Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
108/11.7TTVFR.P2
Nº Convencional: JTRP000
Relator: MARIA JOSÉ COSTA PINTO
Descritores: PRESCRIÇÃO DO PODER DISCIPLINAR
INQUÉRITO PRÉVIO
DEVER DE LEALDADE
TRABALHADOR BANCÁRIO
Nº do Documento: RP20140224108/11.7TTVFR.P2
Data do Acordão: 02/24/2014
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROVIDO PARCIALMENTE
Indicações Eventuais: 4ª SECÇÃO (SOCIAL)
Área Temática: .
Sumário: I – Caso o empregador pretenda valer-se do início do inquérito prévio com vista a ver interrompida a contagem do prazo de prescrição do direito de exercer o poder disciplinar, caber-lhe-á demonstrar a verificação do início do inquérito prévio e das circunstâncias previstas no artigo 352.º do Código do Trabalho.
II – No domínio do sector bancário a base de recíproca confiança da relação laboral, como fundamento objectivo da permanência do vínculo, assume especial relevância face ao tipo de actividade realizada pelos respectivos trabalhadores.
III – Integra justa causa de despedimento o comportamento de uma assistente comercial bancária que, ao longo de cerca de 6 meses, atribui ilegitimamente a diversos clientes taxas de juros de depósitos a prazo superiores às que, na altura, se encontravam em vigor, sem conhecimento ou autorização superior e utilizando abusivamente a password da Gerente da agência.
IV – Apesar do comportamento ulterior da trabalhadora de assumir a responsabilidade por todo o prejuízo que possa ter causado, que minora a gravidade das consequências patrimoniais do comportamento, aquela conduta é susceptível de comprometer definitivamente a base de confiança do contrato de trabalho.
V – A natureza discricionária do poder disciplinar não prejudica a necessária consideração da prática disciplinar do empregador e da ideia de coerência disciplinar, que no caso do despedimento se retira do artigo 351.º, n.º 4 do Código do Trabalho.
VI – O despedimento não traduz violação do princípio da igualdade em matéria disciplinar quando, da análise comparativa efectuada, não se evidencia uma prática disciplinar incoerente, sendo substancialmente distintas as motivações das condutas dos diferentes trabalhadores analisados, o grau de culpa revelado por cada um deles, o seu passado laboral e as circunstâncias particulares em que cada um actuou.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo n.º 108/11.7TTVFR.P2
4.ª Secção

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto:
II
1. Relatório
1.1. B…, assistente comercial, impugnou judicialmente no Tribunal do Trabalho de Santa Maria da Feira a regularidade e licitude do seu despedimento efectuado em 27 de Janeiro de 2011 por C…, SA.
Realizada a audiência de partes, e não tendo havido conciliação, foi ordenada a notificação do empregador para apresentar o articulado com a motivação do despedimento e o processo disciplinar.
No seu articulado (fls. 51 e ss.), a Ré empregadora alegou, em síntese: que a A. não cumpriu, atempadamente, uma ordem de subscrição de um produto financeiro, o qual, entretanto, esgotou, e subscreveu, posteriormente, à revelia da respectiva cliente e sem conhecimento ou autorização superior e utilizando a password da Gerente, um outro produto, de rendibilidade inferior, pelo que a C… terá de reembolsar a mesma cliente em montante que poderá ascender a € 11.188,79; que a A. atribuiu, ilegitimamente, a diversos clientes taxas de juros de depósitos a prazo superiores às que, na altura, se encontravam em vigor, sem conhecimento ou autorização superior e utilizando abusivamente a password da Gerente; que alterou a ordem dos titulares de uma conta, à revelia dos clientes e dos seus superiores hierárquicos, afectando positivamente os saldos da sua carteira de clientes, tendo em vista o cumprimento dos objectivos comerciais e o recebimento de eventuais incentivos; que com tal actuação, a arguida cometeu infracções disciplinares de gravidade que constituem justa causa de despedimento. Peticiona se declare lícito o despedimento e juntou o processo disciplinar.
Na contestação apresentada ao articulado de motivação do despedimento (fls. 339 e ss.), a A. trabalhadora veio alegar a prescrição de parte das infracções disciplinares que lhe são imputadas e impugnou parte dos factos invocados pela sua empregadora em fundamento da justa causa, alegando circunstancialismo de facto do qual retira que as infracções que praticou não configuram justa causa de despedimento. Alegou, ainda, que a prática disciplinar da Ré não tendo sido no sentido de proceder ao despedimento dos trabalhadores quando ocorrem as irregularidades do tipo das que lhe foram imputadas. Em reconvenção, pediu a condenação da Ré a reintegrá-la ou pagar-lhe indemnização devida pela ilicitude do despedimento, que computa no valor de € 10.125,00, a pagar-lhe as retribuições que deixou de auferir desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da decisão do Tribunal e a pagar-lhe, a título de danos não patrimoniais, a quantia de € 5.000,00, bem como a pagar-lhe juros de mora contados desde a data da apresentação da contestação.
A Ré apresentou articulado de resposta (fls. 364 e ss.), pugnando pela improcedência das excepções invocadas e impugnando parte dos factos que consubstanciam o pedido reconvencional. Sobre a questão da sua prática disciplinar, a Ré alegou que cada caso é um caso, objecto de ponderação casuística face à sua gravidade e circunstâncias, atenuantes ou agravantes, e que não existem factores de comparação entre o caso da A. e dos colegas que menciona. Conclui pela improcedência da excepção e da reconvenção e, não concedendo, pede se deduzam às retribuições intercalares que venham a ser reconhecidas as quantias previstas nas alíneas a), b) e c) do n.º 2, do artigo 390.º do CT.
Foi proferido despacho saneador, em que se relegou para a decisão final o conhecimento da excepção de prescrição, e foram seleccionados os factos assentes e a matéria de facto controvertida, que foi objecto de reclamação, julgada parcialmente procedente por despacho de fls. 419 a 421.
No decurso da audiência de julgamento, em que se procedeu à gravação da prova pessoal produzida, foi indeferido um requerimento probatório (fls. 592) através de despacho proferido em 29 de Março de 2012. Deste despacho foi interposto recurso pela A. que foi julgado por esta Relação em acórdão de 29 de Outubro de 2012 que terminou decidindo o seguinte: “[n]os termos supra expostos acordam conceder provimento ao recurso e revogar o despacho recorrido, anulando o julgamento, sem prejuízo da prova por depoimento pessoal e da prova testemunhal já produzida. Após a junção dos documentos requeridos pela Autora deverão ser produzidas novas alegações e ser novamente decidida a matéria de facto e em seguida ser proferida nova sentença conforme for de direito.”
Anulada assim a sentença entretanto proferida em 21 de Maio de 2012, foi produzida a prova documental determinada e, proferidas novas alegações, foi decidida a matéria de facto em litígio em 4 de Julho de 2013, por despacho que não foi objecto de reclamação.
A Mma. Julgadora a quo proferiu, após, sentença final que terminou com o seguinte dispositivo:
«[…]
Por todo o exposto julgo a ação improcedente e, em consequência:
a) declaro regular e lícito o despedimento da Autora;
b) condeno a Ré C…, S.A.., a pagar à Autora a quantia de € 187,50 (cento e oitenta e sete euros e cinquenta cêntimos), acrescida de juros de mora contados desde o seu vencimento até integral pagamento.
[…]».

1.2. A A., inconformada, interpôs recurso desta decisão e formulou, a terminar as respectivas alegações, as seguintes conclusões:
“A - A subscrição em nome da reclamante D... em 23.12.2008, a aplicação C1... na quantia de €100.000, sem que o respectivo impresso estivesse assinado pela cliente
B – E a não certificação do pedido de subscrição da aplicação C2..., não obstante o mesmo encontrar-se totalmente preenchido e subscrito pela reclamante D...
C – Ocorreram a 23.12.2008
D - A nota de culpa foi notificada à recorrente por carta registada com data de 15.09.2010
E - A Recorrida por deliberação de 01.09.1010 decidiu instaurar o processo disciplinar à requerida.
F - Em 25.01.2010, a DPN RPN9 remeteu à DAI cópia da informação elaborada pela Gerência de ..., da qual consta que foi subscrita, naquela agência, uma aplicação que não correspondia à que havia sido solicitada pela cliente nº ........, D....
G – A DAI decidiu a 28.01.2012 instaurar o respectivo processo de inquérito/auditoria
H – Os factos imputados à recorrente e supra transcritos não configuram qualquer crime e muito menos de infidelidade
I –São instantâneos e consumiram-se no dia 23.12.2008
J - O primeiro facto porventura interruptivo da prescrição na tese da sentença, terá ocorrido a 26.01.2010
L – Prescreveu pois o direito de exercer o poder disciplinar por parte da recorrida sobre a recorrente por via da pratica desses factos.
M –Violou a douta sentença em crise, ao assim o não entender o disposto nos artigos 372 e 411 nº 4 do C.T. de 2003 e 329 do C.T actual Sem prescindir
N - Na acta de audiência de julgamento de16 de Novembro 2011 encontra-se a assentada do depoimento de parte da recorrida e, tendo em conta esse depoimento a resposta aos quesitos
O - 34º deve ser alterada e adequada de acordo com a confissão transcrita na assentada;
P - 37º deve ser alterada e adequada de acordo com a confissão transcrita na assentada,
Q - 41 - Deve ser alterada e adequada de acordo com a confissão transcrita na assentada, respondendo-se provado;
R - 48º Deve ser alterada e adequada de acordo com a confissão transcrita na assentada, e tendo em conta o depoimento da gerente transcrito que reconhece que nada validou e nenhuma sanção lhe foi aplicada
S - o depoimento da testemunha E... referido parte acima esclarece que o mapa é um mapa com as taxas negociais, ou seja, tem de haver password da gerência que sai no final do dia com as operações que foram efectuadas com a password do gerente, mais esclarecendo que as taxas de juro constam dessa listagem
T - O quesito 49º da base instrutória que mereceu a resposta de não provado devera ver a resposta substituída por provado
U – Pois as diversas P.E juntas com sínteses de sanções disciplinares aplicadas pela recorrente, as deliberações punitivas e os relatórios finais dos P.D não contrariadas documentalmente nem testemunhalmente pela recorrida e não impugnadas demonstram o que delas constam
V – Pois em infracções mais graves que as imputadas à recorrente a recorrida não aplicou a sanção de despedimento sem justa causa nem a demissão
X – E quem não sanciona o mais grave com despedimento não deve sancionar o menos grave com despedimento
Z - O entendimento da jurisprudência é de que a incoerência disciplinar da empresa conduz ao entendimento de inexistência de justa causa na sanção de despedimento decretada.
AA – Essa Relação tem competência para alterar a matéria de facto nos moldes transcritos nas conclusões anteriores;
BB – E por outro lado a incoerência da pratica disciplinar da recorrente resulta manifesta, quer da resposta aos quesitos agora corrigidos, quer mesmo dos documentos juntos, na eventualidade de se entender não corrigir os mesmos.
CC - Violou a douta sentença em crise, entre outras disposições os artigos 13 e 53 da CRP e ainda o 351 e 357 nº 4 do actual CT.
Ainda sem prescindir
DD – As infracções imputadas à recorrente terão de ter em consideração toda a demais matéria provada com especial incidência dos pontos
43 . À A. era-lhe facultada a “password” da gerência necessária à efectivação das operações;
44.O vice Presidente da C..., Dr. F..., referiu publicamente que não deixaria sair nenhum deposito a prazo da C... nem que para isso implicasse majoração das taxas desses depósitos
45 .A Autora até à sua suspensão manteve o acesso aos códigos alarme da agencia
3. A Autora foi suspensa das suas funções a 20.09.2010
1. A Ré por deliberação de 01.09.2010 decidiu instaurar processo disciplinar à Autora
8.A Autora é trabalhadora desde 2002, exercendo as funções de assistente comercial C3.. na Agencia ... no Porto
9.Tinha em carteira mais de 500 clientes, responsabilidade em todo o serviço da Agencia, com atendimento polivalente
10.A ré exige iniciativa, autonomia, responsabilidade e pro-actividade e fixa objectivos quer para entregar incentivos, quer para promover na carreira os seus trabalhadores.
11. A Autora desenvolveu a sua actividade numa Agência com muitos clientes, sendo sempre elogiada pelos seus desempenhos profissionais, nomeadamente pelo Vice Presidente da C... na reunião final do ... do projecto C3....
14. A Autora assumiu a responsabilidade por todo o prejuízo que possa ter causado
36. Parte da actuação da Autora foi concretizada com o intuito de incrementar os seus resultados e, em consequência ser premiada com maiores incentivos.
40. A alteração do 2º para o 1º titular da conta não causou prejuízo à re e aos clientes
41. Esta é pratica corrente para gestores de clientes, assistentes comerciais e gerentes da Ré
46. Saía muitas vezes para alem do horário nunca reivindicando o pagamento de trabalho suplementar
47.Muitas vezes adiava a hora de almoço
48. Tinha bom relacionamento com os colegas de trabalho
49. Zelava pela boa imagem da empresa junto de todos os que com ela contactavam
Da matéria assente
EE – Os factos imputados não foram susceptíveis de afectar a imagem da empregadora junto dos clientes
FF - A cliente D... referiu que estimava muito a recorrente e qualificou-a de óptima funcionária
GG - Quanto à troca de titulares da conta nenhum cliente soube
HH - E quanto à taxa de juro atribuída mais alta que a da rede os clientes ate ficaram favorecidos e a C... também os manteve como clientes e foi a recorrente quem suportou o custo do juro concedido a mais.
II - Assumiu os prejuízos decorrentes dos factos
JJ – Norteou-se pela satisfação dos interesses da cliente que, na sua ingenuidade e alguma inexperiência, julgava conseguir.
KK - Os objectivos a que os funcionários da recorrida são sujeitos são muito ambiciosos e exigentes.
LL - A C... foi o objectivo final da actuação da recorrente e saiu beneficiada,
MM - Quanto a alteração dos titulares da conta é um acto que é pratica corrente para gestores de clientes, assistentes comerciais e gerentes da ré
NN – Não tem razão a douta sentença em crise quando conclui que, após os factos imputados, não haveria dialogo profícuo entre a Autora e os seus superiores hierárquicos.
OO - A recorrente continuou o seu trabalho, apos os factos ate 20.09.2010, data da suspensão, sempre com dialogo profícuo com a sua hierarquia.
PP – A douta sentença em crise rejeitou na ponderação os factos que caminham em sentido inverso ao do despedimento, e que aconselham a aplicação de uma sanção que não ponha em causa o vinculo contratual entre recorrente e recorrido, não só porque a relação de confiança não foi afectada a esse ponto, mas também porque o despedimento é uma sanção desproporcionada e desadequada tendo em conta os factos provados.
QQ - A decisão do despedimento devera ter em conta o disposto no artigo 396 do C.T de 2003 actual 351 e 357 do C.T
RR - Violou a douta sentença em crise o disposto nos artigos supracitados bem como dos artigos 13º e 58º da C.R.P.
TERMOS EM QUE DEVE O PRESENTE RECURSO MERECER PROVIMENTO E, EM CONSEQUÊNCIA, CONHECER-SE DA PRESCRIÇÃO NOS MOLDES INVOCADOS, ALTERAR-SE A MATÉRIA DE FACTO COMO SE ALEGA NAS CONCLUSÕES, E SEMPRE REVOGANDO A DOUTA SENTENÇA EM CRISE, SUBSTITUINDO-SE POR OUTRA QUE NÃO RECONHEÇA A REGULARIDADE E LICITUDE DO DESPEDIMENTO DA RECORRENTE COM TODAS AS LEGAIS CONSEQUÊNCIAS.”
1.3. Respondeu a R. pugnando pela improcedência do recurso e manutenção da sentença recorrida.
Concluiu do seguinte modo:
“1. A presente Apelação vem interposta da douta sentença que julgou improcedente a excepção de prescrição invocada pela Autora, ora Recorrente e julgando lícito e regular o seu despedimento, absolveu a Ré, ora Recorrida, dos pedidos formulados.
2. A douta sentença proferida pela Meritíssima Juiz a quo não merece qualquer censura, tendo feito uma correctíssima apreciação da prova produzida e uma exemplar aplicação do direito aos factos provados.
3. A Recorrente discorda dos fundamentos da douta sentença quanto à apreciação da invocada excepção de prescrição.
4. A infracção respeitante não subscrição do produto C2... com a subscrição de outro produto – C1... – com rendibilidades inferiores, à revelia do que foi solicitado pela cliente, teve, efectivamente início em 23.12.2008.
5. Discordando-se, nesta parte, da análise feita na douta sentença recorrida, os factos em causa, embora praticados de forma instantânea – o que não se nega - integram-se numa acção continuada da ora Recorrente, que se prolongou até, pelo menos, ao final de 2009.
6. Não obstante a Recorrente ter plena consciência da gravidade da sua conduta, nela persistiu desde a prática inicial dos factos – 23.12.2008 – até, pelo menos, à reclamação verbal apresentada pela cliente – 29.10.2009, omitindo às suas chefias e à própria Recorrida a sua gravíssima conduta.
7. Há, pois, um facto instantâneo ocorrido em 23.12.2008, mas há também uma continuada omissão da Recorrente, ocultando às suas chefias e à C... a forma desleal como tinha actuado.
8. Trata-se, por isso, salvo melhor opinião, de uma infracção continuada, cujo prazo de prescrição se inicia apenas quando cessa a conduta infractora, o que, como se disse, não ocorreu antes de 29.10.2009.
9. Sendo a Autora notificada da nota de culpa em 16.09.2010, não havia ainda decorrido o prazo prescricional de 1 ano.
10. Como muito bem se conclui na douta sentença recorrida, a conduta da Recorrente é susceptível de integrar a prática de um crime de infidelidade p.p. no artigo 224.º do Código Penal, caso em que sempre seria aplicável, por isso, o prazo de prescrição de 5 anos previsto no artigo 118.º, n.º 1 alínea c) do Código Penal.
11. No caso dos autos, atenta a factualidade provada, designadamente nos pontos 18, 23 a 26 e 38 e 39 da matéria de facto, bem andou a Meritíssima Juiz a quo ao entender que estes mesmos factos são suscetíveis de constituir crime de infidelidade, previsto e punido pelo artigo 224.º do Código Penal, cujo prazo de prescrição, nos termos do disposto no artigo 118.º, n.º 1, alínea c) do mesmo diploma, é de cinco anos.
12. Não se verifica, assim, a alega prescrição da infracção disciplinar.
13. No que se refere à impugnação da matéria de facto devem manter-se, com excepção do que se refere ao quesito 41.º, as respostas dadas, em concreto no que respeita aos quesitos 34.º, 37.º, 48.º e 49.º.
14. Para tanto, importa considerar os meios de prova e os fundamentos expostos detalhadamente nas presentes alegações.
15. Diga-se, ademais, quanto à matéria do quesito 49.º, que os documentos juntos aos autos a Fls. 455 e 456, 618 a 627 e 635 a 911 demonstram que a Recorrida prossegue uma prática disciplinar solidamente coerente e assente na apreciação casuística e na proporcionalidade e adequação das sanções disciplinares aplicadas, como, de resto, se impunha à Recorrida.
16. A douta sentença recorrida fez, no que respeita à apreciação da justa causa de despedimento, uma exemplar apreciação da matéria de facto concluindo que as condutas imputadas à Recorrente e que ficaram demonstradas nestes autos constituíam, indubitavelmente, justa causa para o despedimento da Recorrente.
