Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRP000 | ||
Relator: | MARIA JOSÉ COSTA PINTO | ||
Descritores: | RESOLUÇÃO DO CONTRATO DE TRABALHO PELO TRABALHADOR PRAZO DE CADUCIDADE FACTO INSTANTÂNEO FACTO CONTINUADO FACTO INSTANTÂNEO COM EFEITOS DURADOUROS | ||
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Nº do Documento: | RP20141117739/12.8TTMTS-A.P1 | ||
Data do Acordão: | 11/17/2014 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | PROVIDO PARCIALMENTE | ||
Indicações Eventuais: | 4ª SECÇÃO (SOCIAL) | ||
Área Temática: | . | ||
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Sumário: | I – O prazo de caducidade do direito de resolução do contrato de trabalho com justa causa, tratando-se de factos instantâneos, inicia-se no momento do conhecimento da materialidade dos factos. II – Já no caso de o comportamento ilícito do empregador ser continuado, o prazo de caducidade só se inicia quando for praticado o último acto de violação do contrato, pois o conhecimento da situação ilícita renova-se permanentemente enquanto ela se mantiver. III – No caso de factos instantâneos com efeitos duradouros, susceptíveis de agravamento com o decurso do tempo, aquele prazo inicia-se não no momento do conhecimento da materialidade dos factos, mas quando, no contexto da relação laboral, assumem tal gravidade que a subsistência do contrato de trabalho se torna a partir de então imediatamente impossível. IV – Deve pois nestas hipóteses fazer-se um juízo perante cada caso concreto no sentido de aferir se o trabalhador, quando conheceu os factos que invoca em fundamento da justa causa, ficou logo em condições de ajuizar das implicações de tal acto no devir do contrato. V – Havendo matéria de facto controvertida com interesse para uma decisão conscienciosa quanto à decisão da excepção da caducidade do direito de resolução, não deve conhecer-se da mesma no despacho saneador e há que ordenar a prossecução dos autos para julgamento, procedendo-se a instrução quanto aos factos alegados pelas partes relevantes para a decisão dessa excepção e para o desfecho da lide, à luz das várias soluções possíveis da questão de direito. | ||
Reclamações: | |||
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Decisão Texto Integral: | Processo n.º 739/12.8TTMTS-A.P1 4.ª Secção Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto: II 1. Relatório1.1. B…, intentou a presente acção emergente de contrato de trabalho no Tribunal do Trabalho de Matosinhos contra C…, S.A e C1…, S.A., peticionando: «a) ser declarado lícito o despedimento do Autor promovido por justa causa, atento os motivos invocados; b) ser reconhecido que a retribuição mensal do Autor era de 11.741,67€ nos termos do supra exposto; c) ser a 1ª Ré condenada ao pagamento dos montantes da retribuição em falta, designadamente o complemento de salário respeitante aos períodos de Outubro de 2009 a Outubro de 2010, e Junho de 2011 a Agosto 2011 - 90.000,00€ e o prémio de gestão respeitante ao ano de 2008 – 12.500,00€. d) ser a 1ª Ré condenada a pagar ao A. uma indemnização por cada ano de antiguidade, fixada em 45 dias de retribuição, dado o grau de ilicitude do despedimento, no total de 202.719,93€ e) ser a 1ª Ré condenada a pagar ao A. uma indemnização por danos não patrimoniais em valor nunca inferior a 150.000,00€ f) ser a 1ª Ré condenada a pagar ao Autor todas as quantias emergentes da cessação do contrato de trabalho como os proporcionais de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal referentes ao ano da cessação (2011) no total de 23.483,34€. g) ser a 2ª Ré condenada ao pagamento solidário das quantias peticionadas nas alíneas c), d), e) e f) do presente pedido.» Em fundamento da sua pretensão alegou, em síntese, que resolveu com justa causa o contrato de trabalho que mantinha com a primeira R. por carta recepcionada no dia 6 de Setembro de 2011 nos termos do disposto no art. 394.º nº2 alíneas a), b), e) e f) e nº3 alínea b) do Código de Trabalho, com fundamento nos factos que alega; que a primeira R. lhe deve os valores peticionados a título de créditos retributivos, indemnização pela resolução com justa causa e indemnização por danos não patrimoniais; que, ao abrigo do contrato de cessão da posição contratual de contrato de trabalho da segunda para a primeira R., a segunda Ré enquanto sua pretérita entidade empregadora responde pelo valor peticionado e sempre será solidariamente responsável pelo seu pagamento atenta a relação de grupo existente nos termos do disposto no art. 334.º do CT, já que detém a 100% a primeira R. Realizada a audiência de partes e não tendo havido conciliação, foi ordenada a notificação das RR. para contestar, vindo as mesmas a apresentar a contestação certificada a fls. 46 e ss. em que impugnam a versão dos factos apresentada pelo A. e, além do mais, invocam a excepção peremptória da caducidade do direito de resolver o contrato de trabalho e alegam que o A. incumpriu o procedimento previsto no artigo 395.º do CT. Em reconvenção, peticionam: «(i) ser a resolução do contrato de trabalho efectuada pelo Autor declarada ilícita e, em consequência, (ii) ser o Autor condenado no pagamento à 1.ª Ré da indemnização prevista nos artigos 399.º e 401.º do Código do Trabalho; Em qualquer caso, (iii) ser o Autor condenado no pagamento de uma indemnização às Rés no valor de € 680.989,42, nos termos dos artigos 483.º, 484.º, 496.º, 562.º, 563.º, 564.º e 566.º do Código Civil.» Na resposta à contestação certificada a fls. 126 e ss., o A. pugou pela improcedência das excepções invocadas e, além do mais, arguiu a excepção de prescrição e caducidade dos créditos peticionados em sede de reconvenção ou, se assim não for entendido, a improcedência da mesma. Foi realizada audiência preliminar e proferido em 24 de Dezembro de 2013 o despacho saneador certificado a fls. 230 e ss. em que o Mmo. Juiz a quo: - decidiu julgar admissível a reconvenção na parte referente aos pedidos deduzidos pelas RR. sob os itens i) e ii) e - não admitiu o pedido reconvencional deduzido pelas RR. sob o item (iii) - condenação do Autor no pagamento de uma indemnização às Rés no valor de € 680.989,42, nos termos dos artigos 483.º, 484.º, 496.º, 562.º, 563.º, 564.º e 566.º do Código Civil -, por não se mostrarem preenchidos os requisitos previstos no art. 30º do Código de Processo de Trabalho, nessa parte absolvendo o A. da instância reconvencional; Expressou ainda no mesmo despacho que o estado dos autos lhe permitia desde já, sem mais produção de prova, o imediato conhecimento (parcial) da acção – no tocante à excepção peremptória da caducidade do direito de resolver o contrato de trabalho, ao (alegado) incumprimento do procedimento previsto no artigo 395.º do código do trabalho invocadas pelas RR. – e da reconvenção – quanto à excepção da prescrição dos créditos peticionados em sede de reconvenção invocada pelo Autor –, o que passou a fazer de imediato, ao abrigo do disposto no n.º 2 do art. 61.º do C.P.T., concluindo a apreciação que efectuou destas questões com o seguinte segmento decisório: «[…] Nestes termos, decide-se: 1. Julgar procedente, por provada, a exceção de caducidade do direito do Autor à resolução do contrato de trabalho com alegação de justa causa relativamente aos factos constantes dos arts. 7º, 13º, 24º, 25º, 26º, 27º e 28º da p.i.. 2. Julgar que o Autor B… não observou o procedimento previsto no art. 395º do Código do Trabalho – indicação sucinta dos factos - quanto ao fundamento atinente aos salários alegadamente em dívida. 3. Consequentemente, absolvo as RR., C…, S.A, e C1…, S.A., dos pedidos contra si formulados pelo Autor C…, na petição inicial, sob as als. a), d), e) e, parcialmente, g). – cfr. fls. 29 e 30. 4. Julgar procedente, por provada, a exceção (perentória) de prescrição invocada pelo Autor, e, em consequência, absolvo-o dos pedidos reconvencionais contra si formulados pelas RR., na contestação, sob as als. (i) e (ii) – cfr. fls. 151. Custas da ação – na parte já decidida – a cargo do A. B…, na proporção do respetivo decaimento (art. 527º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil). Custas da reconvenção a cargo das RR. C…, S.A, e C1…, S.A., na proporção do respetivo decaimento (art. 527º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil). Registe e notifique. Quanto ao mais – pedidos formulados, na p.i., sob as als. b), c), f) e g (parte) -, o estado dos autos não permite, sem mais produção de prova, o imediato conhecimento do mérito da causa, motivo por que, impondo-se o prosseguimento dos autos, se procede de imediato à discriminação dos factos admitidos por acordo (por confissão ou admissão e prova documental) e dos factos controvertidos (base instrutória). […]» Proferido de seguida o anunciado despacho de condensação processual, foi ainda fixado à causa o valor de € 1.161.692,69 (fls. 262). 1.2. O A., inconformado, interpôs recurso desta decisão e formulou, a terminar as respectivas alegações, as seguintes conclusões [que expressis verbis se transcrevem]: “A. Entendeu o Exmo. Sr. Juiz a quo que o Autor na sua carta de resolução do contrato de trabalho, não observou "o disposto no nº1 do art. 395.º do CT, quer quanto à fundamentação sucinta dos factos relativamente aos fundamentos enunciados sob a alínea D), quer quanto ao prazo de caducidade relativamente aos demais fundamentos invocados - forçoso será concluir pela improcedência da verificação de justa causa de resolução do contrato de trabalho, pelo que julgo inviável tal pedido, vem como o correlativo pedido de indemnização com fundamento na justa causa de resolução do contrato." B. Ora, salvo o reiterado respeito, não pode o aqui recorrente conformar-se com tal conclusão, até porque, pelo menos no que dizia respeito ao prazo de caducidade relativamente aos fundamentos invocados na carta de resolução do contrato de trabalho com justa causa, não se nos afigura que, na presente data, com os factos já constantes do processo fosse possível ao Exmo. Sr. Juiz a quo tomar uma decisão sobre tal matéria. C. De facto, e como consta desde logo da própria carta de resolução, os factos alegados perpetuaram-se no tempo, não se tratando de factos instantâneos. D. Conforme resulta do alegado em sede da resposta à contestação apresentada, tendo os factos alegados se verificado no final do mês de Julho, e tendo o aqui recorrente estado de férias e, nesse mesmo sentido, ausente da empresa entre o final do mês de Julho e o decurso do mês de Agosto, só aquando do seu regresso à empresa é que tomou real e efetivo conhecimento dos factos em causa, bem como da repercussão dos mesmos. E. Consta do nº1 do art. 395º do Código de Trabalho que o trabalhador deve comunicar a resolução do contrato ao empregado, por escrito, com indicação sucinta dos factos que a justificam, nos 30 dias ao conhecimento dos factos. F. O nº1 do art. 395º do CT é claro ao considerar que o prazo aí melhor referido só começa a contar da data do conhecimento dos factos por parte do trabalhador e não da data em que os mesmos tiveram lugar. G. Como consta da carta de resolução junta com a PI como doc nº2, o aqui recorrente sustentou a resolução do seu contrato de trabalho em vários acontecimentos, a saber: (i) - Fui privado da desempenhar as funções de Diretor Financeiro inicialmente da totalidade das empresas que faziam parte do Grupo C2..., e desde à algum tempo a esta parte, das sociedades C3..., S.A. e C4...l,S.A. (ii) No pretérito dia 25 de Julho de 2011, cerca das 19 horas, nas instalações da Maia, e sem o meu conhecimento ou autorização, a Exma. Sra. Dra. D... e o Exmo. Sr. Dr. E... entraram no meu gabinete/posto de trabalho e para além de terem remexido na generalidade dos papéis que ali se encontravam, profissionais e pessoais, apostos nas prateleiras, armários e nas minhas mesas de trabalho, decidiram mesmo remover para local que desconheço a quase totalidade da documentação que se encontrava na minha secretária, inslusive pessoal e grande parte dos dossiers que se encontravam dispersos pelos outros locais do meu gabinete. (iii) Foi-me retirado o acesso físico ao meu local de trabalho, por via da alteração das fechaduras do portão e portas do mesmo. (iv) Foi-me retirada a viatura de serviço, que me estava adstrita. (v) Foi-me retirado o acesso total ao sistema informático do Grupo, designadamente a minha conta de email (B1...