Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
0210999
Nº Convencional: JTRP00035238
Relator: COSTA MORTÁGUA
Descritores: TRÁFICO DE ESTUPEFACIENTE
AGRAVAMENTO
AVULTADA COMPENSAÇÃO ECONÓMICA
ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA
CONCURSO REAL DE INFRACÇÕES
RECURSO
MATÉRIA DE FACTO
Nº do Documento: RP200212180210999
Data do Acordão: 12/18/2002
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recorrido: T J V N FAMALICÃO
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: .
Decisão: .
Área Temática: .
Legislação Nacional: DL 15/93 DE 1993/01/22 ART21 N1 ART24 B C ART28 N1 N3.
DL 207-A/75 DE 1975/04/17 ART3 N1 A.
DL 22/97 DE 1997/06/27 ART6.
CP95 ART275 N1 N3.
Sumário: Integra a prática, em concurso real, de um crime de tráfico de estupefacientes previsto e punido nos artigos 25 n.1 e 24 alíneas b) e c) do Decreto-Lei n.15/93, de 22 de Janeiro e um crime de associação criminosa do artigo 28 ns.1 e 3 do mesmo diploma legal, a conduta do arguido que levou a que se constituísse um grupo de pessoas, entre as quais ele próprio, que, actuando concertadamente e em comunhão de esforços e intentos, se vinham dedicando, reiterada e continuamente, à actividade de aquisição, transporte, manipulação, armazenamento e revenda de heroína e cocaína, sendo que tal arguido era quem geria os proventos monetários resultantes dessa actividade, determinava os investimentos a fazer na aquisição de mais produtos estupefacientes, recebia e guardava o dinheiro proveniente das vendas e pagava aos demais como compensação pela sua participação, estabelecia os preços de venda de tais produtos, onde e quando se abasteceriam dos mesmos, assumindo a liderança de tal grupo. Logrou assim distribuir tais produtos por grande número de pessoas, com o que obtiveram e queriam continuar a obter avultada compensação remuneratória.
Não obsta à conclusão de que o arguido contribuiu para a distribuição da droga por elevado número de pessoas o facto da não identificação concreta de todos os compradores, pois face ao mecanismo de distribuição demonstrado e às quantidades dos produtos transaccionados não subsistem dúvidas a esse respeito.
A compensação económica não tem necessariamente que ser quantificada em concreto, antes decorrendo das quantidades transaccionadas e, sendo caso disso, dos bens adquiridos por via de tais transacções, aqui, sim, a quantificar em termos de mercado.
A reapreciação das provas gravadas pela Relação só pode abalar a convicção acolhida na 1ª instância, caso se verifique que a decisão sobre a matéria de facto não tem qualquer fundamento nos elementos de prova constantes do processo ou está profundamente desapoiada face às provas recolhidas.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação do Porto:

Na comarca de....., conjuntamente com outros, em processo comum, com intervenção do Tribunal Colectivo, mediante acusação do Ministério Público, foram condenados os arguidos:

1. Jo.....:
a) como autor de um crime de tráfico de estupefacientes agravado, previsto e punível pelos artigos, 26º do CP, e 21º, n.º 1, e 24º, als. b), c) e j), do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 45/96, de 3 de Setembro, com referência às Tabelas I-A e I-B ao mesmo anexas, na pena de prisão de 11 anos e 6 meses;
b) como autor de um crime de associação criminosa, previsto e punível pelos artigos, 26º do CP, e 28º, nºs. 1 e 3, do citado Decreto-Lei n.º 15/93, na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 45/96, de 3 de Setembro, na pena de prisão de 12 anos e 6 meses;
c) como autor de dois crimes de detenção ilegal de arma de defesa, previstos e puníveis pelo artigo 6.º do Decreto-Lei nº 22/97, de 27 de Junho, na pena de prisão de 6 meses por cada um deles; e,
d) procedendo à punição do concurso de infracções, nos termos do artigo 77.º do CP, na pena única de prisão de 16 anos;

2. José.....:
a) como autor material de um crime de detenção de arma proibida, previsto e punível pelo artigo 275º, n.º 2, do CP, com referência artigo 3º do Decreto-Lei n.º 207-A/75, de 17 de Abril, na pena de prisão de 1 ano;
b) como autor material de um crime de tráfico de estupefacientes agravado, previsto e punível pelos artigos, 21.º, n.º 1, e 24.º, alíneas b) e c), do mesmo Decreto-Lei nº 15/93, na pena de prisão de 8 anos; e,
c) procedendo à punição do concurso de infracções, nos termos do artigo 77.º do CP, na pena única de prisão de 8 anos e 5 meses.

Foram declarados perdidos a favor do Estado os bens mencionados no acórdão recorrido, que observou os pertinentes preceitos tributários e administrativos.

Inconformados os arguidos interpuseram recurso.

A. As conclusões da motivação apresentada pelo arguido José..... (transcrição):

De facto (artigo 412º, n.º 3 e 4 do CPP)
1 - Encontra-se erradamente julgada a matéria constante nos nº 10, 60, últimas duas linhas, 63, 64, 87, última parte, 88, na parte em que lhe atribui o ter agido para além do transporte e depósito, 91, na parte em que lhe atribui a responsabilidade da arma e 96, na parte em que não admite que o recorrente confessou os factos que, na realidade, praticou, da matéria considerada apurada.
2 - Tal matéria está erradamente julgada porquanto, conforme resulta do depoimento prestado pelo arguido em audiência de julgamento (cassete n.º 1, lados A e B) e ainda dos elementos que da sua boca sempre saíram para os autos (cfr. fIs. 1030, no que concerne aos elementos de identificação), o recorrente nunca viveu no Edifício V...... É certo que o alugou, mas alugou-o nas condições que narrou, isto é, por determinação do Pe....., que não queria que os produtos que mandou trazer fossem depositados num bairro social, como aquele em que vivia. Tudo o resto, de misturas e vendas, não era nem da sua responsabilidade, nem da sua competência, funções confiadas ao Pa..... e ao António.
3 - Os investigadores nem sequer tinham conseguido, até à data da busca, ligar o apartamento ao aluguer do recorrente, porquanto ignoravam tal situação, razão pela qual a busca domiciliária de fIs. 841 foi feita como se o apartamento ainda fosse utilizado pelo buscado Adelino....., a quem, segundo se narra, foi entregue "cópia do mandado que ordenou a diligência". Aliás, a busca só teve o sucesso que teve, face à informação do recorrente.
4 - Os investigadores nada sabem sobre o relacionamento do recorrente com a droga, para além daquilo que ele próprio disse. Na verdade, tinham-no visto uma ou duas vezes (Jorge....., cassete n.º 2, lado B e cassete 3, lado A), situações que o recorrente explicou com a maior das naturalidades, no Hospital e na casa da L....., ou conheceram-no no dia da detenção (Carlos....., cassete n.º 4, lado A). De resto, nada sabem sobre si (Vítor....., cassete nº 2, lado B; Afonso....., cassete n.º 2, lado B; Alexandre....., cassete nº 3, lados A e B; Orlando....., cassete n.º 3, lado B; Avelino....., cassete n.º 4, lado A; Vítor J....., cassete n.º 4, lado A; Pedro....., cassete nº 4, lado A; Manuel....., cassete n.º 4, lado A; Estrela....., cassete n.º 4, lado A; Adolfo....., cassete nº 4, lados A e B; Francisco....., cassete n.º 4, lado B; José A....., cassete n.º 4, lado B) .
5 - A decisão recorrida viciou o seu raciocínio, não atendendo à verdade total da versão do recorrente, por ter partido do pressuposto, errado, por não provado, que o recorrente residia na casa de V...... Nenhum dos elementos de prova dos autos, ou produzido em audiência o indicia: e o recorrente desmente-o com veemência, explicando o seu relacionamento com tal fracção.
6 - Quer dizer que a versão do recorrente não tem prova que a contradite, pelo que, não violando as regras da experiência, tem de ser aceite.

De direito (artigo 412º, n.º 2 e 5 do CPP)
1 - Não se verificam, face à matéria considerada apurada, no que ao crime de tráfico de estupefacientes diz respeito, as agravantes das alíneas b) e c) do artigo 24º do DL 15/93.
2 - A primeira, pura e simplesmente, porquanto foi considerada verificada com base no facto de pretender distribuir produtos por grande número de pessoas, quando a norma impõe que tal tenha ocorrido no passado.
3 - A segunda, porquanto a quantia que o arguido iria ganhar não é subsumível ao conceito de avultada compensação económica e, porquanto, para além disso, no caso concreto, o "... procurava obter..." não tem subjacentes actos concretos donde tal se possa inferir .
4 - E as meras intenções não são puníveis, face à definição do artigo 1º do CP.
5 - Ao ter interpretado tal norma de maneira diferente, violou a decisão recorrida o artigo 29º da CRP.
6 - Temos, pois, que o recorrente deveria ser punido pelo crime de tráfico de estupefacientes na previsão do artigo 21º do DL 15/93.
7 - A posse da arma foi erradamente subsumida ao n.º 2 do artigo 275º do CP , quando o deveria ter sido ao n.º 3.
8 - Tal norma prevê moldura penal alternativa de prisão ou multa.
9 - Face ao artigo 70º do CP, o tribunal tem de dar preferência à pena de multa, se realizar adequada e suficientemente as finalidades da punição.
10 - Nada na prova indicia que tal não ocorra no caso concreto.
11 - Fixada a escolha das penas, tem de ater-se ao critério do artigo 71º do CP para fixar a sua medida.
12 - Face ao específico pessoal do recorrente, vertido na matéria apurada sob A), 3, 96 a 99, adequam-se ao caso concreto as penas parcelares de 4 anos e 6 meses pelo crime de tráfico de estupefacientes, da previsão do artigo 21º do DL 15/93 e a pena de multa de 100 dias à taxa diária de 2€, para o crime do artigo 275º, nº 3º do CP.
13. Ao ter entendido de outra forma, violou a decisão recorrida os normativos citados.

Assim, impõe-se a sua revogação nos termos reclamados.