17. Como resulta da análise dos factos imputados à Recorrente e demonstrados nestes autos, a Recorrente contrariando as instruções de uma cliente não subscreveu o produto solicitado por aquela cliente e subscreveu outro diferente sem disso dar conhecimento quer à cliente, quer à sua chefia, omitindo a sua grave conduta por longo período de tempo.
18. Não satisfeita, a Recorrente procedeu à concessão de taxas de juros superiores ao que era permitido à agência, o que fez também à revelia de quaisquer instruções da sua chefia e com o desconhecimento desta, usando, para o efeito, a password da gerente que lha havia confiado na base da confiança que nela depositava.
19. Ainda não satisfeita, a Recorrente procedeu, no final do ano à alteração de titulares das contas e repôs a titularidade correcta das contas logo no início do ano posterior, o que fez sem qualquer pedido nesse sentido por parte dos clientes, visando com isso engrandecer a carteira sob sua gestão a 31.12 e beneficiar ilicitamente de incentivos.
20. Atentos os factos provados, tem, necessariamente, de concluir-se que a conduta da Recorrente, pela sua gravidade, determinou a impossibilidade da subsistência da relação contratual, pela perda definitiva do elemento confiança, que a C... deixou de ter na mesma.
21. O comportamento da Recorrente integra, não só os requisitos de natureza subjectiva e objectiva, como também o nexo de causalidade entre aquela conduta e a impossibilidade da subsistência da relação de trabalho, que o nº 1, do artº 351º da Lei nº 7/2009 de 12 de Fevereiro, exige.
22. A conduta da Recorrente, dada como provada, por assumir a forma de intencional e culposa, determinou a impossibilidade da subsistência da relação de trabalho, face à situação de absoluta quebra de confiança entre esta e a C..., S.A., não havendo, face à gravidade de tal conduta, lugar à aplicação de qualquer outra sanção que não seja o despedimento com justa causa, conforme resulta do disposto no nº 1, conjugado com as disposições legais contidas nas alíneas a), d) e e), do nº 2 do artº 351º do Código do Trabalho, aprovado pela Lei nº 7/2009 de 12 de Fevereiro,
23. De acordo com o disposto nas cláusulas 22ª, alíneas b) e d), 104ª, nº 1 e 106ª, nº 1, alínea f) do Acordo de Empresa, alíneas a), c) e e) do nº 1 do artº 128º do Código do Trabalho e ainda nº 1, conjugado com as alíneas a), d) e e), do nº 2 do artº 351º do Código do Trabalho.
24. Por isso, bem concluiu a Meritíssima Juiz a quo ao escrever: “A Autora agiu culposamente, não podendo desconhecer que ao atuar como atuou violava os seus deveres contratuais, denotando uma postura desonesta quer ao alterar titulares das contas para tentar obter beneficio, não sendo relevante que não o tenha obtido uma vez que tal não resultou de qualquer facto voluntário da mesma, quer ao subscrever produto que sabia que a cliente não tinha solicitado quando detetou que, por falha sua, não subscreveu o produto que lhe havia sido solicitado.
Assim, não obstante o teor dos factos provados sob os pontos 8. a 12., que em rigor correspondem ao exercício das funções que lhe estavam atribuídas, atendendo às consequências da sua conduta não se vê que a Ré haja aplicado à Autora uma sanção disciplinar desproporcionada.”.
25. Para, e muito bem, decidir: “Em consequência, julgo regular e licito o despedimento da Autora e, em consequência, não tem a mesma direito à indemnização peticionada pela ilicitude do despedimento.”.
26. A deliberação de despedimento aplicado à ora Recorrente, pela Recorrida, respeitou integralmente quer as cláusulas 27.ª e 106.ª do Acordo de Empresa aplicável, quer o disposto nos artigos 23.º e 330.º do Código do Trabalho, sendo inteiramente regular e lícita.
27. Deve, pois, negar-se provimento à Apelação, confirmando-se integralmente a douta sentença recorrida.
Termos em que deve negar-se provimento ao recurso mantendo-se a douta sentença recorrida, com o que farão V. Exas inteira JUSTIÇA!”

1.4. O recurso foi admitido por despacho de fls. 1026.
1.5. Recebidos os autos neste Tribunal da Relação, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto pronunciou-se, em douto parecer, no sentido de ser negada a apelação.
Apenas a A. se pronunciou sobre a posição do Ministério Público, sustentando a posição anteriormente expressa nas suas alegações.
Colhidos os “vistos” e realizada a Conferência, cumpre decidir.
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2. Objecto do recurso
Sendo o âmbito dos recursos delimitado pelas conclusões das alegações do recorrente – artigo 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil aprovado pela Lei n.º 41/2013[1], de 26 de Junho, aplicável “ex vi” do art. 87.º, n.º 1, do Código de Processo do Trabalho – ressalvadas as questões do conhecimento oficioso que ainda não tenham sido conhecidas com trânsito em julgado, as questões que se colocam à apreciação deste tribunal consistem em saber:
1.ª – da impugnação da decisão de facto quanto às respostas dadas aos quesitos 34.º, 37.º, 41.º, 48.º e 49.º da base instrutória;
2.ª – da prescrição do direito de exercer o poder disciplinar;
3.ª – da justa causa de despedimento;
4.ª – das consequências do despedimento, caso se conclua pela sua ilicitude.
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3. Fundamentação de facto
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3.1. A recorrente começa por impugnar a decisão proferida na 1.ª instância em sede de matéria de facto no que diz respeito às respostas aos quesitos 34.º, 37.º, 41.º, 48.º e 49.º da base instrutória.
A impugnação deduzida é precisa quanto aos factos a que se reporta e quanto aos fundamentos da alteração pretendida, sendo que, quando é invocada prova testemunhal (quanto aos quesitos 37.º, 48.º e 49.º), delimita as concretas passagens dos depoimentos que se pretendem ver reapreciados e o sentido do julgamento por que propugna.
Estão pois preenchidos os requisitos para a impugnação da decisão de facto que estabelece o artigo 685.º-B do Código de Processo Civil, na redacção que lhe foi conferida pelo Decreto-Lei n.º 303/2007, de 24 de Agosto, lei processual aplicável em 2013.08.01 (data em que foram produzidas as alegações de recurso)[2], pelo que não se verifica qualquer obstáculo à apreciação da impugnação da decisão com reapreciação dos meios de prova indicados.
Para o efeito, ter-se-á em consideração que na reapreciação da decisão de facto pelo Tribunal da Relação, o que é proposto ao tribunal de segunda instância não é que proceda a um novo julgamento – desprezando o juízo formulado na primeira instância sobre as provas produzidas e a expressão do processo lógico que conduziu à pronúncia sobre a demonstração (ou não) dos factos ajuizados –, é certo, mas que, no uso dos poderes próprios de tribunal de recurso, averigúe – examinando a decisão da primeira instância e respectivos fundamentos, analisando por si as provas e procedendo ao confronto do resultado desta análise com aquela decisão e fundamentos – se o veredicto alcançado pelo tribunal recorrido quanto aos concretos pontos impugnados assentou, ou não, num erro de apreciação.
Esta perspectiva resultava do disposto no artigo 712.º do Código de Processo Civil revogado e surge reforçada no Código de Processo Civil de 2013 que, em obediência aos objectivos enunciados na exposição de motivos da lei que o aprovou – “de reforçar os poderes da 2.ª instância em sede de reapreciação da matéria de facto impugnada”– prevê na alínea a) do n.º 2 do artigo 662.º, o dever do Tribunal da Relação de ordenar a “renovação”, mesmo oficiosamente, “da produção da prova quando houver dúvidas sérias sobre a credibilidade do depoente ou sobre o sentido do seu depoimento” (quando na lei revogada o nº 3 do artigo 712º restringia a renovação dos meios de prova aos produzidos em primeira instância que se mostrassem absolutamente indispensáveis ao apuramento da verdade). E prevê inovatoriamente na alínea b) do mesmo nº 2 do novel artigo 662.º a possibilidade de produção, mesmo oficiosamente, de “novos meios de prova” em segunda instância, “em caso de dúvida fundada sobre a prova realizada”[3].
No caso sub judice, constam do processo todos os elementos de prova que serviram de base à decisão sobre os enunciados pontos da matéria de facto (por constarem dos autos os documentos invocados e terem sido gravados os meios de prova oralmente produzidos perante o tribunal a quo), pelo que se conhecerá do recurso interposto, reapreciando-se a prova produzida – para o que se procedeu à audição dos depoimentos prestados em audiência e à análise dos documentos juntos aos autos –, aferindo do acerto da decisão de facto proferida na 1.ª instância na parte impugnada.
Vejamos, pois.
3.1.1. Quanto aos quesitos 34º e 37.º da base instrutória
Indagava-se, em tais quesitos, o seguinte:
«34º
Em 2009 o projecto C3 era um projecto-piloto e não se inseria nesse sistema de incentivos?
(…)
37º
Era-lhe facultada a password da gerência necessária à efectivação das operações?»
A Mma. Juiz a quo respondeu ao quesito 34.º: “Provado que em 2009 o projeto C3 era um projeto-piloto”.
E ao quesito 37.º: “Provado”.
Ou seja, considerou o quesito 34.º provado, com excepção da exclusão da inserção no sistema de incentivos e o quesito 37.º totalmente “provado”.
No que diz respeito a estes factos, invoca a recorrente, que devem os mesmos ser alterados e adequados de acordo com a confissão transcrita na assentada, invocando ainda, quanto ao quesito 37.º, o depoimento da testemunha G…, gerente da agência em que a A. exercia funções, que, perguntada pelo mandatário da recorrente sobre se lhe foi aplicado algum castigo por ter facultado a password à recorrente e não ter validado as operações por esta efectuadas com a mesma, refere que não teve nenhum castigo nem tão pouco uma censura.
No despacho em que motivou a resposta à matéria de facto, a Mma. Juiz a quo consignou quanto a esta matéria que:
“A resposta aos art. 34º a 36º assentam nos depoimentos de H… e E…, que confirmaram tratar-se de projeto piloto, sem incentivos próprios mas abrangido pelo incentivos normais da C…, no que se refere ao art. 34º. (…)
A matéria do art. 37º da base instrutória foi admitida pela própria gerente e a do art. 39º por todos quanto ao teor da declaração. De facto, desta comunicação não pode extrair-se de forma alguma que qualquer funcionário estivesse legitimado a fixar a taxa de juro que lhe aprouvesse, sem autorização expressa.”
Perante os indicados depoimentos, e vista a matéria que o legal representante da R. confessou em julgamento, não vemos razões para alterar as respostas dadas.
Com efeito, o quesito 34.º resulta da alegação da A. efectuada no artigo 39.º da contestação, na qual a mesma, depois de dizer no artigo 38.º que ao tempo não era (a A.) elegível em termos de sistema de incentivos, alega que em 2009 o projecto C3 era um projecto-piloto e não se inseria nesse sistema de incentivos.
Na assentada do depoimento de parte da R. ficou a constar, quanto ao artº 34º “confessa que em 2009 o projecto C3… era um projecto piloto referindo que não beneficiava de sistema de incentivos próprios mas sim do sistema de incentivos comuns a toda a rede comercial”.
Esta ideia de que o projecto C3… estava abrangido pelos incentivos normais da C… resulta também dos depoimentos das testemunhas a que se reporta a Mma. Julgadora a quo na sua decisão – as testemunhas H… (que foi director da região onde se enquadra a agência … e conhece a trabalhadora) e E… (sub-gerente na mesma agência em que a A. trabalhava de Outubro de 2010 a Julho de 2011) –, as quais referiram que aquele projecto se enquadrava na dinâmica normal da actividade e nos incentivos (a primeira testemunha), e que era um projecto iniciado em 2008 e 2009 que se inseria no sistema de incentivos normais da C…, não havendo incentivos especiais, ou “à parte” para o gestor C3…, ao contrário do que sucede com os gestores C4… (a segunda testemunha).
Há pois consonância entre a assentada do depoimento da R. e o depoimento das testemunhas quanto à inserção do projecto C3… no sistema de incentivos, não havendo elementos probatórios para afirmar, como estava perguntado, que o projecto C3… “não se inseria” no sistema de incentivos, pelo que nenhuma censura merece a resposta dada.
O mesmo se diga quanto ao ponto 37.º da base instrutória, que resulta da alegação da A. constante do artigo 44.º da contestação e que foi considerado provado, pelo que nada mais poderia pretender a recorrente quanto ao mesmo.
Aliás, em bom rigor a recorrente não chega a indicar o que pretende se dê como provado a mais do que estava perguntado no quesito, limitando-se a referir o depoimento de parte e o da testemunha G…, dizendo que deve a resposta ser alterada e adequada de acordo com a confissão transcrita na assentada, porquanto dela se apura a obrigação de validar as operações efectuadas com a password da gerente, que no caso dos autos tal não ocorreu e que ao gerente não foi aplicada qualquer sanção. Ora a A. não alegou estes factos no seu articulado e estão os mesmos, até, em contradição com o ali alegado – cfr. os artigos 86.º e 87.º da contestação – não sendo o presente recurso a sede própria para os alegar ex novo.
Considerando os termos em que mostra formulado o quesito 37.º, a assentada do depoimento de parte (“confessa que por vezes os gerentes facultam a password a funcionários da sua confiança e para efectivação das operações embora depois as mesmas devam ser validadas pelo gerente”) e o depoimento da testemunha G… (gerente da agência em que a A. desenvolvia funções à data dos factos), a resposta de “provado” dada aquele quesito 37.º é a que se impunha, não se vislumbrando em tal resposta qualquer erro de julgamento de facto.
3.1.2. Quanto aos quesito 41.º da base instrutória
Diz a recorrente que o mesmo deve ser considerado “provado” de acordo com a confissão transcrita na assentada.
A Mma. Juiz a quo fundou a sua resposta a este quesito na circunstância de as testemunhas inquiridas ao art. 41º da base instrutória, I… e E…, afirmarem desconhecer a mesma.
Contudo, perguntando-se no quesito se foram à A. “atribuídos incentivos em Junho de 2010, que foram suspensos” e dizendo o legal representante da R. que “confessa” a matéria deste artigo, impõe-se que se considere o mesmo “provado” o que nesta instância se faz por força daquela confissão (artigos 663.º, n.º 2 e 607.º, n.º 4 do NCPC).
Nesta conformidade, acrescenta-se à matéria de facto provada o seguinte:
«44-A – Foram atribuídos à A. incentivos em Junho de 2010, que foram suspensos.»
Procede, nesta parte, a impugnação deduzida.
3.1.3. Quanto aos quesito 48.º da base instrutória
Em tal quesito perguntava-se se:
«48º
A gerência assina todos os documentos que validam as operações, como é o caso dos autos?»
A Mma. Juiz a quo considerou o quesito 48.º “não provado” e, com relevo para se perceber a razão da sua convicção quanto a esta matéria (relacionada com outra a que anteriormente respondeu no mesmo despacho), exarou o seguinte:
“Para a resposta aos art. 16º a 20º da base instrutória assumiram relevância os documentos de fls. 123 e 124, confirmados pelas testemunhas que prestaram depoimento a esta matéria e os depoimentos prestados por G…, que referiu que as taxas de juro em causa foram atribuídas pela Autora com a sua password, sem o seu consentimento e sem autorização, que as taxas concedidas ultrapassam o “plafond” da competência da gerência; que a Autora possuía a sua password por existir uma relação de confiança e para agilizar as operações porque, à data dos factos, inúmeras operações necessitavam da password da gerência, até para atribuir PIN a caderneta, mas que os funcionários, incluindo a Autora tinham instruções para no final do dia apresentarem à gerência todos os documentos referentes a operações que tivessem sido efetuadas com a password da mesma; que a Autora não lhe apresentou alguns desses documentos, como os que constam de fls. 414 e 415 dos autos que não contêm a sua rubrica e que lhe apresentou outros onde não constam as taxas de juros atribuídas e que rubricou por confiar na Autora e para si “ser óbvio que seriam constituições de depósitos a prazo nas condições permitidas pela agência”. Não obstante resultar do depoimento desta testemunha que a mesma poderia e deveria efetuar maior controlo dos atos praticados pelos funcionários, o certo é que resultou claro que a Autora efetuou as operações que lhe foram imputadas. Os factos foram, também, confirmados por J…, que os detetou na inspeção efetuada ao serviço da Autora após participação, que a atribuição de tais taxas necessitava de autorização central; que a C… teve de renegociar as taxas com os clientes, tendo a Autora assumido e efetuado o pagamento não assumido pela C…. Foi, ainda, relevante o depoimento de H…, Diretor de Área da Ré, que confirmou o despacho por si proferido no documento de fls. 123 a 126 dos autos e que o mesmo foi assinado na data que dele consta e que todos os funcionários sabem que os atos praticados com password da gerência têm de ser por esta assinados.
(…)
A resposta à matéria de fato constante dos art. 42º a 47º resulta do forma clara do depoimento das testemunhas da Autora que a comprovaram nos termos dado por provados, mostrando desconhecer a demais. Sendo que no que se refere ao zelo da Autora o mesmo não pode ser dado por provado por contraditório com os factos provados e que motivaram o processo disciplinar e quanto à matéria do art. 48º a mesma resulta do já supra exposto quanto à assinatura dos atos praticados com a password da gerência, resultando que validava os atos que lhe eram apresentados e com os elementos deles constantes.» (sublinhados nossos)
Defende a recorrente que seja a resposta ao quesito 48.º alterada e adequada de acordo com a confissão transcrita na assentada, e tendo em conta o depoimento da gerente G… (que reconhece que nada validou e nenhuma sanção lhe foi aplicada) e o depoimento da testemunha E… (que esclarece que sai no final do dia um mapa com as operações que foram efectuadas com a password do gerente, mais esclarecendo que as taxas de juro negociadas constam dessa listagem).
Na assentada do depoimento de parte da R. efectuada em audiência (fls. 450), ficou exarado, quanto a este ponto da base instrutória o seguinte: “artº 48º - confessa que a gerência deve assinar todos os documentos com vista à validação das operações efectuadas com a password da gerência.” Esta indicação do depoente relativamente ao que “deve” a gerência fazer, de modo algum pode ter o alcance de que se considere provado, com referência ao “caso dos autos”, como era expressamente perguntado naquele quesito, que a gerência “assina todos os documentos que validam as operações”.
O depoimento de parte não é, pois, de molde a determinar uma alteração da resposta dada na 1.ª instância.
Mas analisemos os depoimentos das testemunhas.
A testemunha G…, admitindo que foi com a sua password de gerente (que deu à A. com “base na confiança” e para um correcto e célere exercício do atendimento dos clientes, pois que era necessária a password até para atribuir um código de caderneta) que a A. atribuiu as taxas de juro superiores às competências da agência, sem o necessário documento de aprovação do director ou administrador, afirmou peremptoriamente, e de modo que se nos afigurou isento e credível, que não teve conhecimento das taxas atribuídas e que não assinou nenhum documento conforme são as normas e as regras da C…. Explicou, também, que ao final do dia o funcionário que usou a password da gerência devia mostrar todos os documentos ao gerente para este tomar conhecimento do que foi efectuado e rubricar tais documentos e que, neste caso, tem “perfeitamente presente” que não rubricou nada.
Por seu turno a testemunha E… (sub-gerente), embora diga que a gerência tem que assinar todos os documentos para validar as operações feitas com a sua password, devendo o funcionário mostrar-lhe os documentos para assinar, e que só com a assinatura do gerente é validada a operação, refere também que se o funcionário não dá o documento a assinar, o gerente não toma conhecimento, podendo contudo ver depois, nas listagens que saem diariamente, um mapa com as taxas negociadas.