@C2....pt) com utilização profissional à mais de oito anos e todos os outros mecanismos, programas e bases informáticas imperativos à prestação da minha actividade profissional. (vi) Foi reencaminhada a minha correspondência designadamente de email para terceiros sem o meu consentimento. H. Sendo que, como consta da carta de resolução do contrato, bem como da Petição Inicial, tais factos perpetuaram-se no tempo. I. Sendo igualmente verdade que, há data de 5 de Setembro de 2011, se mantinham todos os factos supra identificados, designadamente o afastamento do aqui recorrente do exercício das funções que eram suas. J. Conforme resulta do teor da própria carta de resolução, bem como da PI apresentada, as violações aos direitos e garantias do aqui recorrente perpetuaram-se no tempo e foram crescendo até um ponto que se tornaram manifestamente insustentáveis. K. Como tem entendido a Jurisprudência dos nossos tribunais, quando a violação de tais direitos e garantias do trabalhador não se esgote num só ato, como foi o caso em apreço, o prazo de trinta dias para que o trabalhador comunique a resolução do seu contrato de trabalho não se inicia com a prática de tais factos, mas sim a partir do momento em que subsistência do contrato de trabalho se torna intolerável para o trabalhador. L. Conforme entendeu o Tribunal da Relação de Lisboa nos seus Acórdãos de 06-07-2011 e 22- 06-2011: "Numa situação de caráter continuado e de efeitos duradouros, que se agrava com o decurso do tempo, o prazo de caducidade a que se refere o referido art. 442.º nº1 do Cód. de Trab, só se inicia a partir da cessação dessa situação ou, então, a partir do momento em que os seus efeitos, no contexto da relação laboral, assumem tal gravidade que a subsistência do contrato de trabalho se torna impossível, ou seja, se torna intolerável para o trabalhador, perante esses factos e as suas nefastas consequências, a manutenção da relação de trabalho." M. Tendo sido esse precisamente o caso em apreço nos presentes autos, todos os atos empreendidos contra o aqui recorrente foram-se avolumando, até ao ponto em que não foi possível por parte do trabalhador aguentar e se viu obrigado a resolver o contrato de trabalho mantido com as aqui recorridas. N. E não se diga, como referiram as recorridas na sua contestação, que tal entendimento origina uma posição abusiva por parte do trabalhador, tendo a respeito de tal temática se pronunciado o Tribunal da Relação do Porto por Acórdão de 07-05-2012 nos termos seguintes: "Não se verifica a caducidade do direito do trabalhador resolver o contrato de trabalho com justa causa se os factos que a integram, tendo-se embora prolongado no tempo, se mantêm à data da resolução do contrato. O contrato de trabalho reveste-se de características especiais, em que a subordinação jurídica e a consequente fragilidade do trabalhador face à sua dependência perante o empregador, bem como a necessidade de garantir o emprego, o levam, não raras vezes e contra a sua vontade, a tolerar a violação, por parte do empregador, dos seus direitos e/ou garantias laborais. Perante a factualidade descrita, e verificando-se ela à data da resolução do contrato de trabalho com invocação da justa causa, o exercício de tal direito não se mostra abusivo não obstante a anterior tolerância do trabalhador em relação a tais comportamentos." O. Pelo que se atesta que ainda não havia operado a caducidade do direito de resolver o contrato de trabalho. P. Não se podendo igualmente conformar com o constante no despacho saneador ora em recurso que refere que "O Autor não invocou qualquer factualidade donde se infira o agravamento da situação com o decurso do tempo". Q. Ora, da própria carta de resolução e da PI, infere-se inequivocamente que os factos que motivaram a resolução do contrato foram sucessivos, sendo o acumular dos mesmos que levou ao agravamento da situação do trabalhador. R. Paralelamente e como igualmente consta da carta de resolução, "Tais factos, até porque perpetrados na presença de terceiros e actualmente do conhecimento geral da organização do Grupo C2..., são manifestamente atentatórios à minha dignidade profissional e sobretudo profissional." Constando a mesma factualidade do item 29º da PI. S. Como é normal, o conhecimento dos factos descritos por parte da generalidade dos trabalhadores e da organização do Grupo C2... não ocorreu num só dia. T. Com o decurso do tempo, os factos descritos foram chegando ao conhecimento de cada vez mais colegas de trabalho, sendo que, no dia 5 de Setembro de 2013, eram já (actualmente como consta da carta de resolução) do conhecimento geral da organização do Grupo C2..., sendo proporcional ao aumento do número de colaboradores que tinham conhecimento dos factos em questão, o aumento do desconforto e agravar da situação do aqui recorrente. Sem prescindir e se tal não for doutamente entendido, U. Ainda que toda a matéria que consta nos pontos supra não fossem consideradas como matéria assente, sempre e de todo o modo teria que ser considerada matéria controvertida, sobre a qual iria, inequivocamente, incidir a produção de prova requerida. V. Pela análise dos autos, apesar de expressamente alegados e com relevância para conhecer do mérito da causa, não resultam como provados ou não provados os seguintes factos: - O Autor gozou férias desde o final de Julho de 2011 e no decurso do mês de Agosto de 2011. - item 25º da resposta à contestação - Só quando regressou de férias é que tomou real conhecimento dos factos alegados na carta de resolução do contrato de trabalho. - item 25º da resposta à contestação - No dia 5 de Setembro de 2011 ainda se mantinham todos os factos supra identificados, designadamente: - item 29º da resposta à contestação - o afastamento do aqui recorrente do exercício das funções que eram suas. - item 29º da resposta à contestação - A falta de acesso às instalações da Empresa. - item 30º da resposta à contestação - A falta de acesso à correspondência e à sua conta de correio eletrónico. - item 31º da resposta à contestação - A viatura de serviço que lhe estava adstrita continuava a não estar ao seu dispor.- item 32º da resposta à contestação - Os documentos pessoais que se encontravam no gabinete do aqui recorrente e que foram removidos sem o consentimento deste ainda não lhe haviam sido entregues – item 33º da resposta à contestação - A impossibilidade de acesso ao sistema informático e ao seu email, ferramenta essencial e o conhecimento que lhe foi barrado tal acesso pelo Grupo C2..., ocorreu na segunda semana de Agosto. - item 46º da resposta à contestação - Os factos em causa foram perpetrados na presença de terceiros. - itens 29º e 37º da PI - No dia 5 de Setembro de 2011 já a generalidade da organização do Grupo C2... tinha conhecimento dos factos em causa. - item 38º da PI - As violações aos direitos e garantias do aqui Autor perpetuaram-se no tempo e foram crescendo até um ponto que se tornaram manifestamente insustentáveis. - item 35º da PI W. Dando-se como provados os factos elencados no item anterior, os quais, enfatize-se, não foram sequer objeto de pronúncia pelo MM. Juiz a quo, conduziria, indubitavelmente, a conclusão distinta da proferida, designadamente no que diz respeito à procedência da exceção de caducidade do direito do Autor, aqui recorrente, à resolução do contrato de trabalho com alegação de justa causa. X. A decisão proferida, ao não fazer qualquer menção sobre os factos supra mencionados, os quais foram alegados em sede de resposta à contestação, enferma de nulidade por manifesta omissão de pronúncia. Y. Nulidade que pelo presente se alega e pretende ver reconhecida com as demais consequências legais. Z. Paralelamente com os motivos supra indicados, alegou ainda o recorrente, em sede da sua carta de resolução que: (vii) V. Exas. à meses a esta data que não me pagam parte do meu salário, pelo que mais uma vez se verifica a violação culposa por parte de V. Exas. de garantias convencionais que me assistem por força do estabelecido no Contrato de Trabalho e na Lei. AA. No que a este ponto diz respeito, entendeu o MM Juiz a quo que o trabalhador, aqui recorrente não indicou de forma sucinta os factos que consubstanciavam os fundamentos alegados. BB. Nos termos das disposições conjugadas do nº5 e da alínea a) do nº2 do art. 394º com o nº1 e 2 do art. 395.º do CT. depreende-se que o prazo de 30 dias mencionado no nº1 do art. 395.º do CT começa a contar do termo dos 60 dias ao fim do qual se considera a falta de pagamento da retribuição como culposa. CC. Conforme consta especificamente da carta de resolução, já há vários meses que não era pago ao aqui recorrente uma parte do seu salário. DD. Adicionalmente, em sede da Petição Inicial apresentada, mais concretamente no item 31º da mesma, o aqui recorrente identificou os períodos em questão, Outubro de 2009 a Setembro de 2010 e Junho a Agosto de 2011, e ainda o valor em atraso de 5.000€ mensais. EE. Refere o MM. Juiz a quo que "face ao estatuído no nº3 do art. 398º, tal alegação fáctica é irrelevante, face ao vício que a missiva da resolução do contrato padece.(...)quanto ao fundamento em apreço, os factos alegados na petição inicial não podem ser judicialmente atendidos, estando vedado ao tribunal pronunciar-se sobre os mesmos." FF. Não obstante entender o aqui recorrente que da missiva enviava constava já a descrição sucinta dos factos que consubstanciam o fundamento alegado, tal como previsto na lei, ainda que assim não fosse, o que não se admite e se equaciona por mera cautela de patrocínio, sempre se dirá que o alegado em sede de petição inicial teria forçosamente que ser atendido, quanto mais não fosse, sendo interpretado como uma correção do vício verificado, aplicando-se extensivamente o disposto no nº4 do art. 398.