B. As conclusões da motivação apresentada pelo arguido Jo..... (transcrição):
a) O arguido foi condenado pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes agravado, p, p. no DL 15/93 de 22-01, artºs. 21 e 24 al. b) c) e j) e 28 nº 2 do mesmo D.L.
b) A condenação supra referida teve na base a matéria apurada e constante a fIs. 7 a 30 do acórdão, pontos 1 a 98.
c) Para fundamentar a sua convicção o tribunal fundou a sua convicção nas declarações dos arguidos, na prova documental, pericial e testemunhal.
Acontece que,
d) Da análise da prova documental, verifica-se que a mesma não se encontra devidamente identificada:
1- O processo é constituído por diversos volumes, sendo certo que existem pelo menos três nºs 1, 2, e 3. A título meramente exemplificativo, refere-se no douto acórdão a fls. 52 , que a matéria apurada que demonstra o relacionamento daquela testemunha, Narciso..... e a arguida Manuela..... e respectiva família poucos dias antes de vir a ser detido, se encontra a fls. 282 e 291, da análise dos autos verifica-se que tais fls. no volume 1 , são respectivamente uma cota a remeter à PJ originais dos ofícios e um relatório médico referente à arguida. Claro está que noutro volume 1, o da P.J. tais fIs, respeitam a fotografias do carro da testemunha Narciso, em casa da arguida, e deste a conversar com o Jo....., várias fotografias da arguida Manuela..... na companhia do seu companheiro, Jo......
2- Isto posto, presume-se que o douto acórdão se refira a estas fls., contudo tal não é especificado, sendo por isso mesmo, deficiente a indicação das provas que serviram para formar a convicção do tribunal, sendo certo que é desta correcta indicação que se entende qual o raciocínio lógico do tribunal para apurar estes factos
3. Tal indicação não cumpre o disposto no art. 374 nº 2 do C.P.P. Tal tem por consequência o disposto no artigo 379 nº 1 e 2 do C.P.P.
4- Pela indicação deficiente das provas, fica-se com a ideia de que nestes elementos o tribunal se baseou em relatos de diligência externa. E, a ser assim salvo o devido respeito, não podia, uma vez que os mesmos não são considerados autos para os efeitos do artigo 99 do C.P.P., e como tal não poderem ser utilizados como meio de prova. O tribunal deveria no caso em apreço atender à prova testemunhal, produzida em audiência de julgamento, isto é, a audição dos agentes da P.J. intervenientes nos referidos relatos (artigo 355 do C.P.P).
5- Mas, e tal facto tem ainda mais expressão, na prova constante, no douto acórdão a fls. 349/364, em especial a carta dirigida ao Jo..... e à Manuela..... Isto porque, a referida carta não se encontra nas páginas supra referidas.
6- Tais cartas foram apreendidas não na residência da arguida ou do seu companheiro, Jo....., ou de qualquer outros dos arguidos intervenientes nos presentes autos, mas na residência de C....., pertencente a Ana......
7- Não existe no douto acórdão qualquer referência à tal Ana...... Não testemunha no processo, fica-se assim sem perceber, em que contexto a mesma surge e não se estabelecendo no acórdão qualquer relação desta com a arguida Manuela..... e ou com o Jo....., não pode socorrer da mesma, apurando que era para o Jo..... e cujo conteúdo é esclarecedor.
8- Pelo que, não só a prova se encontra deficientemente indicada, como no caso acima referido e atento às razões aduzidas não poderia ter sido considerada. Tal facto acarreta nos termos do disposto nos artºs. 374 e 379 do C.P.P a nulidade da sentença.
e) Há errada subsunção jurídica dos factos
crime de tráfico de estupefacientes agravado p.p. pelos artigos 21 nº 1 e 24 alínea b) , c) , j) do Decreto Lei 15/93 de 22/01 e ainda, por um crime p. p. pelo artº 28 Decreto Lei supra citado.
2- Contesta o recorrente, tal condenação.
Ponderados todos os elementos de facto apurados, entende o recorrente não ser possível identificar entre a matéria provada os factos indispensáveis ao preenchimento da factualidade típica da incriminação. Tanto na vertente objectiva - o tipo objectivo - como na vertente subjectiva- o tipo subjectivo, o processo não dispõe de elementos que permitam concluir que a droga foi distribuída por um grande número de pessoas, resulta sim a prática de um crime em co-autoria onde ninguém tem um papel diferenciado ou preponderante porquanto dos autos nesta parte inexistem elementos que permitem aferir tal, verificando-se nesta parte igualmente o vício previsto no art. 410. n.º. 2.
1- Os factos apurados não são subsumíveis ao art. 24 al. b) do Dec. Lei nº 15/93 de 22/01.
Deu-se como apurado que, o Jo..... e a arguida, pelo menos desde o fim do ano de 1998, e até á sua detenção ocorrida em 27 de Março de 2000, se dedicaram com regularidade à venda lucrativa de produtos estupefacientes, nomeadamente heroína e cocaína, o que vinham fazendo em vários locais da área desta comarca.
No âmbito desta actividade, forneceram heroína e cocaína a vários indivíduos, entre os quais se contaram Mariano..... e Susana....., Narciso....., David....., Mário....., Paulo..... e Vítor M...... Assim,
2- O simples facto de estarem em causa quantidades de estupefacientes e de estarem envolvidas no negócio quantias em dinheiro, não é suficiente, só por si, para se poder considerar que o estupefaciente foi distribuído por um grande número de pessoas, o normativo é claro exige-se entrega efectiva e não mera presunção.
3- Do conjunto da matéria de facto provada, nomeadamente das quantidades de estupefacientes apreendidas, presume-se que assim tenha acontecido. Tal presunção constitui, porém, apenas um índice, que, todavia, não é suficiente para agravar a conduta dos arguidos em termos de qualificação jurídica dos crimes que lhe são imputados. Serviria, como é o caso para se poder chegar à conclusão de que o arguido obteve ou procurava obter avultados lucros aliás a factualidade apurada resulta de 4 detenções de produtos, que nem sequer foram distribuídos
Violou-se o disposto no art. 24 al. b) do Decreto Lei supra citado.
- Há insuficiência para a decisão da matéria de facto provada.
- Isto é, o Tribunal dá como provado, que o arguido e arguida se dedicou ao tráfico de estupefacientes pelo menos desde o fim do ano de 1998 e até 27 de Março de 2000, contudo não apurou nenhum facto concreto a partir de finais de 1998. No douto acórdão, todos os factos apurados de aquisição e venda de produtos estupefacientes, antes da detenção do arguido, situam-se entre Novembro de 1999 a Fevereiro de 2000.
- Pelo que, há também erro notório na apreciação da prova
- Violou-se o disposto no artigo 410 nº 2 al. c).
- Pelo que, atento ao vício invocado deve determinar-se o reenvio do processo para novo julgamento art. 426 nº 1 do C.P..
H) O arguido foi condenado como co-autor de um crime de tráfico de produtos estupefacientes agravado, p. e p. pelos artºs. 26 do C.P e 21 nº 1 e 24, als. b), c) e j), do D.L.15/93, de 22 de Janeiro. E pelos artºs. 26 do C.P e 28 nº 1 e 3 do DL supra citado.
- Entende o recorrente que o tribunal nunca deveria ter punido o arguido, pela agravante da alínea j) do DL 15/93 de 22-01 e pelo artigo 28 nº 1 e 3 do mesmo DL. Isto porque, ao condená-lo pelo artigo 28 a sua conduta ilícita da alínea j) está abarcada no crime de associação, sendo certo que dos autos inexiste factualismo que permita integrar a conduta do arguido numa ou noutra situação.
Não é possível responsabilizar o arguido pelo crime de associação criminosa, por ser manifesto, que os factos provados não preenchem minimamente a factualidade típica daquela infracção. Nem na sua dimensão objectiva, nem subjectiva.
1. Por um lado e como uma consideração mais atenta dos factos provados para avultar, resulta claro que não pode, no caso sub judice, falar-se de associação, grupo ou organização com o sentido, alcance e as exigências que estas expressões ganham no universo de sentidos da incriminação do artigo 28 do DL 15/93 de 22-01, (por referência ao artigo 299 do C.P).
2. O que, só por si afasta definitivamente a subsunção dos factos provados no tipo objectivo do crime de associação criminosa. E da mesma forma, por ser manifesto que não se provou o dolo, isto é, o conhecimento e a vontade de realização do tipo objectivo na plenitude dos seus elementos.
3. Não se trata de entidade autónoma e transcendente e como centro de motivações e imputação de acções criminosas.
4. Trata-se única e simplesmente de uma família composta por três elementos que estão ligados única e simplesmente em co-autoria.
Noutro plano, nunca os outros supostos membros se sentiram subordinados à vontade colectiva da associação nem comprometidos com os seus interesses ou desígnios. Nunca a ela reportaram os motivos e os efeitos das suas condutas ilícitas veja-se nos factos dados como provados que se vê sempre arguido Jo..... e Manuela juntos, sem haver destrinça de tarefas. Não se reconhece actuação diferencial integrando uma entidade própria, diversa, com estabilidade permanência, entidade que constitua um mais em relação á pluralidade de arguidos, como que impondo à sua vontade destes em determinadas situações e sendo reconhecida por eles como tal, esclarecedor é o item 84 do douto acórdão que diz o Jo..... levou a que se constituísse um grupo, que actuavam concertadamente e em comunhão de esforços ...reiteradamente dedicavam-se à sobredita actividade de transporte manipulação armazenamento e revenda ... salvo o devido respeito isto integra a co-autoria na prática do crime de trafico e não de associação criminosa
5. Tão pouco vislumbramos motivos que integrem a figura do bando porquanto se trata de uma estrutura familiar que visa desta forma satisfazer as suas necessidades bem como as do agregado familiar.
6- O tribunal tem que ter em conta que se está no âmbito de fortes relações familiares, companheira e genro. Não há um mínimo de organização ou de
7- Diferenciação de funções, ou de obrigações de prestação de contas, ou qualquer relação hierárquica.
8. O tribunal em jeito de conclusão conclui que o Jo..... fundou a organização mas na factualidade dada como provada inexiste qualquer elemento que nos permita aferir tal, é sempre visto com a Manuela, deslocam-se conjuntamente, vendem conjuntamente e todo que têm traduz uma economia comum.
Pelo que, não se verifica o crime de associação criminosa (Neste sentido Ac. de 21 de Janeiro de 1992, do 1º Juízo Criminal de Lisboa: CJ, XVII, tomo I, 307).
g) - Violou-se o disposto no artigo 21 e 24 al. j ) e 28 nº1 e nº do DL 15/93 de 22.01.
I. - Da prova documental, testemunhal e das declarações do arguido, o Tribunal não poderia ter declarado perdido a favor do Estado a viatura de marca Mercedes - Vito, acima identificada e os objectos em ouro apreendidos nesta e na residência da arguida.
1. Isto porque, da análise de toda a prova tida em consideração pelo tribunal resulta que tal veículo sendo propriedade da arguida não se encontra pago, não resultando que tal viatura fosse utilizada para o transporte de produtos ilícitos, resultando do depoimento das testemunhas de defesa que o arguido efectivamente exercia actividade profissional, veja-se que detinha carrinha, própria para acondicionarem mercadorias, ver cassete testemunhas indicadas como n.º 40, 45, 46 e 47, atestaram não só sob a personalidade do arguido bem como do exercício profissional de feirante.
2. Violou-se o disposto no artigo 35 do DL 15/93 de 22-01.
J) - Os critérios que presidem à medida concreta da pena são os indicados no art. 70 do C.P.- No caso concreto, atento às razões atrás aduzidas haveria que condenar a arguida por um crime de tráfico de estupefacientes agravado, p. p nos artºs. 21 e 24 alínea c).
1. Não é manifestamente o caso. Não estamos perante circunstâncias excepcionais, ou ligadas à gravidade objectiva dos factos ou à má formação da personalidade, muito pelo contrário pela idade significativa do arguido o facto de ser primário aos cinquenta anos revela que não tem propensão a delinquente, tal deve ser encarado como uma nódoa negra na sua vida, que obviamente se deve penalizar, todavia, deve-se reservar para situações mais graves os limite máximo da pena, para ilicitude superior.
2. Dada a gravidade dos factos apurados, modo de execução e demais circunstâncias ponderadas no douto acórdão, entendemos ser adequada a pena de 6 anos de prisão.
3. A decisão recorrida violou o disposto nos artºs. 72 e 73 do C.P.
L) - Face aos critérios legais do (artºs. 70 e 71 do C.P) a recorrente deveria ser punida, atento as razões aduzidas na motivação do recurso ora interposto, apenas pelo crime de tráfico de estupefacientes agravado p.p. no Dec. Lei nº 15/93 de 22/01, artºs. 21 e 24 al. c) decisão recorrida violou, nessa parte, os artºs. 40, 70 e 71 , ambos do C.P.P. (leia-se CP).
Pede a revogação da decisão.

Respondeu o Ministério Público em ordem à improcedência dos recursos.

Nesta Instância o Exmº. Procurador-Geral Adjunto emitiu Parecer, nele concluindo, tal como na 1ª Instância, no sentido da manutenção da decisão recorrida.

Foi observado o disposto no artigo 417º, n.º 2º, correram os ‘vistos’, e teve lugar a audiência designada no artigo 423º, ambos do CPP.