Destes depoimentos não pode também inferir-se que, especificamente no “caso dos autos”, como é perguntado no quesito 48.º da base instrutória, a gerência assinou os documentos que validam as operações em causa, pelo que a resposta de “não provado” conferida pela 1.ª instância é conforme com a prova produzida, não determinando os elementos probatórios indicados pela recorrente uma decisão diversa da recorrida quanto a este aspecto da decisão de facto.
3.1.4. Quanto aos quesito 49.º da base instrutória
Em tal quesito perguntava-se o seguinte:
«49.º - Em várias situações idênticas à da Autora, nunca a Ré aplicou a sanção de despedimento?»
Diz a recorrente que este quesito deveria ter-se considerado “provado” pois as diversas sínteses de sanções disciplinares aplicadas pela recorrente, as deliberações punitivas e os relatórios finais dos P.D não contrariados documentalmente nem testemunhalmente pela recorrida, e não impugnadas, demonstram o que delas constam, pois em infracções mais graves que as imputadas à recorrente a recorrida não aplicou a sanção de despedimento sem justa causa nem a demissão.
Cremos, contudo, que este ponto da base instrutória deverá considerar-se irrespondível e não escrita a resposta que lhe foi dada, na medida em que encerra um juízo valorativos ou matéria conclusiva.
Com efeito, para afirmar – como o quesito pergunta – que em várias situações idênticas à da Autora, nunca a Ré aplicou a sanção de despedimento, é imprescindível que se conheçam as várias situações em que a R. não aplicou a sanção de despedimento e é necessário que se faça um juízo sobre as mesmas, de modo a concluir – ou não – que elas podem considerar-se “idênticas” à da A.
Ora, embora na lei processual civil actualmente em vigor inexista preceito igual ou similar ao artigo 646.º, n.º 4 do Código de Processo Civil revogado – de acordo com o qual se têm "por não escritas as respostas do tribunal colectivo sobre questões de direito e bem assim as dadas sobre factos que só possam ser provados por documentos ou que estejam plenamente provados, quer por documentos, quer por acordo ou confissão das partes" – a separação entre facto e direito continua a estar, como sempre esteve, presente nas várias fases do processo declarativo, quer na elaboração dos articulados, quer no julgamento, quer na delimitação do objecto dos recursos. O direito aplica-se a um conjunto de factos que têm que ser realidades demonstráveis e não podem ser juízos valorativos ou conclusivos.
Por isso o artigo 607.º, n.º 3 do Código de Processo Civil aprovado pela Lei n.º 41/2013 prescreve que na sentença deve o juiz "discriminar os factos que considera provados” e o n.º 4 do mesmo preceito dispõe que "[n]a fundamentação da sentença o juiz declara quais os factos que julga provados e quais os que julga não provados, analisando criticamente as provas, indicando as ilações tiradas dos factos instrumentais e especificando os demais fundamentos que foram decisivos para a sua convicção; o juiz toma ainda em consideração os factos que foram admitidos por acordo, provados por documento ou por confissão reduzida a escrito, compatibilizando toda a matéria de facto adquirida e extraindo dos factos apurados as presunções impostas pela lei ou pelas regras de experiência".
Segundo o artigo 663º, n.º 2 do Código de Processo Civil aprovado pela Lei n.º 41/2013, na elaboração do acórdão, observar-se-á, na parte aplicável, o preceituado nos artigos 607.º a 612.º, pelo que o comando normativo do artigo 607.º relativo à discriminação dos factos se aplica, também, ao Tribunal da Relação, impedindo-o de fundar o seu juízo sobre afirmações constantes do elenco de facto que se traduzam em juízos valorativos.
Como se refere no Acórdão da Relação do Porto de 2013.10.07 (Processo n.º 488/08.1TBVPA.P1, in www.dgsi.pt) esta questão “resolve-se nos mesmos termos no domínio da lei processual que vigorou até 31.08.2013 ou aplicando o novo diploma adjetivo: antes como agora, a fundamentação (de facto) da decisão (sentença ou acórdão) só pode ser integrada por factos”.
Por isso não podem os tribunais deixar de continuar a enfrentar a sobejamente conhecida dificuldade da destrinça entre os factos (reconstituição histórica do mundo do ser) e as questões de direito (actividade perceptiva do dever ser)[4], entre o saber o que constitui um puro facto ou o que se traduz já numa conclusão que apenas se pode afirmar perante a análise e valoração de factos concretos[5].
Ora, como resulta do já exposto, o artigo 49.º da base instrutória que se transcreveu não questiona a verificação de um facto, positivo ou negativo, como necessariamente se impunha também à face do CPC em vigor à data da elaboração da base instrutória e da decisão da matéria de facto [cfr. os arts. 511.º, n.º 1 e 653.º do VCPC, vg. do n.º 2 deste último, cujo comando estabelece que o juiz, na decisão proferida “declarará quais os factos que o tribunal julga provados e quais os que julga não provados (…)”].
Ao invés, encerra manifestamente um juízo, o qual deverá ser feito em face de outros factos concretos que emergem da análise dos procedimentos disciplinares e deliberações punitivas que a A. invoca nos artigos 73.º a 76.º da sua contestação, por referência às comunicações de pessoal que junta com esse articulado e que a R. veio ulteriormente e melhor documentar em consequência da decisão deste Tribunal da Relação do Porto de 2012.10.29.
Deverá pois considerar-se irrespondível este artigo 49.º da base instrutória, revogando-se a decisão de facto na parte em que o julgou “não provado”, sem prejuízo de se aditar à matéria de facto o que de relevante emerge dos documentos juntos a fls. 359 a 361, 618 a 627 e 635 a 911 – todos emitidos pela R. ou pelo instrutor por si nomeado para os inerentes procedimentos disciplinares –, que não foram impugnados e correspondem à alegação constante dos artigo 73.º a 76.º da contestação da A.
Com efeito, os factos plenamente provados (vg. por prova documental com força probatória plena) que não constem da matéria dada como provada pela 1.ª instância devem ser tidos em consideração pelo Tribunal da Relação, se relevantes para a decisão do pleito uma vez que, nos termos do já citado artigo 663.º, n.º 2 do Código de Processo Civil aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho, se aplicam ao acórdão da Relação as regras prescritas para a elaboração da sentença, entre as quais o artigo 607.º, n.º 3, por força do qual o juiz deve tomar em consideração na fundamentação os factos admitidos por acordo e os provados por documento (de acordo com as regras dos artigos 362.º e ss. do Código Civil) ou confissão reduzida a escrito (equivalente ao artigo 659.º, n.º 3 do CPC revogado).
Nesta conformidade, e na sequência da alegação que a A. fez constar da sua contestação, ter-se-ão como plenamente provados, mercê dos documentos juntos a fls. 359 a 361, 618 a 627 e 635 a 911, os factos 55. a 60., que se acrescentarão à matéria de facto provada no lugar próprio.
E tem-se também como plenamente provado por documento (fls. 272 e 302) o seguinte facto, que releva para a apreciação da causa por situar no tempo os factos referidos no ponto 31. da matéria de facto:
«31-A – Na nota de culpa formulada no procedimento disciplinar e no relatório que faz parte integrante da decisão de despedimento é imputada à A. a atribuição de taxas superiores às da oferta comercial em vigor no período compreendido entre 26 de Maio e 16 de Outubro de 2009.»
*
*
3.3. Os factos a atender para a decisão jurídica do pleito, após a intervenção deste Tribunal da Relação, são os seguintes (destacam-se os que foram objecto de alteração):

Factos que integravam os factos assentes:
1. A Ré, por deliberação de 01.09.2010, decidiu instaurar processo disciplinar à Autora.
2. A nota de culpa foi comunicada à Autora por carta datada e registada a 15.09.2010.
3. A Autora foi notificada da nota de culpa a 16.09.2010.
4. A Autora foi suspensa das suas funções em 20.09.2010.
5. A Administração da Ré deliberou em reunião de 19.01.2011 aplicar à Autora a sanção de despedimento, constando da deliberação que “dá o seu inteiro acordo aos fundamentos de facto e de direito constantes do Relatório Final, (…) tendo em consideração a conduta imputada à arguida, consubstanciada, em síntese, no facto de:
• Não ter cumprido, atempadamente, uma ordem de subscrição de um produto financeiro, o qual, entretanto, esgotou, e ter subscrito, posteriormente, à revelia da respectiva cliente e sem conhecimento ou autorização superior e utilizando a password da Gerente, um outro produto, de rendibilidade inferior, pelo que a C… terá de reembolsar a mesma cliente em montante que poderá ascender a € 11.188,79;
• Ter atribuído, ilegitimamente, a diversos clientes taxas de juros de depósitos a prazo superiores às que, na altura, se encontravam em vigor, sem conhecimento ou autorização superior e utilizando abusivamente a password da Gerente;
• Ter alterado a ordem dos titulares de uma conta, à revelia dos clientes e dos seus superiores hierárquicos, afectando positivamente os saldos da sua carteira de clientes, tendo em vista o cumprimento dos objectivos comerciais e o recebimento de eventuais incentivos. (…)
o Conselho aplica à empregada B… a pena disciplinar de despedimento sem qualquer indemnização ou compensação.”
6. Esta deliberação e o relatório final do processo disciplinar foram comunicados à Autora por carta datada de 27.01.2011.
7. A Ré assumiu para com a cliente D… a rentabilidade da aplicação “C2…”, acordando com esta aplicar-lhe o capital da forma que entendesse mais rentável assumindo pagar-lhe o que a rentabilidade escolhida pela cliente proporcionaria.
8. A Autora é trabalhadora da Ré desde 2002, exercendo as funções de assistente comercial C3… na Agencia …, no Porto.
9. Tinha em carteira mais de 500 clientes, responsabilidade em todo o serviço da Agencia, com atendimento polivalente.
10. A Ré exige iniciativa, autonomia, responsabilidade e pró – actividade e fixa objectivos quer para entregar incentivos, quer para promover na carreira os seus trabalhadores.
11. A Autora desenvolveu a sua actividade numa Agencia com muitos clientes, sendo sempre elogiada pelos seus desempenhos profissionais, nomeadamente pelo Vice-presidente da C… em reunião final do … do projecto C3….
12. Teve uma promoção por antiguidade.
13. Tem 5 dias de férias não gozadas relativamente ao ano anterior ao da cessação do contrato.
14. A Autora assumiu a responsabilidade por todo o prejuízo que possa ter causado.
15. A Autora, em 2009.12.30, trocou a ordem dos titulares da conta de depósito a prazo nº ………...... de forma a que o 2º titular, K… (cliente nº ……..), que pertencia à sua carteira de clientes, passasse a figurar como 1º titular na conta.
16. A Autora atribuiu taxas superiores às da oferta comercial em vigor, em depósitos a prazo, que careciam de autorização superior para o efeito.
Factos que integravam a base instrutória:
17. Em 25.01.2010, a DPN RPN 9 remeteu à DAI, cópia da Informação elaborada pela Agência …, da qual consta que foi subscrita naquela Agência uma aplicação que não correspondia à que havia sido solicitada pela cliente nº ……., D….
18. A mesma Agência … comunicou que o Seguro de Capitalização “C1…” foi incorrectamente registado em nome daquela cliente, em 2008.12.23, pelo valor de € 100.000 uma vez que esta havia subscrito um impresso respeitante à aplicação da L… “C2...”.
19. Não foi possível corrigir o lapso cometido junto da L….
20. Em consequência, foi autorizado o pagamento da rendibilidade do produto “C2…”, que a cliente tinha subscrito, assumindo a C… o reembolso, no final do prazo da aplicação, do eventual prejuízo emergente da situação, que poderá atingir o valor máximo de € 11.188,79.
21. Através de carta, datada de 2009.12.03, a cliente formalizou a sua reclamação.
22. Já antes tinha reclamado verbalmente, o que havia motivado que a Agência já tivesse apresentado o assunto à Direcção Comercial, em 2009.10.29.
23. A Autora subscreveu em nome da reclamante, em 2008.12.23, a aplicação “C1…”, na quantia de € 100.000, sem que o respectivo impresso estivesse assinado pela cliente.
24. O pedido de Subscrição da aplicação “C2…”, não foi certificado, apesar de preenchido e subscrito pela reclamante, com data de 2008.12.05.
25. Quando a Autora atendeu a cliente esta já tinha escolhido o produto onde pretendia aplicar o dinheiro, sendo que já tinha sido informada antes das várias opções.
26. A rendibilidade das duas aplicações é diferente e têm politicas remuneratórias distintas.
27. Através de email datado de 2010.03.22, a DCP comunicou à DAI que a Autora havia sido incorrectamente beneficiada no “Sistema de Incentivos”, porque o plafond da sua carteira de activos sob gestão ficara indevidamente valorizado em € 146.000 devido a uma alteração de titulares efectuada na conta de depósito a prazo nº ………......, em 2009.12.30, facto que poderia ter alterado o coeficiente de cálculo para o respectivo prémio, o que não chegou a acontecer.
28. O que fez em detrimento da cliente nº …….., M…, que não tinha gestora associada, mas que consta na respectiva ficha de assinaturas como 1ª titular.
29. A alteração dos titulares da conta foi efectuada com a intenção de atingir objectivos por manipulação dos dados.
30. Para efeitos da afectação dos saldos da carteira de cada gestor apenas relevam os saldos dos clientes que figuram como 1ºs titulares das contas.
31. A A. procedeu do modo indicado no facto n.º 16. com os seguintes clientes[6]:

31-A – Na nota de culpa formulada no procedimento disciplinar e no relatório que faz parte integrante da decisão de despedimento é imputada à A. a atribuição de taxas superiores às da oferta comercial em vigor no período compreendido entre 26 de Maio e 16 de Outubro de 2009
32. A Autora, para a atribuição de taxas, utilizou a password da Gerente.
33. As taxas de rede em vigor à data da constituição dos referidos depósitos a prazo eram mais reduzidas.
34. O valor do prejuízo causado à Ré, correspondente à diferença entre a taxa que fora garantida pela Autora aos clientes e a que foi posteriormente autorizada, cifra-se em € 2.386,24.
35. A decisão de despedimento foi comunicada à Autora em 27 de Janeiro de 2011.
36. Parte da atuação da Autora foi concretizada com o intuito de incrementar os seus resultados e, em consequência, ser premiada com maiores incentivos.
37. Os factos que motivaram o processo disciplinar só foram conhecidos pelos responsáveis comerciais e pela DAI, em meados do ano de 2009, nomeadamente a concessão de taxas de juro mais favoráveis a clientes sem autorização.
38. No dia 23 de dezembro quando a Autora decidiu validar o produto solicitado por D…, este já estava esgotado e não era já possível subscreve-lo.
39. A Autora aplicou a quantia da mesma no produto C1…”.
40. A alteração do 2º para o 1º titular da conta não causou prejuízo à Ré e aos clientes.
41. Esta é prática corrente para gestores de clientes, assistentes comerciais e gerente da Ré.
42. Em 2009 o projeto C3… era um projeto-piloto.
43. À Autora era-lhe facultada a password da gerência necessária à efetivação das operações.
44. O Vice-presidente da C…, Dr. F…, referiu publicamente que não deixaria sair nenhum depósito a prazo da C… nem que para isso implicasse majoração das taxas desses depósitos.
44-A. Foram atribuídos à A. incentivos em Junho de 2010, que foram suspensos.
45. A Autora, até à sua suspensão, manteve o acesso aos códigos alarme da agência.
46. Saía muitas vezes para além do horário nunca reivindicando o pagamento de trabalho suplementar.
47. Muitas vezes adiava a hora do almoço.
48. Tinha bom relacionamento com os colegas de trabalho.
49. Zelava pela boa imagem da empresa junto de todos os que com ela contactam.
50. A Autora sentiu-se humilhada.
51. A Ré divulgou internamente o seu despedimento.
52. Sente-se preocupada.
53. O que afeta a sua vida pessoal, familiar e social.
54. Sente-se injustiçada.
«55 - A Administração da R. emitiu em 26 de Setembro de 2007 a deliberação documentada a fls. 619, relativa à aplicação de sanção disciplinar à trabalhadora Q…, da qual fez constar, designadamente, o seguinte:
“Apreciado o processo disciplinar instaurado contra a empregada Q…, o Conselho dá o seu inteiro acordo aos fundamentos de facto e de direito constantes do Relatório Final, considerando provados, nos termos do mesmo Relatório, os factos indicados pelo Instrutor do processo e que fazem parte da Nota de Culpa deduzida contra a arguida.
Tal Relatório constitui, pois, parte integrante da presente Deliberação, para todos os efeitos legais.
Deste modo, tendo em consideração a conduta da arguida, consubstanciada, em síntese, na apropriação ilícita, para proveito próprio, da quantia de € 119,98, pertencente a uma cliente da C…, com recurso à emissão irregular de uma caderneta e do respectivo PIN, o Conselho concorda com a gravidade que emerge de tal conduta.
Tratando-se, embora, de infracções de relevante gravidade objectiva, susceptíveis de fazer quebrar, de forma absoluta e definitiva, a confiança indispensável à subsistência da relação laboral, na determinação da medida concreta da sanção a aplicar têm-se, porém, em consideração circunstâncias que constituem atenuantes de importância da conduta sob censura, nomeadamente a precária situação socio-económica da arguida e do seu agregado familiar, composto por duas filhas que vivem exclusivamente a seu cargo, o arrependimento por aquela manifestado, a confissão dos factos, as boas referências profissionais e o seu bom comportamento anterior.
Nestes termos, tendo em atenção os actos praticados pela arguida, as circunstâncias que concorrem a favor e contra a mesma e o Parecer da Comissão de Trabalhadores, de acordo com as cláusulas 22.ª, alíneas b) e d), 104.ª e 106.ª, n.º 1, alínea e), do Acordo de Empresa, e com as alíneas a), c) e d) do n.º 1 do art.º 121.º do Código do Trabalho, conjugado com a alínea e) do art.º 366.º do mesmo Código, o Conselho aplica à empregada Q… a sanção disciplinar de suspensão do trabalho com perda de retribuição e de antiguidade, graduada em sessenta dias.
(…).”
55-A – No relatório final do procedimento disciplinar desta trabalhadora, documentado a fls. 635 e ss. e datado de 2007.08.20, o instrutor ponderou, além do mais, que considera provados os factos dos artigos 1.º a 6.º da nota de culpa dos quais resulta que em 2007.03.12 a arguida levantou da conta de um cliente a quantia de € 119,98 através de uma caderneta a que, minutos antes, atribuíra um PIN, valor que utilizou para pagar as explicações da filha. O referido instrutor considerou ainda, em fundamento da sua proposta, os seguintes factos:
- a trabalhadora tem a seu cargo duas filhas, sendo uma delas menor, que dependem exclusivamente de si uma vez que os respectivos progenitores não contribuem com alimentos para o sustento das mesmas;
- tem como único rendimento o ordenado que aufere, com o qual tem que fazer face a todos os encargos, nomeadamente o pagamento da amortização mensal do empréstimo para habitação, alimentos, despesas escolares, transportes e todas as outras despesas inerentes à vida familiar;
- é empregada da C… há mais de 15 anos, lidou com bastante dinheiro e teve antes um “comportamento irrepreensível”;
- sofria então de “depressão major reactiva”;
- não tem registada a aplicação de qualquer sanção disciplinar.