º do CT que prevê que "o trabalhador pode corrigir o vício até ao termo do prazo para contestar, mas só pode utilizar esta faculdade uma vez". GG. Entende o aqui recorrente que esta faculdade seria sempre aplicável por força de uma interpretação extensiva ao preceito supra transcrito, no entanto, mesmo que assim não fosse, no caso em apreço, ainda mais evidente é a utilização de tal faculdade, uma vez que as Rés em sede da contestação vieram impugnar a resolução operada com base em ilicitude do procedimento previsto no nº1 do artigo 395.º, pelo que sempre e de todo o modo assistiria ao Autor, aqui recorrente tal faculdade- HH. Assim sendo, e contrariamente ao doutamente decidido, não pode o Tribunal a quo não atender os factos constantes na petição inicial a este respeito. II. Mesmo que entendesse que não o poderia fazer porque o trabalhador só poderia utilizar tal faculdade em contestação à impugnação deduzida pela entidade empregadora, sempre teria que admitir o alegado a este respeito em sede de resposta à contestação, mormente o constante no item 42º da mesma. JJ. Assim sendo, afere-se que o prazo referido no nº1 do art. 395.º do CT ainda se encontrava a decorrer quando foi apresentada a carta de resolução, sendo, nesse mesmo sentido, tempestiva e fundamentada a resolução operada. Nestes termos e noutros de Direitos que V. Exas. doutamente suprirão requer-se a V. Exas. que julguem o presente recurso procedente por provado e em consequência, revoguem as decisões proferidas em sede de despacho saneador, mormente no que diz respeito às identificadas sob os números 1. a 3. de fls 24: 1. Julgar procedente, por provada, a exceção de caducidade do direito do Autor à resolução do contrato de trabalho com alegação de justa causa relativamente aos factos constantes dos arts. 7º, 13º, 24º, 25º, 26º, 27º e 28º da p.i. 2. Julgar que o Autor B... não observou o procedimento previsto no art. 395.º do Código do Trabalho - indicação sucinta dos factos - quanto ao fundamento atinente aos salários alegadamente em dívida. 3. Consequentemente, absolvo as RR., C..., S.A., e C1..., S.A., dos pedidos contra si formulados pelo Autor B..., na petição inicial, sob as als. a), d), e) e, parcialmente, g). - cfr. fls. 29 e 30. com as demais consequências legais, designadamente o prosseguimento dos autos para a apreciação de todos os pedidos formulados em sede de petição inicial, incluindo os identificados sob as alíneas a), d), e) e g) (na sua totalidade).” 1.3. As RR. recorridas apresentaram contra-alegações, concluindo pelo não provimento do recurso. 1.4. O recurso foi admitido por despacho certificado a fls. 272 com subida imediata, em separado. 1.5. Recebidos os autos neste Tribunal da Relação, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto pronunciou-se em douto Parecer, a que as partes não responderam, no sentido de que “o acórdão a proferir deve contemplar a continuidade da sentença”. Colhidos os “vistos” e realizada a Conferência, cumpre decidir. * 2. Objecto do recurso* Sendo o âmbito dos recursos delimitado pelas conclusões das alegações do recorrente – artigo 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil aprovado pela Lei n.º 41/2013[1], de 26 de Junho, aplicável “ex vi” do art. 87.º, n.º 1, do Código de Processo do Trabalho –, as questões que se colocam à apreciação deste tribunal, por ordem lógica da sua apreciação, prendem-se com a análise:1.ª – da nulidade da sentença por omissão de pronúncia; 2.ª – da suficiência da motivação da carta de resolução quanto à falta de pagamento de salários e da possibilidade de uma eventual insuficiência ser suprida na petição inicial da acção instaurada pelo trabalhador para reconhecimento da justa causa de resolução ou na resposta à contestação que nessa acção o mesmo apresente (através de uma interpretação extensiva do artigo 398.º, n.º 4 do Código do Trabalho); 3.ª – da caducidade do direito de resolução quanto aos factos alegados nos artigos 7.º, 13.º e 24.º a 28.º da petição inicial e da eventual necessidade de se decretar a anulação da decisão recorrida para ampliação da matéria de facto com vista ao apuramento integral, em audiência de julgamento, de factos alegados na petição inicial e na resposta à contestação relevantes para a apreciação daquela questão. * Deve notar-se que se mostra transitado em julgado o segmento da decisão sob censura em que a mesma não admitiu o pedido reconvencional deduzido pelas RR. sob o item (iii) - condenação do Autor no pagamento de uma indemnização às Rés no valor de € 680.989,42, nos termos dos artigos 483.º, 484.º, 496.º, 562.º, 563.º, 564.º e 566.º do Código Civil -, e, absolveu o A. da instância reconvencional e na parte em que julgou procedente a excepção de prescrição invocada pelo Autor, e o absolveu dos pedidos reconvencionais contra si formulados pelas RR., na contestação, sob as als. (i) e (ii).* 3. Fundamentação de facto* * Os factos materiais relevantes para a decisão da causa foram fixados pelo saneador-sentença recorrido nos seguintes termos:«[...] 1. O Grupo Empresarial C2… é constituído, diretamente, por 8 empresas. 2. A C1… detém 100% do capital social da quase totalidade das empresas do Grupo. 3. A holding do Grupo, a C1…, vem sendo presidida pelo Senhor F… conforme documentos constantes de fls. 157 a 161. 4. Em 1 de Março de 2000, o Autor entrou para os quadros da C1…, S.A., 2ª Ré, assumindo funções de Diretor Administrativo e Financeiro de todo o Grupo C2…. 5. Em 1 de Agosto de 2003, o Autor, juntamente com a C1…, S.A., e C…, S.A., 1ª Ré, outorgaram o intitulado “CONTRATO DE CESSÃO DA POSIÇÃO CONTRATUAL DE CONTRATO DE TRABALHO”, cuja cópia consta de fls. 45 e 46, nos termos do qual a posição contratual resultante do contrato de trabalho do A. foi cedida pela C1…, S.A. à 1ª ré, a qual garantiu àquele “todos os direitos decorrentes da sua antiguidade ao serviço da cedente, os quais reportam à aludida data de 01-03-2000”. 6. Desse contrato constava, designadamente, que “ao trabalhador é assegurado, em caso de incumprimento reiterado das obrigações contratuais que incumbem à cessionária, a faculdade de retornar à empresa cedente ou a qualquer outra empresa do grupo que exerça actividade idêntica ou similar à Cedente ou Cessionária”, conforme documento constante de fls. 45 e 46. 7. Foi solicitado ao Autor que entregasse uma viatura (Ford …) que estava ao serviço da C3…, cuja entrega ocorreu no dia 30 de Julho de 2011 (sábado), nas instalações de Matosinhos. 8. Mediante carta registada com aviso de receção datada de 5 de Setembro de 2011, rececionada pela 1ª Ré no dia 6 de Setembro de 2011, o Autor comunicou à 1ª Ré a resolução do seu contrato de trabalho com invocação de justa causa, conforme documentos constantes de fls. 39 a 41. 9. A referida missiva tem o seguinte teor: “(…) Assunto: Resolução do Contrato de Trabalho com justa causa nos termos do disposto no art. 394.º do Código de Trabalho Exmos Senhores Pela presente venho comunicar a V. Exas a resolução do meu contrato de trabalho com Justa causa nos termos do disposto no art. 394º, nº 2, alíneas a), b), e) e f) e alínea b) do nº 3, do Código de Trabalho, a qual produz efeitos imediatos. Os motivos que levaram à minha decisão, prendem-se, designadamente, com os factos já remetidos a V Exa em escritos anteriores, nomeadamente o meu email datado de 01 de Agosto de 2011 e cujo conteúdo aqui: deixo por reproduzido para todos os demais efeitos legais, e que ainda aqui sucintamente reitero, em conjugação com outros sucedidos posteriormente e agora do meu conhecimento: - Fui privado de desempenhar as funções de Diretor Financeiro inicialmente da totalidade das empresas que faziam parte do Grupo C2…, e desde à algum tempo a esta parte das sociedades C3…, SA e C4… , SA. -No pretérito dia 25 de Junho de 2011, cerca das 19 horas, nas instalações da Maia, e sem o meu conhecimento ou autorização. a Exma sra Dra D… e o Exmo Sr Dr E…, entraram no meu gabinete/posto de trabalho e para além de terem remexido na generalidade dos papeis que ali se encontravam, profissionais e pessoais, apostos nas prateleiras, armários e nas minhas mesas de trabalho, decidiram mesmo remover para local que desconheço, a quase totalidade da documentação que se encontrava na minha secretária inclusive pessoal e grande parte dos dossiers que se encontravam dispersos pelos outros locais do meu gabinete. - Foi-me retirado o acesso físico ao meu local de trabalho, por via da alteração das fechaduras do portão e portas do mesmo, - Foi-me retirada a viatura de serviço, que me estava adstrita. - Foi-me retirado o acesso total ao sistema informático do Grupo, designadamente, a minha conta de email, (B1…@C2….pt) com utilização profissional e pessoal à mais de oito anos, e todos os outros mecanismos, programas e bases informáticas imperativos à prestação da minha actividade profissional. - Foi reencaminhada a minha correspondência designadamente de email para terceiros sem o meu consentimento; Tais factos, até porque perpetrados na presença de terceiros e actualmente do conhecimento geral da organização do Grupo C2…, são manifestamente atentatórios à minha dignidade profissional e sobretudo pessoal. As factualidades descritas não tiveram justificação plausível, pelo que as mesmas configuram uma violação culposa por parte de V. Exas. das garantias convencionais adstritas a qualquer trabalhador Adicionalmente, V. Exas à meses a esta data que não me pagam parte do meu salário, pelo que mais uma vez se verifica a violação culposa por parte de V. Exas. de garantias convencionais que me assistem por força do estabelecido no Contrato de Trabalho e na Lei. Neste sentido e nos termos do disposto no art. 396.º do Código de Trabalho, tenho direito a uma indemnização, quê não prescindo a determinar em 45 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano de antiguidade, bem como aos proporcionais que me são devidos em função da cessação do contrato de trabalho, montantes que agradecia a regularização num prazo não superior a 10 dias, sob pena de me ver obrigado a recorrer às instâncias judiciais competentes. Informo ainda, que embora não quantifique nesta, não prescindo da indemnização por danos morais decorrentes da violação dos meus direitos, nos termos já supra expostos Solicito também que me disponibilizem a declaração para o Fundo de Desemprego. (…)”. conforme documentos constantes de fls. 39 e 40. 10. Por carta datada de 15 de Setembro de 2011, a 1ª Ré enviou carta registada com A/R ao Autor, na qual refutava a existência de justa causa de resolução do contrato, conforme documento constante de fls. 42. 