Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
| ||
Relator: | RUI VOUGA | ||
Descritores: | SOCIEDADE COMERCIAL EXCLUSÃO DE SÓCIO EXONERAÇÃO | ||
![]() | ![]() | ||
Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 02/10/2009 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
![]() | ![]() | ||
Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | CONFIRMADA A DECISÃO | ||
![]() | ![]() | ||
Sumário: | I - A exclusão de sócios - a saída de sócio de uma sociedade, em regra por iniciativa desta e por ela e/ou pelo tribunal decidida, com fundamento na lei ou cláusula estatutária está especialmente prevista no CSC apenas para as sociedades em nome colectivo (art. 186º, aplicável também às sociedades em comandita simples – art. 474º) e para as sociedades por quotas (arts. 241º-242º). II - Enquanto a exoneração do sócio assenta numa decisão unilateral dele próprio, a exclusão de sócio é da iniciativa da sociedade, contra o desejo ou a inacção do sócio. III - Causa legal genérica de exclusão de sócios é a contida (como cláusula geral) no art. 242º, 1. Apontam-se como situações integradoras da fórmula geral do cit. artigo, comportamentos desleais e/ou gravemente perturbadores do funcionamento da sociedade, nomeadamente, o aproveitamento em benefício próprio de oportunidades de negócios da sociedade, a frequente propositura de acções chicaneiras contra a sociedade, a difusão de opiniões desabonatórias sobre a sociedade, a apropriação ilícita de bens sociais, a utilização em benefício próprio do património da sociedade, a revelação de segredos da organização empresarial da sociedade, actos de concorrência desleal contra a sociedade, provocação culposa de desavenças graves entre os sócios, assédio sexual a trabalhadores da sociedade. IV - Para legitimarem a exclusão judicial, é ainda necessário que estes (e outros) comportamentos tenham causado ou sejam susceptíveis de causar prejuízos relevantes à sociedade. Porém, não se exige um prejuízo efectivo, mas apenas a capacidade de provocar danos. V - O sócio-gerente que adopte comportamentos como os indicados há pouco (violando deveres não apenas enquanto gerente mas também enquanto sócio) fica igualmente sujeito a ser excluído da sociedade. VI - Não é possível ver no mero facto de o gerente da sociedade haver deixado de ser visto com a frequência que normalmente acontecia nas instalações, tendo renunciado à gerência alguns meses depois, um comportamento desleal para com a sociedade. Se este renunciou às funções de gerente é natural que tenha deixado de comparecer nas instalações da empresa com a frequência com que antes costumava comparecer. VII - Não tendo ficado provado qualquer outro facto relativo a estas suas ausências, designadamente que, a partir dessa altura, deixou de exercer as funções que habitualmente exercia, esta diminuição da frequência da sua comparência nas instalações da A. não pode justificar, por si só, a exclusão do sócio. FG | ||
![]() | ![]() |
Decisão Texto Integral: | Acordam na Secção Cível da Relação de Lisboa: "M, Lda.”, S. Domingos de Rana, intentou acção declarativa de condenação, sob a forma de processo comum ordinário, contra C, Estoril, pedindo a exclusão de sócio do R. da sociedade A. e a sua condenação a pagar à Autora a quantia de € 124.998,00, a titulo de indemnização por perdas e danos, acrescida do que se vier a apurar na pendência da acção e em execução de sentença. Para tanto, alegou, em síntese, que: - o R. foi gerente da A. e o único que exercia a gerência de facto da sociedade, dado ser pessoa da confiança dos demais gerentes e ser ele quem tinha o know how do negócio da A.; - em finais de 2002, começou a constatar-se uma diminuição da actividade da A. e, em finais do mesmo ano, o ora R. deixou de ser visto nas suas instalações até que apresentou a renúncia às funções de gerente da A.; - tendo sido solicitada uma auditoria à sociedade, constatou-se que, a dada altura, o filho do R. e a sua mulher constituíram uma sociedade, denominada “F, Lda.”, havendo o R. passado a actuar em benefício dessa sociedade, tendo para ela desviado fornecedores e clientes com quem sempre contactara na qualidade de gerente e sócio da A., tendo tal sociedade – cujos únicos sócios são familiares do R. - passado a comercializar produtos de marcas prestigiadas que antes eram comercializados pela A.; - o R., ao fazer crer a clientes e fornecedores da A. que esta deixou de fornecer determinados produtos que até então comercializava em exclusivo, prejudicou a boa imagem da A.. A Ré contestou, por excepção e por impugnação. Defendendo-se por excepção, arguiu a excepção da prescrição, por entender dever aplicar-se por analogia o prazo de 90 dias previsto no art. 254°, n° 6, do Código das Sociedades Comerciais, prazo esse que, in casu, foi ultrapassado. Defendendo-se por impugnação: - alegou que todos os gerentes da A. exerciam as suas funções e que não se pode imputar as dificuldades económicas que a A. começou a sentir no ano de 2002 à sua conduta; - negou ter beneficiado de qualquer modo a sociedade “F, Lda.”, a qual tinha relações comerciais próximas com a A., ou ter violado os seus deveres de fidelidade e lealdade para com a A.; - sustentou que os problemas que surgiram deveram-se ao facto de os restantes sócios da A. terem querido que este ficasse com as suas quotas, tendo porém exigido do A. determinadas condições que este não pôde aceitar. A A. replicou, pugnando pela improcedência da excepção invocada (dado que o prazo de 90 dias previsto no art. 254°, n° 6, do Código das Sociedades Comerciais não é aplicável às acções de exclusão de sócio). Findos os articulados, o processo foi saneado – tendo, nesta sede, sido julgada improcedente a excepção peremptória de prescrição arguida pelo R. -, fixaram-se os factos assentes por acordo das partes e por documentos dotados de força probatória plena e organizou-se a base instrutória, após o que se seguiu a instrução dos autos. Discutida a causa em audiência de julgamento (com gravação da prova testemunhal produzida) e decidida a matéria de facto controvertida, veio a ser proferida (em 25/6/2007) sentença final que julgou a acção totalmente improcedente por não provada e, em consequência, absolveu o Réu tanto do pedido da sua exclusão de sócio da Autora, como do pedido da sua condenação no pagamento duma indemnização à Autora. Inconformada com o assim decidido, a Autora apelou da referida sentença, tendo rematado as concernentes alegações com as seguintes conclusões: “A) A Apelante intentou acção para exclusão do R., ora