É a seguinte a matéria de facto dada como PROVADA no acórdão sub juditio:
1) Desde data não concretamente apurada, mas, pelo menos desde o fim do ano de 1998 e até à sua detenção ocorrida em 27 de Março de 2000, o arguido Jo..... e a Manuela..... dedicaram-se com regularidade à venda lucrativa de produtos estupefacientes, nomeadamente heroína e cocaína, o que vinham fazendo em vários locais da área desta comarca.
2) O arguido Jo..... e a Manuela..... tinham a sua habitação sita na Rua....., Edifício V....., nesta cidade de....., onde passaram a residir em Março de 1995 e até finais de 1997.
3) Em inícios de 1996, o arguido Jo..... e a Manuela..... compraram o prédio rústico sito no Lugar de..... ou da L....., composto por uma parcela de terreno para construção, com a área de 904 metros quadrados, a confrontar de Norte com António..... e de Nascente, Poente e Sul com o caminho público, descrito na Conservatória do Registo Predial de..... sob o n.º 00387/221189.
4) Na escritura do contrato de compra e venda respectiva ficou a figurar como outorgante compradora apenas a Manuela....., sendo tal aquisição inscrita no registo predial apenas a favor desta.
5) Nesse mesmo ano, o arguido Jo..... e a Manuela..... fizeram construir nesse terreno a moradia que actualmente nele está implantada, passando a constituir o prédio urbano sito na Rua....., Lugar da L....., ....., para onde se mudaram em finais de 1997, aí passando a residir desde então.
6) Assim, desde finais de 1998, o arguido Jo..... e a Manuela..... centralizaram a sua actividade de venda de produtos estupefacientes nesta casa do Lugar da L......
7) Em Maio de 1997, Fernanda..... comprou o referido apartamento do Edifício V....., constituído pela fracção autónoma designada pela letra “R”, destinada a habitação, no terceiro andar esquerdo, que faz parte do prédio urbano em regime de propriedade horizontal, sito no Lugar..... ou Rua....., da freguesia de....., concelho de....., descrito na Conservatória do Registo Predial desta cidade sob o n.º 00608/210192, que era propriedade de Manuela......
8) Tal fracção autónoma foi adquirida pelo preço de oito milhões de escudos, que foi pago àquela vendedora em notas do Banco de Portugal.
9) Com a mudança do arguido Jo..... e da Manuela..... para a referida casa do Lugar da L....., o Adelino, que na época vivia com a referida Fernanda..... e veio a casar com ela, passou a residir no dito apartamento do Edifício V....., onde se manteve até início de Março de 2000.
10) Em início de Março de 2000, foram os arguidos José..... e Maria..... que passaram a habitar o referido apartamento do Edifício V......
11) Para guardarem os produtos estupefacientes por eles vendidos, o arguido Jo..... e a Manuela....., desde o fim de 1998, usavam uma casa sita em Rua....., Lugar de P....., ......
12) O arguido Jo..... e a Manuela....., além de venderem aqueles produtos directamente a pessoas que os contactavam para o efeito, igualmente encarregavam o Adelino de proceder à venda de tais produtos, bem como se serviam de indivíduos que vendiam tais produtos a consumidores por conta deles.
13) Assim, em algumas ocasiões, as pessoas interessadas em adquirir aqueles produtos contactavam o arguido Jo..... e a Manuela..... na residência destes ou por telefone, encomendando as quantidades pretendidas e combinando um local para a sua entrega e pagamento do respectivo preço.
14) Nessas ocasiões, após tal contacto, o arguido Jo....., sozinho ou acompanhado da Manuela....., dirigia-se à casa de P....., acima referida, ou a outros locais não apurados, após o que ia entregá-lo ao local combinado para o efeito com o comprador e deste recebia o dinheiro correspondente.
15) Noutras ocasiões, após contacto prévio com os respectivos compradores, o arguido Jo..... e a Manuela..... mandavam o Adelino ir buscar as quantidades pretendidas aos locais onde estavam guardadas a heroína e cocaína, entregá-las àquelas pessoas e destas receber o dinheiro do respectivo preço.
16) Assim, o Adelino ia buscar a heroína e cocaína encomendadas aos locais onde estavam guardadas, procedia à sua entrega aos compradores e destes recebia pagamentos em dinheiro, que depois entregava ao arguido Jo..... e à Manuela....
17) No âmbito da actividade acima descrita, o arguido Jo..... e a Manuela.... forneceram heroína e cocaína a vários indivíduos, entre os quais se contaram Mariano..... e Susana....., Narciso....., David....., Mário....., Paulo..... e Vítor M......
18) No dia 30 de Abril de 1999, ao fim da tarde, Emanuel..... e Miguel..... dirigiram-se a local não apurado, com o objectivo de aí adquirirem heroína.
19) Naquele local, alguém entregou àqueles dois uma embalagem plástica, contendo heroína com o peso líquido de 49,130 gramas (conforme exame pericial cuja certidão se mostra junta a fls. 2764), em troca de dinheiro que os mesmos lhe entregaram.
20) Na posse de tal produto, os referidos Emanuel e Miguel dirigiram-se para o Porto, levando-o consigo, vindo a ser interceptados por agentes da Polícia Judiciária.
21) Na sequência de anteriores contactos mantidos com o arguido Jo..... e a Manuela....., quer na casa destes do Lugar de P....., quer pelo telefone móvel do primeiro, com o n.º 9......, no dia 22 de Novembro de 1999, cerca das 21 horas, o referido Narciso..... foi a casa daqueles dois, levando a acompanhá-lo o referido David....., com o objectivo de aí adquirir cocaína.
22) Uma vez aí chegados, o Narciso e o David..... contactaram o arguido Jo..... e a Manuela.
23) Então, o Adelino, fazendo-se transportar para o efeito no veículo automóvel de marca “Ford Galaxy”, de matrícula n.º ..-..-IX, compareceu no local.
24) Por sua vez, o arguido Jo..... e a Manuela.... entregaram cinco embalagens plásticas contendo cocaína, com o peso líquido total de 392,490 gramas (conforme exame pericial certificado a fls. 2736), ao referido Narciso, que por sua vez as entregou ao David....., que as ocultou na sua roupa.
25) Na posse de tal produto, estes dois últimos saíram daquela casa, dirigindo-se para o Porto, fazendo-se transportar no veículo automóvel de marca “Mercedes Benz” de matrícula n.º ..-..-KC, de propriedade do Narciso, vindo a ser interceptados por agentes da Polícia Judiciária.
26) No dia 15 de Dezembro de 1999, o Mariano..... e a Susana...... dirigiram-se a esta cidade de....., com o objectivo de adquirirem cocaína ao arguido Jo..... e à Manuela....., por intermédio de outras pessoas que serviriam de correios e do Adelino que procederia à respectiva entrega a estes.
27) O Mariano..... e a Susana....., por contacto telefónico com o arguido Jo....., para o telemóvel deste com o n.º 9......, encomendaram-lhe que lhes fornecesse cerca de duzentos e cinquenta gramas de cocaína, que destinavam a ser vendida a terceiros.
28) Tendo o arguido Jo..... aceitado fornecer-lhes tal produto, o Mariano..... e a Susana..... desde logo combinaram com aquele que a respectiva entrega seria feita em....., para o que utilizariam como correio a Laura......
29) Assim, para cumprimento do acordado, o arguido Jo..... incumbiu o Adelino de proceder à entrega da cocaína encomendada à referida Laura......
30) Em execução de tal acordo, o Mariano..... e a Susana..... mandaram a Laura vir a esta cidade buscar aquele produto.
31) Assim, no referido dia 15 de Dezembro de 1999, à tarde, a Laura, na companhia do seu primo Carlos S....., dirigiu-se a esta cidade para vir buscar a referida cocaína e, por seu turno, o Mariano..... e a Susana..... igualmente se deslocaram a esta cidade, fazendo-se transportar no veículo automóvel de marca “Fiat Croma”, de matrícula n.º ..-..-BH, de propriedade do Mariano, para controlarem os movimentos daqueles primeiros e se assegurarem de que a transacção de cocaína acordada ocorria conforme combinado.
32) Uma vez nesta cidade, o Mariano..... e a Susana..... e os referidos Laura..... e Carlos S..... dirigiram-se para junto da confeitaria denominada “E.....”, sita na Rua....., defronte ao Edifício V....., onde à data residia o Adelino.
33) Nesse local, cerca das 17 horas e 30 minutos, surgiu o Adelino, fazendo-se transportar no referido veículo automóvel “Ford Galaxy”, e falou com o Mariano..... para lhe confirmar que a entrega da cocaína ia ser realizada e que a Laura..... e o Carlos S..... o deviam seguir até ao local da entrega.
34) Então, o Mariano..... transmitiu tais indicações à Laura.... e ao Carlos S....., que seguiram o Adelino até uma rua mais recatada desta cidade, onde este último entregou à primeira uma embalagem plástica contendo cocaína, com o peso líquido de 251,050 gramas (conforme exame pericial certificado a fls. 1987).
35) Fazendo-se sempre transportar no veículo automóvel “Fiat Croma” o Mariano..... e a Susana..... igualmente seguiram aqueles até à referida rua, para controlarem aquela entrega.
36) Depois de tal entrega, a Laura..... e o Carlos S....., bem como o Mariano..... e a Susana..... no “Fiat Croma”, regressaram em direcção ao Porto, levado a Laura..... o referido produto, que destinava a entregar a estes dois últimos.
37) Durante o percurso para o Porto, foram aqueles interceptados por agentes da Polícia Judiciária.
38) O arguido Jo..... e a Manuela...., igualmente, forneceram heroína e cocaína, a troco de dinheiro, a Mário....., entregando-lhe entre 100 e 200 gramas de cada um tais produtos.
39) No dia 29 de Dezembro de 1999, cerca das 23 horas, tendo o Mário....., depois de contactar com o arguido Jo..... para o referido número de telemóvel, nos termos já descritos, se deslocado à referida casa da....., onde se encontrou com o Jo..... e a Manuela....., aí permanecendo cerca de vinte minutos.
40) De seguida, o Mário..... foi encontrar-se no Lugar de P..... com pessoa que não foi possível apurar e este, por ordem do Jo....., entregou ao primeiro quatro embalagens plásticas contendo heroína, com o peso líquido total de 198,148 gramas, e quatro embalagens plásticas contendo cocaína, com o peso líquido total de 200,720 gramas (conforme exame pericial certificado a fls. 2684).
41) Na posse de tal produto, o Mário..... dirigiu-se para sua casa, vindo a ser interceptado no caminho por agentes da Polícia Judiciária, já na madrugada do dia 30 de Dezembro de 1999.
42) No dia 2 de Fevereiro de 2000, cerca das 16 horas, o arguido Jo..... recebeu na sua casa da L..... o Paulo..... e o Vítor M....., que aí se haviam deslocado com o intuito de comprarem heroína, que destinavam a entregar a um terceiro.
43) Uma vez aí chegados, o referido Paulo..... entregou ao arguido Jo..... o dinheiro relativo ao preço daquele produto e combinaram ambos que a entrega do mesmo seria feita no Lugar de P......
44) Dessa forma, os referidos Paulo..... e Vítor M..... dirigiram-se para o referido Lugar de P....., onde alguns minutos depois chegou o arguido Jo....., tendo este entregado àqueles cinco embalagens plásticas contendo heroína, com o peso líquido total de 407,398 gramas (conforme exame pericial certificado a fls. 2851).
45) Na posse de tal produto os referidos Paulo..... e Vítor M..... dirigiram-se para casa, sendo interceptados pelo caminho, mais concretamente nos Carvalhos, por agentes da Polícia Judiciária.
46) No âmbito da investigação realizada nestes autos, no dia 27 de Março de 2000, foram realizadas, depois de autorização judicial, buscas domiciliárias na residência do arguido Jo..... e da Manuela....., sita no Lugar da L..... e na aludida casa sita no Lugar de P....., no referido apartamento do Edifício V....., então habitado pelo arguido José....., e num espaço de garagem do mesmo Edifício V....., então utilizado pelo Adelino.
47) Na referida habitação do Lugar da L....., onde residiam o arguido Jo..... e a Manuela...., foi encontrado um saco, contendo um quilo de elásticos n.º 33, àqueles pertencente e que os mesmos destinavam a usar nas embalagens de produtos estupefacientes por eles vendidas.
No interior dessa mesma habitação, possuía o arguido Jo.....:
a) uma espingarda caçadeira, de calibre 12 mm, para cartuchos de caça, de marca Benelli, modelo M3 SUPER 90 (Slug), com o n.º de série M387565, de origem italiana;
b) uma espingarda caçadeira, de calibre 12 mm, parta cartucho de caça, de marca LUIGI FRANCHI, modelo ASSO, com o n.º de série 00179A, de origem italiana;
c) vinte e cinco cartuchos de 12 mm, tipo zagalote;
d) um colete de caça contendo vinte e oito cartuchos de projécteis diversos;
e) uma mochila azul contendo sessenta cartuchos de 12 mm de diversos projécteis;
f) uma navalha de marca Nicul, com cabo em madeira castanha e lâmina com catorze centímetros de comprimento;
g) uma caixa contendo dezassete munições de calibre 6,35 mm.
Das referidas espingardas caçadeiras, o arguido Jo..... apenas tinha manifestada a n.º 00179A e apenas para esta tinha licença de uso e porte de arma de caça.
No veículo automóvel de marca “Mercedes Benz”, modelo “Vito”, de matrícula n.º ..-..-OJ, propriedade da Manuela...., que se encontrava estacionado junto à referida residência, possuía o arguido Jo....., que ali os havia guardado:
a) uma pistola semi-automática de calibre 6,35 mm BROWNING, de marca TANFOGLIO GIUSEPPE, modelo GT27, com cano de comprimento de 64 mm, com seis estrias dextrógiras no seu interior, com o número de série rasurado, de origem italiana, munida do respectivo carregador que se encontrava vazio;
b) um carregador para munições de calibre 6,35 mm BROWNING, pertencente a uma pistola de marca STAR, modelo STARLITE, de origem espanhola, vazio.
Tal pistola não se encontrava manifestada nem registada, e o arguido Jo..... não era titular de licença de uso e porte de tal arma de fogo.
No interior do veículo automóvel de marca “Mercedes Benz”, modelo “Vito”, de matrícula n.º ..-..-NG, de sua propriedade, possuía o arguido Jo....., que ali os havia guardado, uma pistola semi-automática de calibre 6,35 mm BROWNING, de marca ASTRA, modelo CUB, com cano de comprimento de 56 mm, com seis estrias dextrógiras no seu interior, com o n.º de série 1221962, de origem espanhola, munida do respectivo carregador, que continha cinco munições daquele calibre, de marca GFL/FIOCCHI, de origem italiana.
Tal pistola não se encontrava manifestada nem registada, e o arguido Jo..... não era titular de licença de uso e porte de tal arma de fogo.
No interior da referida casa de habitação, possuíam o arguido Jo..... e a Manuela..... um fio em ouro amarelo, com crucifixo em ouro e dois anéis com libras em ouro.
No interior do referido veículo automóvel de matrícula n.º ..-..-OJ, dentro de uma mala, possuíam o arguido Jo..... e a Manuela..... diversas peças em ouro, melhor descritas a fls. 745 e 746.
No interior deste veículo automóvel igualmente possuíam o arguido Jo..... a Manuela....., dentro de um saco azul claro, a quantia de 5.004.500$00 (cinco milhões e quatro mil e quinhentos escudos) em notas do Banco de Portugal, agrupadas em maços presos com elásticos, depositada a fls. 1299.
No interior do referido veículo automóvel de matrícula n.º ..-..-NG, possuíam o arguido Jo..... e a Manuela..... a quantia de 56.000$00 (cinquenta e seis mil escudos) em notas do Banco de Portugal, depositada a fls. 1302.
48) Tais objectos em ouro e dinheiro possuídos pelo arguido Jo..... e pela Manuela..... foram por eles obtidos no âmbito da sua actividade de venda de produtos estupefacientes, tendo recebido os mesmos como contrapartida das entregas de tais produtos que faziam a terceiros.
49) Também no interior do veículo automóvel de matrícula n.º ..-..-NG, possuíam aqueles um telemóvel de marca Nokia, modelo 61150, e um telemóvel de marca Motorola, que eram pelos mesmos usados nos seus contactos relativos à sua actividade de venda de produtos estupefacientes.
50) Na busca domiciliária realizada nesse mesmo dia, na referida casa de da Rua de......, Lugar de P....., descobriu-se que estavam ali guardados, os seguintes produtos e utensílios pertencentes ao arguido Jo..... e à Manuela.....:
a) nove embalagens plásticas contendo paracetamol, com o peso de 769,410 gramas (conforme exame pericial de fls. 1329);
b) uma embalagem contendo heroína, com o peso líquido de 98,750 gramas (conforme exame pericial de fls. 1536);
c) uma pequena embalagem contendo cocaína, com o peso líquido de 1,730 gramas (conforme exame pericial de fls. 1317);
d) vários sacos transparentes e recortes dos mesmos, habitualmente usados para acondicionar produtos estupefacientes, com resíduos de paracetamol;
e) uma faca, três colheres e um carregador para telemóvel com resíduos de heroína;
f) uma máquina de calcular de marca Converter, com resíduos de heroína;
g) uma balança digital de marca Tanita, com resíduos de heroína;
h) um moinho eléctrico de marca Braun, com resíduos de uma substância cuja natureza não foi possível determinar.
51) Os produtos estupefacientes referidos destinavam-se a ser vendidos a terceiros pelo arguido Jo..... e pela Manuela......
52) O referido paracetamol destinava-se a ser por estes misturado nos produtos estupefacientes que vendiam e assim aumentar o seu volume e obterem maiores lucros com aquelas vendas.
53) Os sacos plásticos e seus recortes, a faca, as colheres, a balança digital e o moinho eléctrico, destinavam-se a ser usados pelo arguido Jo..... e pela Manuela..... na mistura, preparação, divisão, pesagem e embalamento daqueles produtos estupefacientes.