11. O Autor remeteu à 2ª Ré a carta datada de 21 de Setembro de 2011, por esta rececionada em 23 de Setembro de 2011, na qual requereu o pagamento de salários em atraso, proporcionais pelo trabalho prestado e indemnização decorrente da resolução contratual, tendo concedido um prazo de cinco dias para o efeito, conforme documentos constantes de fls. 43, 44 e 47. 12. A 2ª Ré respondeu ao Autor nos termos constantes da carta datada de 27 de Setembro de 2011, cuja cópia consta de fls. 48. 13. A petição inicial dos presentes autos deu entrada mediante via eletrónica, através do Citius, em 31/08/2012 (cfr. fls. 59). 14. Na petição inicial o A. solicitou a citação prévia das RR., o que foi deferido mediante despacho datado de 3/09/2012 (cfr. despacho constante de fls. 60). 15. As RR. foram citadas para a ação em 5/08/2012, conforme A/R`s constantes de fls. 63 e 64. 16. Realizada a audiência de partes em 9/10/2012, as partes requereram a suspensão da instância com vista à obtenção de um acordo (cfr. fls. 82 e 83). 17. Decorrido o prazo de suspensão da instância sem que as partes tenham alcançado um acordo, as Rés apresentaram contestação mediante via eletrónica, através do Citius, em 8/11/2012 (cfr. fls. 182). [...]». Estes os factos a atender para resolver as questões postas no recurso. * 4. Fundamentação de direito* 4.1. Da nulidade da sentença* No decurso das suas conclusões, o recorrente invoca que a sentença recorrida padece de nulidade por omissão de pronúncia “ao não fazer qualquer menção sobre os factos” que indicou como alegados em sede de resposta à contestação e reputa de relevantes para a decisão do mérito da causa (conclusões X e Y).Nos termos do preceituado no artigo 77.º do Código de Processo do Trabalho “[a] arguição de nulidades da sentença deve ser feita expressa e separadamente no requerimento de interposição do recurso”. Este preceito pressupõe que o anúncio da arguição e a corresponde motivação das nulidades (a substanciação das razões por que se verificam) devem constar do requerimento de interposição do recurso que é dirigido ao órgão judicial “a quo”, permitindo ao juiz recorrido aperceber-se, de forma mais rápida e clara, da censura produzida e possibilitando-lhe o eventual suprimento das nulidades invocadas, o que pode até modificar o objecto do recurso interposto, tornando parcialmente inúteis as alegações. Por isso, não cumpre a referida exigência legal, a arguição da nulidade da sentença, omitida no requerimento de interposição do recurso, e feita só na alegação, uma vez que não permite que o tribunal recorrido, no momento em que se debruça sobre o requerimento de interposição, designadamente para apreciar da admissibilidade do recurso, facilmente se aperceba de quais os vícios apontados à decisão impugnada e respectivos fundamentos, de modo a que, rapidamente, deles tome conhecimento, procedendo, se for caso disso, à sanação, do que poderá resultar a desnecessidade de subsistir o recurso nessa parte. Em consonância com esta especialidade estabelecida pela lei processual laboral, a jurisprudência tem considerado, pacificamente, que não deve ser conhecida pelo tribunal ad quem a nulidade da sentença em processo laboral que não foi arguida no requerimento de interposição de recurso[2]. No caso em análise, o recorrente não cumpriu no requerimento de interposição de recurso o formalismo que lhe é imposto no artigo 77.º do Código de Processo do Trabalho, nada ali referindo quanto a uma nulidade da decisão recorrida, nem expondo, mesmo resumidamente, as razões de uma eventual nulidade e limitando-se a interpor recurso de apelação da sentença com que se não conformou e a indicar o seu efeito e modo de subida (vide fls. 271). Pelo que é de considerar extemporânea a referida arguição de nulidade da sentença da primeira instância. Deve ter-se presente, contudo, que, em bom rigor, o que o recorrente invoca a este propósito prende-se com o erro de julgamento em que, na sua perspectiva, o tribunal a quo incorreu ao decidir de mérito sem determinar a produção de prova sobre parte da matéria alegada nos artigos que indica da resposta à contestação, não se traduzindo na imputação à sentença de uma nulidade por um qualquer dos motivos legalmente enunciados no artigo 615.º do Código de Processo Civil de 2013 já em vigor à data da sua prolação. Seja como for, sem prejuízo de se apreciar a argumentação do recorrente aduzida a propósito, na medida em que a mesma possa constituir fundamento do recurso de apelação, não pode conhecer-se da nulidade invocada a este título. * 4.2. Do cumprimento do ónus de “indicação sucinta dos factos” quanto à parte da missiva relativa ao salário alegadamente em dívida* Ao caso sub judice aplica-se o regime jurídico do Código do Trabalho aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de Fevereiro, em face do que prescreve o art. 7.º, n.º 1 da Lei Preambular, e atenta a data do acto desvinculatório e dos factos que o fundamentam nele situados no tempo.O artigo 394.º, n.º 1 do Código do Trabalho de 2009 possibilita a desvinculação contratual por declaração unilateral do trabalhador sem necessidade de observar o período de aviso prévio previsto no art. 400.º do Código do Trabalho em situações que considera serem particularmente graves e se prefigurem de molde a que deixe de ser exigível ao trabalhador que permaneça ligado à empresa por mais tempo, isto é, pelo período fixado para o aviso prévio. Estabelece o art.º n.º 2 do referido artigo 394.º do mesmo diploma, que constituem justa causa de resolução do contrato pelo trabalhador, nomeadamente, os seguintes comportamentos do empregador: “a) falta culposa de pagamento pontual da retribuição; b) violação culposa das garantias legais ou convencionais do trabalhador; c) aplicação de sanção abusiva; d) falta culposa de condições de segurança, higiene e saúde no trabalho; e) lesão culposa de interesses patrimoniais sérios do trabalhador; f) ofensa à integridade física ou moral, liberdade, honra ou dignidade do trabalhador, punível por lei, praticada pelo empregador ou seu representante legítimo.” De acordo com o artigo 395.º, n.º 1 do Código do Trabalho, a declaração de resolução deve ser feita por escrito, com indicação sucinta dos factos que a justificam, nos trinta dias subsequentes ao conhecimento desses factos. Dessa indicação depende a atendibilidade dos factos invocados pelo trabalhador para justificar a cessação imediata do contrato[3]. Diferentemente do que sucede com a nota de culpa, não se exige uma “descrição circunstanciada dos factos”, mas apenas uma “indicação sucinta” dos mesmos, diferença que resulta de no primeiro caso, a descrição factual se inserir num procedimento disciplinar com vista ao despedimento e ser “essencial para a defesa do trabalhador, já que as suas possibilidades de defesa dependem do conhecimento dos factos de que é acusado” e de no segundo se tratar somente de “anunciar à contraparte o fundamento de uma rescisão imediata”. Mas, mesmo aqui, sempre o deverá ser “em termos tais que permitam, se necessário, a apreciação judicial da justa causa alegada”[4]. Ou seja, apesar de na resolução não estar em causa o direito de defesa da contra-parte, é essencial que a descrição factual efectuada de forma sucinta na missiva resolutória permita, por si só, a apreciação judicial da existência de justa causa para a resolução. Na palavra de Ricardo Nascimento, "[e]xiste assim uma menor exigência formal na resolução do contrato por iniciativa do trabalhador em relação ao despedimento por facto imputável ao trabalhador e compreende-se a diferença: no primeiro caso, trata-se somente de anunciar à contraparte o fundamento de uma rescisão imediata, em termos tais que permitam, se necessário, apreciação judicial da justa causa alegada, enquanto no segundo, a descrição factual insere-se num processo de despedimento, sendo a mesma essencial para a defesa do trabalhador, já que as suas possibilidades de defesa dependem do conhecimento dos factos de que é acusado". Não obstante, continua, “embora a indicação dos motivos que fundamentam a resolução contratual por parte do trabalhador possa ser efetuada de forma sucinta, os mesmos têm, cum grano salis, que delimitar espacio-temporalmente os factos integradores desses motivos. Só esses factos, e não outros, podem ser invocados judicialmente, em sede de acção indemnizatória”[5]. Como se refere no Ac. do Supremo Tribunal de Justiça de 05 de Janeiro de 2012[6], “na comunicação escrita que corporiza a resolução, deve o trabalhador indicar os factos concretos que o levaram a tomar essa atitude, o que deverá ser feito de forma sucinta, mas clara e suficiente para permitir a apreciação judicial da existência de justa causa, tendo em atenção que só os factos indicados na comunicação, e não outros, são atendíveis para a justificar judicialmente”. Ainda à luz da LCCT aprovada pelo Decreto-Lei n.° nº 64-A/89 de 27 de Fevereiro, salientava Abílio Neto que por muitas e fortes que sejam as razões que assistam ao trabalhador para a rescisão imediata do contrato, se as não discriminar no documento de despedimento, perde a oportunidade e a possibilidade de o fazer mais tarde, designadamente na acção de indemnização que venha a intentar contra a entidade patronal[7]. No caso "sub judice", o A. pôs termo ao contrato de trabalho que o vinculava à primeira R. invocando justa causa, através da carta datada de 5 de Setembro de 2011 que enviou à R. [factos 8. e 9.)], aí fundando a sua atitude resolutória, além do mais, no seguinte: “V. Exas à meses a esta data que não me pagam parte do meu salário” (sic.) A decisão da 1.ª instância, debruçando-se sobre este fundamento, discorreu nos seguintes termos: «[…] Relativamente à referida alegação, na missiva remetida à 1ª ré o Autor não particulariza – como podia e devia - «a que período e quais os montantes a que o suposto “não pagamento de salário” se reporta». Ora, face aos termos em que se encontra redigida a carta de 5 de Setembro de 2011, dirigida pelo autor à 1ª ré, esta, colocada na posição dum declaratário normal - art. 236.º do Cód. Civil -, está, na parte em apreço, impossibilitada de alcançar a natureza dos factos que motivaram a resolução contratual com esse concreto fundamento, nomeadamente quais os montantes em dívida (natureza e correspetivo valor ou quantum) e a que período se reportam. É certo que o Autor na respectiva petição inicial, nos artigos 31.º e 64.º, alegou factos tendentes a concretizar a invocada falta de pagamento de «salários», nos quais se afirma que «em pelo menos dois períodos, Outubro de 2009 a Setembro de 2010» «e Junho a Agosto de 2011, que uma parte do salário do Autor está em atraso, mais concretamente a verba de 5.000,00€ mensais». Porém, face ao estatuído no n.