Apelado, por verificar terem sido praticados por este actos de concorrência desleal, causadores de prejuízo relevante. B) O Apelado, gerente da Apelante, deixou de ser visto com a frequência que normalmente acontecia nas instalações da Apelante, tendo renunciado à gerência alguns meses depois. Esse facto, conjugado com os prejuízos avultados da Apelante, com as despesas efectuadas a favor do gerente da F, Lda. (concorrente directa da Apelante) que é filho do Apelado e ainda com os benefícios que daí advieram para a Fr, Lda., nomeadamente a representação da marca “Ex”, a representação dos produtos da sociedade “V, Lda. e a “aquisição” para a sua carteira de clientes de um cliente da Apelante, a Al, Lda., permitem concluir pela deslealdade do Apelado e estabelecer um nexo causal entre as condutas do Apelado e as correspondentes consequências nefastas dessas mesmas condutas na Apelante. C) Dos factos provados, pode concluir-se pela existência de um comportamento do Apelado desleal e gravemente perturbador da Apelante. D) O art.º 242º, nº 1 do Código das Sociedades Comerciais estatui a exclusão do sócio que com o seu comportamento desleal ou gravemente perturbador do funcionamento da sociedade cause ou lhe possa causar prejuízos relevantes. Face à análise dos factos dados como provados não é concebível outra conclusão que não a de que estão preenchidos os requisitos exigidos pela norma mencionada e que deste modo, outra não podia ser a decisão do Tribunal a quo além da condenação do Apelado no peticionado pela Apelante. E) Mesmo enquanto gerente, o ora Apelado deveria agir diligentemente, como um gestor criterioso, sempre no interesse da Apelante, algo que não fez, muito pelo contrário, agiu em claro prejuízo da Apelante e por isso só se pode concluir pela sua responsabilidade pelos danos sofridos pela Apelante. F) O tribunal a quo sempre deveria ter recorrido ao disposto no artº 661º, nº2 do CPC ainda que concluísse pela ausência de demonstração de danos, condenando assim o Apelado no que se viesse a liquidar em sede de execução de sentença. G) Face à prova produzida e ao seu enquadramento nas disposições legais aplicáveis, a decisão proferida pelo tribunal, da qual agora se recorre, deveria ser no sentido contrário do que efectivamente foi, ou seja, o Apelado deveria e deve ser condenado no pedido formulado pelo Apelante, ficando deste modo excluído da sociedade e obrigado a pagar a indemnização exigida pelo Apelante. Nestes termos, nos demais de Direito aplicáveis, e sem prescindir do douto suprimento de V. Exas., deve dar-se provimento ao presente recurso, revogando-se a decisão impugnada e substituindo-se a mesma por Acórdão que decrete a exclusão do Recorrido e a condenação no pagamento da indemnização peticionada, acrescida de juros vincendos ou se assim não se entender no que se vier a liquidar em execução de sentença. Assim, farão V.Exas. a costumada JUSTIÇA.” O Réu/Apelado contra-alegou, pugnando pelo não provimento da Apelação da Autora. Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir. O OBJECTO DO RECURSO Como se sabe, sem embargo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer ex officio, é pelas conclusões com que o recorrente remata a sua alegação (aí indicando, de forma sintéctica, os fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão recorrida: art. 690º, nº 1, do C.P.C.) que se determina o âmbito de intervenção do tribunal ad quem [1] [2]. Efectivamente, muito embora, na falta de especificação logo no requerimento de interposição, o recurso abranja tudo o que na parte dispositiva da sentença for desfavorável ao recorrente (art. 684º, nº 2, do C.P.C.), esse objecto, assim delimitado, pode vir a ser restringido (expressa ou tacitamente) nas conclusões da alegação (nº 3 do mesmo art. 684º) [3] [4]. Por isso, todas as questões de mérito que tenham sido objecto de julgamento na sentença recorrida e que não sejam abordadas nas conclusões da alegação do recorrente, mostrando-se objectiva e materialmente excluídas dessas conclusões, têm de se considerar decididas e arrumadas, não podendo delas conhecer o tribunal de recurso. Por outro lado, como meio impugnatório de decisões judiciais, o recurso visa tão só suscitar a reapreciação do decidido, não comportando, assim, ius novarum, i.é., a criação de decisão sobre matéria nova não submetida à apreciação do tribunal a quo. Ademais, também o tribunal de recurso não está adstrito à apreciação de todos os argumentos produzidos em alegação, mas apenas – e com liberdade no respeitante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito (art. 664º, 1ª parte, do C.P.C., aplicável ex vi do art. 713º, nº 2, do mesmo diploma) – de todas as “questões” suscitadas, e que, por respeitarem aos elementos da causa, definidos em função das pretensões e causa de pedir aduzidas, se configurem como relevantes para conhecimento do respectivo objecto, exceptuadas as que resultem prejudicadas pela solução dada a outras (art. 660º, nº 2, do C.P.C., ex vi do cit. art. 713º, nº 2). No caso sub judice, emerge das conclusões da alegação de recurso apresentada pela Autora ora Apelante que o objecto da presente Apelação está circunscrito a 2 (duas) questões: a) Se os factos apurados pelo tribunal “a quo” (nomeadamente, que o Apelado, ainda enquanto gerente da Apelante, deixou de ser visto com a frequência que normalmente acontecia nas instalações da Apelante, tendo renunciado à gerência alguns meses depois; que, a partir do final de 2002 (altura a partir da qual o Apelado deixou de ser visto com a mesma frequência nas instalações da Apelante), a situação desta agravou-se, tendo perdido pelo menos um cliente, a representação privilegiada da marca “Et” e registado perdas avultadas resultantes da diminuição da actividade que sofreu; que o R. utilizou o cartão de crédito Unibanco da A. para fazer face a despesas em viagens que efectuou com o seu filho B, o qual é gerente da empresa concorrente da Autora “F, Lda.”) permitem concluir pela deslealdade do Apelado e estabelecer um nexo causal entre as condutas do Apelado e as correspondentes consequências nefastas dessas mesmas condutas para a Apelante, nos termos e para os efeitos previstos no art.º 242º, nº 1 do Código das Sociedades Comerciais (possibilidade de exclusão do sócio que, com o seu comportamento desleal ou gravemente perturbador do funcionamento da sociedade, cause ou lhe possa causar prejuízos relevantes); b) Se, ainda mesmo que o tribunal a quo tivesse concluído pela ausência de demonstração de danos, sempre haveria que lançar mão do disposto no art.