr. I…, mas que o Sr. G… lhe disse que se dava bem com o senhorio. *** 3º) S…, que já explorou, com o seu filho, o estabelecimento aproximadamente de 1989 a 1998. Adiantou que fez obras no arrendado, mas pediram autorização à senhoria. Obras essas que consistiram “em colocar bocas-de-incêndio”, outras que tiveram a ver com a substituição de canos entupidos e outras ainda que consistiram em pintar o imóvel. Esclareceu que a carta de fls. 165 foi escrita pelo seu filho, mas que nunca chegaram a fazer os balneários/vestiários para a empregada, pois não foram pressionados para esse efeito e as condições económicas não o permitiram. Mais expressou que se deslocou ao locado a convite do representante da Ré, há cerca de um ano, e este estava na mesma, sem quaisquer alterações. Nunca conheceu os AA. *** 4º) K…, que é empregada de quartos na indústria hoteleira e trabalha desde 1974 na pensão, objecto dos autos.A testemunha referiu que o Sr. G…, seu patrão em 1974, conhecia o senhorio, o Dr. I…, com quem às vezes conversava e tomava café. Acrescentou que quando começou a trabalhar a pensão já estava como actualmente se encontra, à excepção de alguns canos ou azulejos que arranjavam ou substituíam, de uma pintura, de um “polivan” e de uma banheira que terão mudado. Afirmou peremptoriamente que, em Fevereiro de 2005, na altura do carnaval, viu duas pessoas que foram visitar a casa, uma delas era o filho do Sr. I… e a outra um cunhado da primeira. Diz que foi chamar o patrão ao café e que quem acompanhou a visita à residencial foi o seu patrão, o Sr. Q…. Nessa ocasião, percorreram os andares, a ver como estavam as divisões e tiraram fotografias. Posteriormente, por intermédio do seu patrão, soube que tais pessoas voltaram ao locado, acompanhadas de uma arquitecta e que tiraram medidas e fotografias. *** Expresse-se que a primeira testemunha, nesta audiência de julgamento, prestou um depoimento relativamente “apaixonado”, ou seja, relativamente parcial, em relação a determinadas questões, tais como, quando questionada sobre se os irmãos T… foram ao locado, quando e como tomaram conhecimento das obras, se algum dos AA., designadamente se o cunhado B… foi, em momento anterior a Abril de 2006, ao arrendado.Posteriormente, quando confronta com a carta de fls. 253 esta testemunha confirmou que a carta foi elaborada e remetida pelo seu marido, mas que não sabe como os AA. foram informados das obras. Ora, nesta parte, o aludido depoimento, atentos os princípios da imediação e da oralidade, não convenceu e, por essa razão, não colhe. *** As restantes testemunhas, atentas as razões de ciência invocadas, revelaram conhecimento directo sobre os factos a que depuseram e, pela forma isenta e objectiva com que o fizeram, convenceram o tribunal das afirmações proferidas.Realce-se que a última testemunha enunciada, foi essencial para a decisão da matéria de facto, revelou ter uma boa memória, no que toca a datas e a nomes, soube perfeita e espontaneamente dizer quem era o seu actual e quem foi o seu primitivo patrão, quando iniciou as funções na hospedaria (em 1974) e sobre factos fundamentais, concretamente quando é que um dos AA., acompanhado do seu cunhado, foi visitar o locado – em Fevereiro de 2005. O mencionado depoimento não foi abalado por nenhum outro depoimento, sendo certo que, note-se, o mesmo, atentos os já referidos princípios da imediação e da oralidade, se revelou isento e objectivo. - A apreciação dos sobreditos depoimentos foi conjugada com todos os documentos juntos aos autos. Da análise da prova resultou adquirido que foram realizadas obras, porém não se sabe por quem e se houve ou não autorização do primitivo senhorio, Dr. I…. *** No que toca à matéria não provada a mesma resultou de uma absoluta falta de prova.”- Os recorrentes consideram face aos depoimentos das testemunhas J… e K…, bem como, o teor dos contratos de arrendamento celebrados e troca de correspondência entre a Ré e o senhorio em 1991 e plantas juntas aos autos e ainda, o facto da Ré admitir na contestação que as obras foram executadas pelos anteriores sócios, com conhecimento e autorização do senhorio, se justifica alterar a decisão à matéria de facto impugnada e sugerem a seguinte resposta:- os pontos n.º 5 e 7.º dos factos provados: provado integralmente a matéria constante no artigo 13.º da Petição Inicial: “a 19 de Abril de 2006, o autor B… visitou o edifício arrendado e foi confrontado…”. - o ponto n.º 7 dos factos provados deverá passar a mencionar que: “em Abril de 2006 o Autor B… deslocou-se ao locado…” e não “…deslocou-se novamente ao locado…”. - art. 24º da petição - provado, nomeadamente que “à revelia dos Senhorios e sem a sua autorização, a Ré alterou a disposição interna do local arrendado.” - A recorrida considera que não se justifica qualquer alteração.- Analisando.A reapreciação da matéria de facto versa fundamentalmente sobre duas questões: - apurar se o Autor B… deslocou-se uma ou duas vezes ao local arrendado e em que ocasião; - se as obras referenciadas na petição foram executadas pela Ré, sem autorização dos senhorios. Os recorrentes ao suscitarem a reapreciação da prova fazem uma análise comparativa dos depoimentos prestados pelas testemunhas nas duas audiências de julgamento e bem assim, da decisão da matéria de facto nas duas sentenças. Contudo, o tribunal de recurso não pode atender a tais argumentos para aferir do erro na apreciação da prova. Os recorrentes suscitaram a questão da gravação deficiente dos depoimentos das testemunhas no julgamento realizado em 20.01.2009, o que foi confirmado pelo Juiz do tribunal “a quo” e determinou a realização de novo julgamento, com anulação da sentença então proferida, despachos que não foram objecto de impugnação. Os apontamentos pessoais quer do magistrado que presidiu ao julgamento, quer dos mandatários das partes não constituem elementos de prova e apenas a gravação dos depoimentos das testemunhas pode ser objecto de reapreciação. Considerando o exposto, na reapreciação da prova cumpre atender apenas ao depoimento das testemunhas prestado na audiência de julgamento do dia 14.12.2010, sendo de todo irrelevante as considerações tecidas pelos recorrentes e recorrida sobre o anterior depoimento das testemunhas, quando como resulta dos autos, estamos perante um novo julgamento. - Procedeu-se à audição da gravação dos depoimentos das testemunhas e a respeito das concretas questões, objecto de impugnação, as testemunhas apresentaram os seguintes depoimentos:- J… – arquitecta, mulher do Autor D…. A testemunha referiu que em Abril de 2006, a pedido dos irmãos T…, realizou a vistoria ao prédio sito na Rua …. A visita foi agendada com cerca de 15 dias de antecedência e no dia em que compareceu, aguardavam a sua chegada. A vistoria foi realizada com a colaboração de um engenheiro – Engenheiro L…. Mais referiu, que elaborou um relatório, que corresponde ao documento que lhe foi exibido e que