º 3 do art. 398º, tal alegação fáctica é irrelevante, face ao vício que a missiva da resolução do contrato padece. Por isso, e uma vez que, quanto ao concreto fundamento em apreço, os factos alegados na petição inicial não podem ser judicialmente atendidos, estando vedado ao tribunal pronunciar-se sobre os mesmos, torna-se também irrelevante apurar, em sede de audiência de julgamento, da veracidade ou não daqueles factos (agora) alegados – atinentes aos reclamados salários em dívida - que poderiam integrar a justa causa para a resolução contratual. […]» É manifesto o acerto destas considerações. Com efeito, e desde logo, é evidente o carácter vago e conclusivo da afirmação de que há meses não é paga uma parte do salário. A leitura de tal afirmação não permite minimamente perceber o significado e relevo no âmbito da relação laboral do que ali é conclusivamente dito. Há quantos meses não é pago o salário? Que “parte” do salário não vem sendo satisfeita? Qual a natureza e valor dessa parcela que diz não ter sido paga? A que períodos diz respeito? Perante o que ficou exarado na carta subscrita pelo recorrente, um declaratário normal não alcançaria o exacto significado fáctico do que ali é alegado e, sobretudo, torna-se impossível uma apreciação judicial deste fundamento da resolução por absoluta carência de factos sobre os quais fundar a decisão de direito. Ora, a observância dos requisitos de forma a que se reporta o artigo 395.º do Código do Trabalho constitui condição da licitude da resolução com invocação de justa causa do contrato de trabalho pelo trabalhador, e integra uma formalidade com natureza ad substantiam, delimitando o conteúdo do escrito a invocabilidade, em juízo, dos factos susceptíveis de serem apreciados para tais efeitos[8]. Independentemente de a falta daquelas formalidades não contender, como não contende, com a eficácia da resolução – pois que esta, ainda que ilícita, produz sempre os efeitos extintivos do contrato de trabalho –, já para efeitos de apreciação da justa causa, a exigência da indicação sucinta dos factos não tem por finalidade a mera prova da declaração, antes condicionando a possibilidade do conhecimento judicial dos factos que, eventualmente, hajam sido determinantes da resolução (cfr. ainda o artigo 364.º, n.º 1 do Código Civil). Ainda a este propósito, alega o recorrente que na petição inicial apresentada, identificou os períodos em questão, referindo os mesmos períodos na resposta à contestação. E sustenta que o alegado em sede de petição inicial teria forçosamente que ser atendido, quanto mais não fosse, sendo interpretado como uma correcção do vício verificado, aplicando-se extensivamente o disposto no n.º 4 do art. 398.º do CT que prevê que o trabalhador pode corrigir o vício, faculdade que seria aplicável por força de uma interpretação extensiva do preceito, tanto mais que no caso em apreço as Rés em sede da contestação vieram impugnar a resolução operada com base em ilicitude do procedimento previsto no nº1 do artigo 395.º. Ora, apesar de efectivamente o recorrente ter identificado no artigo 31.º da petição inicial os períodos em que alega estar uma parte do salário não pago – Outubro de 2009 a Setembro de 2010 e Junho a Agosto de 2011 – e o valor em atraso – que se consubstanciaria num complemento de vencimento de € 5.000,00 mensais –, reiterando aqueles períodos na resposta à contestação (artigo 42.º), cremos não merecer censura a decisão do Mmo. Juiz a quo ao afirmar que a referida alegação fáctica dos articulados é irrelevante, face ao vício que a missiva da resolução do contrato padece. Senão vejamos. Dispõe a norma invocada pelo recorrente que “[n]o caso de a resolução ter sido impugnada com base em ilicitude do procedimento previsto no nº 1 do artigo 395º, o trabalhador pode corrigir o vício até ao termo do prazo para contestar, mas só pode utilizar essa faculdade uma vez”. Como é consensualmente entendido na doutrina, esta norma do n.º 4 do artigo 398.º do Código do Trabalho que permite ao trabalhador corrigir o vício gerador da ilicitude do procedimento até ao termo do prazo para contestar (equivalente ao artigo 445.º do Código do Trabalho de 2003), só se aplica no caso de ser do empregador a iniciativa judicial de impugnar a resolução efectuada pelo trabalhador. Já se é o trabalhador que assume a iniciativa de instaurar a acção judicial – como sucedeu in casu – o empregador pode invocar a ilicitude do procedimento sem que o trabalhador tenha a oportunidade de corrigir o vício procedimental, não sendo aquele preceito aplicável a estes casos, ainda que por analogia[9]. Cremos que, efectivamente, nada autoriza o intérprete a concluir que o legislador ao formular a norma e inscrevê-la no âmbito da acção de impugnação instaurada pelo empregador, aludindo expressamente ao “prazo para contestar” (sendo que apenas nessa acção cabe ao trabalhador contestar) tenha dito menos do que pretendia. Ora só nesse caso – que entendemos não ocorrer – seria o intérprete autorizado a alargar o texto legal e a fazer a sua interpretação extensiva[10]. Além disso, mesmo no âmbito da acção de impugnação da resolução instaurada pelo empregador em que se inscreve, a referida faculdade não visa suprir a omissão da factualidade justificativa da resolução que deve constar da comunicação – a única atendível, de acordo com o n.º 3 do artigo 398.º –, mas tão só conferir “a possibilidade de uma melhor caracterização dos (mesmos) factos, os já anteriormente invocados e por escrito”[11]. Ora no caso vertente a alegação que o ora recorrente fez constar do artigo 31.º da petição inicial e 42.º da resposta não caracteriza factos que tenha feito constar da missiva de 5 de Setembro de 2011 – pois que nesta apenas é feita uma afirmação genérica e conclusiva –, mas constitui, ela própria, a indicação sucinta de factos que, eventualmente, poderiam consubstanciar a invocada justa causa. Concluímos pois, como a 1.ª instância, que os factos alegados na petição inicial e na resposta à contestação quanto ao concreto fundamento em apreço não podem ser judicialmente atendidos para justificar a licitude da resolução operada pelo A. através da carta remetida à primeira R. em 5 de Setembro de 2011, estando vedado ao tribunal pronunciar-se sobre os mesmos, por força da já referida limitação temática, o que torna irrelevante averiguar da sua veracidade em sede de audiência de julgamento para efeitos de apuramento da justa causa de resolução contratual. Improcede, nesta parte, o recurso. * 4.3. Da caducidade do direito de resolução quanto aos factos alegados nos artigos 7.º, 13.º e 24.º a 28.º da petição inicial e da eventual necessidade de se decretar a anulação da decisão recorrida para ampliação da matéria de facto* 4.3.1. A decisão sob censura, no que diz respeito à caducidade do direito de resolução, teceu as seguintes considerações [excluem-se as notas de rodapé]:«[…] Analisemos, então, os fundamentos fácticos invocados pelo Autor na mencionada carta para fundar a justa causa de resolução do contrato de trabalho. (a) «Fui privado de desempenhar as funções de Director Financeiro inicialmente da totalidade das empresas que faziam parte do GrupoC2…, e desde» há «algum tempo a este parte das sociedades C3…, S.A. e C4…, S.A..» Apesar de na referida missiva o Autor não ter indicado a data a partir da qual foi alegadamente privado de exercer as funções de Director Financeiro, certo é que no decurso da sua petição inicial baliza temporalmente tais datas, ao reportá-las, respectivamente, a Junho de 2010 e pouco dias após 13 de Julho de 2011 (cfr. artigos 6º, 7º, 11º, 12º e 13º da p.i.). Quanto a este concreto circunstancialismo fáctico, que se traduz em factos instantâneos cujos efeitos se estendem ou prolongam no tempo, é de concluir como as RR. que, aquando da comunicação dirigida à 1.ª Ré (feita em 6 de Setembro de 2011), já havia operado a caducidade do direito resolver o contrato de trabalho, por ter sido exercido o prazo de 30 dias que o trabalhador dispunha para resolver o contrato. Em igual sentido veja-se o Ac. da RP de 25/02/2013, disponível em www.dgsi.pt, nos termos do qual pese embora a alteração das funções da trabalhadora ser duradoura e continuada, esta circunstância, sem mais, não impede o decurso do referido prazo de 30 dias18. Saliente-se, aliás, que o Autor não invocou qualquer facticidade donde se infira o agravamento da situação com o decurso do tempo, pelo que o decurso do prazo de caducidade se iniciou logo que foi alegadamente privado do exercício das funções de Director Financeiro - no limite das sociedades C3…, S.A. e D4…, S.A., o que na sua alegação ocorreu pouco dias após 13 de Julho de 2011 -, e não ulteriormente. (b) -No pretérito dia 25 de Junho de 2011, cerca das 19 horas, nas instalações da Maia, e sem o meu conhecimento ou autorização, a Exma sra Dra D… e o Exmo Sr Dr E…, entraram no meu gabinete/posto de trabalho e para além de terem remexido na generalidade dos papeis que ali se encontravam, profissionais e pessoais, apostos nas prateleiras, armários e nas minhas mesas de trabalho, decidiram mesmo remover para local que desconheço, a quase totalidade da documentação que se encontrava na minha secretária inclusive pessoal e grande parte dos dossiers que se encontravam dispersos pelos outros locais do meu gabinete. (c) - Foi-me retirado o acesso físico ao meu local de trabalho, por via da alteração das fechaduras do portão e portas do mesmo; Foi-me retirada a viatura de serviço, que me estava adstrita19; Foi-me retirado o acesso total ao sistema informático do Grupo, designadamente, a minha conta de email, (B1…@C2….pt) com utilização profissional e pessoal à mais de oito anos, e todos os outros mecanismos, programas e bases informáticas imperativos à prestação da minha actividade profissional; Foi reencaminhada a minha correspondência designadamente de email para terceiros sem o meu consentimento; Relativamente ao circunstancialismo supra elencado [b) e c)] o Autor alega na p.i., no art. 38º, que o facto supra referido [reportando-se ao fundamento enunciado sob o item b)] é do conhecimento da generalidade dos trabalhadores do Grupo, porque divulgado pelos próprios autores e por elementos da Administração em reuniões havidas, sendo também «do conhecimento geral que a partir de 30 de Julho de 2011», lhe foi vedado o acesso «ao seu posto de trabalho e bloqueado o acesso à sua correspondência eletrónica e postal». Nesta conformidade, quanto ao referido concreto circunstancialismo fáctico, é igualmente de concluir que tais factos deveriam ter sido invocados, pelo Autor, até 30 de Agosto de 2011. Não o tendo sido – pois só o foram em 6 de Setembro de 2011 -, forçoso será também concluir pela inobservância do prazo de 30 dias previsto no n.