º 661º, nº 2 do CPC e condenar o R., ora Apelado, no que se viesse a liquidar em execução de sentença. MATÉRIA DE FACTO Factos Considerados Provados na 1ª Instância: Não tendo sido impugnada a decisão sobre matéria de facto, nem havendo fundamento para a alterar oficiosamente, consideram-se definitivamente assentes os seguintes factos (que a sentença recorrida elenca como provados), devidamente ordenados segundo uma sequência lógica e cronológica: 1) - A sociedade A. tem como objecto social a actividade de importação, exportação, comercialização e representação de materiais, equipamentos e ferramentas para a construção civil, obras públicas e indústria, prestação de serviços de consultadoria de gestão e das tecnologias de informação (doc. fls. 135). 2) - A sociedade A. encontra-se matriculada desde 30 de Setembro de 1996, tendo inicialmente como sócios o ora R., F, Lda. e como gerentes os dois primeiros sócios e C (doc. fis. 135). 3) - Em 26 de Julho de 1999 foi inscrita na matricula da A. a cessão da quota de F, Lda. e a cessação de funções de gerente do primeiro (doc. fls. 135). 4) - Na mesma data foi inscrita a nomeação de gerentes do ora R., C, J e Fs (doc. fls. 135). 5) - E em 22 de Abril de 2004 foi inscrita a renúncia do ora R. às funções de gerente por renúncia de 7 de Abril de 2003 (doc. fls. 135). 6) - Foi o R. quem seleccionou as pessoas que vieram a ser contratadas pela A. 7) - Era o R. quem conhecia bem o negócio a que a A. se dedicava. 8) - Na prática, dos gerentes em exercício era o R. quem delineava a estratégia comercial da A.. 9) - Na prática, dos gerentes em exercício era o R. quem detinha o know how do negocio. 10) - Dos gerentes em exercício era o réu quem decidia quais os produtos e marcas a comercializar. 11) - Os demais gerentes confiavam na experiência, lealdade, e conhecimentos do aqui R. 12) - Após os três primeiros anos a A. começou a consolidar a sua implementação no mercado. 13) - No ano de 2000 a A. obteve um resultado positivo de exercício de Esc. 6.045.793$00. 14) - Em 2001 foi apurado um resultado líquido positivo de € 37.722,88. 15) - O volume de negócios da A. foi crescendo desde a data da sua constituição até ao ano de 2002. 16) - Em finais de 2002 começou a constatar-se uma diminuição da actividade da A. 17) - No ano de 2002 a A. apresentou um resultado negativo de € 124.998,00. 18) - Em finais de 2002 princípios de 2003 o R. deixou de ser visto nas instalações da A. com a frequência que até aí era habitual. 19) - Em finais de 2002 o volume de vendas da A. relativo aos produtos da marca "E" sofreu um decréscimo. 20) - Os produtos "E" que eram comercializados pela A. passaram a ser igualmente comercializados pela sociedade Ferrer. 21) - O responsável pelas vendas dos produtos "E" informou C que desde finais do ano de 2002 passou a ter relações comerciais directas com a sociedade F, Lda. 22) - A A. nunca teve um contrato de representação exclusiva dos produtos da marca "E". 23) - Os produtos da sociedade "V, Lda." passaram a ser comercializados pela sociedade F, Lda. 24) - A sociedade A, Lda. era cliente da A. 25) - E começou a comprar produtos à sociedade F, Lda. 26) - Houve clientes da A. que a interrogaram sobre "mudanças". 27) - A A. teve como funcionário o Sr. L. 28) - Que, em data anterior a Abril de 2003, visitou clientes da A. com cartões de apresentação da sociedade F, Lda. 29) - B e S são sócios da sociedade F, Lda., cujo objecto social é a actividade de design e produção de imagens, gráfica e digital, interactiva, em video, internet e intranet, e outros suportes multimedia; prestação de serviços de consultadoria nas mesmas áreas. 30) - Que se apresenta aos clientes como F, Lda. (Div. Produtos …). 31) - B é filho do ora R. (doc. fls. 167). 32) - O R. utilizou o cartão de crédito Unibanco da A. para fazer face a despesas em viagens que efectuou com B, este na qualidade de gerente da F, Lda. 33) - O R. requereu a alteração da titularidade do numero de telemóvel que lhe estava adstrito para si próprio. 34) - O R. enviou à A. uma carta datada de 7 de Abril de 2003, junta aos autos a fls. 29, cujo teor aqui se da por integralmente reproduzido. 35) - Após o facto referido em 34) foi solicitada uma auditoria à sociedade A. 36) - No dia 20 de Outubro de 2003, realizou-se uma Assembleia-Geral extraordinária da A., na sua sede, com a seguinte ordem de trabalhos: 1. Dar a conhecer e apreciar os resultados da auditoria efectuada pela sociedade "J, Lda."; 2. Discutir e deliberar sobre a proposição de acção judicial, tendo em vista à exclusão do sócio C, atento o seu comportamento desleal e gravemente perturbador da sociedade; bem como a sua condenação a indemnizar a sociedade por actos praticados na sua qualidade de sócio e gerente da mesma, designadamente, e quanto aos factos até agora apurados: - Transmissão de falsas informações a clientes relativamente à representação comercial de alguns fornecedores com o consequente cancelamento e desvio de encomendas para outra sociedade; - Utilização indevida de bens da sociedade. 37) - O R., regularmente convocado, não compareceu à Assembleia Geral que teve lugar no dia 20 de Outubro de 2003. 38) - O R. solicitou à A. o resultado da auditoria referida no ponto 1) da convocatória da Assembleia Geral bem como a explicitação da proposta de deliberação. 39) - Na Assembleia-geral referida em 36) foi deliberada a propositura de acção judicial com vista à exclusão de sócio do ora R. da sociedade A. e a sua condenação por todos os prejuízos causados. O MÉRITO DA APELAÇÃO 1) Se os factos apurados pelo tribunal “a quo” (nomeadamente, que o Apelado, ainda enquanto gerente da Apelante, deixou de ser visto com a frequência que normalmente acontecia nas instalações da Apelante, tendo renunciado à gerência alguns meses depois; que, a partir do final de 2002 (altura a partir da qual o Apelado deixou de ser visto com a mesma frequência nas instalações da Apelante), a situação desta agravou-se, tendo perdido pelo menos um cliente, a representação privilegiada da marca “E” e registado perdas avultadas resultantes da diminuição da actividade que sofreu; que o R. utilizou o cartão de crédito Unibanco da A. para fazer face a despesas em viagens que efectuou com o seu filho B, o qual é gerente da empresa concorrente da Autora “F, Lda.”) permitem concluir pela deslealdade do Apelado e estabelecer um nexo causal entre as condutas do Apelado e as correspondentes consequências nefastas dessas mesmas condutas para a Apelante, nos termos e para os efeitos previstos no art.