consta de fls. 39 (doc. nº 8 junto com a petição) e bem assim, três plantas nas quais faz uma análise comparativa, por recurso à planta original. A testemunha referiu que a planta original ou projecto reporta-se aos anos 50 e foi partindo desse projecto aprovado e licenciado pela Câmara Municipal …, que anotou as alterações em conformidade com o que observou no local. Referiu, ainda, que na Câmara Municipal … não consta qualquer alteração ao projecto inicial e só aquele projecto obteve licença. Disse que na Câmara Municipal não deu entrada qualquer pedido para alteração com o objectivo de realização de obras. Na vistoria analisou espaço a espaço e piso a piso e verificou que o prédio sofreu alterações, porque foram demolidas paredes, introduzidas novas paredes e instalações sanitárias, nos três pisos. Ao nível de alterações do ponto de vista estrutural verificou que foi eliminado o acesso ao 1º piso, através de uma escada. Esclareceu que o prédio dispunha de uma escada social e de acessos de serviço e estes últimos foram eliminados e no mesmo local foi construído um novo compartimento, uma copa. Verificou, ainda, o encerramento de um vão e a introdução de casa-de-banho em todos os quartos. Com a construção de casas-de-banho nos quartos observa-se descontinuidade do rodapé, do tecto, de remate do tecto. A caixa de escada sofreu alterações mais profundas porque representa uma alteração na tipologia da habitação. Anotou todas as alterações nas plantas. Referiu desconhecer quando e quem realizou as obras que configuram alterações ao projecto inicial, nomeadamente se as mesmas foram objecto de autorização pelo anterior proprietário, pai dos Autores. Disse, ainda, que não sabe quem procedeu à demolição das escadas de serviço. Contudo, a testemunha precisou que pela análise dos materiais aplicados – modelos de louças sanitárias, torneiras, séries, materiais utilizados nos acabamentos – considera que as obras foram realizadas há não mais de 20 anos ou 15 anos. Verificou a aplicação de pladur, que constitui uma solução relativamente recente. Concluída a vistoria e elaborado o relatório, os Autores ficaram surpreendidos com as alterações e ficou convencida que não tinham conhecimento das alterações e apenas tomaram conhecimento das mesmas com a elaboração do relatório. Declarou desconhecer se os Autores tinham conhecimento da realização das obras e ainda, desconhecer se em data anterior o Autor B…, acompanhado do cunhado, se deslocou ao local. Referiu, ainda, que o projecto de construção do prédio é da autoria do arquitecto W… (pai) e tinha por objecto a construção de uma casa familiar com um consultório médico. No prédio está instalada uma residencial. Declarou, ainda, que não tem um contacto próximo com os irmãos “T…” e desconhece desde quando a questão “Prédio da Rua …” passou a ser tratada na família. Casou-se em 2005 e não tem conhecimento da forma como era gerido o património dos pais dos Autores, revelando ter conhecimento que depois da morte da mãe dos Autores, mais propriamente depois da partilha, o prédio em causa passou a ser administrado pelos irmãos, mas era a Drª. C… que tratava dos assuntos. Exibido o doc. de fls. 253, declarou desconhecer a carta e o motivo pelo qual se faz referencia a “ fomos informados no passado mês de Fevereiro “, mas admitiu que a mesma está assinada pelo seu marido e o papel timbrado pertence ao seu marido. - - Q… – comerciante, que explorou a pensão residencial em causa durante cerca de 10 meses, há 30 anos (por referência à data do julgamento). A testemunha referiu que por trespasse adquiriu o estabelecimento industrial ao Sr G… e nunca conheceu o pai dos Autores, nem qualquer membro da família “T…”. Referiu que nunca demoliu paredes, nem escadas e limitou-se a pintar as paredes e a colocar alcatifa no chão, porque na altura se usava este tipo de revestimento no pavimento. Todos os quartos tinham casas-de-banho com banheira e apenas dois dispunham de chuveiro. A pensão dispunha de uma única escada. A recepção dispunha de um balcão que é o que tem. Enquanto explorou a pensão pagou as rendas a uma empresa imobiliária “U…”, pois mensalmente o funcionário da referida empresa deslocava-se à pensão para receber as rendas. Quando recentemente se deslocou ao local, a pedido do Sr G…, em data anterior ao primeiro julgamento (2009), verificou que estava tudo na mesma, com excepção da alcatifa, que foi retirada e nas duas casas-de-banho com chuveiro foram colocadas banheiras. Disse, ainda, que a pensão possui 15 quartos (afirmação que suscitou algumas objecções por parte do mandatário dos Autores, porque aquando do primeiro julgamento a testemunha terá indicado outro número, aspecto que o Juiz do tribunal “a quo” também anotou, fazendo apelo aos seus apontamentos, referindo que a testemunha terá respondido “ 11 a 14 quartos”). Referiu, ainda, que passou o estabelecimento a dois senhores brasileiros “torna – viagem” Exibidas as fotografias juntas a fls. 254 não conseguiu explicar se eram visíveis alterações no prédio. Declarou, por fim, que quando celebrou o contrato de trespasse foi-lhe facultado o contrato de arrendamento, mas não se lembra das cláusulas estabelecidas quanto à realização de obras. Disse, ainda, que desconhece se o Sr G… fez obras. - - S… – declarou que a partir de 1990 e durante 10 anos foi sócio da Ré, juntamente com o seu filho. A testemunha começou por referir que apesar de ter sido sócio da Ré e nessa qualidade explorar o estabelecimento comercial em causa nestes autos, o seu filho tinha um papel mais activo na gestão do estabelecimento. Referiu, também, que explorou o estabelecimento durante 10 anos e disse ainda, “como recebeu, entregou”. Não executou obras e limitou-se a colocar um alarme, por advertência dos Bombeiros. Nunca conheceu o senhorio, pois procedia ao pagamento da renda numa empresa imobiliária, sita à Rua …. O prédio arrendado possuía uma única escada. Confrontado com os documentos de fls. 158, 159 e 165 esclareceu que pediu autorização ao senhorio para executar obras no local e apesar de concedida autorização, nunca realizou as obras. Confrontado com as plantas que constam da carta que dirigiu ao senhorio não conseguiu esclarecer o seu conteúdo, nomeadamente a razão da menção “1ª fase” e “2ª fase”. Referiu, ainda, que há cerca de dois anos deslocou-se à pensão e verificou que não havia qualquer alteração, por comparação com a data em que explorou o estabelecimento. - - K… – empregada de limpeza na pensão residencial, onde exerce a sua profissão desde 1974.A testemunha referiu que o primeiro patrão se chamava G1…, com quem trabalhou durante cerca de cinco anos. Conheceu o anterior proprietário do prédio que por vezes, a pedido do seu patrão se deslocava ao local arrendado, para verificar da necessidade de execução de obras. Disse, ainda, que quando o seu patrão pretendia fazer qualquer alteração comunicava ao senhorio, mas nunca chegou a realizar