54) A máquina calculadora era usada por estes no cálculo do dinheiro a pagar pelos indivíduos que lhes adquiriam aqueles produtos.
55) Na casa de habitação do Lugar de P....., tinham os arguidos José M..... e Clara......., uma máquina de filmar de marca Sony, diversos objectos em ouro melhor descritos a fls. 790 verso e 791, e a quantia de 1.159.000$00 (um milhão e cento e cinquenta e nove mil escudos), quantia esta depositada a fls. 1298. Os objectos em ouro tinham-lhes sido entregues pelo arguido Jo...... e pela Manuela..... para serem guardados e haviam sido obtidos por estes como contrapartida de entregas de produtos estupefacientes que fizeram a diversas pessoas.
56) Naquela casa do Lugar de P....., possuía o arguido José M.....:
a) uma pistola semi-automática de calibre 6,35 mm BROWNING, de marca ASTRA, modelo CUB, com cano de comprimento de 56 mm, com seis estrias levógiras no seu interior, com o número de série rasurado, de origem espanhola, munida do respectivo carregador;
b) uma pistola semi-automática de calibre 6,35 BROWNING, de marca FABRIQUE NATIONALE (FN), modelo BABY, com cano de comprimento de 53 mm, com seis estrias dextrógiras no seu interior, com o n.º de série 205RN3986, de origem belga, munida do respectivo carregador;
c) um carregador para munições de calibre 6,35 BROWNING;
d) dez munições de calibre 6,35 BROWNING, sendo nove da marca GECO, de origem alemã, e uma de marca GFL/FIOCCHI, de origem italiana;
e) uma caixa contendo trinta e nove munições de calibre 9 mm Parabellum;
f) um cinto cartucheira com trinta cartuchos de calibre 12 mm.
57) Tais pistolas não se encontravam manifestadas nem registadas, nem o arguido José M..... é titular de licença de uso e porte de tais armas de fogo.
58) No dia da busca domiciliária ali realizada, tinha o arguido José..... no referido apartamento do Edifício V..... os seguintes produtos:
a) três sacos, contendo várias embalagens, com uma mistura de paracetamol e cafeína, com o peso de 910 gramas, conforme exame pericial de fls. 1325;
b) duas embalagens contendo paracetamol com o peso de 1780 gramas, conforme exame pericial de fls. 1327;
c) sete embalagens prensadas em forma de tijolo, contendo uma mistura de paracetamol com cafeína, com o peso de 7246,485 gramas, conforme exame pericial de fls. 1323;
d) três embalagens prensadas em forma de tijolo, contendo heroína, com o peso líquido total de 3077,350 gramas, conforme exame pericial de fls. 1323.
59) Tais produtos haviam sido guardados naquele local pelo arguido José....., destinando-se a heroína a ser misturada com os demais produtos e depois entregue, para ser vendida.
60) Naquela ocasião e local, igualmente tinha o arguido José..... guardados os seguintes utensílios:
a) um liquidificador de marca Philips com resíduos de heroína;
b) três tabuleiros com resíduos de heroína;
c) uma concha, uma colher de sopa, duas facas, um martelo, todos com resíduos de heroína;
d) uma balança digital de marca Tanita com resíduos de heroína,
e) doze rolos de fita-cola industrial;
f) vários invólucros de embalagens habitualmente usadas para acondicionar estupefacientes, sendo dez delas adequadas para um quilo, com resíduos de heroína;
g) uma prensa de marca Mega, modelo KSG-15A, com as respectivas placas-molde, própria para embalar produtos estupefacientes;
h) uma balança de precisão de marca Tefal, com resíduos de heroína.
61) Tais utensílios destinavam-se a ser e foram usados pelo arguido José..... na mistura, divisão, pesagem e embalamento dos produtos estupefacientes por ele possuídos.
62) Naquele mesmo apartamento, possuía o arguido José..... uma máquina de contagem de notas de marca De La Rue, modelo 2620, que lhe havia sido entregue pelo arguido João......., destinando-se a mesma a ser usada na contagem do dinheiro proveniente da actividade de venda de produtos estupefacientes descrita.
63) No mesmo apartamento, tinha o José..... guardados:
a) uma pistola semi-automática de calibre 40 SMITH & WESSON (equivalente a 10 mm no sistema métrico), de marca TAURUS, modelo 92AF, com cano de comprimento de 124 mm, com seis estrias dextrógiras no seu interior, sem número de série visível, munida do respectivo carregador, contendo dez munições;
b) uma caixa com sete munições de calibre 9 mm;
c) uma caixa com quarenta e cinco munições de calibre 6,35 mm.
Tal pistola não se encontra manifestada nem registada, e o arguido José..... não era titular de licença de uso e porte de tal arma de fogo.
64) No interior daquele apartamento, tinham o José..... e Maria..... guardados a quantia de 169.485$00 (cento e sessenta e nove mil e quatrocentos e oitenta e cinco escudos), em notas do banco de Portugal, depositada a fls. 1301, bem como vários objectos em ouro e um relógio, melhor descritos a fls. 815.
65) No espaço de garagem daquele Edifício V..... que era usado pelo Adelino à data daquela busca, possuía este ali guardados os seguintes objectos:
a) uma pistola semi-automática de calibre 6,35 mm BROWNING, de marca STAR, modelo CU (STARLET), com cano de comprimento de 59 mm, com seis estrias dextrógiras no seu interior, com o n.º de série 885723, de origem espanhola, munida do respectivo carregador contendo seis munições;
b) uma pistola semi-automática de calibre .22 MAGNUM (equivalente a 5,6 mm no sistema métrico, de marca AMT, modelo AUTOMAG II, com cano de comprimento de 114 mm, com seis estrias dextrógiras no seu interior, com o número de série rasurado por puncionamento profundo, de origem norte-americana, munida do respectivo carregador contendo oito munições;
c) embrulhadas num lenço, trinta e quatro munições de calibre .22 longo e seis munições de calibre 6,35 mm.
66) Tais pistolas não se encontravam manifestadas nem registadas, nem o Adelino era titular de licença de uso e porte de tais armas de fogo.
67) Na ocasião das referidas buscas, e porque se encontravam nos locais onde as mesmas decorreram, foram revistados o Adelino e a arguida Maria......
68) Quando de tal revista, tinha o Adelino na sua posse:
a) uma porção de haxixe (resina de canabis), com o peso líquido de 1,070 gramas, conforme exame pericial de fls. 1315;
b) um telemóvel de marca Motorola;
c) cinquenta mil pesetas espanholas;
d) dois anéis de mesa em metal amarelo, um deles com uma libra datada de 1910 e o outro com nove pedras incrustadas.
69) O referido telemóvel era pelo Adelino habitualmente usado nos contactos com o arguido Jo..... e com a Manuela....., no âmbito da descrita actividade de venda de produtos estupefacientes.
70) O dinheiro espanhol e os dois anéis de mesa eram provenientes da descrita actividade de venda de produtos estupefacientes, tendo o Adelino recebido tais valores e objectos como contrapartida da mesma.
71) Quando da referida revista pessoal, tinha a arguida Maria..... em seu poder, no interior da sua carteira de mão:
a) uma embalagem plástica contendo paracetamol, com o peso de 6,210 gramas, conforme exame pericial de fls. 1319;
b) a quantia de 264.000$00 (duzentos e sessenta e quatro mil escudos) em notas do Banco de Portugal, depositada a fls. 1300;
c) setenta e cinco mil pesetas espanholas;
d) uma pulseira em metal amarelo e um relógio de marca Maurice Lacroix.
72) Naquele mesmo dia 27 de Março de 2000, data de realização das referidas buscas domiciliárias, foram apreendidos os seguintes veículos automóveis:
a) “Mercedes-Benz”, de modelo “Vito”, com a matrícula n.º ..-..-OJ, de propriedade da Manuela....., com o valor patrimonial de 3.525.000$00;
b) “Mercedes-Benz”, de modelo “Vito”, com a matrícula n.º ..-..-NG, de propriedade do arguido Jo....., com o valor patrimonial de 2.983.000$00;
c) “Ford”, de modelo “Galaxy Diesel (WGR)”, com a matrícula n.º ..-..-IX, de propriedade do Adelino, com o valor patrimonial de 3.533.000$00;
d) “BMW”, de modelo “Serie 3 Cabriolet (E36)”, versão “M3 Cabriolet”, com a matrícula n.º ..-..-HI, de propriedade do arguido José....., com o valor patrimonial de 5.628.000$00.
73) Em 9 de Maio de 2000, veio a ser apreendido o veículo automóvel de marca “BMW”, de modelo “Serie 3 (E36)”, versão “M3”, com a matrícula n.º ..-..-HI, de propriedade do arguido Jo....., com o valor patrimonial de 4.900.000$00, por se ter detectado que o mesmo havia sido levado para o estabelecimento de venda de automóveis denominado “A.....”, sito em....., área desta comarca, para ser vendido.
74) Os sobreditos veículos automóveis, com excepção de que é referido em 72), alínea d), foram adquiridos pelos respectivos proprietários, os arguidos acima indicados, com dinheiro que obtiveram da sua descrita actividade de tráfico de produtos estupefacientes.
75) Tais veículos automóveis, com excepção do que é referido em 72), alínea d), eram igualmente usados pelos seus proprietários em tal actividade, servindo os mesmos de forma essencial para o transporte daqueles produtos por eles vendidos, quando da sua aquisição, venda e transferência de e para os locais onde eram armazenados.
76) O prédio rústico sito no Lugar de ..... ou da L....., é composto por uma parcela de terreno para construção, com a área de 904 metros quadrados, a confrontar de Norte com António..... e de Nascente, Poente e Sul com o caminho público, descrito na Conservatória do Registo Predial de..... sob o n.º 00387/221189.
77) A aquisição do direito de propriedade sobre o referido prédio rústico veio a ser inscrita no registo predial respectivo a favor da Manuela..... pela apresentação n.º 26/110696, uma vez que foi esta quem outorgou a escritura pública respectiva como compradora.
78) O arguido Jo..... e a Manuela..... pagaram a construção da moradia implantada em tal prédio, empreitada essa contratada e executada pelo construtor civil Abílio....., a quem pagaram pela mesma o montante global de cerca de 8.500.000$00, em numerário.
79) O apartamento do Edifício V..... é constituído pela fracção autónoma designada pela letra “R”, destinada a habitação, no terceiro andar esquerdo, que faz parte do prédio urbano em regime de propriedade horizontal, sito no Lugar..... ou Rua....., da freguesia de....., concelho de....., descrito na Conservatória do Registo Predial desta cidade sob o n.º 00608/210192, foi pago pelo preço de 8.000.000$00 respectivos em numerário à vendedora, Manuela......
80) Por seu turno, o arguido João....... forneceu a máquina de contar dinheiro acima referida.
81) Por intermédio do arguido José..... e do Adelino, o arguido João..... outorgou como comprador, em 22 de Março de 2000, no Segundo Cartório Notarial de....., a escritura do contrato de compra e venda da referida fracção autónoma do Edifício V....., em que foram outorgantes vendedores o arguido Adelino e sua mulher, Fernanda......
82) Igualmente a pedido do arguido José....., em Fevereiro de 2000, o arguido João..... aceitou vender-lhe, como intermediário entre aquele e o seu anterior proprietário, o referido veículo automóvel de marca “BMW”, de matrícula n.º ..-..-HI, pelo preço de 6.500.000$00, valor este que aquele lhe iria pagar em numerário, em prestações.
83) Assim, o arguido João..... entregou ao arguido José..... tal veículo automóvel, bem como os documentos respectivos, e deste recebeu como pagamento, além de um outro veículo automóvel avaliado em 1.800.000$00, a quantia de 500.000$00 em notas do Banco de Portugal, nada mais tendo recebido daquele por entretanto ter ficado preso preventivamente à ordem destes autos e o sobredito veículo ter sido apreendido.
84) Com a sua descrita actuação, o arguido Jo..... levou a que se constituísse um grupo de pessoas, entre os quais se contava ele próprio, e o Adelino e Manuela....., que actuando concertadamente e em comunhão de esforços e intentos, se vinham dedicando, reiterada e continuamente, à sobredita actividade de aquisição, transporte, manipulação, armazenamento e revenda de heroína e cocaína.
85) Os proventos monetários resultantes de tal actividade eram geridos pelo arguido Jo....., que determinava quais os investimentos a fazer na aquisição de mais produtos estupefacientes, e com a Manuela....., recebiam e guardavam o dinheiro proveniente das vendas e, como compensação pela sua participação na mesma, pagavam quantias em dinheiro aos demais, sendo, igualmente, o arguido Jo..... quem determinava os preços de venda de tais produtos, onde e quando se abasteceriam dos mesmos, a quem os vendiam e onde eram guardados, assim financiando aquela actividade e assumindo a liderança de tal grupo.
86) Por seu turno, o Adelino aderiu a tal grupo, passando a actuar concertadamente e em conjugação de esforços e intentos na descrita actividade de tráfico de produtos estupefacientes liderada e financiada pelo arguido Jo....., com a descrita colaboração da arguida Manuela......
87) Ao actuarem pela forma descrita, em conjugação de esforços e intentos, lograram o arguido Jo..... e a Manuela..... e Adelino, atentas as quantidades de produtos estupefacientes por eles transaccionadas, distribuir tais produtos por grande número de pessoas, com o que obtiveram e queriam continuar a obter avultada compensação remuneratória. Igualmente o arguido José..... pretendia, com o seu comportamento acima descrito, distribuir os produtos que detinha por grande número de pessoas e obter avultada compensação remuneratória.
88) O arguido Jo..... e a Manuela..... e Adelino, bem como o arguido José..... conheciam as características estupefacientes de tais produtos e bem assim que a sua aquisição, transporte, detenção, manipulação e venda são proibidos, mas não se abstiveram de agir do modo descrito, o que quiseram e fizeram.
89) O arguido Jo..... e igualmente sabia que com a sua actuação promovia e levava à formação de um grupo de pessoas que, agindo concertadamente, tinham como objectivo levar a cabo a descrita actividade de tráfico de produtos estupefacientes, bem como liderava e financiava tal actividade, o que quis e fez.
90) Por seu turno, o Adelino e Manuela..... sabiam que tomavam parte em grupo de pessoas que, agindo concertadamente, sob liderança e mediante financiamento do arguido Jo....., tinham como objectivo levar a cabo a descrita actividade de tráfico de produtos estupefacientes, o que quiseram e fizeram.
91) Ao terem na sua posse as pistolas acima descritas e que lhes foram apreendidas, sabiam os arguidos Jo....., José M....., José..... e o Adelino que as mesmas não se encontravam manifestadas nem registadas e que não eram titulares de licença de uso e porte de tais armas de fogo, bem como que a sua detenção em tais condições é proibida, mas não se abstiveram de agir do modo descrito, o que quiseram e fizeram.
92) Em 6 de Novembro de 1999, cerca das 17 horas, o arguido Manuel A..... encontrava-se junto ao Centro Comercial A....., no interior do referido veículo automóvel “Fiat Croma” (apreendido a fls. 2859), a vender a outros indivíduos embalagens contendo heroína e cocaína.
93) Abordado por agentes da Polícia de Segurança Pública, naquela ocasião e local, tinha o arguido Manuel A..... na sua posse uma embalagem contendo heroína, com o peso líquido de 2,486 gramas, e duas embalagens contendo cocaína, com o peso líquido total de 1,287 gramas (conforme exame pericial certificado a fls. 2873), que destinava a vender a consumidores de tais produtos.
94) Na mesma ocasião, tinha o arguido Manuel A..... na sua posse a quantia de 12.000$00, em notas do Banco de Portugal, quantia que obteve de vendas de heroína e cocaína por si feitas, e que se encontra depositada a fls. 1160.
95) O arguido Manuel A...... tinha perfeito conhecimento da natureza estupefaciente dos produtos por ele adquiridos e vendidos, e bem assim que a respectiva aquisição e venda são proibidos, mas não se absteve de agir do modo descrito, o que quis e fez.
96) O arguido José..... confessou parcialmente os factos dados como provados.
97) Os arguidos não têm antecedentes criminais.
98) O arguido José..... nunca teve qualquer tipo de negócio ilícito com o arguido Jo..... ou com os seus familiares.
99) O arguido José..... é pessoa considerada na zona da sua residência, tem trabalho garantido e tem bom comportamento anterior e posterior aos factos. É casado segundo a tradição cigana e tem dois filhos. Tem apoio familiar.
100) A arguida Maria..... é pessoa considerada na zona da sua residência, tem trabalho garantido e tem bom comportamento anterior e posterior aos factos.
101) O arguido Jo..... é pai de cinco filhos menores e três maiores.
102) O arguido Jo..... é conceituado na área da sua residência.
103) O arguido Jo..... não frequentou a escola.
104) O arguido Jo..... tem tido o apoio e visita dos seus pais enquanto preso e tem adoptado um comportamento normal no EP.
105) A casa dos arguidos José M..... e Clara..... é constituída por 1 quarto, uma sala, cozinha e W.C.
106) Os arguidos José M..... e Clara..... são pessoas conceituadas na área da sua residência, contando, respectivamente, 87 e 69 anos de idade, sendo esta pessoa doente e assistida frequentemente no Hospital de......
107) O arguido Manuel A..... é toxicodependente e tem bom comportamento posterior aos factos.
108) O arguido Manuel A...... tem o 1.º ano de escolaridade do ensino básico, vive com a companheira e uma filha de 22 meses em casa arrendada, beneficiando do apoio da família desta.