º 242º, nº 1 do Código das Sociedades Comerciais (possibilidade de exclusão do sócio que, com o seu comportamento desleal ou gravemente perturbador do funcionamento da sociedade, cause ou lhe possa causar prejuízos relevantes). O tribunal “a quo” julgou a presente acção totalmente improcedente, com base no seguinte argumentário: “Em suma, dos factos provado não se pode extrair que o R. tenha tido qualquer comportamento desleal para com a A. O que se provou foi que a partir de Abril de 2003 o R. deixou de ser gerente da A., que uma sociedade da qual o seu filho é sócio e gerente e que existe desde 1999 exerce uma actividade concorrente com a da A. e que a partir de dada altura, por razões que não se apuraram, essa sociedade passou a comercializar produtos que a A. comercializa e angariou um cliente que era da A. Não foi, porem, feita qualquer prova de que o R. tenha tido qualquer intervenção nesses factos, nem tão pouco se provou que o R. tenha passado a trabalhar por conta ou a prestar serviços para essa sociedade. Não quer dizer que o R. não seja responsável, mas essa responsabilidade tinha de ser provado pela A. e não o foi, não sendo suficiente para que se extraia essa conclusão o facto de o R. ter querido manter o número do telemóvel da A. que lhe estava adstrito. Significa isto que não ficou provado que o R. tenha passado a exercer uma actividade concorrente com a da A., que tenha passado informação privilegiada da A. a uma sociedade concorrente ou que tenha ido exercer noutra sociedade uma actividade concorrente com a da A.. É certo que a proibição do exercício de actividade concorrente é totalmente independente do cargo de gerente e existe quer o sócio seja ou não gerente da sociedade em causa. Porém, não ficou demonstrado que o R. tenha tido um qualquer comportamento desleal nem enquanto foi gerente nem quando deixou de o ser. O único facto concreto imputável ao R. foi o de ter renunciado à gerência, mas esse facto não é bastante para que o mesmo seja excluído de sócio dado que ninguém pode ser obrigado a ser gerente contra a sua vontade. Não restam duvidas de que entre os sócios da A. terá havido um qualquer desentendimento, mas não se apuraram nem as causas do mesmo nem quem foi o seu responsável. Não está, pois, demonstrado o primeiro requisito exigido pelo art. 242° do Cód. Soc. Comerciais: comportamento desleal do sócio R. Mas, mesmo que assim não fosse, o certo é que também o segundo requisito ficou por demonstrar. Como se referiu supra, para que o sócio seja excluído não basta que tenha comportamentos desleais. É também preciso que esses comportamentos causem ou possam vir a causar a sociedade "prejuízos relevantes". Ora a A. não demonstrou que o R. fosse responsável pela diminuição dos seus resultados de exercício nem que tivesse tido qualquer prejuízo de natureza patrimonial ou não patrimonial a este imputável. Aliás, não deixa de ser curioso que a A. tenha mandado fazer uma auditoria à sociedade após a renuncia do R. ao cargo de gerente e não tenha feito a junção aos autos de tal auditoria. Em suma, não provou a A. qualquer facto concreto do qual se possa concluir que o R. tenha causado ou possa vir a causar à A. um qualquer prejuízo. Esta não prova implica a improcedência do pedido de exclusão de sócio e do pedido de condenação no pagamento à A. dos prejuízos causados.”. Sustenta, porém, ex adverso, a Autora ora Apelante que os factos julgados provados pelo tribunal “a quo” (nomeadamente, que o Apelado, ainda enquanto gerente da Apelante, deixou de ser visto com a frequência que normalmente acontecia nas instalações da Apelante, tendo renunciado à gerência alguns meses depois; que, a partir do final de 2002 (altura a partir da qual o Apelado deixou de ser visto com a mesma frequência nas instalações da Apelante), a situação desta agravou-se, tendo perdido pelo menos um cliente, a representação privilegiada da marca “E” e registado perdas avultadas resultantes da diminuição da actividade que sofreu; que o R. utilizou o cartão de crédito Unibanco da A. para fazer face a despesas em viagens que efectuou com o seu filho B, o qual é gerente da empresa concorrente da Autora “F, Lda.”) permitem concluir pela deslealdade do Apelado e estabelecer um nexo causal entre as condutas deste e as correspondentes consequências nefastas dessas mesmas condutas para a Apelante, nos termos e para os efeitos previstos no art.º 242º, nº 1 do Cód. das Soc. Com.. Quid juris ? A exclusão de sócios está especialmente prevista no CSC apenas para as sociedades em nome colectivo (art. 186º, aplicável também às sociedades em comandita simples – art. 474º) e para as sociedades por quotas (arts. 241º-242º) [5]. «Podemos defini-la como saída de sócio de uma sociedade, em regra por iniciativa desta e por ela e/ou pelo tribunal decidida, com fundamento na lei ou cláusula estatutária» [6] [7]. «Ao invés da exoneração, a saída do sócio excluído processa-se contra ou sem a sua vontade» [8]. «Enquanto a exoneração do sócio assenta numa decisão unilateral dele próprio, a exclusão de sócio é da iniciativa da sociedade, contra o desejo ou a inacção do sócio» [9]. «O direito de excluir ou promover a exclusão de sócio é atribuído pela lei ou (imediatamente) pelo estatuto social à sociedade» [10]. «Trata-se de uma medida delicada, que envolve a supressão de uma posição patrimonial privada e que não pode operar sem uma razão ponderosa e sem uma compensação adequada» [11]. A Lei das Sociedades por Quotas de 1901 apenas previa a exclusão para a hipótese do sócio remisso, isto é, do sócio que, devidamente avisado, não efectuasse, no prazo legal, a prestação correspondente à sua entrada no capital social (cfr. o art. 12º, § 1º, daquele diploma) ou que faltasse ao cumprimento da obrigação de prestações suplementares (cfr. os arts. 18º e 19º daquela Lei). O Código Civil vigente e regula a exclusão de sócio de sociedades civis nos artigos 1003º a 1006º. Muito embora tenha havido, na preparação do Código das Sociedades Comerciais, «uma preocupação generalizadora mais ampla, tanto mais que o tema suscitara, entre nós, o interesse da doutrina [12], todavia, não se foi ao ponto de codificar as diversas hipóteses de exclusão de sócio que, assim, ficaram dispersas pelo tecido do Código» [13]. De sorte que a exclusão do sócio de sociedade por quotas está prevista, nomeadamente, nas seguintes disposições do CSC: - no artigo 204º, nºs 1 e 2 : exclusão do sócio remisso que, interpelado, não realize, no prazo legal, a entrada a que se encontre obrigado; - artigo 