qualquer obra de alteração. Declarou que quando a sociedade passou a explorar o estabelecimento, o Sr Q… aplicou papel de parede e alcatifa no soalho. Recebeu o estabelecimento no estado em que actualmente se encontra. Realizaram-se entretanto pequenas obras, como substituição de base de chuveiro por banheira (porque a base de chuveiro estava furada), substituíram-se os azulejos e canos, quando entupiram. Referiu, ainda, que o turismo exigiu a realização de obras, mas não foram feitas. Referiu, também, que depois do Sr G… “passar a casa”, nunca mais viu os senhorios. A testemunha declarou, que em Fevereiro de 2005 deslocaram-se ao estabelecimento duas pessoas, sendo que uma, identificou-se como filho do senhorio e o outro, como seu cunhado e pretendiam ver o prédio. A testemunha dirigiu-se ao Café para chamar o Sr V…, seu patrão. Esclareceu que a visita ocorreu na altura do Carnaval. A testemunha não acompanhou a visita, mas sabe através de comentários do seu patrão, que percorreram todo o prédio e tiraram fotografias. Posteriormente, em 2006, voltaram lá, mas nessa altura a testemunha não se encontrava presente no local e foi o seu patrão, que comentou que estiveram lá os senhorios com uma arquitecta, para tirar medidas e fotografar. - A respeito da data em que um dos senhorios – recorrentes / autores - se deslocou ao prédio arrendado, apenas as testemunhas J… e K… revelaram ter conhecimento dos factos, sendo certo que tal como referiu o Juiz do tribunal “ a quo “, o depoimento da testemunha K… revelou-se determinante para apurar os factos.Resulta do seu depoimento que esteve presente em Fevereiro de 2005, quando um dos proprietários do prédio se deslocou ao prédio arrendado e não esteve presente em qualquer outra visita dos proprietários. Não soube identificar a pessoa que recebeu, revelando ter conhecimento que era filho do proprietário do prédio, porque foi assim que se identificou. Conclui-se que a pessoa em causa seria um dos Autores, pois apenas o senhorio teria interesse em conhecer o local. O seu depoimento mostrou-se credível, pois não foi infirmado por qualquer outro meio de prova. Com efeito, apenas a testemunha J… veio depor a esta matéria e apesar de referir que ficou convencida que todos os Autores tomaram conhecimento das alterações depois da vistoria, nada revelou saber a respeito de uma visita anterior. Por outro lado, o teor do documento junto pelos Autores a fls. 253 a 257, é bem revelador que em data anterior à realização da vistoria, pelo menos o Autor D…, que assina a carta, revela ter conhecimento da realização de obras, porque na carta faz tal referência - “foram executadas obras nesse imóvel, nossa propriedade, sem a necessária autorização dos proprietários …”. Este documento reforça a credibilidade do depoimento da testemunha K…. Contudo, face ao teor da carta, que tem a data de 06 de Abril de 2006 onde se refere “fomos informados no passado mês de Fevereiro”, poderia discutir-se se a visita ocorreu em Fevereiro de 2005 ou em Fevereiro de 2006. Temos como certo que em Fevereiro de 2005 ocorreu uma visita, porque a testemunha assim o afirmou com grande convicção e segurança, o que não invalida que se tenha realizado outra visita em Fevereiro de 2006, sendo certo que nem a Ré o refere na contestação, nem os Autores na resposta à contestação e a própria carta também não o refere. O facto de obterem a informação em Fevereiro de 2006, não significa que apenas nessa data foi efectuada a visita ao local arrendado. Quanto à vistoria realizada em Abril de 2006 resulta admitido pelas partes nos articulados que o Autor B… esteve presente. Contudo, não se pode afirmar que o Autor B… “esteve de novo no local arrendado”, quando se deslocou em Abril de 2006 ao prédio arrendado, porque do depoimento das testemunhas não se pode extrair tal conclusão. Assim, apenas temos como certo que em Fevereiro de 2005, na altura do Carnaval um dos autores e um cunhado visitaram o local arrendado e em Abril de 2006 o Autor B…, a testemunha J… e um engenheiro (Engenheiro L…) visitaram o prédio arrendado. Conclui-se, assim, que quanto à concreta matéria do ponto 5 e 7 dos factos provados, apenas em relação ao ponto 7 se justifica alterar a decisão, eliminando a expressão “ novamente “. - A respeito da matéria do art. 24º da petição (à revelia dos senhorios e sem a sua autorização, a Ré alterou a disposição interna do local arrendado.), que mereceu a resposta “Não provado”, a decisão não merece censura. Tal como se mostra formulado, o art. 24º da petição engloba matéria de direito e matéria de facto e contém conclusões. Este aspecto condiciona a reapreciação da matéria de facto. Determina o art. 713º/2 CPC que na elaboração do acórdão deve observar-se, na parte aplicável, o preceituado nos art. 659º a 665º CPC. O art. 659º/3 CPC dispõe que: “Na fundamentação da sentença, o juiz tomará em consideração os factos admitidos por acordo, provados por documentos ou por confissão reduzida a escrito e os que o tribunal colectivo deu como provados, fazendo o exame critico das provas de que lhe cumpre conhecer.” Contudo, o art. 646º/4 CPC, prevê: “Têm-se por não escritas as respostas do tribunal colectivo sobre questões de direito e bem assim as dadas sobre factos que só possam ser provados por documentos ou que estejam plenamente provados, quer por documento, quer por acordo ou confissão das partes.” Como refere Lebre de Freitas: “o tribunal colectivo exorbita da sua competência (atribuída para a livre apreciação da prova dos factos da causa) quando se pronuncie sobre questões de direito ou sobre factos que só possam ser provados por documento ou estejam plenamente provados por documento, admissão ou confissão. Compete, efectivamente, ao juiz singular determinar, interpretar e aplicar a norma jurídica (art. 659º/2) e pronunciar-se sobre a prova dos factos admitidos, confessados ou documentalmente provados (art. 659º/3).” (ob cit., vol. II, pag. 605) Ás conclusões de direito são assimiladas, por analogia, as conclusões de facto, ou seja, “os juízos de valor, em si não jurídicos, emitidos a partir dos factos provados e exprimindo, designadamente, as relações de compatibilidade que entre eles se estabelecem, de acordo com as regras da experiência.” (Lebre de Freitas, ob. cit., vol II, pag. 606) Antunes Varela considera que deve ser dado o mesmo tratamento “ás respostas do colectivo, que, incidindo embora sobre questões de facto, constituam em si mesmas verdadeiras proposições de direito” (Manual de Processo Civil, pag. 648) Em qualquer das circunstâncias apontadas, confirmando-se que, em concreto, determinada expressão tem natureza conclusiva ou é de qualificar como pura matéria de direito, deve considerar-se não escrita, nos termos do art. 646º/4, sem necessidade de anulação do julgamento. No caso concreto, a matéria do art. 24º da petição está relacionada com a matéria de facto dos artigos que o precedem. Com efeito, nos