º 1 do art. 395º do Código de Trabalho, o que mais uma vez nos reconduz à verificação da caducidade do direito resolver o contrato de trabalho quanto a tais fundamentos. […]» Alega o recorrente que, com os factos já constantes do processo, não era possível ao Exmo. Sr. Juiz a quo tomar uma decisão sobre a caducidade relativamente aos demais fundamentos invocados, julgando inviáveis os pedidos formulados com fundamento na justa causa de resolução do contrato. E funda esta sua conclusão em dois vectores argumentativos. Por um lado, na alegação de que os factos descritos na carta de resolução se perpetuaram no tempo e se mantinham em 5 de Setembro de 2011, não se tratando de factos instantâneos, inferindo-se da carta e da petição inicial que os factos foram sucessivos e o seu acumular levou ao agravamento da situação do trabalhador (conclusões C a T). Por outro lado, na alegação de que aqueles factos se verificaram no final do mês de Julho e, tendo o recorrente estado de férias e ausente da empresa entre o final do mês de Julho e o decurso do mês de Agosto, só aquando do seu regresso à empresa é que tomou “real e efectivo conhecimento dos factos em causa”, bem como da repercussão dos mesmos, havendo matéria controvertida necessária à apreciação da excepção da caducidade (conclusões U a W). Vejamos. 4.3.2. Resulta do já citado artigo 395.º, n.º 1 do Código do Trabalho que a declaração de resolução do trabalhador com invocação de justa causa deverá feita por escrito, com indicação sucinta dos factos que a justificam, “nos 30 dias subsequentes ao conhecimento desses factos”. Este prazo de 30 dias previsto no n.º 1 do artigo 395.º para o exercício do direito de resolver o contrato de trabalho por iniciativa do trabalhador, é de caducidade, como resulta do disposto no n.º 2 do artigo 298.º do Código Civil, nos termos do qual, “[q]uando, por força da lei ou por vontade das partes, um direito deva ser exercido dentro de certo prazo, são aplicáveis as regras da caducidade, a menos que a lei se refira expressamente à prescrição”, pelo que não se interrompe, nem se suspende (artigo 328.º do Código Civil). Tal caducidade não opera ope legis, carecendo de ser invocada pela parte interessada, uma vez que se trata de matéria não encontra excluída da disponibilidade das partes (cfr. o n.º 2 do artigo 333 e o artigo 303.º, do Código Civil). A contagem do prazo de 30 dias inicia-se com o “conhecimento” pelo trabalhador dos factos que integram a justa causa de resolução invocada, conhecimento este que, em princípio, coincide com a data por ele alegada para a sua verificação, atendo o estreito envolvimento pessoal das partes no contrato de trabalho e o facto de, por definição (cfr. o artigo 394.º, n.ºs 2 e 3), o facto que integra a justa causa se reflectir de imediato na pessoa do trabalhador, envolvido no devir de um contrato que é executado diariamente, com excepção dos períodos de fins de semana, feriados e férias. Este necessário nexo cronológico entre a decisão de resolver o contrato e os factos invocados mais não constitui do que “uma manifestação do princípio da actualidade da justa causa que traduz a regra de que a resolução se deve seguir imediatamente à verificação da situação de impossibilidade, até em consonância com a finalidade do direito de resolução – evitar situações insustentáveis”[12]. Seja como for, a interpretação desta regra “tem de se fazer em articulação com a própria noção de justa causa”[13], o que se nos afigura determinar que, consoante o tipo de factos invocados em fundamento da justa causa, se devam adoptar diferentes perspectivas na fixação do dies a quo para a contagem do prazo que a mesma prevê. Com a fixação de um prazo de caducidade, o legislador parte do princípio de que, se depois de tomar conhecimento dos factos que fundamentam a resolução, o trabalhador não reagiu por mais de 30 dias, é de supor que o acto do empregador não impossibilitou a prossecução da relação, não havendo por isso justa causa para a resolução. Assim, tratando-se de factos instantâneos, em que a conduta é uma só, realizada ou executada em dado momento, factos estes que se esgotam com o respectivo acto concretizador, aquele prazo inicia-se no momento do conhecimento da materialidade dos factos. Já no caso de o comportamento ilícito do empregador ser continuado (p. ex. no caso de violação do direito de ocupação efectiva), o prazo de caducidade só se inicia quando for praticado o último acto de violação do contrato (o conhecimento da situação ilícita renova-se permanentemente enquanto ela se mantiver), ao invés do que ocorre com os factos instantâneos que se esgotam com o respectivo acto concretizador, embora os seus efeitos possam protrair-se no tempo (p. ex. em determinados casos de baixa de categoria profissional ou de redução da retribuição)[14]. Mas nestas últimas hipóteses, assentes em factos instantâneos, mas com efeitos duradouros susceptíveis de agravamento com o decurso do tempo, tem-se entendido que aquele prazo se inicia, não no momento do conhecimento da materialidade dos factos, mas quando assumem tal gravidade no contexto da relação laboral que a subsistência do contrato de trabalho se torna imediatamente impossível[15]. Assim, se o trabalhador não tiver logo a exacta percepção das implicações do acto instantâneo do empregador (p. ex. por estar o trabalhador convicto de que se trata de uma situação temporária), deve entender-se que o prazo se inicia, não no momento inicial do conhecimento da pura materialidade dos factos mas, sim, quando no contexto da relação laboral o trabalhador fique ciente da sua efectiva gravidade e a mesma seja de molde tornar inexigível a partir de então a manutenção da relação. Deve pois nestas hipóteses fazer-se um juízo perante cada caso concreto no sentido de aferir se o trabalhador, quando conheceu os factos que invoca em fundamento da justa causa, ficou logo em condições de ajuizar das implicações de tal acto no devir do contrato. Em conformidade com este entendimento foram proferidos o Acórdão da Relação do Porto de 25 de Fevereiro de 2013[16] – de acordo com o qual, pese embora a alteração das funções da trabalhadora tenha efeitos duradouros, esta circunstância, sem mais, não impede o decurso do referido prazo de 30 dias quando não resulta da matéria de facto que a decisão de pôr fim ao contrato dependeu de qualquer ponderação com base na efectiva prestação do trabalho depois de decorridos os 30 dias –, o Acórdão do STJ de 14 de Setembro de 2011[17] – do qual se extrai que, tendo o trabalhador conhecimento de todos os factos atinentes à retirada de parte das funções que até então exercia, o que lhe permitia ajuizar da dimensão da lesão dos seus direitos e exercer o direito de resolução do contrato nos trinta dias subsequentes a esse conhecimento, ocorre a caducidade do direito de resolução do contrato de trabalho pelo trabalhador se a declaração de resolução só foi efectivada depois desses 30 dias – e o Acórdão do STJ de 18 de Dezembro de 2013[18] – segundo o qual, provando-se que, a partir de Maio de 2010 até Novembro de 2010, a autora se inteirou de toda a factualidade atinente à retirada de funções que desempenhava e à atribuição das mesmas a outro trabalhador e bem assim tendente a persuadi-la a celebrar um novo acordo de cedência ocasional de trabalhadores, com inclusão de cláusula indicativa de local de trabalho diferente do que possuía, estava a mesma em condições de ajuizar a dimensão da lesão dos seus direitos e exercer o direito de resolução do contrato, nos 30 dias subsequentes à obtenção de tal conhecimento. 4.3.3. No caso vertente, o recorrente pôs termo ao contrato de trabalho que o vinculava à primeira R. através da carta registada com aviso de recepção datada de 5 de Setembro de 2011 referida nos pontos 8. e 9. da matéria de facto, recebida pela sua empregadora no dia 6 de Setembro de 2011, na qual comunicou a resolução do contrato de trabalho com invocação de justa causa. 4.3.3.1. O primeiro fundamento nela invocado em fundamento da resolução foi o seguinte: «Fui privado de desempenhar as funções de Director Financeiro inicialmente da totalidade das empresas que faziam parte do Grupo C2…, e desde» há «algum tempo a este parte das sociedades C3…, S.A. e C4…, S.A.» Na carta em que procede à resolução, o recorrente não indica a data a partir da qual foi alegadamente privado de exercer as funções de Director Financeiro, o que desde logo nos coloca sérias dúvidas sobre a suficiência desta descrição quanto à matéria da privação do desempenho de funções, para se considerar cumprida a exigência de indicação sucinta dos factos em que se funda a justa causa de resolução constante do artigo 395.º, n.º 1 do Código do Trabalho. Diríamos mesmo que tal exigência não se mostra cumprida pois que a descrição é extremamente vaga (não se percebe como, por quem ou de que modo foi o A. “privado” da direcção financeira), não há a mínima localização temporal dos factos e a afirmação que o recorrente fez constar da missiva afigura-se, até, contraditória, parecendo haver logo no primeiro momento (inicialmente) uma privação das funções de director financeiro da “totalidade das empresas do grupo”, o que torna depois equívoco que, num segundo momento (desde há algum tempo) essa privação se reporte a duas sociedades do mesmo grupo que, à partida, já estariam incluídas na primeira afirmação (a não ser que houvessem sido constituídas posteriormente, o que não é esclarecido e é contrariado pela alegação constante dos artigos 7.º a 9.º da petição inicial, em que o A. exceptua da totalidade das empresas do grupo C2… a que se refere no primeiro momento, a C4…, S.A. e a C3…, S.A.). Seja como for, uma vez que no decurso da sua petição inicial o ora recorrente baliza temporalmente tais datas ao reportá-las, respectivamente, a Junho de 2010 e a pouco dias após 13 de Julho de 2011, é possível efectuar – como a 1.ª instância – um juízo seguro quanto à verificação da caducidade. Com efeito, na petição inicial, o A. é claro quanto à localização temporal da alegada privação das funções de director financeiro que, como alega, se verificou concretizou em dois momentos: em Junho de 2010 (cfr. os artigos 6º e 7º da petição inicial) e poucos dias após 13 de Julho de 2011 (cfr. os artigos 11º, 12º e 13º da petição inicial). Tratou-se, pois, de factos instantâneos, embora com efeitos para o futuro, nada indiciando no caso vertente que o A. não tenha ficado de imediato com a exacta consciência do significado de tal alegada retirada de funções, ou que só com o passar do tempo se tenha tornado inexigível a manutenção da relação de trabalho com tal fundamento. Aliás, é de notar que, de acordo com a alegação do A., estes factos se verificaram sempre na sequência da renúncia que fez a cargos de administração das empresas de que deixou de ser director financeiro (quer em Junho de 2010, quer em Julho de 2011). Assim, se pretendia resolver o contrato de trabalho com tais fundamentos, deveria tê-lo feito nos 30 dias subsequentes às datas em que, segundo alegou, deixou de desempenhar as inerentes funções, o que necessariamente conheceu, se não antes (porque pessoalmente envolvido na renúncia por si feita à administração de tais sociedades), pelo menos por ocasião da alegada privação que, segundo a descrição da petição inicial, ocorreu, respectivamente, em Junho de 2010 e poucos dias após 13 de Julho de 2011. Em sentido similar decidiram os já citados Acórdão da Relação do Porto de 25 de Fevereiro de 2013 e Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 14 de Setembro de 2011 e de 18 de Dezembro de 2013. Diferentemente no caso sobre que se debruçou o Acórdão da Relação do Porto de 07 de Maio de 2012 invocado pelo recorrente[19], eram alegados (e ficaram provados), factos concretos demonstrativos de que nos 30 dias que antecederam a resolução a ali autora (assistente de consultório) foi sendo incumbida de funções que extrapolavam claramente o objecto do seu contrato de trabalho e, em parte, se traduziam em desvalorização profissional (vg. funções de limpeza), tratando-se, pois, de uma situação de factos continuados e não de um facto instantâneo de alegada retirada de determinadas funções que prolonga os seus efeitos no tempo. A partir do momento em que foi alegadamente privado da direcção financeira das empresas que identificou, o recorrente ficou ciente de que deixou de estar incumbido daquela direcção. Nada tendo sido pelo A. alegado no sentido de que estaria convicto de que a privação seria transitória ou que, de algum modo, tinha a expectativa de que houvesse uma reversão da situação, cabe concluir que o A. se confrontou com um facto instantâneo cujos efeitos, naturalmente, perduraram no tempo, mas que ficou desde logo em condições de ajuizar das implicações de tal acto no devir do contrato. Como a 1.