A FUNDAMENTAÇÃO do acórdão recorrido:

a) declarações dos arguidos:
- declarações do arguido Jo....., que resolveu prestar declarações numa fase muito adiantada do julgamento, reconhecendo que residiu no apartamento V..... mais ou menos até 1995 e admitiu a generalidade das apreensões que lhe foram efectuadas, mas negou completamente o seu envolvimento em qualquer actividade de tráfico de estupefacientes; todavia, as explicações que deu para a posse de avultada quantia em dinheiro e muitos objectos em ouro (3.000.000$00 eram seus e 2.000.000$00 eram o resultado de doações de várias pessoas da etnia cigana para pagar o casamento de um filho, que nem chegou a realizar-se; o ouro foi comprado por familiares e pela companheira com dinheiro do trabalho respectivo), para a existência de documentos emitidos em seu nome e da Manuela..... na casa de P..... onde foi apreendido estupefaciente e que ficava mesmo ao lado da casa dos seus pais (talvez a Manuela..... os tivesse deixado cair quando lá foi chamar pelos filhos que ali e encontrariam a brincar), para a posse de armas de defesa não autorizadas nem manifestadas, e em especial uma caçadeira de cano curto com sistema “pump-action” (eram para se defender e para caçar) foram consideradas inverosímeis e incoerentes; a inverosimilhança e incoerência têm que ver com o seguinte: não ter sido demonstrada qualquer actividade profissional do arguido (na busca realizada a usa casa não foi encontrado nada relacionado com a actividade de feirante, por exemplo); a testemunha que veio assegurar a proveniência da parte do dinheiro destinada ao tal casamento (Joaquim.....) assistiu à maior parte das sessões do julgamento; os objectos em ouro, além de serem muitos, têm inscrições cuja ligação familiar não foi demonstrada (“P....”, “Lça Padrinho”), encontrando-se alguns partidos; curioso é o facto de se terem encontrado também objectos em ouro na casa dos arguidos José M..... e Clara..... com a inscrição “Lça Padrinho”, tendo também alguns daqueles inscrições de nomes cujas ligações familiares não foram demonstradas (Lídia e Isamael, Lça Avós, Mafalda, Simão, Hélder, Jacinta 28-02-81); quanto à queda dos documentos em nome do arguido e da Manuela..... na casa de P..... onde foi encontrado estupefaciente, o tribunal não acreditou atendendo ao conjunto da exuberante prova existente nos autos sobre o envolvimento do arguido na actividade de tráfico de estupefacientes, adiante referida, e à extraordinária coincidência que constituiria tal facto; quanto à necessidade das armas, é estranho que alguém que se queira defender não manifeste as armas e não solicite a respectiva autorização de uso e porte;
- declarações do arguido José....., que assumiu a posse do estupefaciente e restantes objectos que foram apreendidos no apartamento V....., com excepção do que se encontrava na garagem; justificou a posse do estupefaciente com um contrato de transporte e depósito celebrado com o respectivo proprietário, auferindo por isso cerca de 200 contos; também a arma lhe teria sido entregue para guarda por uma amigo; o tribunal não acreditou nestas últimas declarações do arguido e considerou que este detinha o produto estupefaciente para venda atendendo a todo o conjunto de objectos que, simultaneamente, lhe foram apreendidos, como sejam o paracetamol e a cafeína (consabidamente utilizados como mistura para os produtos estupefacientes), um liquidificador, três tabuleiros, duas balanças digitais e invólucros de embalagens, tudo com resíduos de heroína (que demonstram o manuseamento naquela casa de produtos estupefacientes) e ainda uma máquina de contar notas (indiciador de movimentação de grandes quantidades de dinheiro, próprio de traficantes deste nível); disse ainda em que circunstâncias apresentou o arguido João..... ao seu cunhado Adelino e como foi efectuado o negócio de compra e venda do apartamento....., sendo certo que adquiriu deste arguido o automóvel e a máquina de contar notas que lhe foram apreendidos; disse ainda que esteve com o Jo..... duas vezes, com quem não tinha qualquer negócio, e que não tinha grande amizade com o Adelino;
- declarações da arguida Clara....., que negou o seu envolvimento em actividades de tráfico de estupefacientes, tendo referido a origem do ouro e do dinheiro que lhe foi apreendido bem como das armas de defesa igualmente apreendidas; quanto ao ouro, o tribunal não acreditou, pelos motivos acima expostos a propósito das declarações do arguido Jo....., embora tenha ficado com dúvidas sobre o conhecimento da respectiva proveniência, e por isso deu este facto (conhecimento) como não provado; disse ainda que ela, o marido (arguido José M.....) a nora (Manuela.....) e o filho (arguido Jo.....), nada tinham que ver com o “anexo”, não sabendo muito bem a quem este pertencia, sendo certo que um neto seu passou lá uns tempos há seis ou sete anos;
- declarações do arguido João....., que admitiu a sua intervenção na compra do apartamento V..... por ser um bom negócio, tendo dito como pagou (em dinheiro) e porquê (assim lhe pediram e o arguido movimentava grandes quantias em numerário devido ao tipo de negócios que efectuava); disse ainda que vendeu automóveis ao arguido José..... e que desconhecia qualquer actividade ilícita do Adelino; todavia, quando lhe foi perguntado se já vendeu o andar (porque era para negócio) ou se o colocou no mercado de arrendamento depois da prisão do arguido José..... (a quem dizia tê-lo arrendado) o arguido respondeu negativamente, o que ligado ao facto de o arguido ter vendido uma máquina de contar notas ao arguido José....., criou dúvidas ao tribunal sobre a sua versão; mas também é certo que a prova sobre o seu envolvimento na alegada conversão de bens em relação a este apartamento não foi absolutamente convincente, pelo que o tribunal também teve dúvidas sobre a factualidade a este respeito constante da douta pronúncia, dando, assim, como não provados os pertinentes factos;

b) Documental:
- documentos juntos aos autos, nomeadamente os de fls. 32, 40, 51, 61 a 63 e 64 a 67 (que demonstram o número de automóveis topo de gama adquiridos pelo Jo..... em tão pouco tempo, mesmo admitindo que possa ter trocado uns por outros) 178/182 (que demonstram uma transacção de estupefacientes), 278/280, 293 (que em conjugação com o livrete e título de registo de propriedade juntos a fls. 862, permite afirmar que o Adelino adquiriu a Ford Galaxy depois de 19/01/99), 297 (que identifica o automóvel da testemunha Narciso.....), 302/311 (que demonstram o relacionamento daquela testemunha com a Manuela..... e respectiva família poucos dias antes de vir a ser detido), 338/340, 343, 347/352 (que demonstram como decorreu o dia 18/11/99 em casa do arguido Jo..... e da Manuela....., em especial as pessoas presentes – Narciso e Adelino, e apenas 4 dias antes da detenção do primeiro), 392 (que identifica o veículo de Mariano.....), 401, 429/433, 437/439 (que demonstram a data de aquisição da Mercedes Vito ..-..-NG pelo Jo..... em 26/11/99), 497/498 (que demonstram a deslocação da testemunha Paulo..... a casa do Jo..... e da Manuela..... no dia da detenção deste na posse de estupefacientes), 754, 753, 754, 766/768, 774/780 (que demonstram a aquisição da Mercedes Vito de matrícula ..-..-OJ e respectiva data, bem como o ouro, armas e dinheiro apreendidos ao Jo..... e à Manuela.....), 786/793 (que demonstram a aquisição da Merecedes Vito, de matrícula ..-..-NG e respectiva data), 821/822 (documentos de extraordinária importância nos autos, pois convenceram o tribunal, em conjugação com os restantes elementos probatórios, que o produto estupefaciente apreendido em..... era pertença do Jo..... e da Manuela.....) 857/859, 898/900, 906, 933, 935, 937, 940, 947, 954, 1028/1030, 1099, 1182/1184 (que demonstram a aquisição do BMW de matrícula ..-..-HI e respectiva data, designadamente o pagamento do prémio de seguro respectivo), 1286/1290, 1312, 1651/1658, 1744/1749 (que demonstram que o Jo..... e a Manuela..... não apresentaram quaisquer rendimentos ao fisco); CRCs de fls. 4071 a 4076; relatórios sociais juntos autos, no referente ás condições de vida dos arguidos, cuja apreciação foi temperada com os restantes elementos probatórios existentes no processo e resultantes da audiência de julgamento;
- certidões de fls. 234/242 (que demonstram a detenção do Emanuel..... e do Miguel.....), 369/384 (em especial a carta dirigida ao Jo..... e à Manuela....., que, no conjunto probatório é elucidativa e esclarecedora), 442/489 (que demonstra a detenção do Mariano....., Susana....., Carlos S..... e Laura.....), 528/620 (que demonstram a detenção do Narciso..... e do David.....), 632/685 (que demonstra a detenção da Paulo..... e do Vitor M.....), 686/733 (que demonstra a detenção do Mário.....), 1198/1258, 1260/1267, 1325/1335 (que demonstra o elevado número de contactos telefónicos entre o Narciso..... e o Jo....., sendo que a justificação daquele para o seu relacionamento com este – comércio – foi totalmente insubsistente), 1369/1371, 1553/1578 (que demonstra contactos elevados entre o Jo..... e o Mário.....), 1884/1707 (que demonstra o número de deslocações do Mário..... a Famalicão), 2072/2214 (que demonstra os contactos telefónicos entre o Mariano e o Jo.....), 2852/2913, 2915/2963, (que demonstra a condenação do David.....), 2965, 3050, 3060, 3064 e 3130 (que demonstra a condenação do Paulo.....); note-se que as certidões de inquérito e de acórdãos condenatórios juntos aos autos apenas serviram ao tribunal para dar como assentes a detenção das pessoas em causa e as consequências jurídicas de tais detenções, sendo certo que toda a factualidade dada como provada no concernente à ligação dessas detenções aos arguidos nestes autos teve como base, essencialmente, a prova testemunhal produzida pela Polícia Judiciária em julgamento (adiante referida em pormenor), bem como a prova produzida por alguns dos intervenientes que foram arrolados como testemunhas, e a presunção de facto tirada pelo tribunal a partir de tais depoimentos e das posteriores detenções, conjugadas com as apreensões de dinheiro, armas, ouro, estupefacientes, e automóveis;
- autos de busca de fls. 759/765 (com a rectificação de fls. 1414), 812/817 (com a rectificação de fls. 1414), 841/842, 990/992 e 1181;
- autos de apreensão de fls. 781, 782, 897, 932, 1180 e 1201;
- autos de revista de fls. 889, 953 (com a rectificação de fls. 1414).