art. 13º a 23º os Autores enunciam as alterações introduzidas no local arrendado e no art. 24º da petição atribuem à Ré a execução das obras, as quais, no entender dos Autores alteram a disposição interna do local arrendado. No art. 24º da petição pretende-se, assim, apurar se foi a Ré que executou as obras. Porém, a afirmação que as mesmas foram executadas “à revelia dos senhorios e sem a sua autorização … e alteram a disposição interna do local arrendado.”, contém em si preposições de direito e conclusões. Nos termos do art. 342º/1 CC recai sobre os Autores – senhorio - o ónus de alegação dos factos constitutivos do direito que invocam, ou seja, os factos que fundamentam a resolução do contrato, no caso, a realização de obras que pela sua natureza comprometem a manutenção do vínculo contratual. Ao arrendatário cumpre alegar e provar os factos impeditivos do direito, como seja, a existência de autorização do senhorio ou a realização das obras com conhecimento e sem oposição do senhorio (art. 342º/2 CC). Não recai sobre o senhorio – autor, o ónus da prova da falta de autorização. Por outro lado, saber se as obras realizadas alteram a disposição interna do local arrendado, constitui uma conclusão a extrair da análise dos demais factos que enunciam as obras executadas e à qual poderá chegar o tribunal, na fase da aplicação do direito aos factos. Neste contexto, apesar do tribunal julgar “não provada” o art. 24º da petição, deve julgar-se não escrita a resposta ao ponto 24º, quanto ás concretas expressões: “à revelia dos senhorios e sem a sua autorização … e alteram a disposição interna do local arrendado.”, por conterem matéria de direito e conclusões. Desta forma fica prejudicada a reapreciação da matéria de facto. Resta, assim, a matéria de facto contida no artigo 24º e que pode ser objecto de reapreciação: saber se foi a Ré quem executou as obras enunciadas nos art. 13º a 23º da petição. Do depoimento das testemunhas resulta que a Ré desde que ocupou a posição de arrendatário não introduziu no prédio as alterações enunciadas nos art. 13º a 23º da petição. Nenhuma testemunha revelou ter conhecimento da realização das obras a que se reporta a matéria dos pontos 13º a 23º, nomeadamente a testemunha K… que trabalha na Residencial desde 1974, como empregada de limpeza. A testemunha J... que veio depor a esta matéria não revelou ter conhecimento quando e quem executou as alterações no prédio. Apenas revelou ter conhecimento que alguns materiais aplicados, pelas características que apresentavam não teriam mais de 20 e 15 anos, o que se revela insuficiente para imputar apenas à Ré a realização das alterações no local arrendado. Com efeito, as alterações em causa reportam-se a demolição de paredes e de escadas de serviço, bem como, construção de novos compartimentos, para além das instalações sanitárias. É certo que resulta do teor do documento junto a fls. 158, 159, 165 a 171, que em Novembro de 1991 a Ré solicitou ao senhorio autorização para realizar obras e as plantas juntas com a carta contêm o esboço para a realização das projectadas obras. Essas obras consistiam na substituição de tubos de água e esgotos, alinhamento das paredes da casa de banho, reboco e pintura das paredes em geral e outras pequenas reparações. Tais obras não apresentavam qualquer ponto em comum, com as referenciadas nos art. 13º a 23º da petição, sendo certo que não cabe ao tribunal aferir se os esboços que constam das plantas correspondem às obras enunciadas na referida carta. Acresce que pelo facto do inquilino pedir autorização para realizar obras, não se pode concluir que as realizou. Da mesma forma, o silêncio dos senhorios a este respeito, não significa autorização, quando como resulta dos termos do contrato de arrendamento, a realização de obras estava condicionada a prévia autorização do senhorio. Os Autores não alegaram que as obras foram executadas pelo arrendatário antes e depois da celebração do contrato de trespasse do estabelecimento comercial. Os Autores atribuem apenas à Ré a realização das obras que enunciam nos pontos 13º a 23º da petição e nesse pressuposto fundam o direito à resolução do contrato, mas da prova não se pode concluir que as obras foram executadas pela Ré. Acresce referir, face ao alegado pelos Apelantes nos pontos 64 e 65 das conclusões de recurso, que muito embora a Ré admita na contestação que o prédio apresenta as alteração descritas nos art. 13º a 23º da petição, não admite que as mesmas foram executadas pela própria, conforme resulta dos art. 14º, 15º, 16º, 36º e 37º da contestação. A Ré não admite que as obras foram executadas pelos anteriores sócios. Refere, apenas que foram executadas em data anterior à constituição da sociedade Ré, em 1978 e em data anterior à chegada dos actuais sócios através da cessão de quotas de 1998, acabando por atribuir a realização das obras, há mais de 37 anos, a G…, com conhecimento do senhorio. (art. 25º a 38º da contestação). Conclui-se, assim, que a decisão quanto ao ponto 24º da petição, não merece censura e como tal, julga-se não provado o seguinte facto: “a Ré executou as obras enunciadas nos art. 13º a 23º da petição.” - Em face do exposto mantém-se a decisão da matéria de facto, com excepção da expressão “ novamente “ no ponto 7 dos factos provados e nessa conformidade julgam-se parcialmente procedentes as conclusões de recurso sob os pontos 1 a 69.- Na apreciação das demais questões e por efeito da reapreciação da prova, cumpre ter presente os seguintes factos provados:1. Os antecessores dos AA., P… e G…, deram de arrendamento a G…, através de escritura pública, outorgada em 22/03/1966, as fracções correspondentes aos 1º, 2º, 3º e 4º andares do prédio urbano sito na Rua …, nº …, da freguesia de …, concelho do Porto, destinadas à indústria hoteleira, mediante o pagamento de uma renda mensal, que se cifra actualmente, em 519,72 euros (cfr. doc. junto a fls. 25 a 32 dos autos, aqui dado por inteiramente reproduzido) –resp. aos arts. 2º a 10º e 12º da petição inicial. 2. O referido contrato foi alterado por escritura pública datada de 7/07/1971 (cfr. doc. junto a fls. 33 a 38, que aqui se tem por integralmente reproduzido) – resp. ao art. 11º da petição inicial. 3. Por cartas, registadas com aviso de recepção, datadas de 8/05/1979 e de 9/05/1979 foi comunicado ao Dr. I…, o trespasse do estabelecimento comercial, instalado no imóvel supra referido, de G… à Ré, “E…, Ldª”- resp. ao art. 1º da petição inicial. 4. Os AA. registaram, em 24/02/1999, a aquisição através de partilha por morte, do imóvel atrás mencionado (cfr. certidão de fls. 21 a 23 e doc. de fls. 139 a 152, que aqui se dão por inteiramente reproduzidos) - resp. ao art. 2º da p.i. 5. Provado, com esclarecimentos: Em Fevereiro de 2005, um dos AA., acompanhado do cunhado, visitou o arrendado, tendo percorrido todos os andares e divisões, e constatou as alterações/obras que, na data referida infra em 8, foram elencadas no documento junto a fls. 39 a 41 (doc. aqui dado por inteiramente reproduzido) – resp. aos arts. 13º a 23º da petição inicial. 