56 - A Administração da R. emitiu em 26 de Setembro de 2007 a deliberação documentada a fls. 620-621, relativa à aplicação de sanção disciplinar à trabalhadora S…, da qual fez constar, designadamente, o seguinte:
“Apreciado o processo disciplinar instaurado contra a empregada S…, o Conselho dá o seu inteiro acordo aos fundamentos de facto e de direito constantes do Relatório Final, considerando provados, nos termos do mesmo Relatório, os factos indicados pelo Instrutor do processo e que fazem parte da Nota de Culpa deduzida contra a arguida.
Tal Relatório constitui, pois, parte integrante da presente Deliberação, para todos os efeitos legais.
Deste modo, tendo em consideração a conduta da arguida, consubstanciada, em síntese, no facto de:
● Ter violado, voluntária e conscientemente, o dever de sigilo bancário, ao transmitir a terceira pessoa, sua amiga, os saldos das contas nºs ………...... e ………......;
● Ter participado, de forma directa e relevante, nos actos preparatórios e de execução de uma fraude bancária, traduzida em dois débitos irregulares das referidas contas, nos valores de € 697,48 e € 88.027,61, efectuados pela sua aludida amiga e filha, em 26 e 27 de Julho de 2006, nomeadamente:
> Através de prestimosa colaboração e ajuda no preenchimento, pelo seu próprio punho, de parte dos documentos de suporte aos débitos fraudulentos – documentos que continham assinaturas falsificadas da titular das contas, já falecida –, sabendo ou não podendo ignorar que a cliente não estava na Agência e que aquelas (amiga e filha) não disponham de poderes para movimentas tais contas;
> Através do acompanhamento pessoal às autoras materiais da fraude, durante o atendimento que a estas foi prestado na Agência Central-Sede, nas datas acima indicadas, permanecendo ao lado delas.
● Ter faltado à verdade, através de postura enganosa, quando, em 26 de Março de 2007, foi ouvida sobre os factos pela Direcção de Auditoria Interna,
o Conselho concorda com a gravidade que emerge de tal conduta.
Com efeito, com tal actuação, a arguida violou, de forma muito grave, os deveres profissionais que sobre ela impendiam, nomeadamente os de zelo, isenção, lealdade, diligência e obediência.
Tratando-se, embora, de infracções de relevante gravidade objectiva, susceptíveis de fazer quebrar, de forma absoluta e definitiva, a confiança que deve presidir à relação funcional, na determinação da medida concreta da sanção a aplicar tem-se, contudo, em consideração o seu bom comportamento anterior, o desempenho profissional ao longo da sua carreira e a abonação muito favorável que lhe foi prestada pela sua hierarquia imediata, circunstâncias que no seu conjunto constituem atenuantes de importância da conduta sob censura”.
Nestes termos, tendo em atenção os actos praticados pela arguida, as circunstâncias que concorrem contra e a favor da mesma e o Parecer da Comissão de Trabalhadores, de acordo com os artigos 5.º, 6.º, n.º 7.º, 7.º, n.º 4.º e § 2.º, 8.º, n.º 1.º, e 18.º do Regulamento Disciplinar dos Funcionários Civis de 22 de Fevereiro de 1913, publicado no Diário do Governo n.º 44, de 24 de Fevereiro de 1913, que continua a aplicar-se na C…, conforme jurisprudência pacífica do Tribunal Pleno do Supremo Tribunal Administrativo – cfr., i. a., Acordão de 24 de Maio de 2005, recurso n.º 927/02, Acordão de 5 de Julho de 2005, recurso n.º 755/04-20, e Acordão de 25 de Outubro de 2005, recurso n.º 831/04-20 –, o Conselho aplica à empregada S… a pena disciplinar de suspensão de exercício e vencimento de trinta a cento e oitenta dias, graduada no seu máximo (180 dias).
(…).”
56-A – No relatório final do procedimento disciplinar desta trabalhadora, documentado a fls. 665 e ss., e datado de 2007.08.14 o instrutor ponderou, além do mais, que considera provados os factos dos artigos 1.º a 17.º da nota de culpa e parcialmente provada o do artigo 18.º, dos quais resulta, bem como do demais processado, que:
- a trabalhadora consultou em 2006.07.26 uma conta titulada por uma pessoa falecida e forneceu informações sobre a mesma a uma cliente da C… que não era titular daquela conta;
- acompanhou a cliente e sua filha nos dias 26 e 27 desse mês sabendo que as mesmas pretendiam movimentar saldos de contas de que não eram titulares ou autorizadas, prestando-se a preencher com o seu punho parte dos documentos que serviram de suporte aos saques fraudulentos no átrio da C…;
- não assumiu estes factos quando a DAI lhe solicitou esclarecimentos em 200703.23;
- a sua chefia directa, apesar do que aconteceu, continua a depositar total confiança na trabalhadora e na sua idoneidade, propondo-a para ser promovida por mérito já na pendência do procedimento disciplinar;
- é empregada da C… com contrato de provimento há mais de 27 anos;
- tem várias promoções por mérito;
- não tem registada a aplicação de qualquer sanção disciplinar.
57 - A Administração da R. emitiu em 25 de Novembro de 2009 a deliberação documentada a fls. 623-624, relativa à aplicação de sanção disciplinar ao trabalhador T…, da qual fez constar, designadamente, o seguinte:
“Apreciado o processo disciplinar instaurado contra o empregado T…, o Conselho dá o seu inteiro acordo aos fundamentos de facto e de direito constantes do Relatório Final, considerando provados, nos termos do mesmo Relatório, os factos indicados pelo Instrutor do processo e que fazem parte da Nota de Culpa deduzida contra o arguido que, à data dos factos, exercia funções de gestor de clientes.
Tal Relatório constitui, pois, parte integrante da presente Deliberação para todos os efeitos legais.
Deste modo, tendo em consideração a conduta do arguido, consubstanciada, em síntese, no facto de:
● Ter movimentado a débito a conta de um cliente, no montante de cerca de € 15.000,00, sem prévio conhecimento ou autorização deste;
● Ter creditado parte significativa de tais verbas em contas por si tituladas, que usou em proveito próprio, bem como em contas pertencentes a outros clientes que faziam parte da sua carreira de gestor, a título de compensação por menos valias ocorridas em produtos C5…, ou devolução de comissões, entre as quais as relativas a anuidades de cartões;
● Ter efectuado tal movimentação a débito através de caderneta e PIN associado à conta daquele cliente, sem conhecimento prévio e autorização do mesmo;
● Ter emitido a caderneta e obtido o respectivo PIN em terminal bancário por si aberto, utilizando para o efeito, abusivamente, a “password” da Gerência,
o Conselho concorda com a gravidade que emerge de tal conduta.
Com efeito, com tal actuação, o arguido cometeu infracções disciplinares graves, por violação, por parte do mesmo, de deveres profissionais que sobre ele impendiam, nomeadamente os de diligência, zelo, obediência, lealdade e isenção.
Tratando-se, embora, de infracções de relevante gravidade objectiva, susceptíveis de fazer quebrar, de forma absoluta e definitiva, a confiança que deve presidir à relação funcional, na determinação da medida concreta da sanção a aplicar tem-se, porém, em consideração as circunstâncias que constituem atenuantes de relevância, nomeadamente o facto de não haver prejuízos materiais a registar, uma vez que o cliente veio, posteriormente a ratificar os débitos efectuados na sua conta, a situação social do seu agregado familiar (mãe idosa e filha deficiente e diabética a cargo), o prestígio social de que goza no meio onde reside e trabalha, os 26 anos de tempo de serviço prestado à C…, com bom comportamento, e a ausência de registo de qualquer sanção disciplinar”.
Nestes termos, tendo em atenção os actos praticados pela arguido, as circunstâncias que concorrem contra e a favor do mesmo e o Parecer da Comissão de Trabalhadores, de acordo com os artigos 5.º, 6.º, n.º 7.º, 8.º, n.º 1.º, e 18.º do Regulamento Disciplinar dos Funcionários Civis de 22 de Fevereiro de 1913, publicado no Diário do Governo n.º 44, de 24 de Fevereiro de 1913, que continua a aplicar-se na C…, conforme jurisprudência pacífica do Tribunal Pleno do Supremo Tribunal Administrativo – cfr., i. a., Acordão de 24 de Maio de 2005, recurso n.º 927/02, Acordão de 5 de Julho de 2005, recurso n.º 755/04-20, e Acordão de 25 de Outubro de 2005, recurso n.º 831/04-20 –, o Conselho aplica ao empregado T… a sanção disciplinar de suspensão de exercício e vencimento de 30 a 180 dias, graduada em 90 dias.
(…).”
57-A – No relatório final do procedimento disciplinar deste trabalhador documentado a fls. 704 e ss. e datado de 2009.10.23, o instrutor ponderou, além do mais, que considera provados os factos dos artigos 1.º a 28.º da nota de culpa, dos quais resulta, bem como do demais processado, que:
- o trabalhador efectuou movimentações na conta de um cliente (pessoa idosa por cujo internamento na U… providenciou), umas das vezes para efectuar pagamentos de despesas da responsabilidade do cliente, uma para emprestar a um irmão seu e outras para compensar alguns clientes da C… que se mostravam descontentes com a cobrança dos valores de anuidades de cartões, de despesas por levantamentos, de descontos de comissões, de portes e outros valores, depositando nas contas dos mesmos as quantias equivalentes a esses valores debitados;
- com esta última finalidade, fez também transferências de contas suas para as desses clientes;
- da conduta do trabalhador não resultaram quaisquer prejuízos materiais para o cliente;
- teve três promoções por mérito;
- trabalha na C… desde 1983 em regime de contrato de provimento, desempenhando funções na agência de Resende desde esse ano;
- não tem registada a aplicação de qualquer sanção disciplinar.
58 - A Administração da R. emitiu em 25 de Novembro de 2009 a deliberação documentada a fls. 625, relativa à aplicação de sanção disciplinar à trabalhadora V…, da qual fez constar, designadamente, o seguinte:
“Apreciado o processo disciplinar instaurado contra a empregada V…, o Conselho dá o seu inteiro acordo aos fundamentos de facto e de direito constantes do Relatório Final, considerando provados, nos termos do mesmo Relatório, os factos indicados pelo Instrutor do processo e que fazem parte da Nota de Culpa deduzida contra a arguida, colocada, à data dos factos, na Agência ….
Tal Relatório constitui, pois, parte integrante da presente Deliberação para todos os efeitos legais.
Deste modo, tendo em consideração a conduta da arguida, consubstanciada, em síntese, no facto de, entre Abril e Setembro de 2008, ter movimentado, a débito, abusivamente, rubricas de “Contas a Liquidar”, no valor de € 98.560,00, para disponibilizar verbas a clientes, a título de adiantamentos sobre pedidos de crédito ainda em estudo na Agência, utilizando, para o efeito, as passwords da Gerência, o Conselho concorda com a gravidade que emerge de tal conduta.
Com efeito, com tal actuação, a arguida cometeu infracções disciplinares graves, por violação, por parte da mesma, de deveres profissionais que sobre ela impendiam, nomeadamente os de diligência, zelo, obediência, lealdade e isenção.
Tratando-se, embora, de infracções de relevante gravidade objectiva, susceptível de fazer quebrar, de forma absoluta e definitiva, a confiança indispensável à subsistência da relação laboral, na determinação da medida concreta da sanção a aplicar têm-se, porém, em consideração circunstâncias que constituem atenuantes de importância relevante da conduta sob censura, nomeadamente o bom comportamento profissional anterior, a ausência de prejuízos materiais, a inexperiência na função, o ter renunciado voluntariamente à função de gestora de cliente, o ser infractora primária e o facto de estar grávida de 12 semanas”.
Nestes termos, tendo em atenção os actos praticados pela arguida e o Parecer da Comissão de Trabalhadores, de acordo com as cláusulas 22.ª, alíneas b), e d), 104.ª e 106.ª, n.º 1, alínea e) do Acordo de Empresa, e com as alíneas a), c) e d) do n.º 1 do art.º 121.º do Código do Trabalho, conjugado com a alínea e) do art.º 366.º do mesmo Código, o Conselho aplica à empregada V… a sanção disciplinar de suspensão do trabalho com perda de retribuição e de antiguidade, graduada em trinta dias.
(…).”
58-A – No relatório final do procedimento disciplinar desta trabalhadora, documentado a fls. 820 e ss. e datado de 2009.11.03, o instrutor ponderou, além do mais, que considera provados os factos dos artigos 1.º a 10.º da nota de culpa, dos quais resulta que no ano de 2008 a arguida movimentou abusivamente as rubricas “Contas a Liquidar” e “Tesouro Público – Contas a Liquidar” para disponibilização de importâncias a clientes, como se de adiantamento se tratasse, sobre os montantes das propostas de crédito que os mesmos tinham apresentado na agência, contrariando as normas internas da C… que regulamentam a concessão de crédito. O referido instrutor considerou ainda, em fundamento da sua proposta, os seguintes factos:
- a trabalhadora está vinculada por contrato de trabalho à C…;
- da sua conduta não resultaram prejuízos materiais para a C… uma vez que as quantias que adiantou estão liquidadas;
- tem duas promoções por mérito;
- não tem registada a aplicação de qualquer sanção disciplinar.
59 - A Administração da R. emitiu em 25 de Novembro de 2009 a deliberação documentada a fls. 627, relativa à aplicação de sanção disciplinar ao trabalhador W…, da qual fez constar, designadamente, o seguinte:
“Apreciado o processo disciplinar instaurado contra o empregado W…, o Conselho dá o seu acordo aos fundamentos de facto e de direito constantes no Relatório Final, considerando provados, nos termos do mesmo Relatório, os factos abaixo indicados, que fazem parte da Nota de Culpa deduzida contra o arguido.
Tal Relatório constitui, pois, parte integrante da presente Deliberação para todos os efeitos legais.
Deste modo, tendo em consideração a conduta do arguido, consubstanciada, em síntese, no facto de:
● Ter movimentado contas da cliente X…, através da utilização do Serviço C6…, alegadamente a pedido e com códigos pessoais e intransmissíveis fornecidos pela cliente, nas instalações da C…;
● Ter aceite ser autorizado na movimentação de três contas da C…, sem autorização superior,
conduta que se traduziu na violação grave de deveres profissionais que sobre ele impendiam, nomeadamente os de zelo, diligência e obediência, o Conselho concorda com a gravidade que emerge de tal conduta.
Nestes termos, tendo em atenção a conduta do arguido, as circunstâncias que concorrem a favor do mesmo, de acordo com as cláusulas 22.ª, alíneas b) e d), 104.ª e 106.ª, n.º 1, alínea e), do Acordo de Empresa, e com as alíneas c) e e) do n.º 1 do art.º 128.º do Código do Trabalho aprovado pela Lei nº 7/2009, de 12 de Fevereiro, o Conselho aplica ao empregado W… a pena disciplinar de suspensão do trabalho com perda de retribuição e de antiguidade, graduada em noventa dias.
(…).”
59-A – No relatório final do procedimento disciplinar deste trabalhador documentado a fls. 846 e ss. e datado de 2009.06.23, o instrutor ponderou, além do mais, que considera provados os factos dos artigos 1.º a 14.º da nota de culpa, dos quais resulta, bem como do demais processado, que:
- o trabalhador movimentou contas de uma cliente como “autorizado” e através da C6…, com acesso a códigos pessoais intransmissíveis alegadamente fornecidos pela cliente e alterou moradas sem autorização da mesma;
- fez tais acessos nas instalações da C…;
- aceitou ser co-titular com a referida cliente de uma conta no Y…;
- aceitou em proveito pessoal prendas e vantagens patrimoniais de valor elevado;
- em acção cível instaurada contra a R., esta afirmou que as eventuais dádivas da cliente ao trabalhador “decorreram das suas relações pessoais, não sendo susceptíveis de se confundirem com a sua envolvência profissional”;
- o trabalhador encontra-se vinculado à C… por contrato de trabalho desde 1997;
- teve quatro promoções por mérito;
- não tem registada a aplicação de qualquer sanção disciplinar.
60 – Nos aludidos relatórios que antecederam as deliberações referidas em 55. a 59., o instrutor nomeado pela R. indicou que podia ser aplicada a demissão (situações referidas nos pontos 56. e 57.) ou o despedimento (situações referidas nos pontos 55., 58. e 59.).
*
4. Fundamentação de direito
*
4.1. Da prescrição do direito de exercer o poder disciplinar
4.1.1. Invoca a recorrente que:
- a subscrição em nome da reclamante D… em 2008.12.23, da aplicação C1… na quantia de €100.000, sem que o respectivo impresso estivesse assinado pela cliente e
- a não certificação do pedido de subscrição da aplicação C2…, não obstante o mesmo encontrar-se totalmente preenchido e subscrito pela reclamante D…, com data de 2008.12.05, ocorreram a 23 de Dezembro de 2008, que a nota de culpa foi notificada à recorrente por carta registada com data de 15.09.2010, que os factos imputados à recorrente e supra transcritos não configuram qualquer crime e muito menos de infidelidade, são instantâneos e consumaram-se naquele dia e que o primeiro facto porventura interruptivo da prescrição na tese da sentença, terá ocorrido a 26 de Janeiro de 2010, pelo que prescreveu o direito de exercer o poder disciplinar por parte da recorrida sobre a recorrente por via da pratica desses factos.
4.1.2. A sentença recorrida, a este propósito, discorreu nos seguintes termos:
«(…) Atento o teor dos factos provados, nomeadamente, os descritos sob os pontos 1. a 3., 18., 23. a 26., 38. e 39., tem de se concluir que o prazo de prescrição das infrações disciplinares imputadas à Autora ainda não tinha decorrido quando foi instaurado o processo disciplinar. De facto, não obstante o facto tenha sido praticado em praticado em dezembro de 2008, não se acompanhando a tese da Ré de que o mesmo configura facto continuado uma vez que o facto se considera praticado no momento em que a Autora atuou, e o processo disciplinar tenha sido formalmente instaurado em janeiro de 2010, entendo que estes mesmos factos são suscetíveis de constituir crime de Infedilidade, previsto e punido pelo art. 224º do Código Penal, cujo prazo de prescrição, nos termos do disposto no art. 118º/1/c) do mesmo diploma, é de cinco anos.
“Como decorre da literalidade do referido normativo, para que o prazo da prescrição penal seja aplicável às infrações disciplinares (desde que, naturalmente, seja superior ao prazo previsto na primeira parte do n.º 2 do art.º 372.º do CT) basta que os respetivos factos também consubstanciem, em abstrato, a prática de um crime. Este é, realmente, o único requisito previsto no aludido normativo legal, para que o prazo geral da prescrição da infração disciplinar – que, nos termos da primeira parte daquele normativo legal, é de um ano – seja alargado quando os factos integradores da infração disciplinar também sejam suscetíveis de constituírem ilícito penal. Para que tal alargamento ocorra, o normativo em causa não exige a verificação de qualquer outro requisito, já que na sua letra não existe a menor referência nesse sentido, nomeadamente no que toca à necessidade de exercício da ação penal e à necessidade de apresentação de queixa-crime por parte do ofendido, quando o exercício daquela esteja dependente de queixa.” – cf. Acórdão do STJ, de 13.01.2010, in www.dgsi.pt .