c) Pericial:
- exames aos veículos apreendidos de fls. 1227, 1580, 1589, 1595 e 1600-A .
- exames de balística de fls. 1752/1761, 1968/1969, 1980/1981, 2372/2374, 2395/2398 e 2628/2633.
- exames toxicológicos de fls. 1383/1407, 1608 e 1710;
- exames directos de fls. 3401 a 3414.

d) Testemunhal:
1. Inspector Chefe Afonso..... (Polícia Judiciária do.....), que dirigiu a investigação;
2. Inspector Jorge..... (Polícia Judiciária do.....), principal investigador de campo nestes autos, tendo referido que a investigação teve início em finais de 1998, que efectuou diversas vigilâncias à moradia do Jo..... e da Manuela..... e à zona de P....., relatando-as resumidamente, e descreveu o comportamento destes e de quem os visitava; esclareceu que aqueles andavam quase sempre juntos e que o Adelino era visita regular e que também ia a P....., pormenorizando os movimentos deste aquando da existência de entregas de estupefaciente; participou na busca às casas de P..... e na detenção do Mário...., do Narciso....., do David..... e do Paulo....., tendo descrito o percurso deste em Famalicão, depois de ter saído da casa da L.....; afirmou ainda que viu o José..... com o Adelino uma vez e que viu o carro daquele por uma vez na L.....;
3. Inspector Alexandre..... (Polícia Judiciária do.....), que participou em várias vigilâncias à casa da L....., tendo aí visto o Adelino com frequência, que era frequente o arguido Jo..... e a Manuela..... andarem o dia todo de um lado para o outro, incluindo os percursos L.....-P.....-L..... ( e aqui referia informações de outros agentes que estavam nesse momento a vigiar P.....), tendo procedido à detenção do Mário.....; afirmou ainda que viu o Paulo..... na casa da L..... no dia em que aquele veio a ser detido nos Carvalhos; participou nas buscas ao apartamento V..... e a P.....;
4. Inspector Orlando..... (Polícia Judiciária do.....), que participou em vigilâncias na casa da L....., tendo referido que via a Manuela..... frequentemente a acompanhar o arguido Jo....., sendo que as pessoas que os visitavam eram normalmente recebidas por este; especificou ainda as deslocações frequentes de ambos a P..... e que às vezes se faziam acompanhar dos filhos; esteve na detenção do Paulo..... e viu o Narciso na L..... no dia em que veio a ser detido, detenção na qual a testemunha também participou;
5. Inspector Vítor..... (Polícia Judiciária do.....), que fez vigilâncias à casa da L....., tendo visto a testemunha Paulo... a entrar naquela no dia em que veio a ser detido;
6. Inspector Pedro..... (Polícia Judiciária do.....), que procedeu a vigilâncias à casa da L..... no âmbito de outro processo, tendo dito que viu o Mariano..... e a Susana..... duas ou três vezes em tal casa;
7. Inspector Avelino..... (Polícia Judiciária do.....), que fez vigilâncias, mas não tinha um conhecimento preciso dos factos;
8. Inspector Manuel..... (Polícia Judiciária do.....), que seguiu o Adelino, o Mariano, a Susana, o Carlos S..... e a Laura depois do encontro destes na confeitaria “E.....”, em Famalicão, tendo descrito o percurso que fizeram, bem como o facto de os terem perdido de vista durante algum tempo, tendo avistado mais tarde o Jeep do Fernando S....., após o que o perderam de novo, e referido a detenção destes algum tempo depois, nesse mesmo dia;
9. Inspectora Estrela..... (Polícia Judiciária do.....), que estava a vigiar o encontro na referida confeitaria, tendo referido que lá se encontravam o Mariano, a Susana e outro casal (mencionando a existência de um Jeep no local) e que chegou uma Ford Galaxy azul escura, conduzida pelo Adelino, tendo o Mariano saído para falar com o condutor desta, após o que o Mariano fez um sinal aos outros, que saíram também, mantendo-se o condutor da Galaxy em espera; entraram nas viaturas e seguiram a carrinha; seguiu o Mariano até ao Porto até ser detido;
10. Inspector Carlos..... (Polícia Judiciária.....), que participou em várias vigilâncias na L..... e em P......, bem como na busca na L....., e disse que a Manuela....., normalmente, estava em casa e acompanhava o marido nas deslocações; disse ainda que viu o Narciso..... a descer a rua que vinha da casa da L..... no dia em que foi detido e que chegou a ver o Adelino sozinho na zona de P.....; explicitou, até, que quando surgia o Jo..... e a Manuela..... em P....., aparecia também, antes ou depois, o Adelino, sendo certo que nunca viu o Adelino e o Jo..... juntos; afirmou ainda que deteve o Paulo.....; disse ainda que só viu o José..... no dia da respectiva detenção;
11. Inspector Adolfo..... (Polícia Judiciária do.....), que efectuou vigilâncias na L..... e em P....., tendo referido as deslocações habituais do Adelino entre L..... e P.....; participou nas buscas a P..... e no apartamento V.....;
12. Inspector Francisco..... (Polícia Judiciária do......), que esteve na vigilância à “E......” e viu a chegada ao local da Ford Galaxy azul; afirmou que quem conduzia a viatura era o Adelino e que o reconheceu através de uma fotografia daquele que lhe cedeu um colega da PJ; confirmou a conversa do Mariano com o Adelino, o sinal ao Carlos S..... e o subsequente abandono do local por todos;
13. Inspector José A..... (Polícia Judiciária do.....), que esteve na vigilância ao encontro acima referido da “E.....”, tendo confirmado o que foi descrito pelos seus colegas, não tendo visto o condutor da Ford Galaxy; esclareceu, contudo, e com muito interesse, que as perdas de contactos com os carros seguidos ocorreram na zona de P..... e na zona da L.....; participou na busca a casa do arguido Jo.....;
14. Inspector Vitor J..... (Polícia Judiciária de.....), que investigou um outro processo e não tinha conhecimentos relevantes para estes autos;
15. Sargento Rui..... (Guarda Nacional Republicana de.....): que conhece os arguidos Jo....., Manuel A..... e Clara....., por ter vivido perto deles, mas não tinha qualquer conhecimento sobre o envolvimento destes com o tráfico de estupefacientes;
16. Agente José D..... (Polícia de Segurança Pública .....), que procedeu à detenção do arguido Manuel A..... após ter recebido uma denúncia a dizer que o mesmo estava vender estupefacientes, tendo referido que estavam três indivíduos com ele e que tinha droga e dinheiro c, bem como um veículo estacionado, cuja marca indicou; neste particular, o tribunal atendeu a que o Manuel A..... tinha consigo duas espécies de estupefacientes, dinheiro, um automóvel estacionado e que se encontrava com outros três indivíduos para concluir que o mesmo estava a proceder à respectiva venda, já que este não é o quadro de um toxicodependente típico que se encontra a consumir, com pretendia demonstrar a respectiva defesa na douta contestação;
17. Mariano.....: recusou o depoimento por ter sido arguido nos autos;
18. Susana....., recusou o depoimento nos termos da anterior testemunha;
19. Rosa.....: prescindida;
20. Maria....., não tinha qualquer conhecimento relevante para os autos;
21. Abílio....., que referiu que tinha adquirido estupefaciente a uma pessoa de alcunha “F.....”, referindo os preços e quantidades, mas não podia assegurar que tal pessoa fosse o Fernando.....;
22. Emanuel....., que referiu conhecer o Miguel....., e a detenção de estupefacientes, mas não conseguiu precisar onde aquela foi adquirida;
23. Miguel.....: prescindida;
24. Laura....., que não reconheceu ninguém e disse ser prima do Carlos S....., com o qual fez uma deslocação a Famalicão, para ir buscar uma encomenda de estupefacientes (da “branca”) e que foi um cigano que lha entregou;
25. Carlos S.....: prescindida;
26. Narciso...., que referiu conhecer bem o Jo....., de quem é amigo, e a Manuela.....; afirmou que no dia em que foi detido esteve em casa daqueles e que falou com a Manuela.....; procurou convencer o tribunal que se dirigiu a casa daqueles para tratar de negócios e que o estupefaciente que foi apreendido no corpo do seu acompanhante foi por aquele adquirido durante a viagem para Famalicão, sem lhe ter dado conhecimento, quando lhe pediu para parar na Trofa; não conseguiu tal desiderato porque todas as suas respostas às questões que a esse respeito lhe foram dirigidas se revelaram incoerentes;
27. David....., que acompanhou o Narciso..... e depôs em sentido idêntico, sendo patente o seu interesse em não comprometer o Narciso nem o Jo..... e a Manuela.....; disse ainda que tinha ido buscar a droga a.....;
28. Vitor M....., que veio com o Paulo..... a Famalicão no dia em que ambos foram detidos, tendo referido que apenas acedeu ao pedido daquele para ao acompanhar, que lhe disse que vinha tratar de assuntos pessoais; referiu que o Paulo.... parou numa casa em Famalicão e que nesta localidade esteve me dois sítios;
29. Paulo....., que afirmou que veio a Famalicão buscar heroína e que se dirigiu a uma vivenda, onde falou com um sujeito de meia idade que o mandou ir a uma outra casa, tendo seguido pela estrada principal e virado à esquerda numa capelinha – descrição que corresponde ao cruzamento para P.....; disse ainda que a rua onde parou não tem saída, o que corresponde à R. .....;
30. Mário......: prescindida;
31. António R....., vizinho do Adelino e nada adiantou com interesse para os autos;
32. Manuel R....., que também é vizinho do Adelino e nada sabia com interesse para os autos;
33. Lucinda.....: irmã do arguido João....., que nada sabia com interesse para os autos;
34. Abílio....., empreiteiro que construiu a casa da L..... e referiu o respectivo preço, embora de forma não aceitável, pois nem sequer sabia quantos os metros quadrados da casa, nem o preço de custo do metro quadrado; indicou, embora de forma imprecisa que pagamentos lhe fizeram (em prestações semanais) e que ainda lhe devem dinheiro, sendo certo que nada fez para o recuperar; segurança demonstrou ao dizer que foi o Jo..... quem contratou e quem pagou;
35. Domingos.....: prescindida;
36. Fernando....., que vendeu móveis ao Jo..... para a casa da L..... pelo preço de cerca de 3 mil e tal contos, tendo recebido perto de 2000, pagos em dinheiro e semanalmente, sendo certo que ainda lhe devem o restante e que nada fez para recuperar tal dinheiro;
37. Joaquim.....: prescindida;
38. Manuela....., vendedora do apartamento do edifício V....., que nada adiantou com interesse para os autos;
39. Rui....., que é o picheleiro que instalou casas de banho e aquecimento central na casa da L..... e comprou um carro ao Jo....., tendo-lhe vendido um outro;
40. José B....., que vendeu um carro ao Jo..... por 3.600 contos, aceitando um Citröen em retoma; referiu que pagou a parte do preço em dinheiro (2.200 contos) em três prestações no prazo de cerca de um mês;
41. José C.....: vendeu um roupeiro a dinheiro ao arguido Jo..... e à Manuela....., não tendo outro conhecimento relevante para os autos;
42. Manuel J....., que não tinha qualquer conhecimento relevante para os autos;
43. Ernesto....., Presidente da Junta de Freguesia de P....., que conhece os arguidos José M..... e Clara..... há muitos anos, como feirantes, sem contudo demonstrar muita segurança no que afirmou;
44. António....., que procurou esclarecer a origem de parte do dinheiro apreendido ao Jo..... e à Manuela....., dizendo que 2.000 contos eram provenientes de doações familiares e da etnia cigana para pagar a festa de casamento de uma filha sua com um filho do Jo.....; todavia, esta testemunha assistiu a grande parte das sessões de julgamento, pelo que o seu depoimento ficou seriamente abalado, para além de que, mesmo que a sua versão fosse verdadeira, a testemunha não poderia assegurar que fosse, precisamente aquele dinheiro, a não ser que tivesse tomado conta dos números das notas;
45. Gracinda....., vizinha do arguido Jo....., que depôs sobre a integração social deste no seu meio;
46. Antónia....., igualmente vizinha daquele, que depôs em idêntico sentido;
47. José Sá Carvalho, igualmente vizinho daquele, que depôs em idêntico sentido;
48. Elísio....., bancário, que era gestor de conta do arguido João..... e afirmou que ele era um excelente cliente, com bons saldos de depósitos à ordem.

A audiência de julgamento decorreu perante o Tribunal Colectivo, como se assinalou, com gravação da prova aí produzida.

O Tribunal conhece de facto e de direito - artigos, 364º e 428º, nº 1º, do CPP.