212º, nº 1: exclusão do sócio que não efectue as prestações suplementares que lhe caibam; - artigo 214º, nº 6: o sócio que abuse da informação obtida por via do exercício do seu direito à informação e prejudique “injustamente” a sociedade e os outros sócios é responsável, nos termos gerais, pelos prejuízos causados e fica sujeito a exclusão. O art. 241º - que é, fundamentalmente, um preceito de enquadramento – estabelece, no seu nº 1, a possibilidade de exclusão de um sócio de sociedade por quotas e distingue entre a exclusão prevista na lei (“… nos casos e termos previstos na presente lei…”) e a exclusão prevista no contrato (“… nos casos respeitantes à sua pessoa ou ao seu comportamento fixados no contrato”). A exclusão prevista na lei é a contemplada nos citt. artigos 204º, nºs 1 e 2, 212º, nº 1, e 214º, nº 6, acima referidos e, ainda, a mencionada na cláusula geral do artigo 242º, nº 1. Efectivamente, «causa legal genérica de exclusão de sócios é a contida (como cláusula geral) no art. 242º, 1: “Pode ser excluído por decisão judicial o sócio que, com o seu comportamento desleal ou gravemente perturbador do funcionamento da sociedade, lhe tenha causado ou possa vir a causar-lhe prejuízos relevantes”. Subjacente a este preceito «estará, pois, uma contraposição entre a exclusão societária, deliberada pelos sócios, e a judicial, a decretar pelo juiz»[14]. «O critério será o seguinte: - cabe exclusão societária quando se esteja perante um facto concreto a que a lei associe a exclusão (p. ex., os factos previstos nos artigos 204º/1 e 2, 212º/1 e 214º/6) ou a que o contrato ligue essa mesma consequência jurídica; - cabe exclusão judicial sempre que nos encontremos no âmbito da cláusula geral do artigo 242º/1»[15]. De jure condendo, MENEZES CORDEIRO[16] manifesta ter dúvidas quanto à bondade da solução legislativa adoptada neste art. 242º/1, ao consagrar uma cláusula geral de conteúdo vago, remetendo a resolução do problema para a apreciação judicial. «Subjacente à opção da lei está o pressuposto positivista de que as cláusulas gerais são fonte de incerteza e de insegurança, as quais têm de ser exorcizadas pelo tribunal»[17]. Porém, «remeter o tema para a sede judicial é fazer pairar sobre a sociedade uma situação (essa sim!) de incerteza durante anos, com pura destruição de riqueza»[18]. Daí que, para este Autor[19], a solução devesse antes ser, sempre, «a da exclusão societária, podendo, depois, o interessado prevalecer-se, quando discorde, das vias judiciais para resolver os conflitos de interesses». De todo o modo, MENEZES CORDEIRO reconhece [20] que «este preceito, salvo o que acima se disse quanto à judicialização do processo, representa um grande avanço jurídico-científico». De facto, na vigência da Lei das Sociedades por Quotas de 1901, entendia-se que, no silêncio do pacto social e faltando um específico preceito na lei, não era possível excluir o sócio. Porém, «mais tarde, autores como AVELÃS NUNES, ANTÓNIO CAEIRO e VAZ SERRA vieram sustentar [ainda no domínio daquela Lei] que tal exclusão era possível quando assentasse em justa causa, numa opção acolhida por alguma jurisprudência»[21]. «Importante, na viragem efectuada [pelo CSC de 1986] foi o dispositivo geral do artigo 1003º do Código Civil [de 1966]» [22]. Tentando concretizar situações integradoras da fórmula geral do cit. art. 242º-1, COUTINHO DE ABREU[23] aponta como comportamentos desleais e/ou gravemente perturbadores do funcionamento da sociedade, nomeadamente, «o aproveitamento em benefício próprio de oportunidades de negócios da sociedade, a frequente propositura de acções chicaneiras contra a sociedade, a difusão de opiniões desabonatórias sobre a sociedade, a apropriação ilícita de bens sociais, a utilização em benefício próprio do património da sociedade, a revelação de segredos da organização empresarial da sociedade, actos de concorrência desleal contra a sociedade [24] [25], provocação culposa de desavenças graves entre os sócios, assédio sexual a trabalhadores da sociedade». Por sua vez, MENEZES CORDEIRO[26] menciona, respigando-as da jurisprudência dos tribunais portugueses, estoutras situações justificativas da exclusão por “comportamento desleal ou gravemente perturbador ”: «- um sócio com conhecimentos importantes a respeito da empresa, coloca tais atributos ao serviço da concorrência e, ainda por cima, incita os funcionários da sociedade à deserção; - um sócio, pouco tempo depois da renúncia à gerência da sociedade, começa a vender os mesmos produtos num seu estabelecimento, a utilizar os catálogos e os preçários da sociedade e a conquistar-lhe clientes, com prejuízos para ela; - um sócio desenvolve uma actividade concorrencial com a da sociedade, procurando angariar mercado através da utilização de meios técnicos e do know how da própria sociedade». De notar que, «para legitimarem a exclusão judicial, é ainda necessário que estes (e outros) comportamentos tenham causado ou sejam susceptíveis de causar prejuízos relevantes à sociedade» [27]. Porém, «não se exige um prejuízo efectivo, mas apenas a capacidade de provocar danos» [28]. «Podemos, pois, dizer que subjaz à cláusula geral do nº 1 do art. 242º a ideia da exclusão permitida somente com “fundamento importante”, como ultima ratio (a exclusão é permitida quando se mostre necessária para que os restantes sócios prossigam normalmente a actividade social)» [29]. De notar que «o sócio-gerente que adopte comportamentos como os indicados há pouco (violando deveres não apenas enquanto gerente mas também enquanto sócio) fica igualmente sujeito a ser excluído da sociedade»[30]. «Todavia, se se conclui que o funcionamento normal da sociedade pode prosseguir com ele na sociedade mas fora da gerência, bastará que seja destituído desta com justa causa (cfr. o art. 257º [do CSC])» [31] [32] [33]. Exposto o problema em tese geral, é altura de descer ao caso dos autos. Ao contrário do sustentado pela Apelante, não é possível ver no mero facto de o Apelado, ainda enquanto gerente da Apelante, haver deixado de ser visto com a frequência que normalmente acontecia nas instalações da Apelante, tendo renunciado à gerência alguns meses depois, um comportamento desleal para com a sociedade [34]. Como bem se observou na sentença ora recorrida, “se o R. renunciou às funções de gerente é natural que tenha deixado de comparecer nas instalações da empresa com a frequência com que antes costumava comparecer”. “Não tendo ficado provado qualquer outro facto relativo a estas suas ausências, designadamente que, a partir dessa