Mesmo que assim não fosse, sempre a prescrição não se teria verificado. Senão vejamos: O art. 353º/3, do Código do Trabalho (anterior art. 411º do Código do Trabalho de 2003), preceitua que a contagem daquele prazo se interrompe com a comunicação/notificação ao trabalhador da nota de culpa e o art. 352º (anterior art. 412º do Código do Trabalho de 2003) determina que igual interrupção acontece com a instauração do procedimento prévio de inquérito, desde que tal procedimento se mostre necessário para fundamentar a nota de culpa e seja iniciado e conduzido de forma diligente, não mediando mais de 30 dias entre a suspeita de existência de comportamentos irregulares e o início do inquérito, nem entre a sua conclusão e a notificação da nota de culpa.
Resulta dos factos provados que a cliente em causa tinha reclamado verbalmente e que tal havia motivado que a Agência tivesse apresentado o assunto à Direção Comercial, em 29.10.2009 e que os factos que motivaram o processo disciplinar só foram conhecidos pelos responsáveis comerciais e pela DAI, em meados do ano de 2009, nomeadamente a concessão de taxas de juro mais favoráveis a clientes sem autorização.
Resulta, ainda, do processo disciplinar junto aos autos que após a comunicação de 29.10.2009 foi determinada a realização de auditoria interna que terminou com o relatório de fls. 186 a 195, de 27 de agosto de 2010, tendo sido ordenada a instauração de processo disciplinar em 01.09.2010.
Em face do exposto, cumprirá determinar qual o momento em que se considera instaurado o processo disciplinar. Dúvidas não restam de que o despacho da entidade empregadora a determinar a instauração do processo disciplinar constitui o ato formal que demarca o início deste, no entanto, importa analisar da relevância da auditoria determinada pela Ré.
De facto, a prescrição baseia-se na inércia do empregador perante o conhecimento da prática de determinada infração e considera-se que tal inércia não ocorre quando o empregador, perante a suspeita da prática de uma infração, ordena a realização de diligências destinadas a apurar e precisar as irregularidades cometidas. Assim, independentemente da denominação que lhes seja dada, aquelas diligências já fazem parte do processo prévio de inquérito destinado a recolher os elementos indispensáveis à elaboração da nota de culpa e a sua realização e, como tal, suspendem o prazo de caducidade do procedimento disciplinar.
De facto, sempre que tal processo se mostre necessário à elaboração da nota de culpa, também ele constitui ato de início de procedimento disciplinar, consubstanciando, nessa medida, facto interruptivo da prescrição da infração. Analisadas as alegações das partes e a matéria de facto provada entendemos que a auditoria determinada pela Ré configura um processo prévio de inquérito e que este se mostrou necessário e justificado.
Assim considerando que a instauração do processo prévio de inquérito interrompeu o decurso do prazo de prescrição nos termos do disposto no art. 352º do Código do Trabalho (correspondente ao art. 412º do Código do Trabalho de 2003), impõe-se concluir que as infrações disciplinares imputadas à Autora não prescreveram.
Mais, como se refere no Ac. do STJ, de 13.01.2010, in www.dgsi.pt “(…) o ónus de alegar e provar os factos que permitam concluir pela caducidade do procedimento disciplinar recaía sobre o autor/trabalhador, uma vez que, no contexto da ação de impugnação de despedimento, a caducidade do procedimento disciplinar é um facto constitutivo da ilicitude do despedimento invocada pelo autor e, consequentemente, dos direitos por ele peticionados com base nessa ilicitude (art.º 342.º, n.º 1, do C.C.).” No mesmo sentido, Ac. do STJ, de 12.02.2009, também na mesma base de dados.
Nestes termos é ao trabalhador que compete o ónus da alegação e prova de que o prazo de que pretende beneficiar foi excedido, para que se possa prevalecer da exceção invocada. “Tal implica demonstrar a data em que o empregador ou o superior hierárquico com competência disciplinar tomou conhecimento dos factos constantes da nota de culpa, o que constitui o termo inicial de tal prazo, bem como a data em que a nota de culpa foi recebida pelo trabalhador, o que constitui o termo final do mesmo prazo.
In casu, importava ao Requerente provar, uma vez que a Requerida é uma sociedade anónima, quem era o superior hierárquico com competência disciplinar, para além da data em que ele toma conhecimento dos factos imputados na nota de culpa. Assim, tal ónus da prova não recai sobre a Requerida, mas sobre o Requerente, por se tratar de facto constitutivo do seu direito (…)”. – cf. acórdão da RP, de 27.02.2012, in www.dgsi.pt.
Dos autos resulta de forma clara que quando foi reportada a situação se desencadearam diligências a apurar os mesmos e terminadas estas foi, de imediato, decidido instaurar processo disciplinar.
Por todo o exposto, julgo improcedente a invocada exceção de prescrição do direito de ação disciplinar.»
Vejamos.
4.1.3. Nos termos do preceituado no artigo 329.º, n.º1 do Código do Trabalho, o direito de exercer o poder disciplinar prescreve “um ano após a prática da infracção, ou no prazo de prescrição da lei penal se o facto constituir igualmente crime”.
Decorre deste preceito que, uma vez cometida a infracção disciplinar, o empregador dispõe de um ano para dela tomar conhecimento a fim de a punir disciplinarmente; transcurso o prazo de um ano sobre a prática da actividade que determina em abstracto a aplicação de uma sanção disciplinar verifica-se o termo final do prazo de prescrição e já não é possível o exercício da acção disciplinar, ainda que o empregador não tenha tido conhecimento da infracção.
A prescrição do direito de exercer o poder disciplinar assenta na ideia de que decorrido o lapso de tempo de um ano sobre a infracção já não é razoável punir o infractor. O termo inicial para a contagem deste prazo situa-se na data da prática da infracção e o seu estabelecimento pretende tutelar o valor da certeza e segurança jurídica que em geral inspira o instituto da prescrição, evitando que o trabalhador fique indefinidamente sob a ameaça de uma eventual falta cometida.
Assim, decorrido o prazo de um ano sobre a prática da actividade que determina em abstracto a aplicação de uma sanção disciplinar, falece também ao empregador o direito de exercer o procedimento disciplinar por prescrição da infracção, ainda que não tenha tido conhecimento da infracção ou que o tenha e exerça o poder disciplinar dentro dos 60 dias após o conhecimento[7].
Quando os factos imputados ao trabalhador integrarem, simultaneamente, ilícito criminal, o prazo de prescrição da infracção disciplinar passa a ser o da prescrição prevista para o ilícito penal (artigo 329.º n.º 1, “in fine”, do Código do Trabalho). Como se tem defendido na jurisprudência, esse alargamento não depende do efectivo exercício da acção penal, nem da prévia verificação de qualquer outra condição ou pressuposto, maxime do exercício do direito de queixa[8].
4.1.4. Assim, face ao modo como está estruturado o recurso e ao teor da sentença recorrida, temos como sub-questões a analisar, dentro da questão da invocada prescrição, as de saber:
- se a conduta imputada à recorrente no procedimento disciplinar deve ser perspectivada como uma infracção continuada;
- se os factos referentes à não certificação do pedido de subscrição da aplicação c2… e subscrição em nome da cliente da C1… integram simultaneamente a prática de um crime de infidelidade previsto e punido pelo artigo 224.º do Código Penal, cujo prazo de prescrição, nos termos do disposto no art. 118º, n.º 1, alínea c) do mesmo diploma, é de cinco anos;
- se ocorreu algum facto interruptivo da prescrição antes da notificação da nota de culpa à trabalhadora.
4.1.4.1. De acordo com as regras de direito criminal que, consensualmente, são de aplicação subsidiária ao direito disciplinar laboral, o prazo de prescrição do crime continuado, tal como este vem definido no artigo 30.º do Código Penal, apenas começa a correr no dia da prática do último acto - cfr. o artigo 119.º, nº 2, alínea b) do Código Penal.
Assim, a demonstrar-se que todos os actos imputados à A. foram praticados de molde a considerar-se que se tratou de uma infracção continuada, o prazo de prescrição de todos eles apenas começa a correr no dia da prática do último acto.
Nos termos do disposto no art. 30º, nº2 do Código Penal, o crime continuado consiste na realização plúrima do mesmo tipo de crime ou de vários tipos de crime que fundamentalmente protejam o mesmo bem jurídico, executada por forma essencialmente homogénea e no quadro da solicitação de uma mesma situação exterior que diminua consideravelmente a culpa do agente”.
São pressupostos do crime continuado:
- que o comportamento do agente atente contra o mesmo bem jurídico ou bens jurídicos fundamentalmente idênticos;
- a homogeneidade do comportamento e um mínimo de conexão temporal e espacial entre os actos;
- que a actividade continuada seja abrangida pelo dolo continuado, ou seja, que as resoluções seguintes renovem as anteriores numa linha psicológica continuada;
- a existência de uma relação que, de fora, e de maneira considerável, facilitou a repetição da actividade criminosa, tornando cada vez menos exigível ao agente que se comporte de maneira diferente[9].
Os factos relativamente aos quais a recorrente invoca a prescrição do direito de exercer o poder disciplinar ocorreram em Dezembro de 2008 (vide os factos 7., 17. a 26., 38. e 39.) e os demais factos imputados à recorrente na decisão de despedimento são nela situados entre Maio e Outubro de 2009 (negociação de taxas de juro de depósitos a prazo sem a necessária intervenção dos seus superiores com competência para efeito) e em 30 de Dezembro de 2009 (alteração da ordem dos titulares das contas).
Os comportamentos proibidos verificados em 2008 consistem numa omissão, quando a A. tinha o dever de acção (de certificar a subscrição do produto relativamente ao qual a cliente havia manifestado a sua vontade) e numa acção, quando a A. tinha o dever de não actuar sem a vontade da cliente (e subscreveu um outro produto à revelia da cliente), consumando-se as infracções disciplinares por ocasião destes comportamentos omissivo e activo (factos 23. e 24.).
Não se evidencia que depois de Dezembro de 2008 a A. haja prosseguido uma conduta de natureza igual à verificada nesse mês – que resumidamente consistiu em não certificar um produto financeiro subscrito pelo cliente, subscrever outro de rentabilidade inferior e aplicar a quantia destinada ao primeiro no segundo –, não persistindo aquela conduta de consumação instantânea para além de Dezembro de 2008.
E de modo algum pode dizer-se, como parece entender a recorrida, que a ocultação durante a quase totalidade do ano de 2009 desta conduta omissiva (e, depois, activa) tem o significado da persistência da sua prática (factos 21. e 22.).
Relativamente às condutas ulteriores da trabalhadora, apesar de as mesmas serem susceptíveis de pôr em causa deveres laborais, não só atentam contra outro tipo de valores laborais como, também, falta o mínimo de conexão temporal entre os actos que permite a afirmação da existência de uma só infracção constituída ou composta por todos os actos imputados à recorrente.
Não estão, pois, preenchidos os requisitos necessários para se poder falar em infracção disciplinar continuada.
4.1.4.2. Quanto à questão de saber se os factos referentes à não certificação do pedido de subscrição da aplicação C2… e subscrição em nome da cliente da C1… integram, simultaneamente, a prática de um crime de infidelidade previsto e punido pelo artigo 224.º do Código Penal, cujo prazo de prescrição, nos termos do disposto no art. 118º, n.º 1, alínea c) do mesmo diploma, é de cinco anos, também se impõe uma resposta negativa.
Com efeito, e em primeiro lugar, ao prescrever que é punível a conduta de “[q]uem, tendo-lhe sido confiado, por lei ou por acto jurídico, o encargo de dispor de interesses patrimoniais alheios ou de os administrar ou fiscalizar, causar a esses interesses, intencionalmente e com grave violação dos deveres que lhe incumbem, prejuízo patrimonial importante”, o artigo 224.º, n.º 1 do Código Penal prevê um crime de resultado – é necessário causar um “prejuízo patrimonial importante”.
Ora no caso vertente apenas se provou que o “eventual” prejuízo emergente da situação, “poderá atingir o valor máximo de € 11.188,79” (facto 20.), o que em tese admite que não se verifique qualquer prejuízo e, a verificar-se, abarca todos os valores que antecedem aquele valor máximo.
Pelo que, muito embora se possa dizer que à recorrida foi confiado, por acto jurídico, o encargo de dispor de interesses patrimoniais alheios – o encargo de, como assistente comercial, aplicar valores pecuniários de que a cliente dispunha na aquisição de um determinado produto financeiro –, os autos não fornecem elementos para concluir ser “importante” o prejuízo patrimonial que causou ao não proceder à certificação da subscrição em conformidade com o que lhe fora solicitado.
Além disso, o tipo subjectivo não se basta com o dolo genérico, como se infere da utilização do advérbio “intencionalmente”, que remete para uma modalidade restrita de dolo que não deriva simplesmente dos verbos utilizados para descrever a conduta de que se infere a acção dolosa, tornando necessária a existência de intencionalidade na provocação do prejuízo.
Ora no caso dos autos nada explica por que razão o pedido de subscrição da aplicação “C2…”, apesar de preenchido e subscrito pela reclamante, com data de 2008.12.05 (facto 24.), não foi certificado logo nesse próprio dia ou nos imediatamente seguintes pela A. que fora incumbida do encargo de o certificar, não havendo quaisquer elementos susceptíveis de indiciar que a trabalhadora teve a intenção de causar prejuízo à cliente (por animosidade, ou qualquer outro motivo) ao não certificar o produto por ela subscrito[10]. Embora se possa dizer que a conduta omissiva provada revela uma grave violação dos deveres que incumbem à trabalhadora no exercício das suas funções (que lhe impunham atender de imediato ao pedido da cliente e certificar a subscrição do produto) e, até, que a mesma tinha necessariamente a consciência de que tal violação seria apta a causar prejuízos, não pode afirmar-se a intenção de os causar, não havendo quaisquer factos demonstrativos desta intencionalidade. Aliás, a atitude que depois tomou de subscrever um outro produto (facto 23.) denota que a A. procurou ulteriormente uma solução para o problema criado (embora constituísse uma solução menos vantajosa), revelando a vontade de resolver ou, ao menos, remendar, aquele problema e tornando menos verosímil a afirmação de que quando se verificou o comportamento proibido no tipo – a omissão quando o agente tinha o dever de acção (certificar o produto que a cliente tinha manifestado a vontade de subscrever) – a A. teve a intenção de causar prejuízos patrimoniais importantes à cliente em causa.
Assim, não pode afirmar-se que a conduta imputada à A. relativa à não certificação do pedido de subscrição da aplicação C2… e subscrição em nome da cliente da C1… integram, simultaneamente, a prática de um crime de infidelidade, o que determina a aplicabilidade ao caso sub judice do prazo de prescrição de um ano previsto no artigo 372.º, n.º 2, primeira parte do Código do Trabalho de 2003, a que veio a corresponder com igual solução normativa o artigo 329.º, n.º 1 do Código do Trabalho de 2009.
4.1.4.3. E qual o momento em que esse prazo de um ano se interrompe?
Os artigos 352.º e 353.º, n.º 3 do Código do Trabalho de 2009 (na sequência da solução consagrada pelo artigo 10º, nºs 11 e 12 do Decreto-Lei n.º 64-A/89, de 27 de Fevereiro, também assumida no Código do Trabalho de 2003) estabelecem expressamente que a comunicação da nota de culpa ao trabalhador interrompe o decurso dos prazos estabelecidos nos nºs 1 e 2 do artigo 329.º, decorrendo igual suspensão do início do procedimento prévio de inquérito, mas quanto a este desde que:
- ocorra nos 30 dias seguintes à suspeita da existência de comportamentos irregulares,
- o procedimento seja conduzido de forma diligente, e
- a notificação da nota de culpa ocorra até 30 dias após a conclusão do mesmo.
Dúvidas não subsistem pois que a comunicação da nota de culpa interrompe o prazo de prescrição do direito de exercer o poder disciplinar e que o inquérito prévio constitui uma fase deste procedimento disciplinar quando seja ordenado pelo empregador ou pelo superior hierárquico com competência disciplinar.
Resulta dos factos provados em 1.ª instância e dos documentos juntos aos autos a seguinte sequência cronológica:
● 5 de Dezembro de 2008 – data em que a cliente preencheu e subscreveu o pedido de subscrição da aplicação C2… (facto 24.);
● 23 de Dezembro de 2008 – a A. subscreveu em nome da cliente a aplicação C1…t (facto 23.);
● meados de 2009 – os responsáveis comerciais e a DAI conheceram os factos que motivaram o procedimento disciplinar (facto 37.);
● 29 de Outubro de 2009 – a Agência apresentou o assunto à Direcção Comercial após reclamação verbal da cliente (facto 22.);
● 3 de Dezembro de 2009 – data da carta em que a cliente formaliza a sua reclamação (facto 21.);
● 25 de Janeiro de 2010 – a DPN RPN 9 remeteu à DAI, cópia da Informação elaborada pela Agência …, da qual consta que foi subscrita naquela Agência uma aplicação que não correspondia à que havia sido solicitada pela cliente nº ……., D… (facto 17.);
● 1 de Setembro de 2010 – a R. delibera instaurar procedimento disciplinar à A. (facto 1.);
● 16 de Setembro de 2010 – a A. é notificada da nota de culpa (facto 3.);
A sentença recorrida atribuiu relevo à determinação pela R. da realização da auditoria interna, determinação esta que não situou no tempo (apenas refere que foi após a comunicação de 2010.10.29) e que diz constar do procedimento disciplinar, sem que também localize, por referência às folhas do mesmo, a realização de tal acto. E conclui que a auditoria configura um processo prévio de inquérito e que este se mostrou necessário e justificado, pelo que interrompeu o decurso do prazo de prescrição nos termos do artigo 352.ºdo Código do Trabalho e as infracções imputadas à A. não prescreveram. Invocou ainda em abono da sua tese doutos arestos do Supremo Tribunal de Justiça dos quais infere que o ónus de alegar e provar os factos que permitam concluir pela “caducidade” do procedimento disciplinar recai sobre o autor/trabalhador, competindo a este o ónus da alegação e prova de que o prazo de que pretende beneficiar foi excedido, para que se possa prevalecer da excepção invocada, o que implica “demonstrar a data em que o empregador ou o superior hierárquico com competência disciplinar tomou conhecimento dos factos constantes da nota de culpa, o que constitui o termo inicial de tal prazo, bem como a data em que a nota de culpa foi recebida pelo trabalhador, o que constitui o termo final do mesmo prazo”.
Ora, quando cuidamos de aferir da prescrição do direito de exercer o poder disciplinar – não da caducidade do procedimento, como se verificava naqueles arestos –, a verificação da excepção depende, apenas, da prova da data em que foi praticada a infracção (sem que releve para esses efeitos o conhecimento por parte do empregador da sua prática), pois que é esta data que sinaliza o termo inicial da contagem do prazo de prescrição, e da prova da comunicação da nota de culpa, que sinaliza em princípio a respectiva interrupção, assim se cumprindo o ónus de alegação e prova do trabalhador que pretende beneficiar do prazo em causa, face à lei substantiva – artigo 329.º, n.º 1 do Código do Trabalho e 342.º, n.º 1 do Código Civil.
Caso o empregador pretenda valer-se do início do inquérito prévio nas circunstâncias enunciadas no artigo 352.º do Código do Trabalho, caber-lhe-á demonstrar a verificação do início do inquérito prévio e de tais circunstâncias com vista a ver interrompida a contagem do prazo de um ano previsto no artigo 329.º n.º 1 do Código do Trabalho de que o empregador dispõe, desde a prática da infracção, para exercício do direito de exercer o poder disciplinar.