É jurisprudência assente que o âmbito dos recursos é determinado pelas conclusões extraídas pelos recorrentes da respectiva motivação, só abrangendo as questões nela contidas, como se infere das disposições conjuntas dos artigos, 412º, nº 1º, do CPP (cfr. artigos, 684º, nº 3º, 690º do CPC, e 4º do CPP).
Dessas questões, acima alinhadas, se conhecerá.

A matéria de facto:

Liminarmente assinale-se que do texto da decisão recorrida, por si só ou em conjugação com as regras da experiência comum, não se perfila qualquer dos vícios apontados no artigo 410º, nº 2º, als., a), b) e c), do CPP, igualmente se não topando qualquer inobservância de requisito cominado com nulidade e que se não deva considerar sanada.
E, nomeadamente, não se conclui pela existência de tais vícios, também, aduzido pelo recorrente Jo..... (os das als. a) e c), citadas), já que o que por ele é infirmado, antes, são determinados pontos da matéria de facto assente tal como fluem no acórdão sub judice, e de que, afinal, discorda.
Vejamos:
Em relação aos citados vícios, exponencialmente alinhados na quase totalidade das decisões recorridas analisadas neste Tribunal, tem-se entendido que:
a) Estamos na presença da insuficiência da matéria de facto para a decisão de direito quando os facto colhidos, após o julgamento, não consentem, quer na sua objectividade quer na sua subjectividade, o ilícito dado como provado;
b) Existe contradição insanável de fundamentação quando de acordo com um raciocínio lógico seja de concluir que não é perfeita a compatibilidade de todos os factos provados;
c) Erro notório é aquele que não escapa ao homem comum e consubstancia-se quando no contexto factual dado como provado e não provado existem factos que, cotejados entre si, notoriamente se excluem, não podendo de qualquer forma harmonizar-se.

Como resulta evidente, não existem no acórdão recorrido os vícios apontados, que, como é por demais sabido, sempre têm de resultar do ‘texto da decisão recorrida’, como peça autónoma, na sua globalidade, mas sem o recurso a quaisquer elementos que lhe sejam externos.
Assim:
A matéria de facto dada como provada é suficiente para a decisão.
Excluída, igualmente, de acordo com o critério exposto, a existência de erro notório na apreciação da prova.
Está hoje conceitual e definitivamente assente que o vício ínsito na referenciada alínea c) do nº 2º do artigo 410º do CPP, é um vício de raciocínio na apreciação das provas, evidenciado pela simples leitura do texto da decisão. Erro tão evidente que salta aos olhos do leitor médio, sem necessidade de qualquer exercício mental. As provas revelam claramente um sentido e a decisão recorrida extraiu ilação contrária, logicamente impossível, incluindo na matéria de facto provada ou excluindo dela algum facto essencial - vd., por todos, o Acórdão do STJ de 30.09.98, prolatado no Processo nº 565/98.

Na esteira do disposto nos artigos, 32º, nº 1º [O processo criminal assegura todas as garantias de defesa, incluindo o recurso], e 205º, nº 1º [As decisões dos Tribunais que não sejam de mero expediente são fundamentadas na forma prevista na lei], da Constituição da República Portuguesa, o artigo 374º, nº 2º do CPP [Requisitos da sentença] exige, não só, a enumeração dos factos provados e não provados, mas ainda uma exposição, tanto quanto possível completa, ainda que concisa, dos motivos, de facto e de direito, que fundamentam a decisão, com indicação e (na redacção introduzida pela Lei nº 59/98, de 25 de Agosto, que iniciou a sua vigência em 1 de Janeiro de 1999 - artigos 6º, nº 1º e 10º, nº 1º) exame crítico das provas que serviram para formar a convicção do tribunal.
Estes motivos de facto que fundamentam a decisão não são nem os factos provados, nem os meios de prova, mas os elementos que em razão das regras da experiência ou de critérios lógicos constituem o substracto racional que conduziu a que a convicção do Tribunal se formasse em determinado sentido, ou valorasse de determinada forma os diversos meios de prova apresentados em audiência.
E tal fundamentação deverá, intraprocessualmente, permitir aos sujeitos processuais e ao Tribunal superior o exame do processo lógico ou racional que lhe subjaz, pela via do recurso (cfr. artigo 410º, nº 2º do CPP).
Por outro lado, extraprocessualmente, a fundamentação deve assegurar pelo conteúdo, um respeito efectivo pelo princípio da legalidade na sentença, e a própria independência e imparcialidade dos juízes, uma vez que os destinatários da decisão não são apenas os sujeitos processuais, mas a própria sociedade.
Temperando-se, assim, o sistema de livre apreciação das provas (artigo 127º do CPP), com a possibilidade de controle imposto pela obrigatoriedade duma motivação racional da convicção formada, evitar-se-ão situações em que se impute ao julgador a avaliação "caprichosa" ou "arbitrária" da prova, e, sobretudo, justificar-se-á a confiança no julgador ao ser-lhe conferida pela liberdade de apreciação da prova garantindo-se, simultaneamente a credibilidade na Justiça (vd. Marques Ferreira, O novo Código de Processo Penal, CEJ, 229 e segs.).
Como assinala Figueiredo Dias (Direito Processual Penal, 204 e segs.), a convicção do juiz há-de ser uma convicção pessoal - até porque nela desempenha um papel de relevo não só a actividade meramente cognitiva mas também elementos racionalmente não explicáveis [v.g. a credibilidade que se concede a um certo meio de prova], e mesmo puramente emocionais - mas, em todo o caso, também ela uma convicção objectivável e motivável, capaz de se impor aos outros.
Uma tal convicção existirá quando e só quando o Tribunal tenha logrado convencer-se da verdade, para além de toda a dúvida razoável.
E, nesta matéria, diremos nós, que se assume, como fundamental, o princípio da imediação, isto é, a relação de proximidade comunicante entre o Tribunal e os participantes no processo, de modo tal que aquele possa obter uma percepção própria do material que haverá de ter como base da sua decisão.
Só estes princípios, com efeito, permitem o indispensável contacto vivo e imediato com o arguido, a recolha da impressão deixada pela sua personalidade.
Só eles permitem, por outro lado, avaliar o mais correctamente possível da credibilidade das declarações prestadas pelos participantes processuais.
E só eles permitem, por último, uma plena audiência destes mesmos participantes, possibilitando-lhes da melhor forma que tomem posição perante o material de facto recolhido e comparticipem na declaração do direito do caso (cfr. F. Dias, ob. cit. 232 e segs.).

Isto dito, concluímos, prima facie, que o recorrente, quando reporta para os vícios invocados, naturalmente por confusão conceitual (artigo 410º, nº 2º, als. a) e c), do CPP), para cuja abundantíssima jurisprudência se remete, se limita a criticar o uso que o Tribunal fez do aludido princípio da livre apreciação da prova (cit. artigo 127º, que referencia o dever do julgador, também, às regras da experiência comum, de perfeita constitucionalidade), em sede de julgamento de facto, pretendendo dever ser outra a matéria provada (cfr., para o exposto, quanto a este princípio, os acórdãos do Tribunal Constitucional publicados no BMJ, 464, 93, e no DR, II série, nº 9, de 12 de Janeiro de 1998, 499).
Mas não menos exacto que o Tribunal a quo indicou, de forma extremamente cuidada e minuciosa, todas as provas que serviram para formar a sua convicção (depoimentos prestados em audiência, não ‘relatos de diligência externa’...), nenhuma delas proibida por lei (artigos, 125º e 355º, nomeadamente o seu nº 2º, que dispensa a leitura em audiência dos documentos constantes dos autos (v.g. uma carta), bastando a existência dos mesmos e a possibilidade de relativamente a eles se poder exercer o contraditório, de assente constitucionalidade - Ac. TC nº 87/99, de 10.02, DR,II,01.07.99), e todas da livre apreciação do julgador, segundo as regras da experiência comum e a sua convicção (artigo 127º, ambos do CPP), operando detidamente a sua análise crítica, com a explicitação individualizada dos participantes que entendeu primordiais para a génese da formação da mesma.

É certo que, por via de errada - e parcial - paginação e duplicação de diversos volumes destes autos, algumas correspondentes indicações, numéricas, em área da fundamentação do acórdão, se acham incorrectas.
Certo, também, é que essa mesma fundamentação, na parte apontada pelo recorrente, existe, obedeceu aos critérios legais supra expostos, e permite, integralmente, a todos os interessados, a sindicância da decisão, sem que exista qualquer dúvida no tocante à integral identificação do material probatório exposto, e que à mesma serviu de suporte.
Afastada, pois, a arguida nulidade prevista no artigo 379º, nº 1º, al.a), do CPP.

Dispõe aquele artigo 127º que, salvo quando a lei dispuser diferentemente, a prova é apreciada segundo as regras da experiência e a livre convicção da entidade competente, princípio da livre apreciação da prova que sofre limitações, nomeadamente no que respeita às provas documental e pericial.
Por outro lado, a lei admite presunções judiciais, que são as ilações que o julgador tira de um facto conhecido para firmar um facto desconhecido, nos casos e termos em que é admitida a prova testemunhal (artigos 349º a 351º do Código Civil).
Como exemplarmente se afirma em acórdão proferido no recurso nº. 9920001 desta Relação, ‘a actividade dos juízes, como julgadores, não pode ser a de meros espectadores, receptores de depoimentos. A sua actividade judicatória há-de ter, necessariamente, um sentido crítico. Para se considerarem provados factos não basta que as testemunhas chamadas a depor se pronunciem sobre as questões num determinado sentido, para que o juiz necessariamente aceite esse sentido ou versão. Por isso, a actividade judicatória, na valoração dos depoimentos, há-de atender a uma multiplicidade de factores, que têm a ver com as garantias de imparcialidade, as razões de ciência, a espontaneidade dos depoimentos, a verosimilhança, a seriedade, o raciocínio, as lacunas, as hesitações, a linguagem, o tom de voz, o comportamento, os tempos de resposta, as coincidências, as contradições, o acessório, as circunstâncias, o tempo decorrido, o contexto sócio-cultural, a linguagem gestual (inclusive, os olhares) e até saber interpretar as pausas e os silêncios dos depoentes, para poder perceber e aquilatar quem estará a falar a linguagem da verdade e até que ponto é que, consciente ou inconscientemente, poderá a mesma estar a ser distorcida, ainda que, muitas vezes, não intencionalmente’.
Isto é, a percepção dos depoimentos só é perfeitamente conseguida com a imediação das provas, sendo certo que, não raras vezes, o julgamento da matéria de facto não tem correspondência directa nos depoimentos concretos, resultando antes da conjugação lógica de outros elementos probatórios, que tenham merecido a confiança do tribunal. Assim, a reapreciação das provas gravadas pelo Tribunal da Relação só pode abalar a convicção acolhida pelo tribunal de 1ª Instância, caso se verifique que a decisão sobre a matéria de facto não tem qualquer fundamento nos elementos de prova constantes do processo ou está profundamente desapoiada face às provas recolhidas.

A fundamentação da decisão - propositadamente acima reproduzida - acha-se alicerçada nas regras da experiência e em adequados juízos de normalidade, não se perfilando a violação de qualquer regra da lógica ou ensinamento da experiência comum.
Nenhuma razão objectiva colhe, agora relativamente a ambos os recorrentes, ao privilegiar ou hierarquizar elementos probatórios, infirmando-os ou afirmando-os de acordo com a sua própria interpretação ou conveniência.
É esta, antes, como vimos tarefa que compete ao Tribunal, já em momento posterior, em sede de decisão.
Enfim: a matéria de facto dada como provada é a que resulta da análise da prova produzida, temperada, como se disse, com os princípios de processo penal convergentes na área, com destaque - inevitável, e desejável sob o ponto de vista da captação psicológica - para o da imediação.
Concluindo-se que nenhum reparo merece a decisão recorrida, quanto à enumeração dos factos provados.

Estabelece o artigo 412º do CPP:
(...).
3. Quando impugne a decisão proferida sobre a matéria de facto, o recorrente deve especificar:
a) Os pontos de facto que considera incorrectamente julgados;
b) As provas que impõem decisão diversa da recorrida;
c) As provas que devem ser renovadas.
4. Quando as provas tenham sido gravadas, as especificações previstas nas alíneas b) e c) do número anterior fazem-se por referência aos suportes técnicos, havendo lugar a transcrição.
(...).

O recorrente José....., como decorre, também, das ‘conclusões’ da respectiva motivação, não cumpriu a imposição legal prevista no nº 4, in fine, do citado artigo 412º, que lhe competia (cfr., por todos, o acórdão deste Tribunal, proferido em 03.07.2002, no recurso nº 631/2002-1ª Secção).

Impor-se ao recorrente o ónus de transcrever as pertinentes passagens da gravação da prova em que se baseia para extrair a conclusão da existência de erro de julgamento da matéria de facto, não priva pois o arguido do direito de recorrer, nem tão-pouco torna o exercício desse direito particularmente oneroso. E, assim, não afecta o direito ao recurso, que, constituindo embora, no processo penal, uma importante garantia de defesa, não é todavia um direito irrestrito tal que o legislador não possa condicionar mediante a imposição de certos ónus ao recorrente - do Acórdão do Tribunal Constitucional, nº 677/99, de 21.12.99, in DR, II, de 28.02.2000.

Assim sendo, a matéria de facto dada como provada, encarada, ainda, sob este ponto de vista, apresenta-se como inatacável.

De qualquer modo, ex abundanti, e relativamente às questões suscitadas nos items 5. e 6. da motivação deste último recorrente, remete-se para o supra expendido sobre a fundamentação da decisão e o princípio da livre apreciação da prova.