altura, [ele] deixou de exercer as funções que habitualmente exercia, esta diminuição da frequência da sua comparência nas instalações da A. não tem qualquer relevância” (ibidem). Tão pouco se pode estabelecer uma relação causal entre o “alheamento” do Apelado (traduzido no simples facto de ele ter deixado de comparecer nas instalações da empresa com a frequência com que antes costumava comparecer) e o agravamento da situação comercial da Apelante verificado a partir de finais de 2002. Tudo quanto se provou, neste âmbito, foi que: - Em finais de 2002 começou a constatar-se uma diminuição da actividade da A.; - No ano de 2002 a A. apresentou um resultado negativo de € 124.998,00; - Em finais de 2002 o volume de vendas da A. relativo aos produtos da marca "E" sofreu um decréscimo; - Os produtos "E", que eram comercializados pela A., passaram a ser igualmente comercializados pela sociedade F; - O responsável pelas vendas dos produtos "E" informou C que desde finais do ano de 2002 passou a ter relações comerciais directas com a sociedade F, Lda.; - Os produtos da sociedade "Vl, Lda." passaram a ser comercializados pela sociedade F, Lda.; - A sociedade A, Lda. era cliente da A.; - E começou a comprar produtos à sociedade Ferrer, Lda.. A mera circunstância de o descrito agravamento da situação comercial da Apelante ter coincidido temporalmente com o facto de o Apelado ter deixado de comparecer nas instalações da empresa com a frequência com que antes costumava comparecer, não é suficiente para se poder estabelecer uma relação causal entre uma coisa e outra. Provou-se – é certo – que: - Era o R. quem conhecia bem o negócio a que a A. se dedicava; - Na prática, dos gerentes em exercício era o R. quem delineava a estratégia comercial da A.; - Na prática, dos gerentes em exercício era o R. quem detinha o know how do negócio; - Dos gerentes em exercício era o réu quem decidia quais os produtos e marcas a comercializar; - Foi o R. quem seleccionou as pessoas que vieram a ser contratadas pela A.. Deste conjunto de factos pode retirar-se que era, de facto, o Apelado quem tinha a gestão comercial da sociedade ora Apelante. Tal não significa, porém, que, na prática, dos quatro gerentes em exercício de funções (a saber: o Apelado; C; J e F), fosse apenas o Apelado quem geria de facto a sociedade. Efectivamente – como bem se notou na sentença ora sob censura -, “a gestão de uma sociedade não passa apenas pela sua área comercial, incluindo também a área administrativa, financeira e de recursos humanos”. “Ora, relativamente a estas áreas, não se provou que o R. tivesse a gestão exclusiva da sociedade: apenas se demonstrou que foi ele quem seleccionou as pessoas que foram trabalhar para a sociedade, mas não se provou que fosse ele quem tinha o pelouro do pessoal, nem tão pouco os pelouros administrativo e financeiro, sendo que sobre estes nada foi sequer alegado ”. “Assim, ficou por demonstrar que fosse o R. o único gerente de facto da A.”. De qualquer modo, o sócio ora Apelado não tinha o dever especial de exercer a gerência (só o contrato de sociedade pode criar para um sócio o dever especial de exercer a gerência e, no caso sub judice, não foi sequer alegado que assim sucedesse) e, por isso, o mero facto de ele haver sido, anteriormente, designado gerente da sociedade aqui Apelante não o impedia de pôr termo, voluntariamente, às suas funções, renunciando ao cargo de gerente. Ao fazê-lo, através da carta que endereçou à Apelante em 7 de Abril de 2003, o ora Apelado não praticou, portanto, nenhum acto ilícito. No que tange àqueloutro invocado comportamento desleal do Apelado, consistente em ter desviado fornecedores e clientes da sociedade Apelante para uma sociedade da qual é sócio e gerente o seu filho, tudo quanto, afinal, a ora Apelante logrou provar foi que : - Em finais de 2002 o volume de vendas da A. relativo aos produtos da marca "E" sofreu um decréscimo; - Os produtos "E" que eram comercializados pela A. passaram a ser igualmente comercializados pela sociedade F; - O responsável pelas vendas dos produtos "E" informou C que desde finais do ano de 2002 passou a ter relações comerciais directas com a sociedade F, Lda.; - Os produtos da sociedade "V, Lda." passaram a ser comercializados pela sociedade F, Lda.; - A sociedade A, Lda. era cliente da A.; - E começou a comprar produtos à sociedade F, Lda.; - A A. teve como funcionário o Sr. L que, em data anterior a Abril de 2003, visitou clientes da A. com cartões de apresentação da sociedade F, Lda.; - B e S são sócios da sociedade F, Lda., cujo objecto social é a actividade de design e produção de imagens, gráfica e digital, interactiva, em video, internet e intranet, e outros suportes multimedia; prestação de serviços de consultadoria nas mesmas áreas. - B é filho do ora R.. Em contrapartida, apesar de o haver alegado, a Apelante não conseguiu demonstrar : a) que, pelo menos desde Novembro de 2002, o R. desviou para a sociedade Fa, Lda fornecedores e clientes da A. (Quesito 12º da Base Instrutória), que sempre tinha contactado na qualidade de gerente e sócio da A. (Quesito 13º da Base Instrutória), usando a informação que tinha sobre a actividade da A. por ser seu sócio e gerente (Quesito 14º da Base Instrutória); b) que o facto de o responsável pelas vendas dos produtos E ter passado, desde finais do ano de 2002, a ter relações comerciais directas com a sociedade F, Lda. só sucedeu devido à intervenção do R., com quem tinha frequentes contactos (Quesito 16º da Base Instrutória); c) que os produtos da sociedade "V, Ida." sempre foram comercializados em exclusivo pela A. (Quesito 17º da Base Instrutória); d) que os produtos da sociedade "V, Ida." passaram a ser comercializados pela sociedade F, Lda., devido à actuação do R. (Quesito 19º da Base Instrutória); e) que houve clientes da A. que a consultaram pedindo propostas de fornecimento e que, em resposta, vieram a ser contactadas pela sociedade F, Lda. (Quesito 24º da Base Instrutória), com quem passaram a estabelecer relações comerciais (Quesito 25º da Base Instrutória); f) que houve clientes que consultaram a sociedade F, Lda. através do n° de fax da A. (Quesito 26º da Base Instrutória); g) que o R. desenvolveu iniciativas no sentido de obter para a sociedade F, Lda. a representação de produtos comercializados pela A. (Quesito 27º da Base Instrutória); h) que foi a pedido do R. que o ex-funcionário da A., Sr. L, visitou clientes da A. com cartões de apresentação da sociedade F Lda., em data anterior a Abril de 2003 (Quesito 31º da Base Instrutória); i) que, nesse