6. Provado apenas que foi aplicado cimento, tijolo e outros materiais naquelas obras –resp. ao art. 26 da p.i.. - Da contestação de fls. 51 a 56. 7. Provado com esclarecimentos: Em Abril de 2006, o A. B… deslocou-se ao arrendado, acompanhado pela sua cunhada, Arqª J… (mulher do co-A., D…) e pelo Engº civil L…, com a finalidade de verificarem a realização de obras não autorizadas, tendo visitado/vistoriado todo o locado, tirado medidas e fotos (resp. aos arts. 10º, 11º e 12º da contestação). 8. Na sequência desta visita, foi elaborado, pela mencionada Arqª J…, o doc. junto a fls. 39 a 41, supra referido no item 5ª, com base na visita ao locado e na sua comparação com a planta do prédio, datada de 1936 e aprovada a 22 de Dezembro de 1950, doc. junto a fls. 43 (documentos aqui dados por integralmente reproduzidos). 9. Dou por inteiramente reproduzidos a planta e a memória descritiva, juntos a fls. 59 a 61, apresentadas pelo então arrendatário do locado, G…, com um carimbo aposto com a data de entrada na Direcção Geral do Turismo de 3 de Julho de 1969, bem como o doc. de fls. 154 e 155. 10. Dou por inteiramente reproduzidos os documentos juntos a fls. 24, 153, 156 a 157, 158, 159 e 165 a 171 e 253. - - Questão prévia - regime jurídico –Na presente acção os Autores-recorrentes pretendem que se reconheça o seu direito à resolução do contrato de arrendamento, com fundamento na realização de obras pelo inquilino, no local arrendado, que alteram a estrutura interna do prédio não autorizadas pelo senhorio. Na sentença, o Juiz do tribunal “a quo” julgou procedente a excepção de caducidade deduzida pela Ré na contestação e absolveu os Autores do pedido. A presente acção foi instaurada em 04.04.2007. O NRAU – Lei 06/2006 de 27/02 – entrou em vigor em 27 de Junho de 2006. O art. 59º/1 do citado diploma, sob a epígrafe “Aplicação no Tempo”, passou a dispor: “O novo regime do arrendamento urbano aplica-se aos contratos celebrados após a sua entrada em vigor, bem como ás relações contratuais constituídas que subsistam dessa data, sem prejuízo do previsto nas normas transitórias.” O nº3 do mesmo preceito prevê: “As normas supletivas contidas no novo regime do arrendamento urbano só se aplicam aos contratos celebrados antes da entrada em vigor da presente lei quando não sejam em sentido oposto ao de norma supletiva vigente aquando da celebração, caso em que é essa a norma aplicável.” O art. 60º determina, ainda: “É revogado o Regime do Arrendamento Urbano, aprovado pelo DL 321-B/90 de 15/10, com todas as alterações subsequentes, salvo nas matérias a que se referem os artigos 26º e 28º da presente lei.” A nova lei estabeleceu um conjunto de normas transitórias considerando o facto da existência de contratos celebrados ao abrigo do RAU e celebrados antes da entrada em vigor do RAU. Maria Olinda Garcia refere a este respeito, que para proceder à exacta delimitação do regime aplicável aos arrendamentos vigentes à data da entrada em vigor do novo regime deverá atender-se à distinção feita pelo nº2 do art. 12º do Código Civil. Refere, ainda, que: “… as normas da nova lei que dispõem sobre condições de validade substancial ou formal do arrendamento não devem ter aplicação retroactiva, continuando, portanto, essa matéria a ser disciplinada pela lei vigente à data da celebração do contrato. Pelo contrário, as normas que dispõem directamente sobre o conteúdo da relação de arrendamento abrangem as relações já constituídas, tendo, portanto, aplicação imediata.” (A Nova Disciplina do Arrendamento Urbano, pag. 51. A propósito desta matéria Cunha de Sá e Leonor Coutinho referem que: “Os arrendamentos urbanos de pretérito que subsistam à data da entrada em vigor do NRAU são por ele abrangidos, nos termos estabelecidos pelos art. 59º/1 e 26º e seguintes, epigrafados “normas transitórias”. Uma vez que o arrendamento se traduz numa situação duradoura, o NRAU respeita o passado decorrido sob a égide da lei antiga e para o futuro abrange na sua disciplina, em termos específicos, os efeitos que se vierem a produzir após a sua entrada em vigor.“ Esses termos específicos são estabelecidos pelo NRAU tendo em atenção a espécie do contrato e a data da sua celebração.” (Arrendamento 2006- Nova Lei, pag. 61-62). Concretizando esta posição e em anotação ao art. 59º do NRAU os citados autores referem: “Conjugando todos os preceitos do NRAU que se relacionam com a sucessão das leis durante a vigência dos arrendamentos urbanos, para fins habitacionais e não habitacionais, que subsistam à data da entrada em vigor do NRAU, temos o seguinte quadro: - é a lei em vigor ao tempo da conclusão do contrato que regula as condições da validade substancial e o potencial dos seus efeitos; - quanto aos efeitos jurídicos do contrato que se traduzem em situações duradouras, respeitam-se os efeitos já produzidos sob o domínio da lei antiga e os efeitos futuros passam a reger-se: > pelos preceitos imperativos do NRAU; > pelos preceitos supletivos do NRAU, mas apenas quando não forem de sentido oposto ao de norma supletiva da lei vigente ao tempo da celebração do contrato, caso em que é esta a norma aplicável; > pelos preceitos resultantes das normas transitórias do NRAU ( artigos 26º a 58º, 59º/2 ), a saber: (…) contratos sem duração limitada - transmissão por morte do arrendatário – contrato para habitação: art. 26º/2, 28º e 57ºdo NRAU; (…) - denúncia pelo senhorio – arrendamentos para habitação: > art. 26º/4/5, art. 28º do NRAU; > art. 1101º a 1104º do CC; > art. 107º do RAU“ .(ob. cit., pag. 111). No caso concreto, o contrato foi celebrado em 22 de Março de 1966, portanto em data anterior à entrada em vigor do novo regime do arrendamento. Contudo, os factos imputados ao arrendatário, ocorrem a partir de data indeterminada e mantêm-se à data da instauração da acção – obras no local arrendado. Cumpre, assim, aplicar o novo regime jurídico, para apreciar dos fundamentos de resolução do contrato, já que na data da instauração da acção – 2007 - vigorava o novo regime e não existem normas transitórias que tutelem o direito invocado. Não se trata de apreciar da validade formal e substancial do contrato, pois os Autores não questionam a validade do contrato, de tal forma, que é no pressuposto da sua existência que vem peticionar a resolução. Como se refere no Ac. STJ 08.04.2010: “ … em matéria de fundamentos da resolução do contrato, deverá aplicar-se o regime em vigor à data da propositura da acção, sendo esse o momento temporal decisivo para apurar se os factos invocados têm eficácia constitutiva do direito invocado, posto que se trata de saber se, nessa data, assistia ao senhorio o direito que se arroga.” (– Proc. 667/05.3 TBCBT.G1.S1 e Ac. Rel. Porto 29.09.2011 – Proc.278/2001.P1, Ac. 19.03.2009 – Proc. 09ª0338, todos em www.dgsi.pt) - - Da