Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
115/06.1TTBRR.L1-4
Relator: SEARA PAIXÃO
Descritores: TRANSMISSÃO DE ESTABELECIMENTO
ESTABELECIMENTO COMERCIAL
PENHORA
QUESTÃO NOVA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 10/07/2009
Votação: MAIORIA COM * VOT VENC
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA A DECISÃO
Sumário: I-O regime legal da transmissão da empresa ou do estabelecimento, previsto quer no n.º 1 do artigo 37.º da LCT quer no art. 318º do CT, envolve a transmissão automática para o adquirente da posição jurídica de empregador relativamente aos contratos de trabalho dos trabalhadores que à data da transferência nele exerçam a sua actividade.
II- O facto de nas instalações em causa existirem alguns bens que não foram objecto de penhora e que foram retirados do seu interior antes da entrega ao adquirente, nomeadamente, armaduras e suportes de lâmpadas e certos equipamentos, não constitui motivo suficiente para descaracterizar o complexo de bens transmitidos, como sendo um estabelecimento comercial.
(sumário elaborado pelo Relator)
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam na secção social do Tribunal da Relação de Lisboa:

Relatório
VS…,

MP…,

JS… e

AA…, propuseram a presente acção emergente de contrato individual de trabalho, sob a forma de processo comum, contra JF…, pedindo a condenação deste a reconhecer a ilicitude do despedimento dos Autores ocorrido em 09 de Fevereiro de 2006, em resultado do encerramento do estabelecimento, no pagamento de oito dias de trabalho prestado entre 01 e 08 de Fevereiro de 2006, no montante total de €917,34, no pagamento de todas as retribuições vencidas e vincendas desde o dia do despedimento até à data do trânsito em julgado da sentença que vier a ser proferida, incluindo as férias e subsidio de férias já vencidas e vincendas, bem como o subsídio de Natal vincendo, estando nesta data vencidos trinta dias de retribuição em relação a cada um dos Autores no montante total de €3.440,00, a reintegrar os Autores no seu posto de trabalho, categoria profissional e retribuição, ou a pagar aos Autores a indemnização que vier a ser fixada pelo Tribunal dentro dos limites legais, conforme opção que os Autores exercerão até à data da audiência final, no pagamento de uma indemnização a título de danos morais que, para o primeiro Autor, ascende a €2.500,00, para o segundo Autor de €2.000,00, para o terceiro Autor de €1.500,00 e para o quarto Autor de €1.500,00, e ainda no pagamento de juros de mora vincendos até integral pagamento.

Para tanto alegaram, em resumo, que foram admitidos ao serviço da VASL – Veículos Automóveis do Sado, Lda, que detinha um estabelecimento comercial destinado a “stand e assistência a automóveis”, sito na Av. D. Afonso Henriques nº 37-A e 37-C na cidade do Barreiro. Em sede de processo de execução fiscal foi penhorado “o direito ao estabelecimento comercial destinado a stand e assistência a automóveis sito na Av. D. Afonso Henriques nº 37-A e 37-C, Verderena, Barreiro, composto por stand e wc com 85 m2 e oficina com 575 m2”. Em 06 de Janeiro de 2003 o Réu adquiriu o referido direito no âmbito daquele processo fiscal, no entanto e como existiu impugnação dessa aquisição, o título de adjudicação a favor do Réu só foi emitido em 10 de Janeiro de 2006, sendo que a entrega do estabelecimento ao R. só veio a verificar-se no dia 8 de Fevereiro de 2006.

No dia 09 de Fevereiro de 2006 os AA compareceram no seu local de trabalho, mas encontraram o estabelecimento encerrado, o que voltou a suceder nos dias seguintes. O R. encerrou o estabelecimento a partir do dia 9.02.2006 impedindo os AA de acederem ao seu posto de trabalho, o que configura um despedimento ilícito.

Os AA têm assim a haver nove dias de trabalho do mês de Fevereiro, bem como as retribuições que deixaram de auferir desde 30 dias antes do despedimento até à data da sentença, tendo ainda o direito a optarem pela sua reintegração ou a receber a indemnização legal. Ao longo do tempo, e em virtude de terem sido despedidos, sofreram stress e angústia, pelo que devem ser ressarcidos com o pagamento de uma indemnização a título de danos não patrimoniais.

O Réu contestou a presente acção impugnando, no essencial, os factos alegados pelos Autores, alegando que em 08 de Fevereiro de 2006 o estabelecimento não se encontrava apto a funcionar. Para que o estabelecimento estivesse apto a funcionar teria o Réu de despender pelo menos €50.000,00, pelo que não se pode considerar que tivesse havido transmissão do estabelecimento adquirido em execução fiscal.

Concluiu pela improcedência da acção e consequente absolvição dos pedidos.

Os Autores apresentaram resposta.

Foi dispensada a realização de audiência preliminar e de organização de base instrutória.

Procedeu-se à realização de audiência de julgamento que decorreu em várias sessões. Na sessão de 21.06.07 o ilustre mandatário da Ré requereu que a inquirição das testemunhas da Ré fosse efectuada no local das instalações em causa, sitas na Avª D. Afonso Henriques nº 37-A e 37-C, no Barreiro, o que foi indeferido por despacho de fls. 288-289.

O Réu interpôs recurso desse despacho e termina as suas alegações com as seguintes conclusões:

(…)

Não houve contra-alegação e o recurso foi admitido com subida diferida.

Fixada a matéria de facto provada e não provada, foram apresentadas reclamações, oportunamente decididas.

Designado dia para julgamento realizou-se este, em várias sessões, com a gravação da prova.