mesmo período, o Sr. L foi visto a trabalhar na casa do R. (Quesito 32º da Base Instrutória); j) que o pedido feito pelo R., de alteração da titularidade do n° de telemóvel que lhe estava adstrito para si próprio, tinha como objectivo que o R. pudesse continuar a ser contactado por clientes e fornecedores da A. (Quesito 33º da Base Instrutória). Em conclusão: não se provou que o R. tenha passado a exercer uma actividade concorrente com a da A., nem que tenha passado informação privilegiada da A. a uma sociedade concorrente ou que tenha ido exercer noutra sociedade uma actividade concorrente com a da Autora. Tudo quanto se apurou foi que uma sociedade da qual é sócio e gerente o filho do Apelado exerce uma actividade concorrente com a da A. e que, a partir de dada altura, por razões que não se apuraram, essa sociedade passou a comercializar produtos que a A. antes comercializava e angariou um cliente que era da A., sem que, porém, tenha sido feita qualquer prova de que o R. haja tido qualquer intervenção nesses factos ou haja contribuído por qualquer modo para a ocorrência dos mesmos. Por outro lado, tão pouco se demonstrou que o sócio ora Apelado tenha difundido quaisquer opiniões desabonatórias sobre a sociedade ora Apelante. Na verdade, conquanto alegado pela Apelante, não se provou: - que o R. fez crer aos clientes e fornecedores da A. que esta deixou de fornecer produtos até então por si comercializados em exclusivo (Quesito 36º da Base Instrutória); - o que obrigou a A. a contactar os seus principais clientes e fornecedores (Quesito 37º da Base Instrutória); - e prejudicou a boa imagem da A. (Quesito 38º da Base Instrutória); - criando nos clientes e fornecedores a convicção de que a A. não possuía capacidade de resposta às diferentes solicitações (Quesito 39º da Base Instrutória); - e dando uma imagem de descoordenação da A. (Quesito 40º da Base Instrutória). Dir-se-á, ainda assim, que, de qualquer modo, sempre a Apelante logrou demonstrar que o R. utilizou o cartão de crédito Unibanco da A. para fazer face a despesas em viagens que efectuou com o seu filho B, o qual é gerente da empresa concorrente da Autora “F, Lda.” – comportamento este que, à primeira vista, não deixaria de configurar uma apropriação ilícita de bens sociais ou a utilização em benefício próprio do património da sociedade [35]. A verdade, porém, é que ficou por demonstrar que as despesas pagas pelo Apelado com o cartão de crédito disponibilizado pela Apelante não estivessem relacionadas com a A., que as viagens em causa não tivessem sido feitas no interesse da Apelante ou que tivessem sido feitas no exclusivo interesse da sociedade concorrente da Apelante “F, Lda.”. Na ausência dessa prova, o mero uso do cartão de crédito da Apelante, por parte do Apelado, para pagar despesas feitas em viagens que ele realizou com o seu filho Bruno Oliveira, não configura, necessariamente, uma apropriação ilícita de bens sociais ou a utilização em benefício próprio do património da sociedade. Donde que, em suma: os factos provados, por si sós, não mostram que o sócio ora Apelado tenha tido um comportamento desleal ou gravemente perturbador do funcionamento da sociedade ora Apelante e que, por isso lhe tenha causado ou possa vir a causar prejuízos relevantes. Assim sendo, inexiste fundamento legal para a sua exclusão e, consequentemente, a apelação improcede, quanto à 1ª questão suscitada nas conclusões da alegação de recurso da Apelante. 2) Se, ainda mesmo que o tribunal a quo tivesse concluído pela ausência de demonstração de danos, sempre haveria que lançar mão do disposto no art.º 661º, nº 2 do CPC e condenar o R., ora Apelado, no que se viesse a liquidar em execução de sentença. Na tese da ora Apelante, a circunstância de o tribunal “a quo” ter concluído pela não demonstração de quaisquer danos para a sociedade em questão não constituiria óbice a que se condenasse o sócio ora Apelado no pagamento dos prejuízos que se viessem a liquidar em execução de sentença, ao abrigo do disposto no art. 661º-2 do Cód. Proc. Civil. Quid juris ? Como vimos supra, para haver lugar à exclusão judicial do sócio duma sociedade por quotas, não se exige um prejuízo efectivo, mas apenas a capacidade de provocar danos. Efectivamente, decorre do cit. art. 242º-1 do CSC que a exclusão de sócio não depende do facto da sua conduta ter já causado danos efectivos à sociedade, bastando a demonstração de que o comportamento do sócio que se pretende excluir é susceptível de causar prejuízos relevantes ao ente societário. Simplesmente, para que o sócio que se pretende ver excluído da sociedade possa ser condenado no pagamento de qualquer indemnização a favor daquela, nunca seria suficiente a prova da mera susceptibilidade de o comportamento do sócio poder vir a causar prejuízos à sociedade. Só se concebe que o sócio se constitua na obrigação de indemnizar a sociedade pelos prejuízos efectivos que o seu comportamento já lhe causou ou vai, previsivelmente, causar no futuro (arts. 563º e 564º-2 do Cód. Civil). Acresce que, no caso sub judice, nem sequer se demonstrou que o sócio ora Apelado tenha tido qualquer comportamento desleal para com a sociedade Apelante, por forma a poder ser excluído do ente societário. Donde que a apelação também improcede, quanto à 2ª questão levantada nas conclusões da alegação de recurso da Apelante. Assim sendo, o recurso improcede in totum, nenhum reparo merecendo a sentença que dele constitui objecto. DECISÃO Acordam os juízes desta Relação em julgar improcedente a Apelação, confirmando integralmente a sentença recorrida. Custas da Apelação a cargo da Autora/Apelante. Lisboa, 10.2.2009 Rui Torres Vouga Maria Rosário Barbosa Maria Rosário Gonçalves ___________________________________ [1] Cfr., neste sentido, ALBERTO DOS REIS in “Código de Processo Civil Anotado”, vol. V, págs. 362 e 363. [2] Cfr., também neste sentido, os Acórdãos do STJ de 6/5/1987 (in Tribuna da Justiça, nºs 32/33, p. 30), de 13/3/1991 (in Actualidade Jurídica, nº 17, p. 3), de 12/12/1995 (in BMJ nº 452, p. 385) e de 14/4/1999 (in BMJ nº 486, p. 279). [3] O que, na alegação (rectius, nas suas conclusões), o recorrente não pode é ampliar o objecto do recurso anteriormente definido (no requerimento de interposição de recurso). [4] A restrição do objecto do recurso pode resultar do simples facto de, nas conclusões, o recorrente impugnar apenas a solução dada a uma determinada questão: cfr., neste sentido, ALBERTO DOS REIS (in “Código de Processo Civil Anotado”, vol. V, págs. 308-309 e 363), CASTRO