No que concerne ao ónus de prova nesta sede, o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 2011.04.13 (processo n.º 218/08.8TTPNF.P1.S1, in www.dgsi.pt) e de 2009.02.12 (processo n.º 08S3965, in www.dgsi.pt) acolheram o entendimento de que, com vista a beneficiar da interrupção da contagem dos prazos previstos no artigo 329.º, n.ºs 1 e 2 do Código do Trabalho, cabe ao empregador provar que ordenou a instauração de um procedimento prévio de inquérito.
Importava pois à recorrente, uma vez que é uma sociedade anónima, demonstrar que ela própria ou um superior hierárquico com competência disciplinar, iniciou ou determinou a iniciação de um inquérito prévio, para obter os efeitos interruptivos previstos no artigo 352.º do Código do Trabalho (cfr. o artigo 342.º, n.º 2 do Código Civil).
No caso sub judice, a matéria de facto dada como provada não permite concluir que tivesse sido ordenada, pelo Conselho de Administração da ré a instauração de procedimento prévio de inquérito e não se demonstrou também que o Conselho de Administração da ré tivesse delegado o seu poder disciplinar no Departamento de Auditoria e Inspecção (DAI), sendo certo que, em bom rigor, não se sabe sequer quem determinou a realização da auditoria interna e quando o fez.
Aliás, é de notar que a própria R. na resposta à contestação refuta a verificação da excepção da prescrição com a tese de que as infracções imputadas à A. constituem uma infracção continuada que cessa apenas em 29 de Outubro de 2009 e se revestem de natureza criminal (vide a resposta de fls. 363 e ss.) e, mesmo no presente recurso, é na tese da infracção continuada, que persiste enquanto a trabalhadora oculta a sua conduta das chefias, e na circunstância de os factos integrarem a prática de um crime, que sustenta a inverificação da prescrição (conclusões 1.ª a 12.ª), nada alegando quanto à existência de um inquérito prévio cujo início haja interrompido a contagem do prazo previsto no artigo, 329.º, n.º 1 do Código do Trabalho de 2009.
Ora, como em situação similar já esta Relação teve que se pronunciar[11], se o processo disciplinar se iniciou com um despacho de instauração de processo disciplinar e em lado algum do processo disciplinar, ou da própria acção, o empregador veio dizer que a decisão de mandar fazer a auditoria correspondia à sua decisão de instaurar um processo prévio de inquérito, não cumpre ao julgador – porque o empregador não se quis prevalecer do benefício da interrupção de prazos – presumir ou qualificar determinadas diligências prévias à decisão de instaurar processo disciplinar como processo prévio de inquérito.
Assim, a interrupção da contagem do prazo de prescrição das infracções disciplinares praticadas em Dezembro de 2008 só pode ter-se por verificada na data em que a A. foi notificada da nota de culpa.
4.1.4.4. Assim, uma vez que a notificação da nota de culpa à recorrente ocorreu apenas em 16 de Setembro de 2010, deve considerar-se consumada a prescrição do direito da R. ora recorrida de exercer o poder disciplinar nos exactos ternos enunciados no n.º 1 do artigo 329.º do Código do Trabalho de 2009, no que diz respeito à não certificação do pedido de Subscrição da aplicação “C2…”, apesar de preenchido e subscrito pela cliente, com data de 2008.12.05. e à subscrição em nome da reclamante, em 2008.12.23, da aplicação “C1…”, sem que o respectivo impresso estivesse assinado pela cliente.
Não deverão pois estas infracções disciplinares ser apreciadas como fundamento da justa causa de despedimento, apreciando-se, oportunamente, se deverão os atinentes factos ser ponderados em termos circunstanciais para aferir da inexigibilidade da manutenção da relação de trabalho nos termos do preceituado no artigo 351.º, n.º 3 do Código do Trabalho, tendo presente a jurisprudência que valoriza infracções disciplinares prescritas ou não sancionadas como facto “agravante” das que, não estando prescritas, são objecto de censura disciplinar e são apreciadas em sede da motivação de justa causa.
Procede o recurso no que diz respeito à invocada prescrição do direito da R. de exercer o poder disciplinar, com o âmbito que acabou de se traçar.
*
4.2. Da justa causa de despedimento
4.2.1. A questão essencial de direito a enfrentar no presente recurso consiste em aferir se o despedimento da recorrente se fundou, ou não, em justa causa.
Em conformidade com o imperativo constitucional contido no artigo 53º da Lei Fundamental, o artigo 351.º, n.º 1 do Código do Trabalho de 2009 define o conceito de justa causa de despedimento como “o comportamento culposo do trabalhador que, pela sua gravidade e consequências, torne imediata e praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho”, estabelecendo-se depois um quadro exemplificativo de comportamentos justificativos desse despedimento.
Esta noção decompõe-se em dois elementos: a) um comportamento culposo do trabalhador - violador de deveres de conduta ou de valores inerentes à disciplina laboral - grave em si mesmo e nas suas consequências; b) que torne imediata e praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho.
Com algumas diferenças de forma (que não de conteúdo) a jurisprudência tem definido nestes termos o conceito de justa causa, considerando ainda:
– que a ilicitude consiste na violação dos deveres a que o trabalhador está contratualmente vinculado, seja por acção, seja por omissão, relativamente a deveres contratuais principais ou secundários, ou ainda a deveres acessórios de conduta, derivados da boa fé no cumprimento do contrato, o que afasta os factos sobre os quais não se pode fazer juízo de censura e aqueles que não constituam violação de deveres do trabalhador enquanto tal;
– que na apreciação da gravidade da culpa e das suas consequências deve recorrer-se ao entendimento de um "bonus pater familias", de um "empregador razoável", segundo critérios de objectividade e razoabilidade (artigo 487.º n.º 2 do Código Civil) em face do condicionalismo de cada caso concreto; e
– que a impossibilidade prática e imediata da relação de trabalho é o elemento que constitui o critério básico de "justa causa", sendo necessário um prognóstico sobre a viabilidade das relações contratuais para se concluir pela idoneidade ou inidoneidade da relação para prosseguir a sua função típica[12].
4.2.2. No articulado motivador, a R. empregadora funda a justa causa do despedimento da A. ora recorrente em três grupos de factos que, sinteticamente e de acordo com a decisão de despedimento, se consubstanciam no seguinte:
• não ter cumprido, atempadamente, uma ordem de subscrição de um produto financeiro, o qual, entretanto, esgotou, e ter subscrito, posteriormente, à revelia da respectiva cliente e sem conhecimento ou autorização superior e utilizando a password da Gerente, um outro produto, de rendibilidade inferior, pelo que a C… terá de reembolsar a mesma cliente em montante que poderá ascender a € 11.188,79;
• ter atribuído, ilegitimamente, a diversos clientes taxas de juros de depósitos a prazo superiores às que, na altura, se encontravam em vigor, sem conhecimento ou autorização superior e utilizando abusivamente a password da Gerente;
• ter alterado a ordem dos titulares de uma conta, à revelia dos clientes e dos seus superiores hierárquicos, afectando positivamente os saldos da sua carteira de clientes, tendo em vista o cumprimento dos objectivos comerciais e o recebimento de eventuais incentivos.
4.2.3. Relativamente ao primeiro grupo de factos, vimos já que não pode o mesmo ser atendível como fundamento ao despedimento operado, por se ter verificado a prescrição do direito de exercer o poder disciplinar quanto aqueles factos nos termos do preceituado no artigo 329.º, n.º 1 do Código do Trabalho de 2009.
4.2.4. Relativamente à imputada concessão a clientes de taxas de juro de depósitos a prazo superiores às da oferta comercial em vigor, que careciam de autorização superior para o efeito, ficou provado que:
- A Autora atribuiu taxas superiores às da oferta comercial em vigor, em depósitos a prazo, que careciam de autorização superior para o efeito (facto 11.).
- O que fez no período compreendido entre 26 de Maio e 16 de Outubro de 2009 e com:
● um empréstimo de € 180.000,00, atribuindo a taxa de 3%, quando a taxa da rede em vigor era de 1,25%,
● um empréstimo de € 19.000,00, atribuindo a taxa de 3%, quando a taxa da rede em vigor era de 1%,
● um empréstimo de € 10.000,00, atribuindo a taxa de 2,5%, quando a taxa da rede em vigor era de 0,90%,
● um empréstimo de € 5.000,00, atribuindo a taxa de 2,5%, quando a taxa da rede em vigor era de 0,51%,
● um empréstimo de € 4.000,00, atribuindo a taxa de 2,5%, quando a taxa da rede em vigor era de 0,51%,
(factos 31., 31-A e 33.)
- A Autora, para a atribuição de taxas, utilizou a password da Gerente (facto 32.)
- O valor do prejuízo causado à Ré, correspondente à diferença entre a taxa que fora garantida pela Autora aos clientes e a que foi posteriormente autorizada, cifra-se em € 2.386,24 (facto 34.)
- A Autora assumiu a responsabilidade por todo o prejuízo que possa ter causado (facto 14.)
É manifesta a ilicitude e a gravidade desta conduta.
Com efeito, está assente que a A., nestes vários empréstimos, atribuiu uma taxa de juro acima da oferta comercial – pois as taxas por si negociadas superavam aquelas que podia atribuir – o que é evidentemente susceptível de causar prejuízo à C… na medida em que, por força da maior taxa de juro alcançada, era menor a rentabilidade dos depósitos a prazo para a sua empregadora.
Resulta também dos factos provados que atribuiu estas taxas sem propor previamente à sua hierarquia uma taxa negociada para esses clientes (propostas que poderiam, ou não, ser aceites pelos seus superiores, caso as mesmas lhes tivessem sido colocadas) e sem obter a necessária autorização para o efeito, actuando com uma autonomia que não lhe era consentida, o que fez nestes em 5 contratos de depósito, sendo que os valores envolvidos – particularmente do primeiro que ascende a € 180.000,00 – não são despiciendos.
E ficou provado que utilizou a password da Gerente da agência, revelando com esta utilização abusiva desmerecer totalmente a confiança que a referida Gerente em si depositou ao permitir à trabalhadora a utilização da sua password, seguramente porque confiava na mesma e não para que praticasse actos violadores das regras instituídas pela sua empregadora.
Ora, a este propósito, cabe ter presente a especificidade das funções que a recorrente desenvolvia ao serviço da R. recorrida e as regras que disciplinavam o seu exercício – que impunham a obtenção de autorização superior para o efeito de conceder a clientes taxas de juro de depósitos a prazo superiores às da oferta comercial em vigor –, bem como o artigo 126.º do Código do Trabalho de 2009, nos termos do qual “[o] empregador e o trabalhador devem proceder de boa fé no exercício dos seus direitos e no cumprimento das respectivas obrigações” e o artigo 128.º, n.º 1, do mesmo Código, nos termos do qual “[s]em prejuízo de outras obrigações, o trabalhador deve … c) [r] ealizar o trabalho com zelo e diligência…e) [c]umprir as ordens e instruções do empregador respeitantes a execução ou disciplina do trabalho, bem como a segurança e saúde no trabalho, que não sejam contrárias aos seus direitos ou garantias; f) [g]uardar lealdade ao empregador….”
Invoca a recorrente que na negociação das taxas de juro dos depósitos a prazo, está implícita a necessidade de assegurar o negócio e fidelizar clientes à C…, face às taxas de juros oferecidas pela concorrência, mas a verdade é que tal matéria foi expressamente vertida na base instrutória e não resultou provada, sem que a A. tenha impugnado a resposta dada pela 1.ª instância. Com efeito, apesar de se perguntar no quesito 35.º, em conformidade com o alegado pela A. na sua contestação, se esta “apenas procedeu a depósitos com taxas superiores, nos valores referido no articulado, para segurar os clientes da Ré que argumentavam que outras instituições bancárias davam taxas de juro superiores”, a Mma. Julgadora a quo considerou o referido artigo da base instrutória como “não provado”.
Assim, ao invés do que pretende a recorrente, não é agora possível a este tribunal de recurso, valendo-se das regras da experiência e do senso comum, e com recurso às presunções judiciais, naturais ou de facto admitidas nos arts. 349.º e 351.º do Código Civil – que permitem ao juiz, partindo de um facto provado ou conhecido, chegar a um facto desconhecido –, depreender ou considerar implícito que na negociação das taxas de juro dos depósitos a prazo a que procedeu, está implícita a necessidade de assegurar o negócio e fidelizar clientes à C….
Se o tribunal a quo considerou expressamente “não provada” a matéria do artigo 35.º da base instrutória e se a recorrente não impugnou a pertinente decisão de facto, mostra-se vedado nesta instância afirmar a verificação daqueles factos por via de presunções judiciais. Conforme constitui jurisprudência pacífica, não é possível extrair dos factos provados ilações que contrariam ou entram em colisão com um facto que foi submetido a concreta discussão probatória e que o tribunal houve como não provado, caso em que se patenteia uma contradição factual susceptível de inviabilizar a decisão jurídica do pleito[13].
Invoca ainda a recorrente que “o vice-Presidente da C…, Dr. F…, referiu publicamente que não deixaria sair nenhum depósito a prazo da C… nem que isso implicasse majoração das taxas desses depósitos”, o que efectivamente ficou provado (facto 44.), mas não se nos afigura justificar o atropelo pela recorrente das regras estabelecidas para a fixação negocial das taxas de juro.
Com efeito, cremos que esta afirmação, se é susceptível de fazer entender aos trabalhadores ser vontade daquele dirigente a manutenção na C… dos depósitos a prazo, não se nos afigura que tenha o alcance de os determinar a fazer “tudo” para que se realizem tais depósitos a prazo, ainda que ultrapassando a necessária autorização superior e negociando taxas de juros que por vezes atingiram um valor percentual superior ao dobro da permitida. Pelo contrário, atendendo a que o discurso está feito na primeira pessoa – o vide-Presidente não deixaria sair nenhum depósito a prazo da C… – cremos que os termos utilizados são mais consentâneos com um repto aos trabalhadores no sentido de suscitarem a intervenção dos seus superiores, mesmo que fosse necessário chegar à Administração, sempre que se suscitasse a questão da majoração das taxas, a fim de tentar assegurar a manutenção dos depósitos a prazo.
Não se nos afigura, pois, que o facto em causa possa justificar a conduta da trabalhadora ora em análise.
Sustenta finalmente a recorrente que suportou por si, as diferenças entre as taxas praticadas pela C… e as acordadas com os clientes.
Ficou efectivamente provado nos autos que a A. assumiu a responsabilidade por todo o prejuízo que possa ter causado (facto 14.), o que, apesar de se tratar de uma atitude posterior aos factos, visa reparar as consequências negativas dos mesmos para a empregadora e tem que ser ponderado como mitigando relativamente a gravidade das suas consequências.
Mas não deixa o comportamento da recorrente de atribuir taxas superiores às da oferta comercial em vigor em depósitos a prazo que careciam de autorização superior para o efeito, nos termos que constam da matéria de facto, de constituir manifesta violação do dever laboral de obediência às ordens e instruções no que respeita à execução e disciplina no trabalho – vg. de cumprir as regras prescritas pela R. para a negociação dos depósitos bancários a prazo – e dos deveres de lealdade boa fé na execução do contrato, a que estava obrigado por força do disposto nos artigos 126.º e 128.º, n.º 1, alíneas e) e f) do Código do Trabalho.
Em suma, é manifesto o desvalor laboral da apurada conduta da trabalhadora quanto a esta matéria da negociação e atribuição indevida de taxas de juro.
Analisados os contornos concretos desta conduta e o grau de contrariedade das mesmas aos deveres laborais a que a recorrente se mostrava adstrita, cremos ser patente a gravidade da culpa da mesma – com a reiteração da sua conduta – e das suas consequências no lastro de confiança subjacente ao contrato, na medida em que constituía dever da recorrente o de respeitar escrupulosamente os limites das suas atribuições funcionais no âmbito das relações comerciais que estabelecia com os clientes em nome da R. e representando os interesses desta, em observância do princípio da boa fé no cumprimento dos contratos previsto no artigo 762.º do Código Civil e dos deveres acessórios de conduta ao mesmo inerentes.
Apreciando a gravidade da culpa e das suas consequências recorrendo ao entendimento de um "empregador razoável", em face das circunstâncias do caso concreto e segundo critérios de objectividade e razoabilidade (artigo 487.º do Código Civil), entendemos que nestes específico aspecto da conduta que a R. lhe imputou em fundamento do despedimento, a recorrente violou culposamente e de forma grave aqueles deveres laborais, mostrando-se preenchida a primeira condição da justa causa de despedimento: a existência de um comportamento do trabalhador violador de deveres de conduta inerentes à disciplina laboral, culposo e grave.
4.2.5. Relativamente ao terceiro grupo de factos, cremos ser também inequívoco o seu desvalor laboral.
Recordemos o que a este propósito ficou provado:
«15. A Autora, em 2009.12.30, trocou a ordem dos titulares da conta de depósito a prazo nº ………...... de forma a que o 2º titular, K… (cliente nº ……..), que pertencia à sua carteira de clientes, passasse a figurar como 1º titular na conta.
(…)
27. Através de email datado de 2010.03.22, a DCP comunicou à DAI que a Autora havia sido incorrectamente beneficiada no “Sistema de Incentivos”, porque o plafond da sua carteira de activos sob gestão ficara indevidamente valorizado em € 146.000 devido a uma alteração de titulares efectuada na conta de depósito a prazo nº ………......, em 2009.12.30, facto que poderia ter alterado o coeficiente de cálculo para o respectivo prémio, o que não chegou a acontecer.
28. O que fez em detrimento da cliente nº …….., M…, que não tinha gestora associada, mas que consta na respectiva ficha de assinaturas como 1ª titular.
29. A alteração dos titulares da conta foi efectuada com a intenção de atingir objectivos por manipulação dos dados.
30. Para efeitos da afectação dos saldos da carteira de cada gestor apenas relevam os saldos dos clientes que figuram como 1ºs titulares das contas.
(…)
40. A alteração do 2º para o 1º titular da conta não causou prejuízo à Ré e aos clientes.
41. Esta é prática corrente para gestores de clientes, assistentes comerciais e gerente da Ré.»
Com esta conduta de alteração da ordem dos titulares da referida conta, à revelia dos clientes e dos seus superiores hierárquicos, efectuada com a intenção de atingir objectivos por manipulação dos dados – pois para efeitos da afectação dos saldos da carteira de cada gestor apenas relevam os saldos dos clientes que figuram como 1ºs titulares das contas –, a recorrente actuou em desconformidade com o já referenciado dever de execução leal
Não pode contudo deixar de se ponderar, com evidente relevo, que a alteração do 2º para o 1º titular da conta não causou prejuízo à Ré e aos clientes (facto 40.) e, sobretudo, o facto de se ter provado que esta é prática corrente para gestores de clientes, assistentes comerciais e gerente da Ré (facto 41.), o que, apesar do desvalor laboral da conduta, nos impede de considerar a mesma, por si só, como fundamento de justa causa de despedimento, sem prejuízo da sua valoração circunstancial no raciocínio a fazer para aferir da valoração global do comportamento da recorrente e da sua aptidão para tornar imediata e praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho.
*
4.2.6. Assente que, ao proceder como precedeu no que diz respeito à concessão a clientes de taxas de juro de depósitos a prazo superiores às da oferta comercial em vigor, sem a necessária autorização superior, a recorrente incorreu em infracção disciplinar de evidente gravidade, susceptível de abalar os alicerces do contrato de trabalho e de legitimamente colocar a dúvida quanto à idoneidade futura do seu comportamento na execução de tal contrato, vejamos se se verifica a impossibilidade prática da relação de trabalho ou da "inexigibilidade" da sua subsistência, o que deve ser feito em concreto, à luz de todas as circunstâncias que no caso se mostrem relevantes, mediante o balanço dos interesses em presença e pressupõe um juízo objectivo, segundo um critério de razoabilidade e normalidade[14].