ª instância, entendemos que o A. não invocou efectivamente qualquer factualidade donde possa inferir-se o agravamento, com o decurso do tempo, da situação relativa à alegada privação das funções de director financeiro. Para além da transcrição que se fez (e se deixou destacada), o recorrente não volta a aludir no texto da carta a esta alegada privação de funções, sendo certo que a referência actualista que efectua no texto e enfatiza nas conclusões do recurso – de que "Tais factos, até porque perpetrados na presença de terceiros e actualmente do conhecimento geral da organização do Grupo C2..., são manifestamente atentatórios à minha dignidade profissional e sobretudo profissional" – não se reporta àquela privação de funções, mas aos factos sucedidos em 25 de Julho e aos que descreve a seguir e que, na lógica da carta, ocorreram na sequência do episódio de 25 de Julho (apesar de, mais uma vez, o recorrente não se ter preocupado em os localizar no tempo com precisão). Assim, o decurso do prazo de caducidade quanto a este aspecto iniciou-se logo que o recorrente foi alegadamente privado do exercício das referidas funções, sendo certo que o facto mais recente a este propósito alegado consistiu na privação da direcção financeira nas sociedades C3…, S.A. e C4…, S.A., o que ocorreu pouco dias após 13 de Julho de 2011 segundo é dito artigo 13.º da petição inicial. Cabe pois confirmar a procedência da excepção de caducidade do direito de resolução do contrato por parte do A. recorrente no que diz respeito à alegada privação de funções de director financeiro das empresas pois, aquando da comunicação dirigida ao empregador e feita em 6 de Setembro de 2011, já havia operado a caducidade do direito resolver o contrato de trabalho com este fundamento, por ter sido excedido o prazo de 30 dias de que o trabalhador dispunha para o efeito. E improcedem, neste aspecto, as conclusões do recurso. 4.3.3.2. Vejamos agora o segundo fundamento invocado na carta de resolução, aí explanado nos seguintes termos: «No pretérito dia 25 de Junho de 2011, cerca das 19 horas, nas instalações da Maia, e sem o meu conhecimento ou autorização, a Exma Sra Dra D… e o Exmo Sr Dr E…, entraram no meu gabinete/posto de trabalho e para além de terem remexido na generalidade dos papeis que ali se encontravam, profissionais e pessoais, apostos nas prateleiras, armários e nas minhas mesas de trabalho, decidiram mesmo remover para local que desconheço, a quase totalidade da documentação que se encontrava na minha secretária inclusive pessoal e grande parte dos dossiers que se encontravam dispersos pelos outros locais do meu gabinete. - Foi-me retirado o acesso físico ao meu local de trabalho, por via da alteração das fechaduras do portão e portas do mesmo; - Foi-me retirada a viatura de serviço, que me estava adstrita; - Foi-me retirado o acesso total ao sistema informático do Grupo, designadamente, a minha conta de email, (B1…@vC2….pt) com utilização profissional e pessoal à mais de oito anos, e todos os outros mecanismos, programas e bases informáticas imperativos à prestação da minha actividade profissional; - Foi reencaminhada a minha correspondência designadamente de email para terceiros sem o meu consentimento;» Relativamente a este circunstancialismo, a decisão da 1.ª instância concluiu igualmente pela caducidade do direito de resolução, afirmando que “tais factos deveriam ter sido invocados, pelo Autor, até 30 de Agosto de 2011” e fundando-se, para o efeito, na alegação que o A. fez constar do artigo 38.º da petição inicial de que o facto supra referido [reportava-se o A. ao episódio de 25 de Julho a que aludira no artigo 37.º] é do conhecimento da generalidade dos trabalhadores do Grupo, porque divulgado pelos próprios autores e por elementos da Administração em reuniões havidas, sendo também “do conhecimento geral que a partir de 30 de Julho de 2011”, lhe foi vedado o acesso “ao seu posto de trabalho e bloqueado o acesso à sua correspondência electrónica e postal”. Daqui inferiu o Mmo. Julgador a quo que este concreto circunstancialismo fáctico deveria ter sido invocado, pelo Autor, até 30 de Agosto de 2011 e, não o tendo sido – pois só o foi em 6 de Setembro de 2011 – não foi observado o prazo de 30 dias previsto no n.º 1 do art. 395º do Código de Trabalho e verifica-se a caducidade do direito resolver o contrato de trabalho quanto a tais fundamentos. Neste aspecto não podemos acompanhar a sentença. Com efeito, não cremos que da alegação de que é do conhecimento da generalidade dos trabalhadores do grupo o relatado episódio do dia 25 e da alegação de que é “do conhecimento geral” que a partir de 30 de Julho de 2011 foi vedado o acesso ao posto de trabalho do A. e bloqueado o acesso à sua correspondência electrónica e postal, possa inferir-se ter o A. tomado conhecimento em tais datas de todos estes factos a que agora nos reportamos. Cabe lembrar que a caducidade do direito de resolução com invocação de justa causa constitui uma excepção peremptória – que determina a inutilização das vantagens da qualificação da situação como de justa causa, apesar de se manterem os efeitos extintivos da declaração resolutória –, excepção que não é de conhecimento oficioso e deve ser invocada pelo empregador na contestação (cfr. os artigos 60.º, n.º 1 do Código de Processo do Trabalho e 493.º, n.º 3 do Código de Processo Civil de 1961, em vigor à data da apresentação da contestação)[20]. Ora, sendo necessário para aferir do seu funcionamento saber quando tomou o trabalhador conhecimento dos factos que fundamentam a resolução, é manifesta a relevância da factualidade alegada pelo A. nos articulados da acção no sentido de que tomou tal conhecimento dos factos que invoca na carta de resolução em data posterior à sua ocorrência, maxime no que diz respeito àqueles que, atenta a descrição que deles é feita, podem não ter sido do seu imediato conhecimento. Analisando a petição inicial e a resposta à contestação, verifica-se que, quanto aos factos agora em apreciação, o A. efectua várias referências temporais quanto ao momento da sua ocorrência e ao momento do seu conhecimento que devem ser atendidas (na parte em que consubstanciam confissão) ou averiguadas (na parte em que refutam o conhecimento contemporâneo à verificação) com vista ao cabal esclarecimento das datas em que se verificaram tais factos e o A. deles tomou conhecimento e à consequente decisão da invocada excepção de caducidade do direito de resolução quanto aos mesmos (vide os artigos 25.º e 38.º da petição e os artigos 25.º, 29.º a 33.º e 46.º da resposta). Particularmente no artigo 25.º da resposta[21], o ora recorrente alegou factos susceptíveis de fazer situar a data do conhecimento que tomou desta factualidade em que também funda a justa causa de resolução em data posterior à sua ocorrência. E impunha-se que tal fosse averiguado na 1.ª instância antes de concluir na decisão recorrida pela verificação da excepção da caducidade do exercício do direito de resolução relativamente aos fundamentos agora em apreciação, apenas com base na alegação que o A. também fez no artigo 38.º da petição da data em que se verificou o “conhecimento da generalidade dos trabalhadores do grupo” (quanto ao episódio do dia 25, a ter-lhe sido vedado o acesso ao posto de trabalho e a ter sido bloqueado o acesso à sua correspondência electrónica e postal). Se este conhecimento geral pode eventualmente vir a ser ponderado, na apreciação a efectuar da globalidade da prova produzida, como contribuindo para a convicção de que o próprio A. igualmente tomou conhecimento dos factos em causa também no dia 30 de Julho, não é o mesmo, de per si, suficiente para afirmar tal conhecimento do A. e para nele fundar a decisão de mérito quanto à caducidade do direito de resolução relativamente a estes factos. Assim, tendo em consideração que os factos descritos na carta de resolução que vieram a ser vertidos nos artigos 24.º a 28.º da petição inicial se consubstanciaram em factos instantâneos que se esgotam em si mesmos (o episódio de 25 de Julho) e factos instantâneos com efeitos que se protelam no tempo (alteração das fechaduras do portão que impediu o acesso físico ao local de trabalho, retirada da viatura de serviço, retirada do acesso ao sistema informático do grupo e reencaminhamento da correspondência de e-mail para terceiros), é imprescindível averiguar se, como alega o A., só dos mesmos tomou conhecimento no final do mês de Agosto (artigo 25.º da resposta à contestação) a fim de possibilitar uma decisão segura sobre a invocada excepção da caducidade do direito de resolução do contrato de trabalho, quando o mesmo foi exercido pelo trabalhador, sendo igualmente conveniente que se precise a data da sua ocorrência (note-se que a este propósito o A. não tem uma alegação coerente – vide por exemplo os artigos 38.º da petição inicial e 46.º da resposta). Persiste, pois, controvertida nos autos matéria alegada pelo A. que, tendo presentes as várias soluções plausíveis da questão de direito em presença, releva para a decisão do litígio, pelo que deve ser lavrado despacho de condensação processual que contemple tal matéria, bem como a matéria a este propósito alegada em fundamento da justa causa de resolução, com excepção dos factos relativamente aos quais se considerou já neste aresto ser inatendível a alegação da justa causa (mora no pagamento de parte da retribuição) e verificada a caducidade do inerente direito (retirada de funções de director financeiro). Perante a factualidade que ainda se mostra controvertida, a questão da caducidade do direito de resolução quanto aos factos de Julho de 2011 alegados nos artigos 24.º a 28.