A significar que este Tribunal está impedido de conhecer dos recursos interpostos pelos arguidos, no plano dos alegados erros de julgamento em matéria de facto.
Como, nesta área, tem sido decidido nesta Relação, sem embargo de se prosseguir na sua apreciação quanto à matéria de direito.

A matéria de direito:

A. As disposições legais penais em equação:

Estatui o artigo 21º, nº 1º, do referido Decreto-Lei nº 15/93 que “Quem, sem para tal se encontrar autorizado, cultivar, produzir, fabricar, extrair, preparar, oferecer, puser à venda, vender, distribuir, comprar, ceder ou por qualquer título receber, proporcionar a outrem, transportar, importar, exportar, fizer transitar ou ilicitamente detiver, fora dos casos previstos no artigo 40.º, é punido com pena de prisão de 4 a 12 anos.” A agravação legal (artigo 24º) estatui que “As penas previstas nos art.ºs 21.º, 22.º e 23.º são aumentadas de um terço nos seus limites mínimo e máximo se: (...) b) as substâncias ou preparações foram distribuídas por grande número de pessoas; c) o agente obteve ou procurava obter avultada compensação remuneratória; (...) j) o agente actuar como membro de bando destinado à prática reiterada dos crimes previstos nos artigos 21.º e 22.º, com a colaboração de, pelo menos, outro membro do bando (...).”
Dispõe o artigo 28.º (Associações criminosas), n.ºs 1 e 3, do citado Diploma legal que “1. Quem promover, fundar ou financiar, grupo, organização ou associação de duas ou mais pessoas que, actuando concertadamente, vise praticar algum dos crimes previstos nos artigos 21.º e 22.º é punido com pena de prisão de 10 a 25 anos.” (...), e que “3. Incorre na pena de 12 a 25 anos de prisão quem chefiar ou dirigir grupo, organização, ou associação, referidos no n.º 1.”
Estabelece o artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 22/97, de 27 de Junho que “Quem detiver, usar ou trouxer consigo arma de defesa não manifestada nem registada, ou sem a necessária licença nos termos da presente lei, é punido com pena de prisão até 2 anos ou com pena de multa até 240 dias.”
E preceitua o artigo 275.º, n.ºs 1 e 3 do CP: “Quem (...) detiver (...) armas proibidas (...) é punido com pena de prisão até 2 anos ou com pena de multa até 240 dias.” – cfr. art.º 3.º, n.º 1, al. a), do Decreto-Lei nº 207-A/75, de 17 de Abril.

Os critérios legais da medida da pena:

Estatui o artigo 70º:
Se ao crime forem aplicáveis, em alternativa, pena privativa e pena não privativa da liberdade, o tribunal dá preferência adequada à segunda sempre que esta realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.
Dispõe o artigo 71º:
1. A determinação da medida da pena, dentro dos limites definidos na lei, é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção.
2. Na determinação concreta da pena o tribunal atende a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depuserem a favor do agente ou contra ele, considerando, nomeadamente:
a) O grau de ilicitude do facto, o modo de execução deste e a gravidade das suas consequências, bem como o grau de violação dos deveres impostos ao agente;
b) A intensidade do dolo ou da negligência;
c) Os sentimentos manifestados no cometimento do crime e os fins ou motivos que o determinaram;
d) As condições pessoais do agente e a sua situação económica;
e) A conduta anterior ao facto e a posterior a este, especialmente quando esta seja destinada a reparar as consequências do crime;
f) A falta de preparação para manter uma conduta lícita, manifestada no facto, quando essa falta deva ser censurada através da aplicação da pena.
3. [...].
Estabelece, ainda, o artigo 40º, todos do CP:
1. A aplicação de penas e de medidas de segurança visa a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade.
2. Em caso algum a pena pode ultrapassar a medida da culpa.
3. (...).

C. A incriminação:

Recorrente Jo.....:

A factualidade assente consubstancia, por banda deste arguido, a prática de um crime de associação criminosa, previsto no artigo 28º, nºs 1º e 3º do Decreto-Lei nº 15/93, preenchidos que se mostram os respectivos elementos típicos.
A prova fixada:
O arguido Jo..... levou a que se constituísse um grupo de pessoas, entre os quais se contava ele próprio, e o Adelino e Manuela....., que actuando concertadamente e em comunhão de esforços e intentos, se vinham dedicando, reiterada e continuamente, à sobredita actividade de aquisição, transporte, manipulação, armazenamento e revenda de heroína e cocaína (84).
Os proventos monetários resultantes de tal actividade eram geridos pelo arguido Jo....., que determinava quais os investimentos a fazer na aquisição de mais produtos estupefacientes, e com a Manuela....., recebiam e guardavam o dinheiro proveniente das vendas e, como compensação pela sua participação na mesma, pagavam quantias em dinheiro aos demais, sendo, igualmente, o arguido Jo..... quem determinava os preços de venda de tais produtos, onde e quando se abasteceriam dos mesmos, a quem os vendiam e onde eram guardados, assim financiando aquela actividade e assumindo a liderança de tal grupo (85).
Por seu turno, o Adelino aderiu a tal grupo, passando a actuar concertadamente e em conjugação de esforços e intentos na descrita actividade de tráfico de produtos estupefacientes liderada e financiada pelo arguido Jo....., com a descrita colaboração da arguida Manuela..... (86).
Ao actuarem pela forma descrita, em conjugação de esforços e intentos, lograram o arguido Jo..... e a Manuela..... e Adelino, atentas as quantidades de produtos estupefacientes por eles transaccionadas, distribuir tais produtos por grande número de pessoas, com o que obtiveram e queriam continuar a obter avultada compensação remuneratória. Igualmente o arguido José..... pretendia, com o seu comportamento acima descrito, distribuir os produtos que detinha por grande número de pessoas e obter avultada compensação remuneratória (87).
O arguido Jo..... e a Manuela..... e Adelino, bem como o arguido José..... conheciam as características estupefacientes de tais produtos e bem assim que a sua aquisição, transporte, detenção, manipulação e venda são proibidos, mas não se abstiveram de agir do modo descrito, o que quiseram e fizeram (88).
O arguido Jo..... e igualmente sabia que com a sua actuação promovia e levava à formação de um grupo de pessoas que, agindo concertadamente, tinham como objectivo levar a cabo a descrita actividade de tráfico de produtos estupefacientes, bem como liderava e financiava tal actividade, o que quis e fez (89).
Por seu turno, o Adelino e Manuela..... sabiam que tomavam parte em grupo de pessoas que, agindo concertadamente, sob liderança e mediante financiamento do arguido Jo....., tinham como objectivo levar a cabo a descrita actividade de tráfico de produtos estupefacientes, o que quiseram e fizeram (90).

Integra, ainda, a sua actividade criminosa, e em concurso real com este - no crime de associação criminosa está em causa a defesa da paz social e a defesa contra o crime organizado, enquanto no tráfico de estupefacientes se protege a saúde pública -, a prática de um crime de tráfico de estupefacientes agravado, previsto nos artigos 21º, nº 1º e 24º, als. b) e c),do mesmo Diploma legal, aqui se afastando, naturalmente, a agravante j) - actuação como membro de bando -, proibida que se perfila a dupla valoração.
Face ao mecanismo de distribuição demonstrado, e à quantidade de produto em equação nos autos, dúvidas não subsistem que as substâncias em causa (heroína e cocaína) foram facultadas a um elevado número de pessoas, concluindo-se, obviamente, que o recorrente contribuiu consideravelmente para a disseminação da droga.
A tal não obstando, naturalmente, a não identificação concreta de todos os compradores, como parece pretender, sem qualquer sentido nesta área do mundo criminal, o recorrente.
Por outro lado, está dado como provado que o recorrente obteve, com o tráfico, avultada compensação remuneratória.
Uma vez mais se refere que a compensação económica não terá, necessariamente, que ser quantificada em concreto, antes decorrendo, sim, das quantidades transaccionadas e, sendo caso disso, dos bens adquiridos por via de tais transacções, aqui sim, a quantificar em termos de mercado - mercado esse que é do conhecimento geral, tudo, aliás, decorrente das mais elementares regras da experiência comum.

E integra, por fim, a autoria de dois crimes de detenção ilegal de arma de defesa, previstos e puníveis pelo artigo 6º do citado Decreto-Lei nº 22/97 - área que não é objecto do presente recurso.

Em sede de medida da pena o Tribunal ponderou, bem, o seguinte circunstancialismo:
Atenuando, a inexistência de antecedentes criminais, as condições de vida do recorrente, designadamente o número de filhos menores a seu cargo, a impor uma considerável redução da medida da pena para mais rapidamente o arguido poder cumprir as suas tarefas de pai, e a consideração social de que desfruta no seu meio; agravando, as fortes necessidades de prevenção geral, o grau elevado da intensidade do dolo, a elevadíssima ilicitude dos factos, em especial no crime de tráfico de estupefacientes, o grau elevadíssimo da culpa, principalmente no crime de tráfico de estupefacientes e de associação criminosa, e a extensão temporal da actividade.

Face aos critérios legais, e atento o exposto, que se sufraga, entendemos manter as penas parcelares, do crime de associação criminosa, esta no limiar do mínimo abstracto, bem como a de cada um dos crimes de detenção ilegal de arma de defesa, alterando a do crime de tráfico agravado que ora se fixa em 9 anos de prisão.
Nos termos do artigo 77º, nºs 1º e 2º, do CP, atendendo, em conjunto, aos factos e à personalidade do arguido, fixa-se a pena unitária em 14 anos de prisão.

Nada a sindicar quanto à declaração de perdimento em favor do Estado dos objectos referidos nas conclusões supra alinhadas.
Tal ocorreu - como referencia expressamente o acórdão recorrido - por via do imperativamente estatuído nos artigos 35º e 36º do citado Decreto-Lei nº 15/93.
Trata-se, afinal, como consta da matéria de facto assente, de material proveniente, e utilizado, na descrita actividade ilícita (items 74. e 75.).

2. Recorrente José.....:

Foi este condenado:
a) como autor material de um crime de tráfico de estupefacientes agravado, previsto e punível pelos artigos, 21.º, n.º 1, e 24.º, alíneas b) e c), do mesmo Decreto-Lei nº 15/93, na pena de prisão de 8 anos;
b) como autor material de um crime de detenção de arma proibida, previsto e punível pelo artigo 275º, n.º 2 (sic), do CP, com referência artigo 3º do Decreto-Lei n.º 207-A/75, de 17 de Abril, na pena de prisão de 1 ano; e,
c) em concurso de infracções, nos termos do artigo 77.º do CP, na pena única de prisão de 8 anos e 5 meses.

Assiste razão ao recorrente no que toca à sua condenação com base na verificação da agravante contida na al.b) do artigo 24º daquele Diploma legal.
Na verdade, trata-se de matéria que não obteve comprovação em sede da correspondente factualidade provada.

O mesmo não se diga do agravante ínsita na al.c) do mesmo dispositivo.
Acha-se provado que o recorrente José..... ‘pretendia, com o seu comportamento (...), obter avultada compensação remuneratória’ (item 87.).
A expressão utilizada no dispositivo legal é ‘procurar’.
Pretender é sinónimo de procurar - cfr. Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea da Academia das Ciências de Lisboa, II, 2969.
Sendo certo que os autos - em sede de matéria de facto supra reproduzida - demonstram uma gama de actos concretos, factos notórios, que a experiência comum faz extravasar das ‘meras intenções’ que o recorrente aduz.
De qualquer forma, trata-se de matéria de facto assente.

Por último, assinale-se que a referência, na condenação do recorrente, ao nº 2º do artigo 275º, do CP, constitui, face à própria redacção do preceito, mero lapso de escrita, como tal, diga-se, lealmente reconhecido.
E que, in casu, estamos perante arma proibida, de elevado calibre (cfr. artigo 3º,nº 1º, al.a), do Decreto-Lei nº 207-A/75, de 17 de Abril).

Em sede de medida da pena o Tribunal ponderou, bem, o seguinte circunstancialismo:
Atenuando, a inexistência de antecedentes criminais, a consideração social de que o arguido desfruta no seu meio, e a confissão parcial dos factos dados como provados; agravando, as fortes necessidades de prevenção geral, a elevada ilicitude, traduzida na quantidade de estupefaciente e “acessórios” apreendidos, a culpa grave, e, ainda, o elevado calibre da arma detida, que aumenta a respectiva ilicitude.

Face aos critérios legais, e atento o exposto, que se sufraga, entende-se manter a pena parcelar relativa ao crime de detenção de arma proibida, e alterar a do crime de tráfico agravada, fixando-a, antes, em 6 anos e 4 meses de prisão.
Nos termos do artigo 77º, nºs 1º e 2º, do CP, atendendo, em conjunto, aos factos e à personalidade do arguido, fixa-se a pena unitária em 6 anos e 6 meses de prisão.

Termos em que, na procedência parcial dos recursos, se altera o acórdão recorrido pela forma seguinte, fixando-se as condenações em pena de prisão:
a) arguido Jo.....: crime de associação criminosa, 12 anos e 6 meses; cada crime de detenção ilegal de arma de defesa, 6 meses; crime de tráfico de estupefacientes, agravado, 9 anos; fixando a pena unitária em 14 anos; e,
b) arguido José.....: crime de detenção de arma proibida, 1 ano; crime de tráfico de estupefacientes, agravado, 6 anos e 4 meses; fixando-se a pena unitária em 6 anos e 6 meses.
Custas nesta Instância pelos recorrentes, fixando-se a taxa de justiça em 12 UCs para o recorrente Jo....., e em 8 UCs para o recorrente José......

Porto, 18 de Dezembro de 2002
António Joaquim da Costa Mortágua
Francisco Augusto Soares de Matos Manso
Manuel Joaquim Braz