excepção de caducidade -Na sentença o Juiz do tribunal “a quo” julgou procedente a excepção de caducidade do direito de acção, com fundamento no facto da acção ter sido instaurada depois de decorrido um ano sobre a data em que um dos comproprietários tomou conhecimento das alterações introduzidas no local arrendado, considerando nomeadamente, como se transcreve: “… que basta que um dos AA. tenha conhecimento do facto que leva à resolução do contrato, “in casu” das obras. Explicitando. Não seria razoável exigir que todos os AA. se deslocassem ao arrendado para verificar as obras, pois se assim fosse facilmente se defraudaria a lei, impedindo-se a caducidade. Para tanto bastava que apenas fosse um ou alguns dos AA. ao locado. Por outro lado, por essa forma, nunca o inquilino teria a possibilidade de provar que os restantes AA. tomaram conhecimento da situação. Acresce que, na hipótese em apreço, face ao documento de fls. 153, se constata que foi enviada pela co-A. C…, na qualidade de senhoria, em Julho de 2005, uma carta à Ré para que esta passasse a efectuar o pagamento da renda para a morada nela constante e do documento de fls. 24 resulta que era aquela que passava e subscrevia os recibos de renda. Ora, foi um dos AA., irmão da mencionada C…, e um seu cunhado dos mesmos, que se deslocaram em Fevereiro de 2005, ao locado e percorreram os seus andares, tendo visitado as divisões e verificado as alterações no imóvel. Assim, a senhoria conhecida da Ré teve obviamente conhecimento das obras. Tanto basta para que se tenha por assente que aquele conhecimento se estendeu aos demais AA. Acrescente-se que seria extremamente injusto exigir aos arrendatários que comunicassem as diversas vicissitudes a todos os senhorios. Muitas vezes, nem os próprios senhorios sabem quem são os restantes comproprietários dos imóveis e tal sucede quando, p. ex. adquirem os imóveis por sucessão “mortis causa”. A mencionada exigência seria descabida, até porque a maior parte das vezes o arrendatário apenas conhece um dos AA. tal sucede, por exemplo, quando falece o primitivo senhorio e são vários os herdeiros, não é razoável que o inquilino os conheça a todos, para evitar eventuais despejos. Expresse-se ainda que quem tem a obrigação de comunicar as obras detectadas no arrendado aos demais senhorios é o locador que se deslocou ao arrendado. Ante o enunciado, dúvidas não restam de que todos os AA. tiveram, ou tinham obrigação de ter, conhecimento em Fevereiro de 2005 do estado do arrendado, razão pela qual, pelo decurso do prazo de um ano contado desde então e até à data da propositura da acção, caducou o direito dos AA. instaurarem a presente acção, tendo como causa de pedir a realização de obras não consentidas pelo senhorio. “ - Os recorrentes insurgem-se contra tal interpretação por considerarem que o simples facto de um dos comproprietários tomar conhecimento do facto que fundamenta a resolução do contrato, pode fazer presumir que os demais também têm conhecimento.Consideram, assim, que não se logrando provar que os demais comproprietários tomaram conhecimento da realização das obras, nem ainda do processo pelo qual poderiam ter conhecimento das mesmas, a excepção deve improceder, porque não está demonstrado que na data da instauração da acção os senhorios tinham conhecimento há mais de um ano da realização das obras pelo inquilino. - Analisando.Os recorrentes vêm impugnar o segmento da decisão que julgou procedente a excepção de caducidade, quando está provado que apenas um dos comproprietários tomou conhecimento do facto fundamento da resolução, pertencendo o prédio em compropriedade aos senhorios. A Ré na sua defesa, por excepção, invocou a caducidade do direito de acção contra todos os Autores, alegando que apenas um dos comproprietários acompanhado do cunhado tomou conhecimento em Fevereiro de 2005 das obras realizadas no local arrendado. Provou-se que em Fevereiro de 2005, um dos Autores acompanhado do cunhado, visitou o arrendado, tendo percorrido todos os andares e divisões e constatou as alterações / obras que, na data referida infra em 8, foram elencadas no documento junto a fls. 39 a 41 (ponto 5 dos factos provados). A resolução do contrato de arrendamento fundada na falta de cumprimento por parte do arrendatário tem de ser decretada pelo tribunal – art. 1084º/2 e art. 14º da Lei 6/2006 de 27/02. Dispõe o art. 1085º do CC, na redacção da Lei 6/2006 de 27/02: “1.A resolução deve ser efectivada dentro do prazo de um ano a contar do conhecimento do facto que lhe serve de fundamento, sob pena de caducidade. 2. Quando se trate de facto continuado ou duradouro, o prazo não se completa antes de decorrido um ano da sua cessação “. Ao abrigo do anterior regime – DL 321-B/90 de 15/10 -, defendia o Prof. Pereira Coelho. que a violação se deve qualificar como instantânea quando a conduta violadora for uma só, realizada ou executada em dado momento temporal, embora os seus efeitos permaneçam ou se protraiam no tempo – alíneas d) e f) do art. 64º - e só deverá ter-se como continuada quando o processo de violação do contrato se mantenha em aberto, alimentado pela conduta persistente do locatário – alínea b), c), e), g), h) e i). (vg. Aragão Seia “Arrendamento Urbano”, pag.313). Na situação concreta, os Autores fundam o direito à resolução do contrato no facto do arrendatário ter realizado obras não autorizadas, que alteram a estrutura interna do prédio. Trata-se, assim, de uma conduta instantânea, ainda que susceptível de se prolongar no tempo, pelo que, o prazo de caducidade conta-se a partir da data em que o senhorio tomou conhecimento dos factos que servem de fundamento ao pedido de resolução. A caducidade do direito de resolução não é do conhecimento oficioso, visto ser estabelecida em matéria não excluída da disponibilidade das partes – nº 2 do art. 333º remissivo ao art. 303º ambos do C.C. – por não respeitar a relações jurídicas indisponíveis, já que o arrendamento urbano pode cessar por acordo entre as partes (art. 1082º CC). Neste contexto, questiona-se se pode operar a excepção de caducidade contra todos os comproprietários, quando apenas um dos comproprietários revela ter conhecimento dos factos. O regime de compropriedade impõe a intervenção colectiva de todos os contitulares do direito (art. 1405º/1 e 1407º CC). Daqui decorre que a qualidade de senhorio é exercida em conjunto por todos os comproprietários, salvo se a administração estiver confiada a um deles. Face ao regime da compropriedade e ao facto da caducidade não constituir uma excepção de conhecimento oficioso, iniciando-se o prazo de caducidade com o conhecimento do facto que deu causa à resolução, a excepção deve ser deduzida contra todos os comproprietários e a mesma só é eficaz se o facto causa da resolução for do conhecimento de todos os comproprietários. Recai sobre o inquilino o ónus de alegação e da prova do conhecimento por todos os comproprietários