º da petição inicial não poderia obter uma resposta definitiva no momento da prolação do despacho saneador e não podia, consequentemente, proferir-se uma decisão absolutória das RR. quanto aos pedidos contra si formulados pelo A. sob as alíneas a), d), e) e, parcialmente, g) da petição inicial, como consequência da verificação daquela caducidade, por não haver então nos autos elementos de facto seguros e bastantes para a prolação de uma decisão conscienciosa. Porque o tribunal a quo não dispunha, então, de todos os elementos factuais necessários e suficientes para esta decisão, impunha-se-lhe que relegasse para final a apreciação da caducidade quanto a estes factos e ordenasse a prossecução dos autos para julgamento para, após a produção de prova, aplicar então o direito aos factos que ficassem apurados. Sendo assim, haverá que anular o saneador-sentença na parte em que decidiu pela caducidade do direito de resolução quanto aos factos alegados nos artigos 24.º a 28.º da petição inicial e absolveu as RR. dos pedidos contra si formulados pelo A. na petição inicial, sob as alíneas a), d), e) e, parcialmente, g), como consequência da verificação daquela caducidade, e ordenar-se a ampliação da matéria de facto nos termos do artigo 662.º, alínea c), in fine, do Código de Processo Civil aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho, prosseguindo os autos para instrução e julgamento, com vista ao apuramento dos factos alegados com relevo para o conhecimento daquela excepção e destes pedidos formulados na petição inicial, se outro fundamento, entretanto, a tal não obstar. Procede, nesta parte, o recurso. * 4.4. Uma vez que houve parcial vencimento no recurso (pois que o A. ficou vencido no que diz respeito à inatendibilidade dos factos relativos à mora no pagamento de parte da retribuição e à caducidade do direito de resolução relativamente à alegada retirada de funções de director financeiro), as custas do recurso serão suportadas pelo A. na proporção de 30%, sendo a restante proporção conforme vencimento a final (artigo 527.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil aprovado pela Lei n.º 41/2013).* 5. Decisão* Em face do exposto, decide-se conceder parcial provimento ao recurso do A. e, consequentemente: 5.1. mantém-se a decisão constante do despacho saneador da 1.ª instância na parte em que julgou procedente a excepção de caducidade do direito do Autor à resolução do contrato de trabalho com alegação de justa causa relativamente aos factos constantes dos arts. 7º e 13º da petição inicial; 5.2. mantém-se a decisão constante do despacho saneador da 1.ª instância na parte em que julgou que o Autor não observou o procedimento previsto no art. 395º do Código do Trabalho – indicação sucinta dos factos - quanto ao fundamento atinente à parte das retribuições alegadamente em dívida; 5.3. anula-se a mesma decisão na parte em que julgou procedente a excepção de caducidade do direito de resolução com alegação de justa causa relativamente aos factos alegados nos arts. 24.º a 28.º da petição inicial e em que absolveu desde logo as RR. C…, S.A, e C1…, S.A., dos pedidos contra si formulados pelo Autor B…, na petição inicial, sob as als. a), d), e) e, parcialmente, g), e determina-se o prosseguimento dos autos quanto a tal matéria, nos termos supra assinalados, após o que se deverá proferir decisão final de mérito sobre aquela excepção de caducidade e sobre estes pedidos, se outro fundamento, entretanto, a tal não obstar. Custas do recurso pelo A. na proporção de 30%, sendo a restante proporção conforme vencimento a final. Nos termos do artigo 663.º, n.º 7, do Código de Processo Civil aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho anexa-se o sumário do presente acórdão. * Porto, 17 de Novembro de 2014Maria José Costa Pinto João Nunes António José Ramos _______________ [1] Preceito a ter em vista pelo Tribunal da Relação no presente momento processual, por força dos arts. 5.º a 8.º da Lei Preambular do Código de Processo Civil de 2013. [2] Vide, entre outros, os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 2011.04.07 (Recurso n.º 231/08.5TTLMG.P1.S1), de 2010.06.07 (Recurso n.º 527/06.0TTBCL.S1), de 2010.01.10 (Recurso n.º 228/09.8YFLSB), de 2005.11.23 (Revista nº 2129/05), de 2004.09.22 (Revista nº 1743/04), de 2004.05.05 (Revista nº 14/04), de 2004.01.20 (Revista nº 1399/03) e de 2003.06.04 (Revista nº 3304/02), todos sumariados in www.stj.pt e vide os Acórdãos do Tribunal Constitucional n.º 403/2000, in D.R., II Série, de 2000.12.13, reportado ao artigo 72º n.º 1 do CPT/81 e n.º 439/2003, in www.tribunalconstitucional.pt, reportado ao artigo 77º n.º 1 do CPT/99, destacando-se ainda o Acórdão n.º 367/2008, que decidiu não julgar inconstitucional a norma do artigo 77.º, n.º 1, quando interpretada no sentido de que a arguição de uma nulidade apenas na parte da motivação, ainda que com nominação expressa, em destaque e separadamente dos restantes fundamentos, e não na parte do requerimento de interposição do recurso, obsta ao seu conhecimento pelo tribunal superior [3] Vide Joana Vasconcelos, in “Código do Trabalho Anotado”, com Pedro Romano Martinez e outros autores, 8ª edição, Coimbra, 2009, p. 1023. Embora o Código do Trabalho de 2009 (como o de 2003) não contenha norma absolutamente idêntica ao art. 34.º, n.º 3 da LCCT (que se reporta aos factos atendíveis para justificar judicialmente a rescisão), vem no n.º 3 do seu art. 398.º a prescrever que na acção em que for apreciada a ilicitude da resolução apenas são atendíveis para a justificar os factos constantes da comunicação referida no nº 1 do artigo 395º. [4] Vide Pedro Furtado Martins, in Cessação do Contrato de Trabalho, Principia, 3.ª Edição, 2012, p. 533. [5] In Da Cessação do Contrato de Trabalho - em especial por iniciativa do Trabalhador, Coimbra, 2008, p. 246. [6] Recurso n.º 2059/05.5TTLSB.L1.S1 - 4.ª Secção. [7] In "Contrato de trabalho, Notas Práticas", Coimbra, 1993, p.655. [8] Vide o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 26 de Março de 2012, Processo n.º 1282/10.5TTBRG.P1, in www.dgsi.pt e o Ac. do Supremo Tribunal de Justiça de 26 de Junho de 2013, Recurso n.º 136/05.1TTVRL.P1.S1 - 4.ª Secção, que reitera serem apenas atendíveis para o efeito da apreciação da (i)licitude da resolução os factos invocados na comunicação escrita dirigida ao empregador. [9] Vide Albino Mendes Baptista, “Notas sobre a cessação do Contrato de trabalho por iniciativa do trabalhador” in A Reforma do Código do Trabalho, Coimbra, 2004, p. 543 e do mesmo autor “A Cessação do Contrato de trabalho por iniciativa do trabalhador” in Estudos sobre o Código do Trabalho, Coimbra, 2004, p. 33 e José Eusébio Almeida, “O Processo do Trabalho e o Código do Trabalho, in A Reforma do Código do Trabalho, Coimbra, 2004, p. 569 e nota 30. [10] Vide Pires de Lima e Antunes Varela, in Noções Fundamentais de Direito Civil, Volume I, 6.ª edição revista e ampliada (reimpressão), Coimbra, 1973, p. 169. [11] Vide José Eusébio Almeida, “O Processo do Trabalho e o Código do Trabalho”, in Prontuário de Direito do Trabalho, n.º 71, p.142. Decidindo que, numa situação em que não consta da comunicação escrita a indicação dos factos para justificar a resolução do contrato, não se pode suprir, na petição inicial, esse vício de procedimento, sendo indispensável a indicação dos factos concretos e a temporalidade dos mesmos, na carta de resolução, foi proferido o Ac. do Supremo Tribunal de Justiça de 24 de Fevereiro de 2010, Recurso n.º 934/07.1TTCBR.C1.S1- 4.ª Secção, sumariado in www.stj.pt [12] Vide Ricardo Nascimento, in obra citada, pp. 249 e 250. [13] Vide Pedro Furtado Martins, in ob. citada, p. 530. [14] Vide os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 08 de Maio de 2002, Revista n.º 3662/01 e de 25 de Setembro de 2002, Revista n.º 2157/01, ambos da 4.ª Secção. [15] Como refere Albino Mendes Baptista, um atraso de 15 dias no pagamento da retribuição ao trabalhador pode não significar a impossibilidade de subsistência da relação de trabalho, mas, o decurso da mora pode agravar os factores potenciais da justa causa de cessação do contrato – in Estudos sobre o Código do Trabalho, citado, p. 31. [16] Processo n.º 203/11.2TTBCL.P1, in www.dgsi.pt. [17] Recurso n.º 296/07.7TTFIG.C1.S1 - 4.ª Secção, sumariado in www.stj.pt. [18] Recurso n.º 259/11.8TTOAZ.P1.S1 - 4.ª Secção, sumariado no mesmo sítio. [19] Processo n.º 470/10.9TTVNF.P1, in www.dgsi.pt. [20] Vide os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 2005.05.25, Recurso n.º 2929/03-4.ª Secção e de 2006.11.08, Recurso n.º 2571/06-4.ª Secção, ambos sumariados em www.stj.pt, e o Acórdão da Relação do Porto de 9 de Setembro de 2013 (Processo n.º 69/11.2TTVRL.P1) relatado pela ora relatora. [21] Onde o A. alegou que “não obstante parte dos factos elencados na carta de resolução terem tido lugar em final de Julho de 2011,certo é que, não pode ser desconsiderado o facto de durante o período que mediou entre o final do mês de Julho e o mês subsequente o aqui Autor se encontrou a gozar férias e nesse mesmo sentido só quando regressou das férias tomou real e efectivo conhecimento dos factos que consubstanciam fundamento para a resolução com justa causa (...)”, o que foi refutado motivadamente no ponto 10.º do articulado da R. que se lhe seguiu. ________________ Nos termos do artigo 663.º, n.º 7, do Código de Processo Civil, lavra-se o sumário do antecedente acórdão nos seguintes termos: I – O prazo de caducidade do direito de resolução do contrato de trabalho com justa causa, tratando-se de factos instantâneos, inicia-se no momento do conhecimento da materialidade dos factos. II – Já no caso de o comportamento ilícito do empregador ser continuado, o prazo de caducidade só se inicia quando for praticado o último acto de violação do contrato, pois o conhecimento da situação ilícita renova-se permanentemente enquanto ela se mantiver. III – No caso de factos instantâneos com efeitos duradouros, susceptíveis de agravamento com o decurso do tempo, aquele prazo inicia-se não no momento do conhecimento da materialidade dos factos, mas quando, no contexto da relação laboral, assumem tal gravidade que a subsistência do contrato de trabalho se torna a partir de então imediatamente impossível. IV – Deve pois nestas hipóteses fazer-se um juízo perante cada caso concreto no sentido de aferir se o trabalhador, quando conheceu os factos que invoca em fundamento da justa causa, ficou logo em condições de ajuizar das implicações de tal acto no devir do contrato. V – Havendo matéria de facto controvertida com interesse para uma decisão conscienciosa quanto à decisão da excepção da caducidade do direito de resolução, não deve conhecer-se da mesma no despacho saneador e há que ordenar a prossecução dos autos para julgamento, procedendo-se a instrução quanto aos factos alegados pelas partes relevantes para a decisão dessa excepção e para o desfecho da lide, à luz das várias soluções possíveis da questão de direito. Maria José Costa Pinto |