MENDES (in “Direito Processual Civil”, 3º, p. 65) e RODRIGUES BASTOS (in “Notas ao Código de Processo Civil”, vol. 3º, 1972, pp. 286 e 299). [5] De facto, «o Código das Sociedades Comerciais não regulou, na parte geral, a exoneração e a exclusão de sócios» (ANTÓNIO MENEZES CORDEIRO in “Manual de Direito das Sociedades”, II Volume, “Das Sociedades em Especial”, 2ª ed., 2007, p. 318). «Apenas dispensou algumas regras quanto às sociedades em nome colectivo (arts. 185º e 186º) e quanto às sociedades por quotas (arts. 240º a 242º): fica a lacuna nas [sociedades] anónimas, numa problemática difícil de reduzir: serão aí possíveis, a exoneração e a exclusão e sendo-o, em que base ?» (ANTÓNIO MENEZES CORDEIRO, ibidem). «Recordemos que, para as sociedades civis puras, legem habemus: artigos 1002 e 1003º, do Código Civil» (ANTÓNIO MENEZES CORDEIRO, ibidem). «De todo o modo, a regulamentação sobre exoneração e exclusão de sócios, elaborada a propósito das sociedades por quotas, é paradigmática» (ANTÓNIO MENEZES CORDEIRO, ibidem). «Nesse domínio coloca-se a maioria da jurisprudência e boa parte das doutrinas portuguesa e alemã» (ANTÓNIO MENEZES CORDEIRO, ibidem). «Em Itália, o problema é exposto e debatido a propósito das sociedades simples – as nossas sociedades civis sob forma civil» (ANTÓNIO MENEZES CORDEIRO, ibidem). [6] JORGE COUTINHO DE ABREU in “Curso de Direito Comercial”, Vol. II, “Das Sociedades”, Setembro de 2004, p. 425. [7] RAÚL VENTURA (in “Comentário ao Código das Sociedades Comerciais”, “Sociedades por Quotas”, Vol. II, 1989, pp. 15 e 44) define “exclusão do sócio” como «a perda da participação na sociedade que a um sócio é imposta ou por deliberação da sociedade, fundada em caso previsto na lei ou em caso respeitante à pessoa ou comportamento do sócio previsto no contrato, ou por sentença judicial baseada em facto previsto na lei». [8] JORGE COUTINHO DE ABREU, ibidem. [9] LUÍS BRITO CORREIA in “Sociedades Comerciais”, 2º volume, 1989, p. 459. [10] JORGE COUTINHO DE ABREU in “Curso de Direito Comercial” cit., Vol. II cit., pp. 425 in fine e 426. [11] ANTÓNIO MENEZES CORDEIRO in “Manual de Direito das Sociedades” cit., II Volume cit., p. 329. [12] Entre os estudos produzidos no domínio da Lei das Sociedades por Quotas de 1901, avulta o de AVELÃS NUNES (“O direito de exclusão de sócio”), publicado em 1968. [13] ANTÓNIO MENEZES CORDEIRO in “Manual de Direito das Sociedades” cit., II Volume cit., pp. 329-330. [14] ANTÓNIO MENEZES CORDEIRO in “Manual de Direito das Sociedades” cit., II Volume cit., p. 332. [15] ANTÓNIO MENEZES CORDEIRO, ibidem. [16] Ibidem. [17] ANTÓNIO MENEZES CORDEIRO, ibidem. [18] ANTÓNIO MENEZES CORDEIRO, ibidem. [19] Ibidem. [20] In “Manual de Direito das Sociedades” cit., II Volume cit., p. 333. [21] ANTÓNIO MENEZES CORDEIRO, ibidem. [22] ANTÓNIO MENEZES CORDEIRO, ibidem. [23] In “Curso de Direito Comercial” cit., Vol. II cit., p. 431. [24] Cfr., igualmente no sentido de que «é proibido ao sócio de uma sociedade por quotas, sem o consentimento dos demais sócios, exercer actividade igual à daquela sociedade onde é sócio, sob pena de responsabilidade pelos danos causados e de exclusão de sócio», sendo que «estas sanções são aplicáveis tanto no caso de exercício da actividade, a título individual, como no caso do sócio exercer as funções de sócio-gerente de outra sociedade por quotas», o Ac. do STJ de 18/4/2006, relatado pelo Conselheiro AZEVEDO RAMOS e proferido no Proc. nº 06A745, cujo texto integral pode ser acedido, via Internet, no sítio www.dgsi.pt.. [25] Cfr., todavia, no sentido de que, uma vez que, «para que seja possível excluir um sócio de uma sociedade por quotas, necessário é que, com o seu comportamento desleal ou gravemente perturbador do funcionamento da sociedade, lhe tenha causado ou possa vir a causar prejuízos relevantes (artigo 242º nº. 1 do CSC86)», «não basta para esse efeito a concorrência, se não se prova que esta colocou a sociedade em situação de não poder atingir o seu escopo social», o Ac. do STJ de 5/6/1997, relatado pelo Conselheiro NASCIMENTO COSTA e proferido no Proc. nº 097B24, cujo texto integral pode ser acedido, via Internet, no sítio www.dgsi.pt. [26] In “Manual de Direito das Sociedades” cit., II Volume cit., p. 333. [27] COUTINHO DE ABREU in “Curso de Direito Comercial” cit., Vol. II cit., p. 431. [28] Ac. do STJ de 29/4/1991, relatado pelo Conselheiro PIRES DE LIMA e proferido no Proc. nº 081681, cujo sumário pode ser acedido, via Internet, no sítio www.dgsi.pt. [29] COUTINHO DE ABREU, ibidem. [30] COUTINHO DE ABREU, ibidem, nota 482. [31] COUTINHO DE ABREU, ibidem. [32] Cfr. igualmente no sentido de que «deverão ser separados, para um sócio gerente, o seu comportamento como gerente (sancionado com a destituição da gerência) e o seu comportamento como sócio, ao qual pode corresponder a exclusão», RAÚL VENTURA, in “Comentário ao Código das Sociedades Comerciais”, “Sociedades por Quotas”, Vol. II, 1989, p. 60. [33] Cfr., também no sentido de que «a exclusão de um sócio da sociedade implicará maior grau de violação de deveres e susceptibilidade de maior dano do que a mera destituição da gerência», pelo que, «não havendo fundamento para destituir um sócio da gerência por maioria de razão não haverá para o excluir da sociedade, como sócio», o Ac. desta Relação de 23/9/1993, relatado pelo Desembargador TORRES VEIGA e proferido no Proc. nº 0059116, cujo sumário pode ser acedido, via Internet, no sítio www.dgsi.pt. [34] Cfr., no sentido de que, uma vez que, «para que seja possível excluir um sócio de uma sociedade por quotas, necessário é que, com o seu comportamento desleal ou gravemente perturbador do funcionamento da sociedade, lhe tenha causado ou possa vir a causar prejuízos relevantes (artigo 242º nº. 1 do CSC86)», «não basta para esse efeito o abandono da gerência; ter levado consigo preçários, catálogos e as chaves do estabelecimento; e o facto de, enquanto gerente, ter vendido materiais a pessoas com mau nome comercial», o Ac. do STJ de 5/6/1997, relatado pelo Conselheiro NASCIMENTO COSTA e proferido no Proc. nº 097B24, cujo texto integral pode ser acedido, via Internet, no sítio www.dgsi.pt. [35] Cfr., todavia, no sentido de que «a movimentação de dinheiros pelo sócio gerente em seu (dele) exclusivo proveito por força dos poderes que detinha enquanto gerente não autoriza a acção de exclusão de sócio», o Ac. do STJ de 15/10/1998, relatado pelo Conselheiro FIGUEIREDO DE SOUSA e proferido no Proc. nº 98B453, cujo sumário pode ser acedido, via Internet, no sítio www.dgsi.pt. |