A subsistência da relação de trabalho é neste sentido impossível quando, à luz deste juízo, se conclua que a ruptura é irremediável e, portanto, nenhuma outra medida se revela adequada a sanar a crise contratual aberta pelo comportamento do trabalhador[15],
No caso sub judice, e por incumbência da recorrida, a recorrente exercia as funções de “assistente comercial C3…” na Agência …, Porto (facto 8.) e tinha em carteira mais de 500 clientes e a responsabilidade em todo o serviço da agência, com atendimento polivalente (facto 9.).
Tendo em, consideração que num contrato de trabalho com uma instituição bancária a componente fiduciária tem um assinalável relevo e em face da natureza das funções que a recorrente desempenhava no âmbito deste contrato, é de considerar que o dever de execução leal a que a mesma se encontrava adstrita se lhe impunha com particular intensidade.
Na verdade, a intensidade do dever geral de lealdade do trabalhador não é sempre igual. O concreto modo de agir da empresa e o concreto posicionamento do trabalhador no âmbito da empresa condicionam estreitamente o feixe das específicas manifestações do dever de lealdade, bem como grau de exigência que ele incorpora quanto à conduta do trabalhador.
Recorde-se que no domínio do sector bancário a base de recíproca confiança da relação contratual de natureza laboral, como fundamento objectivo da permanência do vínculo, assume especial relevância face ao tipo de actividade realizada pelos respectivos trabalhadores, uma vez que movimentam vultuosas quantias em dinheiro e intervêm em elevadas operações de crédito, em larga medida dependentes da sua actuação e informações.
Nesta senda tem sido emitida vasta jurisprudência pelos tribunais superiores[16], da qual destacamos o douto Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 08 de Janeiro de 2013 (Processo n.º 447/10.4TTVNF.P1.S1, in www.dgsi.pt), segundo o qual, no plano de valoração da justa causa nos termos do artigo 351.º, n.º 3 do Código do Trabalho, “não pode descurar-se o sector de actividade (bancária) em que se desenvolve a prestação contratada e a particular exigência da componente fiduciária nela pressuposta, domínio em que a “confiança”, mais que mero “suporte psicológico” de uma relação jurídica inter-pessoal duradoura, se traduz afinal no exercício de uma “função de confiança”, essencial na organização técnico-laboral criada e mantida pelo empregador. Exige-se dos trabalhadores bancários uma postura de inequívoca transparência, insuspeita lealdade de cooperação, idoneidade e boa fé na execução das suas funções, respeitando escrupulosamente as regras do contrato (as decorrentes da Lei geral e, particularmente, as constantes das normas internas que disciplinam a sua intervenção profissional).»
Não está em causa no comportamento infraccional em análise que a trabalhadora tenha obtido proveito da conduta que prosseguiu, mas o desrespeito objectivo das regras estabelecidas pela R. para as aplicações financeiras, vg. no que diz respeito à remuneração dos depósitos a prazo, e as evidentes consequências desse comportamento na confiança que o empregador deposita no trabalhador e na própria imagem pública de confiança, prestígio e segurança da instituição bancária, que é susceptível de ser abalada com o facto de se saber que um trabalhador que intervém em nome da instituição e em representação dos seus interesses, acaba por negociar as taxas de juro respectivas a seu bel-prazer, sem para isso ter autorização, pondo em causa a segurança dos negócios firmados (como veio a acontecer com os depósitos a prazo referidos na matéria de facto, em que nenhuma das taxas autorizadas posteriormente à atribuída pela A. se aproxima desta última).
O que constitui um evidente prejuízo[17].
As apuradas condutas da recorrente são aptas a minar a confiança que a instituição bancária naturalmente tem que depositar num trabalhador a quem confere as funções de assistente comercial, com uma carteira de mais de 500 clientes (factos 8. e 9.), a quem promoveu uma vez por antiguidade (facto 12.) e de quem, obviamente, espera uma conduta de objectividade, correcção e probidade incompatível com a comissão das irregularidade que a recorrente praticou ao nível da negociação e atribuição sucessiva de taxas de juro em depósitos a prazo, ao longo do ano de 2009, nos termos que ficaram provados.
As circunstâncias de a trabalhadora dispor de “atenuantes” tal como indicado na apelação – “as resultantes da matéria constante dos pontos 8 (9 anos de antiguidade, sem sanções e com 1 promoção); 9 (imenso trabalho distribuído); 11 (elogios da hierarquia à sua competência e desempenho); 14 (assumiu toda a responsabilidade de prejuízos que viessem a ocorrer); 44 (a hierarquia incentivou captações de depósitos); 45 (no inquérito manteve a confiança da empresa); 46, 47 e 48 (deu o que podia à empresa)” – não alteram este nosso juízo.
É com efeito de atender ao passado da recorrente, com muito trabalho e empenho (vide também a este propósito os factos 46. a 49.), uma promoção “por antiguidade” e aos elogios da hierarquia – apesar de o tempo de vida do contrato não ser muito extenso (cerca de 7 anos desde 2002 até à data da prática dos factos em 2009) – bem como, como já foi dito, à assunção pela trabalhadora da responsabilidade de prejuízos que viessem a ocorrer, já não devendo dar-se o relevo pretendido à indicação pelo vice-Presidente da R. para captação de depósitos (que se nos afigura em nada justificar a conduta, como já foi referido) ou à manutenção da recorrente em funções até à sua suspensão (note-se que não pode nestes autos afirmar-se ter havido um inquérito prévio que assim deva ser formalmente considerado).
Mas, do mesmo passo, a consideração da empresa pelo trabalho da recorrente que se retira dos invocados factos faria esperar de si um exercício laboral mais conforme com as regras estabelecidas e o comportamento que prosseguiu frustrou obviamente essas expectativas (porque contrário aos padrões de conduta nelas pressuposto) e tornou imprevisível para o empregador saber se, no futuro, o mesmo comportamento (ou similar) não se repetirá.
O facto de a R. exigir “iniciativa, autonomia, responsabilidade e pró-actividade e fixar objectivos quer para entregar incentivos, quer para promover na carreira os seus trabalhadores” (facto 10.), não pode significar uma “autonomia” sem regras (repare-se que a R. exige também “responsabilidade”), sendo de notar que os bons resultados que decorrem de uma actuação com violação de regras elementares geram proveitos ilegítimos.
Resulta patente dos factos que a recorrente visava projecção pessoal e profissional o que, sendo em si louvável, não pode ser obtido a qualquer custo e não pode, manifestamente, ser alcançado com uma autonomia alheada da necessidade de obter autorização da hierarquia para negociar taxas de juro e vincular a instituição bancária perante os clientes.
Ora a recorrente revelou, em elevado grau, indiferença perante as regras que disciplinam a sua actividade profissional, actuando em atropelo das mesmas em negócios jurídicos de evidente relevância, ao negociar taxas de juros que careciam de autorização superior para serem aplicadas e comprometendo, deste modo, o pressuposto fiduciário do contrato, incorrendo nas hipóteses de justa causa de despedimento previstas nas alíneas a), e d) do artigo 351.º do Código do Trabalho.
Fazendo uma análise circunstancial mais ampla nos termos prescritos no n.º 4 deste artigo 351.º, cabe dizer que a A. já patenteara essa indiferença com os comportamentos assumidos em Dezembro de 2008 – em que também não exerceu devidamente as suas funções profissionais e omitiu a prática de actos que lhe foram solicitados, prescindindo depois do próprio consentimento (e até conhecimento) da cliente em nome de quem subscreveu um produto financeiro distinto do pretendido para aplicação de € 1000.000,00 – e que a sua conduta ulterior assumida em Dezembro de 2009 – de troca de ordem dos titulares de uma conta para atingir objectivos e ser incorrectamente beneficiada no sistema de incentivos por manipulação de dados –, que aquelas indevidas negociações de taxas de juro não constituem actos isolados, mas são sinal de uma postura geral no exercício das funções profissionais de actuação com indiferença pelas normas estabelecidas, o que não pode deixar de ser ponderado nesta sede.
Um trabalhador integrado numa organização empresarial com as características de uma instituição bancária, não pode – por patentes exigências funcionais de transparência e lealdade, necessariamente pressupostas na imagem de indefectível confiança e segurança que se presumem numa instituição a quem se confiam os aforros, a sua aplicação e gestão e/ou os pedidos de financiamento[18] – actuar à margem da instituição e violando regras por ela estabelecidas num dos domínio mais sensíveis da actividade bancária como o é a gestão dos aforros dos particulares.
Fazendo um juízo sobre a gravidade do comportamento da recorrente e das suas consequências – ao conceder ao longo dos meses de Maio a Outubro de 2009 taxas de juros superiores ao que era permitido à agência, sem autorização superior, usando, para o efeito, a password da gerente que lha havia confiado na base da confiança que nela depositava –, em todo o circunstancialismo factual apurado, bem como sobre a inexigibilidade da subsistência da relação laboral, à luz do critério objectivo do "bonus pater familias" ou do "empregador razoável", entendemos que a recorrente prosseguiu uma conduta que eliminou a confiança que a R. depositava no seu exercício profissional quando a investiu nas funções de assistente comercial.
Assim, atentas todas as circunstâncias que rodearam a prática deste comportamento, pode afirmar-se que com a violação pela recorrente dos deveres que sobre si concretamente impendiam enquanto trabalhadora da R. ao longo do ano de 2009, ficou comprometida a possibilidade da subsistência da relação de trabalho, revelando-se a sanção do despedimento proporcional e adequada à gravidade do comportamento infraccional analisado.
*
4.2.7. A questão que se coloca a este passo – e que a recorrente esgrimiu no recurso – consiste em saber se os autos patenteiam a violação, por parte da R., do princípio da coerência disciplinar.
Alega a recorrente que em infracções mais graves que as a si imputadas, a recorrida não aplicou a sanção de despedimento sem justa causa nem a demissão e que quem não sanciona o mais grave com despedimento não deve sancionar o menos grave com despedimento. Invoca ainda que a incoerência disciplinar da empresa conduz ao entendimento de inexistência de justa causa na sanção de despedimento decretada.
A recorrida, por seu turno, invocou que prossegue uma prática disciplinar coerente e assente na apreciação casuística e na proporcionalidade e adequação das sanções disciplinares aplicadas, e que a conduta da recorrente, pela sua gravidade, determinou a impossibilidade da subsistência da relação contratual, pela perda definitiva do elemento confiança, que a C… deixou de ter na mesma.
Vejamos.
Antes de mais, importa referir que "o poder disciplinar é discricionário, no sentido de que cabe ao empregador decidir da oportunidade do seu exercício, de acordo com critérios que ele julgue apropriados para a prossecução dos interesses da organização de que é titular", não estando o empregador obrigado a punir disciplinarmente os trabalhadores que cometeram infracções, nem sequer a desencadear o respectivo processo[19].
Porém, a natureza discricionária do poder disciplinar não prejudica a necessária consideração da prática disciplinar do empregador e da ideia de coerência disciplinar, que no caso do despedimento se retira do artigo 351.º, n.º 4 do Código do Trabalho (ao remeter a apreciação da justa causa para o quadro da gestão da empresa), e “valoriza a prática disciplinar das empresas para condenar, por excessiva, uma sanção que extravaze consideravelmente a punição dada anteriormente a casos semelhantes ou a punição diferente de dois trabalhadores pela prática da mesma infracção”[20].
Conforme refere Monteiro Fernandes, "as decisões disciplinares hão-de ser tomadas, não isoladamente, mas como emanações de um critério, obedecendo a uma lógica que vincula a entidade patronal a não se desviar dela em decisões subsequentes, quer perante o mesmo trabalhador, quer relativamente a outros da empresa em causa"[21].
E, segundo Jorge Leite e Coutinho de Almeida[22] “[a] prática disciplinar da empresa, como circunstância a atender para apreciação da existência de justa causa, constitui uma espécie de critério de uniformização disciplinar e visa impedir tratamentos desiguais ou discriminatórios num domínio tão importante e tão sensível como é o dos despedimentos, o que, diga-se de passagem, já resultaria do princípio da igualdade, consagrado constitucionalmente (artigo 13.º). Afinal o que se pretende é evitar que, a pretexto de uma infracção disciplinar, se façam despedimentos por motivos políticos, ideológicos, sindicais ou outros que a ordem jurídica considera ilegítimos”.
Na jurisprudência foi proferido, entre outros, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 2007.02.07 (Recurso n.º 2444/06, da 4.ª Secção), de acordo com o qual “o poder disciplinar que a lei confere ao empregador deve ser por este exercido segundo critérios de justiça, respeitando nomeadamente o princípio da igualdade”.
No entanto, apesar destas tentativas de objectivação do exercício do poder disciplinar e diminuição do grau de discricionariedade inerente à actuação disciplinar do empregador, não se pode esquecer que a prática ou coerência disciplinar da empresa não é o elemento decisivo na apreciação da justa causa – decisivo é o grau de culpa, a gravidade da infracção e das suas consequências –, sendo apenas avaliada circunstancialmente no âmbito da ponderação do quadro de gestão da empresa.
Ora, procedendo à análise dos factos provados a propósito da actuação disciplinar da R. relativamente aos trabalhadores referidos nos pontos 55. a 60. da matéria de facto e dos documentos neles referenciados e juntos a fls. 618-627 e 635-911 destes autos, com referência aos ilícitos disciplinares que nos mesmos são imputados aqueles trabalhadores, verificamos que nenhuma das infracções sobre que versam aqueles procedimentos se revestem da natureza das imputadas à ora recorrente.
Em nenhuma das situações os trabalhadores arguidos atribuíram taxas de juro superiores às permitidas em depósitos a prazo efectuados por clientes da R., negociando tais taxas à revelia da sua hierarquia, por sua exclusiva iniciativa, e fazendo ponderações de natureza comercial que não lhes cabia fazer, em comportamento que foi reiterado ao longo de seis meses, utilizando a password confiada pela gerente da agência, de modo a colocar gravemente em causa a confiança do empregador no seu exercício laboral futuro.
Todavia, uma vez que se pode dizer que, em termos objectivos, algumas das infracções disciplinares se revestem de uma gravidade superior aquelas em que incorreu a ora recorrente, cabe proceder à análise dos relatórios disciplinares e das deliberações finais proferidas em cada um dos referidos processos, a fim de proceder a um juízo global comparativo e aferir se a R. foi coerente na actuação disciplinar ou, ao invés, exerceu o seu poder disciplinar de forma arbitrária relativamente à recorrente.
Ora, analisando os factos provados a este propósito e os documentos que os suportam, podemos adiantar que, da análise comparativa efectuada, entendemos não haver elementos factuais que evidenciem uma prática disciplinar incoerente, sendo substancialmente distintas as motivações das condutas neles apreciadas, o grau de culpa revelado por cada um dos trabalhadores, o seu passado laboral dos referidos trabalhadores e as circunstâncias particulares em que cada um actuou.
Com efeito, e sem necessidade de repetir todos os pormenores que ficaram descritos com a minúcia possível, no elenco de factos fixado já neste Tribunal da Relação, cremos dever realçar-se, quanto a cada um dos trabalhadores ali referenciados, o seguinte:
A – Factos 55. e 55-A
Como se disse na motivação da decisão de facto “a Ré perante uma funcionária que se apropriou da quantia de € 119,98 de um cliente, considerou que a conduta era grave e susceptível de ser sancionada com a sanção de despedimento só o não tendo feito porque a mesma era funcionária com 15 anos de antiguidade, sem qualquer antecedente disciplinar; confessou de imediato os factos; encontrava-se em estado de descontrolo emocional motivado por dificuldades económicas, tendo a seu cargo duas filhas, uma delas menor, que da mesma dependiam exclusivamente porque o outro progenitor não pagava qualquer quantia para o seu sustento; a mesma tinha como único rendimento o salário auferida na Ré”.
A conduta da trabalhadora, justificativa em termos objectivos da sanção expulsiva por, em abstracto, ser apta a minar a confiança que o empregador nela depositava, é de maior gravidade objectiva do que a prosseguida pela recorrente, mas não é demonstrativa de uma conduta profissional com violação de regras que se reiteram ou agravam como sucedeu com a recorrente. Pelo contrário, a carreira da trabalhadora tem uma dimensão já com alguma dimensão (mais de 15 anos) e o comportamento anterior “irrepreensível”, acompanhado do imediato arrependimento e confissão ponderados na deliberação punitiva, justificam ter a R. considerado o acto praticado como uma situação isolada para a qual se prefigura suficiente, e inibitória de idêntica conduta no futuro, uma sanção conservatória. Acresce que, ao nível da culpa, o acto censurável da trabalhadora surge num cenário de dificuldades económicas, de uma situação familiar e económica difícil e de débil saúde que se reflectiu numa depressão major, sendo compreensível que a R. tenha atendido a este condicionalismo que envolveu a conduta e tenha considerado o acto como um precalço e não como o significado de uma ulterior conduta desonesta.
B – Factos 56. e 56-A
Ficou exarado na 1.ª instância quanto a esta trabalhadora que “perante uma funcionária que forneceu informações sobre uma conta a quem não era titular da mesma, considerou que a conduta era grave e susceptível de ser sancionada com a sanção de despedimento só o não tendo feito porque a mesma era funcionária com 27 anos de antiguidade, sem qualquer antecedente disciplinar; porque a sua hierarquia directa mostrou continuar a ter total confiança na mesma e, já na pendência do processo disciplinar propôs a sua promoção por mérito; já tinha registado na sua ficha várias promoções por mérito, tendo, no entanto, aplicado à mesma a pena de suspensão com perda de remuneração pelo período de 180 dias”.
Nesta situação, a conduta da trabalhadora é violadora do dever de sigilo bancário, não afirmando a R. peremptoriamente que a trabalhadora soubesse da falta de poderes das duas clientes a quem forneceu informações para movimentar a conta da cliente falecida, pelo que não se pode ter este facto como adquirido. Trata-se pois, também aqui, de uma conduta isolada e que também não é demonstrativa de uma conduta profissional violadora de regras, que se reitera, como sucedeu com a recorrente. Pelo contrário, a carreira desta trabalhadora assume uma dimensão muitíssimo relevante (mais de 27 anos), o mesmo sucedendo com a valia do exercício anterior, em que tem várias promoções por mérito (repare-se que a recorrente, por seu turno, estava ao serviço apenas há cerca de 7 anos, com uma promoção por “antiguidade”), continuando a sua chefia directa a depositar total confiança na trabalhadora apesar do sucedido e propondo-a mais uma vez para ser promovida por mérito já na pendência do procedimento disciplinar. Neste contexto, justifica-se ter a R. mantido, também, a confiança na trabalhadora que num período temporal tão lato teve sempre uma conduta laboral meritória, pelo que, perante um acto isolado – que a distingue claramente da recorrente que assumiu diversas condutas à margem das normas instituídas –, nunca poderia dizer-se que a manutenção da relação de trabalho se tornou inexigível, justificando-se uma sanção conservatória.