do facto que serve de fundamento à resolução, por constituir um facto impeditivo do direito do senhorio (art. 342º/2 CC). Nas circunstâncias em que o prédio arrendado pertence a vários comproprietários, a jurisprudência tem defendido de forma que podemos considerar maioritária, que é necessário provar-se que todos eles têm conhecimento, há mais de um ano, do facto que serve de fundamento à acção. Só não será assim se os consortes tiverem confiado a administração do prédio a um deles. Nesse caso tudo se passa como se só este fosse o dono do prédio (Aragão Seia “Arrendamento Urbano – Anotado e Comentado”, ed. 1995, pag. 315; Pinto Furtado “Manual do Arrendamento Urbano”, vol. II, 5ª ed.2011, pag. 1153 – Ac. Rel. Lisboa 09.06.1994, CJ XIX, III, 111; Ac. Rel. Coimbra 13.01.1987, CJ XII, I, 29, Ac. Rel. Lisboa 09.01.85 – sumário dgsi.pt.; CJ 1985, I, 137, Ac. Rel. Lisboa 08.10.1996 – sumário- dgsi.pt, Ac. Rel. Porto 05.11.2002 – JTRP 00034349 – www.dgsi.pt). Em sentido contrário, pronunciou-se o Ac. Rel. Lisboa de 12.11.1987 com os seguintes argumentos: “Em abono da solução por que se opta está o facto de a administração do condomínio se reger pelas normas das sociedades civis e em última análise das pessoas colectivas (art. 1407º, 998º, 165º CC) com a natural consequência de pelos actos ou omissões de um ou mais dos condóminos todos terem de responder. Respondendo, no entanto, o condomínio pelos actos dos condóminos – mesmo que se simples omissões se trate (art. 998 e 165º CC) – dúvidas não pode haver acerca do dever que impende sobre qualquer dos condóminos de avisar os seus compartes da existência de qualquer facto de que tenha conhecimento, susceptível de prejudicá-los. As relações existentes entre os vários co-senhorios obrigam-nos a todos e a cada um a comportamento leal e recíproco. Se qualquer deles não cumpre o seu dever, informando os que susceptível de prejudicá-los ou de aproveitar-lhes, se for passando, não é justo que por uma falta se penalize a parte adversa.” (CJ XII, V, 104) Estes argumentos merecem-nos particular atenção, porque na sentença em recurso, ainda que sem desenvolver a mesma fundamentação de direito, seguiu-se esta posição. Retomando o caso concreto, desde logo cumpre-nos referir que não seguimos a posição defendida na sentença, por duas ordens de razões: em sede de fundamentação de direito seguimos a posição que merece o acolhimento maioritário da jurisprudência, pelos motivos que já deixamos exposto e por outro lado, os factos provados não permitem obter as conclusões a que chegou o Juiz do tribunal “a quo”. Recaindo sobre a Ré – arrendatário – o ónus da prova da excepção, de acordo com o art.342º/2 CC, constata-se da análise dos factos provados, que em Fevereiro de 2005 – mais de um ano antes da instauração da acção - apenas um dos comproprietários tomou conhecimento das alterações no local arrendado. Não se provou quem era a pessoa em causa, pois são três os comproprietários, nem a seu tempo a Ré alegou que essa pessoa era o comproprietário e exercia os poderes de administração em representação dos demais. Por outro lado, também não se logrou provar a identificação do cunhado que em Fevereiro de 2005 acompanhou o comproprietário na visita efectuada ao local arrendado e nada nos permite concluir que seria o marido da outra comproprietária. Não resulta dos factos provados, nem foi alegado pela Ré, que o comproprietário que visitou o local arrendado deu conhecimento aos demais comproprietários das alterações que observou e se o fez, na data em que visitou o local ou em data posterior, ou seja, se antes da realização da vistoria em Abril de 2006. Os factos provados não permitem concluir que desde data anterior a 19.04.2006 os restantes comproprietários tinham conhecimento da extensão das obras e alterações introduzidas no local arrendado. Conclui-se, assim, que a Ré não logrou provar que os Autores – senhorios – tinham conhecimento da natureza e extensão das obras há mais de ano, por referência à data da instauração da acção e por esse motivo, a excepção de caducidade deve improceder. Pelo exposto, julgam-se procedentes as conclusões de recurso sob os pontos 70 a 79 e nessa conformidade, revoga-se a sentença e julga-se improcedente a excepção de caducidade. - Fazendo uso da faculdade conferida pelo art. 715º CPC e uma vez que o processo contém todos os elementos para apreciar dos fundamentos do pedido – resolução do contrato -, questão esta suscitada no recurso e garantido o contraditório com as contra-alegações, passamos a apreciar a terceira questão.- - Da resolução do contrato com fundamento na realização de obras pelo arrendatário, não autorizadas pelo senhorio - No ponto 80 das conclusões de recurso concluem os recorrentes que revogada a sentença deve julgar-se resolvido o contrato e ordenado o despejo da Ré, com fundamento no art. 64º /1 d) RAU e art. 1074º/2, 1083º, 1407º, 985º e 1024º/2 CC. - Analisando.Os Autores vieram instaurar a presente acção de despejo, com vista a obter a resolução do contrato de arrendamento celebrado com a Ré, com fundamento na realização de obras pelo arrendatário, não autorizadas pelo senhorio. O contrato de arrendamento urbano é o contrato pelo qual uma das partes concede à outra o gozo temporário de um prédio urbano, no todo ou em parte, mediante retribuição – art. 1022º e 1023º CC. Considera-se realizado para comércio ou indústria o arrendamento de prédios ou parte de prédios urbanos ou rústicos tomados para fins directamente relacionados com uma actividade comercial ou industrial. O contrato em apreço, atenta a matéria de facto apurada, insere-se na categoria de contrato de arrendamento para o exercício da actividade industrial – indústria de hotelaria. Com efeito, apurou-se que a Ré pelo menos a partir de 08.05.1979, por efeito do contrato de trespasse de estabelecimento comercial, passou a ocupar a posição de arrendatário no contrato celebrado em 1966 pelos antecessores dos Autores, explorando o estabelecimento de pensão residencial sito à Rua …, no Porto (ponto 1, 2, 3, 4 dos factos provados). Com a celebração do contrato, o arrendatário fica sujeito ás obrigações enunciadas no art. 1038º CC. Nos termos do art. 1038º/d) CC o arrendatário tem a obrigação de não fazer do prédio uma utilização imprudente. Da conjugação dos art. 1043º, 1036º, 1073º, 1111º e art. 1074º /2 CC resulta que o arrendatário pode executar obras no arrendado, mas em circunstâncias determinadas. A boa manutenção deve ser assegurada ao longo do arrendamento pelo senhorio, conforme resulta do disposto no art. 1074º /1 CC, ao colocar as obras de conservação ordinárias, extraordinárias e de beneficiação a cargo do senhorio. Sobre o arrendatário recai o encargo de proceder a reparações de pequenas deteriorações feitas para assegurar o seu conforto ou comodidade – art. 1073º CC O arrendatário deverá avisar o senhorio sempre que tenha conhecimento de vícios da coisa e saiba que a ameaça algum perigo, nomeadamente as obras em geral destinadas a manter o prédio nas condições requeridas pelo fim do contrato e existentes à data da sua celebração – art. 1038º h) CC. O arrendatário pode contudo desde logo efectuar as obras urgentes com direito a reembolso, mas tem do mesmo modo de avisar o senhorio – art. 1036º CC. Contudo, sem autorização por escrito do senhorio ou sem que do contrato conste tal faculdade, o arrendatário não pode efectuar obras no prédio arrendado – art. 1074º/2 CC. Este regime explica-se face à natureza do contrato de arrendamento que confere ao arrendatário o direito de gozar a coisa arrendada no âmbito do fim convencionado, mas não lhe confere a faculdade de intervir na dimensão física da coisa. O arrendatário, como refere Menezes Leitão: “só limitadamente tem poderes de transformação da coisa locada, sendo este um acto absolutamente reservado ao proprietário, pelo que a realização de obras pelo arrendatário constitui uma infracção contratual que determina a resolução do contrato, uma vez que nestes casos é manifestamente inexigível ao senhorio a sua manutenção.”. “(“Arrendamento Urbano” Almedina – 2006, pag. 92 ; e também Olinda Garcia “Arrendamentos para Comércio e Fins Equiparados” Coimbra Ed. 2006, pag. 214 e ainda na jurisprudência Ac. STJ 10.07.2007 – Proc. 07B2221 dgsi.pt) No actual regime do arrendamento urbano a realização de obras pelo arrendatário, não autorizadas pelo senhorio deixou de constituir um fundamento autónomo de resolução do contrato de arrendamento, como acontecia no âmbito do RAU – DL 321-B/90 de 15/10 – art. 64º /1 d). Contudo, uma vez que o direito atribuído ao senhorio de resolução do contrato não está subordinado a um conjunto de fundamentos taxativos e a faculdade do arrendatário executar obras no local arrendado apenas é admitida em circunstâncias muito concretas, podemos concluir que a realização de obras pelo arrendatário não autorizadas pode constituir fundamento para a resolução do contrato, nos termos do art. 1083º/2 e 3 do CC, desde que o “incumprimento pela sua gravidade ou consequências, torne inexigível à outra parte a manutenção do arrendamento” ou ainda, ocorrendo “oposição pelo arrendatário à realização de obra ordenada por autoridade pública.” Menezes Leitão refere a este respeito que “se alargou o fundamento de resolução do contrato consistente na realização de obras e deteriorações no prédio, pois todas as que não sejam permitidas por aquelas disposições – art. 1043º, 1073, 1074º/2 CC - passaram a constituir fundamento de resolução do contrato, independentemente das suas características.” (ob. cit., pag. 92 e “Estudos em Honra do Professor Oliveira Ascensão – Deteriorações e Obras no Novo Regime do Arrendamento Urbano”, vol. II, pag. 931) Gravato Morais, citando Pedro Romano Martinez, defende que apesar de não se enunciar taxativamente as causas de resolução do contrato, no que respeita à realização de obras pelo arrendatário: “a solução (da nova lei) não se altera: as deteriorações que excedem o paradigma do nº 1 do art. 1073º do CC e as obras ilícitas que pela sua gravidade afectem a estrutura do edifício ou ponham em causa a divisão interna facultam ao senhorio o exercício do direito de resolução.” (“Novo Regime do Arrendamento Comercial”, 2ª ed., pag. 239) Concluímos, assim, face à previsão do art. 1083º/2 CC, que a realização de obras pelo arrendatário que não estão contempladas no contrato e sem autorização do senhorio constituem fundamento para resolução do contrato pelo senhorio, desde que o incumprimento pela sua gravidade ou consequências torne inexigível à outra parte a manutenção do arrendamento ou quando ocorra oposição pelo arrendatário à realização de obras ordenada por autoridade pública. Retomando a apreciação do caso concreto. Da análise do contrato de arrendamento, resulta que o senhorio concedeu autorização ao arrendatário para montar um lavatório e bidés nos quartos de dormir dos andares, um sanitário no segundo quarto e ainda, para fazer uma divisória nos quartos de banho dos terceiros e quartos andares, para assim, isolar as bacias de banho das sanitas (ponto 1 dos factos provados). Ficou, ainda, assente no contrato que o arrendatário não tinha autorização para fazer quaisquer outras obras, sem autorização por escrito dos senhorios e bem assim, que ficavam a pertencer ao prédio as obras que o arrendatário fizesse, constituíssem ou não benfeitorias, sem que este as pudesse retirar, pedir por elas indemnização ou usar de direito de retenção no fim do contrato (ponto 1 dos factos provados). As alterações introduzidas no local arrendado compreendem: demolição de paredes existentes e construção de novas, encerramento de uma porta, introdução de treze novas instalações sanitárias com a consequente alteração das redes de distribuição de água e águas residuais, demolição de acesso ao piso superior e introdução de uma copa equipada com frigorífico, fogão e pio (ponto 8 dos factos provados). Os Autores, contudo, não lograram provar que as alterações foram introduzidas com obras realizadas pela Ré – arrendatária. Em nada releva para este efeito, o facto da Ré não lograr provar que as obras foram executadas pelo primitivo arrendatário, com autorização do senhorio, porque constituía ónus dos Autores provar que as obras foram realizadas pela Ré, enquanto inquilino e portanto, depois da realização do trespasse do estabelecimento comercial. Com efeito, ao abrigo do art. 342º/1 CC, recaía sobre os Autores – senhorios – o ónus da prova deste facto, porque constitutivo do seu direito, já que é neste facto que fundam o direito à resolução do contrato. Daqui decorre que não se pode imputar à Ré o incumprimento das obrigações emergentes do contrato, no tocante à execução de obras no local arrendado e por isso, não se reconhece o direito aos Autores de obterem a resolução do contrato, nos termos do art. 1082º/2 CC. Improcedem, assim, as conclusões de recurso sob o ponto 80 e nessa conformidade absolve-se a Ré do pedido. - Nos termos do art. 446º CPC as custas são suportadas:- na apelação pelos recorrentes e recorrida, na proporção de 2/3 e 1/3, respectivamente; - na 1ª instância pelos Autores e Ré, na proporção de ¾ e ¼, respectivamente. - III. Decisão:Face ao exposto, acordam os juízes desta Relação em julgar parcialmente procedente a apelação e nessa conformidade: - altera-se a decisão da matéria de facto, quanto ao ponto 7; - julga-se improcedente a excepção de caducidade do direito de acção deduzida pela Ré; e - julga-se improcedente a acção, absolvendo-se a Ré do pedido. - Custas:- na apelação pelos recorrentes e recorrida, na proporção de 2/3 e 1/3, respectivamente; - na 1ª instância pelos Autores e Ré, na proporção de ¾ e ¼, respectivamente. * Porto, 07.05.2012* * * (processei e revi – art. 138º/5 CPC) Ana Paula Pereira de Amorim José Alfredo de Vasconcelos Soares de Oliveira Ana Paula Vasques de Carvalho |