C – Factos 57. e 57-A
Relativamente a este trabalhador, a motivação da decisão de facto refere o seguinte: “perante um funcionário que movimentou conta de cliente sem prévia autorização, considerou que a conduta era grave e susceptível de ser sancionada com a sanção de despedimento só o não tendo feito porque era funcionário com 26 anos de antiguidade, sem qualquer antecedente disciplinar; não se verificou prejuízo para a instituição nem cliente; parte dos movimentos foram pagamentos em nome do cliente; o cliente ratificou todas as operações efectuadas pelo trabalhador na pendência do processo disciplinar; havia forte relação de proximidade entre trabalhador e cliente, tendo sido o 1º que diligenciou pelo internamento do 2º em U… e que se não o tivesse feito, provavelmente o cliente teria morrido; tinha registado na sua ficha três promoções por mérito tendo, no entanto, sido aplicado ao mesmo a pena de suspensão com perda de remuneração pelo período de 90 dias”.
Nesta situação, a conduta do trabalhador é relevantemente violadora de deveres laborais, mas a verdade é que o cliente cuja conta ele movimentava veio a ratificar todos os débitos efectuados na conta. A ponderação por parte da R. de circunstâncias que considera atenuantes – “o facto de não haver prejuízos materiais a registar, uma vez que o cliente veio, posteriormente a ratificar os débitos efectuados na sua conta, a situação social do seu agregado familiar (mãe idosa e filha deficiente e diabética a cargo), o prestígio social de que goza no meio onde reside e trabalha, os 26 anos de tempo de serviço prestado à C…, com bom comportamento, e a ausência de registo de qualquer sanção disciplinar” – afigura-se razoável, maxime tendo em consideração que ele tinha uma carreira profissional ao serviço da R. que assume uma dimensão assinalável (26 anos), factor que distingue este funcionário da A., o mesmo sucedendo com o valia do seu exercício, em que teve três promoções por mérito.
D – Factos 58. e 58-A
A Mma. Julgadora a quo ponderou, quanto a esta trabalhadora, que a R.: “perante uma funcionária que movimentou de forma abusiva “contas a liquidar” e “Tesouro Público – contas a liquidar”, considerou que a conduta era grave e suscetível de ser sancionada com a sanção de despedimento só o não tendo feito porque a mesma era funcionária com 7 anos de antiguidade, sem qualquer antecedente disciplinar; por ser inexperiente na função em concreto que efetuava (era estagiária nessa função) já tinha registado na sua ficha duas promoções por mérito, renunciou a cargo que exercia, encontrava-se grávida e não causou prejuízo”.
Nesta situação, não pode afirmar-se ser a antiguidade da trabalhadora distinta da da A., sendo certo, também, que a própria infracção é a que tem mais atinências com as perpetradas pela recorrente no que diz respeito às taxas de juro, pois que se trata de proceder a adiantamentos indevidos sobre pedidos de créditos em estudo na agência entre Abril e Setembro de um ano, usando a password da gerência para o efeito. Mas outros factores há que distinguem a situação e justificam que a R. confie no ulterior desempenho laboral da trabalhadora. Na verdade, para além do bom comportamento anterior (que a A. não tinha, como se retira do episódio anterior em que a A. contrariou as instruções de uma cliente e não subscreveu o produto por ela e veio a subscrever outro diferente sem disso dar conhecimento quer à cliente, quer à sua chefia, omitindo a sua conduta por longo período de tempo) e de duas promoções por mérito (que a A. também não tinha), o caso tem a particularidade de haver inexperiência na função (o que os autos não indiciam que ocorresse no caso da A.) e de a referida trabalhadora ter renunciado voluntariamente à função de gestora de cliente. Assim, deixaram de se verificar razões justificativas do receio de que, no desenvolvimento de tais funções a trabalhadora voltasse a proceder a adiantamentos indevidos sobre pedidos de crédito formulados por clientes, restaurando-se a confiança abalada pela prática dos factos que lhe foram imputados, numa altura em que encontrava grávida (o que também não pode deixar de ser ponderado), justificando-se uma sanção conservatória.
E – Factos 59. e 59-A
Relativamente a este trabalhador, a motivação da decisão de facto refere o seguinte: “perante um funcionário que efetuou movimentos em conta de cliente e que para o efeito tinha autorização, movimentos motivados por relações pessoais com a cliente mas que foram efetuados nas instalações da Ré, considerou existir uma relação de promiscuidade entre interesses pessoais e profissionais e decidiu aplicar ao mesmo a pena de suspensão com perda de remuneração pelo período de 90 dias.”
Nesta situação seria incoerente que a R. optasse pela decisão de despedimento pelo facto de o trabalhador ter movimentado a conta da cliente como “autorizado” que estava, mas sem permissão da hierarquia, e com códigos pessoais fornecidos pela cliente, na medida em que em acção cível instaurada contra a R., esta afirmou que as eventuais dádivas da cliente ao trabalhador “decorreram das suas relações pessoais, não sendo susceptíveis de se confundirem com a sua envolvência profissional”. Acresce que não há outras condutas infraccionais, anteriores ou posteriores, e o trabalhador tem um percurso profissional ao serviço da R. com cerca de 12 anos e já com 4 promoções por mérito. Neste condicionalismo se compreende e justifica a sanção de 90 dias de suspensão com perda de retribuição.
Em suma, analisadas estas decisões disciplinares e antecedentes relatórios, não pode concluir-se que a recorrida exerceu o seu poder disciplinar de forma arbitrária relativamente à recorrente.
Como se ponderou no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 2003.06.24 (Rev. n.º 3495/02, da 4.ª Secção), exigindo o princípio da igualdade (art.º 13, da CRP) um tratamento igual de situações de facto iguais e um tratamento diferente de situações de facto diferentes e não havendo um paralelismo que permita afirmar terem os ilícitos disciplinares praticados pelo autor e por outros trabalhadores os mesmos graus de ilicitude e culpa, não pode afirmar-se que foi postergado pela recorrida o princípio da igualdade de tratamento no domínio disciplinar. Também no Ac. do STJ de 2003.06.11 (Rev. n.º 4671/02, da 4.ª Secção), foi dito que a prática disciplinar, que pode considerar-se um corolário do princípio da igualdade, consagrado no art. 13.º da CRP (que se exige a uma entidade empregadora relativamente aos trabalhadores ao seu serviço), visa evitar que infracções idênticas sejam disciplinarmente sancionadas de forma diversa, quando nenhuma razão exista para essa discriminação.
Ora no caso sub-judice, e como resulta do exposto relativamente às diferenças que se assinalam entre as situações em análise, não pode fazer-se um paralelismo entre o caso da recorrente e os dos trabalhadores referenciados nos pontos 55. a 59. da matéria de facto, de modo a poder afirmar-se que a recorrida violou o princípio da igualdade ao proceder ao despedimento da primeira e, simultaneamente, ter mantido os postos de trabalho dos segundos, o que sucedeu relativamente a cada um, ponderando o específico circunstancialismo em que surgiram as correspondentes infracções e as suas motivações.
Para além das diferenças já referenciadas, resulta patente dos factos provados que a recorrente visava incrementar os seus resultados e, em consequência, ser premiada com maiores incentivos o que, como se disse, não pode, manifestamente, ser alcançado com uma autonomia de actuação indiferente ao cumprimento das regras que disciplinam a sua actividade profissional (vg. indiferente à necessidade de obter autorização da hierarquia para negociar taxas de juro superiores às que estavam em vigor) e com a manipulação de dados com a intenção de atingir objectivos. O exercício profissional ainda relativamente curto da recorrente, já com um episódio anterior aos factos que fundaram o despedimento (o ocorrido em Dezembro de 2008), e a ausência de motivações específicas e compreensíveis para o que sucedeu, para além da projecção pessoal e profissional (que, naturalmente, constitui um móbil que perdurará no tempo), justificam que a recorrida receie que a recorrente persista numa actuação à revelia daquelas regras e considere comprometida a base de confiança do contrato.
Improcedem as conclusões das alegações da recorrente no que diz respeito à invocada violação do princípio da igualdade em matéria disciplinar.
*
4.2.8. Em suma, e como decorre do exposto, o comportamento prosseguido pela A. é grave e justifica plenamente, à luz do critério objectivo do "empregador razoável", que tenha levado a R. a instaurar o procedimento disciplinar e a concluir no mesmo pela aplicação da sanção do despedimento, por estar integrado o conceito de "justa causa", tal como é enunciado no artigo 351.º, n.º 1, do Código do Trabalho, o que determina a improcedência dos pedidos de declaração de ilicitude do despedimento, de reintegração e de pagamento prestações vencidas e vincendas, bem como de indemnização por danos não patrimoniais formulados pela recorrente.
*
4.2.9. Porque ficou vencida na decisão final do recurso, apesar do parcial vencimento quanto à impugnação da matéria de facto e na excepção da prescrição, incumbe à recorrente o pagamento das custas respectivas (artigo 527.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho), não se autonomizando as vertentes do recurso em que foi acolhida a sua pretensão, uma vez que tal não teve qualquer influência no resultado final do mérito da acção, em que não obteve vencimento.
*
*
5. Decisão
Em face do exposto:
5.1. julga-se parcialmente procedente a impugnação da matéria de facto deduzida e, em consequência, acrescenta-se à matéria de facto o ponto 44-A acima descrito;
5.2. acrescentam-se oficiosamente à matéria de facto elencada na 1.ª instância os pontos n.ºs 31-A. e 55. a 60.;
5.3. julga-se verificada a excepção da prescrição do direito de exercer o poder disciplinar quanto aos factos verificados em Dezembro de 2008;
5.4. nega-se provimento à apelação e mantém-se a decisão final constante da sentença da 1.ª instância.
Custas pela recorrente.
*
Nos termos do artigo 663.º, n.º 7, do Código de Processo Civil aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho, anexa-se o sumário do presente acórdão.

Porto, 24 de Fevereiro de 2014
Maria José Costa Pinto
João Nunes
António José Ramos
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[1] Diploma a ter em vista pelo Tribunal da Relação no presente momento processual, por força dos arts. 5.º a 8.º da Lei Preambular do Código de Processo Civil de 2013.
[2] Em face do disposto nos artigos 5.º e 8.º da Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho, que aprovou o novo Código de Processo Civil, é o mesmo aplicável aos processos pendentes, nos actos que se desenrolem a partir de 1 de Setembro de 2013. Temos contudo em vista, nesta análise dos actos que se praticaram à luz do anterior Código de Processo Civil, a redacção constante da republicação em anexo ao DL 329-A/95, de 12 de Dezembro, com as alterações introduzidas pelos seguintes diplomas: DL 180/96, de 25-9; DL 125/98, de 12-5; L 59/98, de 25-8; DL 269/98, de 1-9; DL 315/98, de 20-10; L 3/99, de 13-1; DL 375-A/99, de 20-9; DL 183/2000, de 10-8; L 30-D/2000, de 20-12; DL 272/2001, de 13-10; DL 323/2001, de 17-12; L 13/2000, de19-2; DL 38/2003, de 8-3; DL 199/2003, de 10-9; DL 324/2003, de 27-12; DL 53/2004, de 18-3; L 6/2006, de 27-2; DL 76-A/2006, de 29-3; L 14/2006, de 26-4; L 53-A/2006, de 29-12; DL 8/2007, de 17-1; DL 303/2007, de 24-8; DL 34/2008, de 26-2; DL 116/2008, de 4-7; L 52/2008, de 28-8; L 61/2008, de 31-10; DL 226/2008, de 20-11; L 29/2009, de 29-6; DL 35/2010, de 15-4; L 43/2010, de 3-9; L 52/2011, de 13-4; L 63/2011, de 14-12; L 31/2012, de 14-8; L 60/2012, de 9/11 e L 23/2013, de 5/3.
[3] Segundo é dito na exposição de motivos, “[p]ara além de manter os poderes cassatórios – que lhe permitem anular a decisão recorrida, se esta não se encontrar devidamente fundamentada ou se mostrar que é insuficiente, obscura ou contraditória -, são substancialmente incrementados os poderes e deveres que lhe são conferidos quando procede à reapreciação da matéria de facto, com vista a permitir-lhe alcançar a verdade material”.
[4] Vide Antunes Varela, Miguel Bezerra e Sampaio Nora, in Manual de Processo Civil, 2.ª edição, Coimbra, 1985, p. 410, nota 1, e as obras aí citadas.
[5] Lançando mão da palavra do referido douto Acórdão da Relação do Porto de 2013.10.07, “pode afirmar-se, em sentido muito simplificador, que uma conclusão implica um juízo sobre factos e estes, quando em si mesmos considerados, revelam uma realidade, compreensível e detetável sem necessidade de qualquer acréscimo dedutivo”.
[6] Altera-se o entróito do facto uma vez que o mesmo perdeu sequência com a eliminação do quesito 16.º e a inclusão da respectiva matéria na alínea P) dos factos assentes (que veio a dar origem ao ponto 16. deste elenco de factos) a que se procedeu no despacho que decidiu as reclamações ao despacho de condensação processual (a fls. 419 e ss.- 3.º volume).
[7] Vide os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 88.12.9 (in BMJ 382/414), da Relação de Lisboa de 97.1.22 (in C.J., t.I, p. 178), da Relação de Lisboa de 97.12.18 (in C.J., t.V, p. 173) e do Supremo Tribunal de Justiça de 1999.4.26 (proferido na revista nº 361/98).
[8] Vide o neste sentido, entre outros, o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 2011.09.21, processo n.º 429/07.3 TTPRT.P1.S1, in www.dgsi.pt, em entendimento que foi considerado conforme com a Constituição pelo Ac. do Tribunal Constitucional n.º 625/11, in www.tribunalconstitucional.pt
[9] Vide o Prof. Eduardo Correia, in “Direito Criminal”, II, Coimbra, 1971, p. 209.
[10] Diz a A. nas suas alegações de recurso que se “esqueceu” de certificar um produto financeiro pretendido pela cliente da C…, D… e por via disso, tentou arranjar-lhe outro produto próximo daquele, tendo-o subscrito por aquela, mas esta razão que adianta para a sua conduta omissiva não tem respaldo na matéria de facto provada.
[11] Acórdão da Relação do Porto de 2012.02.27 (processo n.º 260/08.9TTVFR.P1, in www.dgsi.pt).
[12] Vide, entre outros, os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 2007.04.18, Processo n.º 2842/06 e de 2006.03.08, Processo n.º 3222/05, ambos da 4.ª Secção e sumariados em www.stj.pt
[13] Vide os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 2001.12.18, Revista n.º 1815/01, de 2009.03.19, Processo n.º 3049/08, de 2009.06.17, Processo n.º 3845/08 e de 2009.07.07, Processo n.º 228/09, todos sumariados in www.stj.pt.
[14] Vide os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 2001.05.31, proferido na Revista n.º 704/01 da 4ª Secção, de 2003.02.19, proferido na Revista n.º 2673/02 da 4ª Secção e de 2003.02.26, proferido na Revista n.º 1198/02 da 4ª Secção, todos sumariados in www.stj.pt
[15] Vide Monteiro Fernandes in "Direito do Trabalho", 13.ª edição, Coimbra, 2006, pp. 551 e ss., Jorge Leite e C. Almeida in "Colectânea de Leis do Trabalho", Coimbra, 1985 pp. 248 ss., B.Lobo Xavier, "Da justa causa de despedimento: conceito e ónus da prova" in R.D.E.S., 1988, pp.1 ss e, entre outros, os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 2001.01.17, proferido na Revista n.º 3318/00 da 4ª Secção, de 2001.10.11, proferido na Revista n.º 591/01 da 4ª Secção, de 2001.12.12, proferido na Revista n.º 2167/01 da 4ª Secção e de 207.06.21, Recurso n.º 3540/06 - 4.ª Secção, também sumariados in www.stj.pt.
[16] Cfr. o Acórdão da Relação de Coimbra de 89.11.14 (in C.J.V, p.97) e os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 2004.12.22 (Revista n.º 1284/04, da 4.ª Secção), de 2005.01.18 (Revista n.º 3157/04, da 4.ª Secção) e de 2005.03.03 (Revista n.º 2517/05, da 4.ª Secção). Como também tem salientado a jurisprudência sem discrepâncias, a perda de confiança não admite gradações, já que a confiança existe ou deixa de existir. Deixando de existir, não há o suporte psicológico mínimo para o desenvolvimento da relação laboral - vide os Acs. do Supremo Tribunal de Justiça de 92.1.22 (in Ac. Dout. 373º, p.108), de 96.3.20 (in Ac. Dout. 416º-417º, p.1069) e de 91.12.18 (in BMJ 412/342) e da Relação do Porto de 97.6.10 (in C.J., t.IV, p. 256).
[17] Vide Júlio Gomes, in Direito do Trabalho, vol. I, Coimbra, 2007, p. 951, que relativamente às consequências perniciosas para efeitos de justa causa de despedimento, afirma que o prejuízo grave para o empregador pode não ser necessariamente de ordem patrimonial, podendo consistir em minar a confiança do empregador, em “lesar a imagem da empresa” ou num dano “organizacional”.
[18] Vide o citado ac. do Supremo Tribunal de Justiça de 08 de Janeiro de 2013.
[19] Vide o Ac. do Supremo Tribunal de Justiça de 2006.06.08, Revista n.º 3374/05, da 4.ª Secção.
[20] Vide Maria do Rosário Palma Ramalho, in “Direito do Trabalho – Parte II – Situações Laborais Individuais”, Coimbra, 2006, pp.633 e ss. e 817 e ss. A autora indica que o desenvolvimento jurisprudencial da ideia da coerência disciplinar se justifica com o princípio da proporcionalidade entre a infracção e a sanção disciplinar.
[21] In Direito do Trabalho, vol. I, 8ª edição, Coimbra, 1993, pág. 483.
[22] In Colevctânea de Leis do Trabalho, Coimbra, 1985, p. 251.
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Nos termos do artigo 663.º, n.º 7, do Código de Processo Civil aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho, lavra-se o sumário do antecedente acórdão nos seguintes termos:
I – Uma vez cometida a infracção disciplinar, o empregador dispõe de um ano para dela tomar conhecimento a fim de a punir disciplinarmente.
II – Caso o empregador pretenda valer-se do início do inquérito prévio com vista a ver interrompida a contagem do prazo de prescrição do direito de exercer o poder disciplinar, caber-lhe-á demonstrar a verificação do início do inquérito prévio e das circunstâncias previstas no artigo 352.º do Código do Trabalho.
III – No domínio do sector bancário a base de recíproca confiança da relação laboral, como fundamento objectivo da permanência do vínculo, assume especial relevância face ao tipo de actividade realizada pelos respectivos trabalhadores.
IV – Integra justa causa de despedimento o comportamento de uma assistente comercial bancária que, ao longo de cerca de 6 meses, atribui ilegitimamente a diversos clientes taxas de juros de depósitos a prazo superiores às que, na altura, se encontravam em vigor, sem conhecimento ou autorização superior e utilizando abusivamente a password da Gerente da agência.
V – Apesar do comportamento ulterior da trabalhadora de assumir a responsabilidade por todo o prejuízo que possa ter causado, que minora a gravidade das consequências patrimoniais do comportamento, aquela conduta é susceptível de comprometer definitivamente a base de confiança do contrato de trabalho.
VI – A natureza discricionária do poder disciplinar não prejudica a necessária consideração da prática disciplinar do empregador e da ideia de coerência disciplinar, que no caso do despedimento se retira do artigo 351.º, n.º 4 do Código do Trabalho.
VII – O despedimento não traduz violação do princípio da igualdade em matéria disciplinar quando, da análise comparativa efectuada, não se evidencia uma prática disciplinar incoerente, sendo substancialmente distintas as motivações das condutas dos diferentes trabalhadores analisados, o grau de culpa revelado por cada um deles, o seu passado laboral e as circunstâncias particulares em que cada um actuou.

Maria José Costa Pinto