De seguida foi elaborada a sentença e proferida a seguinte decisão:

“Pelo exposto, julga-se parcialmente procedente a presente acção e, consequentemente:

a) declaro ilícito o despedimento dos Autores levado a cabo pelo Réu e, como tal condeno-o a reconhecê-lo;

b) condeno o Réu a pagar ao Autor VS… uma indemnização que se cifra na presente data no montante de €34.500,00 (trinta e quatro mil e quinhentos euros), mas a qual será computada em €1.500,00 (mil e quinhentos euros) por cada ano ou fracção até à data do trânsito em julgado da presente decisão;

c) condeno o Réu a pagar ao Autor MP… uma indemnização que se cifra na presente data no montante de €17.955,00 (dezassete mil novecentos e cinquenta e cinco euros), mas a qual será computada em €945,00 (novecentos e quarenta e cinco euros) por cada ano ou fracção até à data do trânsito em julgado da presente decisão;
d) condeno o Réu a pagar ao Autor JS… uma indemnização que se cifra na presente data no montante de €4.270,00 (quatro mil duzentos e setenta euros), mas a qual será computada em €610,00 (seiscentos e dez euros) por cada ano ou fracção até à data do trânsito em julgado da presente decisão;
e) condeno o Réu a pagar ao Autor AA… uma indemnização que se cifra na presente data no montante de €3.850,00 (três mil oitocentos e cinquenta euros), mas a qual será computada em €385,00 (trezentos e oitenta e cinco euros) por cada ano ou fracção até à data do trânsito em julgado da presente decisão;
f) condeno o Réu a pagar a cada um dos Autores o valor das retribuições que deixaram de auferir desde a data do despedimento (a acção foi proposta nos 30 dias subsequentes ao despedimento) e até ao trânsito em julgado da presente acção (nº 4 do referido artigo 437º).

Ao montante dessas retribuições, em conformidade com o disposto no nº 2 e 3 do citado artigo 437º, há que deduzir o montante das importâncias que o trabalhador tenha comprovadamente obtido com a cessação do contrato e que não receberia se não fosse o despedimento, bem como deverá ser deduzido o subsidio de desemprego que tenha auferido, devendo, neste caso, o empregador entregar essa quantia à segurança social. Quanto a estes montantes, e ignorando-se se posteriormente ao despedimento os Autores auferiram qualquer uma destas importâncias, e em caso afirmativo quais os montantes auferidos, terá que se relegar para execução de sentença a quantificação das mesmas (artigo 70º do Código de Processo de Trabalho e artigo 661, nº 2 do Código de Processo Civil);
g) condeno o Réu a pagar ao Autor VS… a quantia de €400,00 (quatrocentos euros) a título de retribuição pelos 08 dias de trabalho prestado em Fevereiro de 2006 e €46,00 (quarenta e seis euros) de subsídio de alimentação;

h) condeno o Réu a pagar ao Autor MP… a quantia de €252,00 (duzentos e cinquenta e dois euros) a título de retribuição pelos 08 dias de trabalho do mês de Fevereiro de 2006 e €46,00 (quarenta e seis euros) de subsídio de alimentação;

i) condeno o Réu a pagar ao Autor JS…. a quantia de €162,67 (cento e sessenta e dois euros e sessenta e sete cêntimos) a título de retribuição pelos 08 dias de Fevereiro de 2006 e €46,00 (quarenta e seis euros) de subsídio de alimentação;

j) condeno o Réu a pagar ao Autor AA… a quantia de €102,67 (cento e dois euros e sessenta e sete cêntimos) a título de retribuição pelos 08 dias de Fevereiro de 2006 e €46,00 (quarenta e seis euros) de subsídio de alimentação;

l) condeno o Réu a pagar ao Autor VS… a quantia de €1.000,00 (mil euros) a título de indemnização por danos não patrimoniais;

m) condeno o Réu a pagar ao Autor MP… a quantia de €1.000,00 (mil euros) a título de indemnização por danos não patrimoniais;

n) condeno o Réu a pagar ao Autor JS… a quantia de €1.000,00 (mil euros) a título de indemnização por danos não patrimoniais;

o) condeno o Réu a pagar ao Autor AA… a quantia de €1.000,00 (mil euros) a título de indemnização por danos não patrimoniais;

p) condeno o Réu ainda no pagamento, sobre todas as quantias acima referidas, dos respectivos juros de mora vencidos e vincendos, a contar desde a data de citação do Réu e até efectivo e integral pagamento, à taxa legal de 4% ao ano;

q) absolvo o Réu dos restantes montantes peticionados a título de indemnização por danos não patrimoniais.

Custas a cargo dos Autores e Réu na proporção do decaimento.”

O Réu interpôs recurso dessa decisão e termina as suas alegações formulando as seguintes conclusões:

(…)
Deve, pois, e com o provimento do presente recurso, revogar-se a decisão recorrida e, em consequência, absolver-se o R./Recorrente dos pedidos formulados.

Os Autores, recorridos, contra-alegaram pugnando pela improcedência do recurso e confirmação da sentença recorrida.
Admitido o recurso na espécie e com o efeito devido, foram os autos remetidos a este Tribunal da Relação.
Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir.
As questões que emergem das conclusões dos recursos são as seguintes:
No recurso de agravo:
- saber se se justificava a inquirição das testemunhas no local da controvérsia;
No recurso de apelação:
- reapreciação da matéria de facto;
- saber se os bens entregues ao Recorrente em 8/Fevereiro/2006, constantes do título de adjudicação de fls. 20 e 21, integram o conceito de estabelecimento comercial e se isso acarretou a transmissão da posição jurídica de empregador relativamente aos Autores, nos termos do art. 318º, n.º 1, do C. Trabalho.


FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

Quanto à reapreciação da matéria de facto

(…)
Pelo exposto, improcede a reclamação da matéria de facto suscitada pelo recorrente, mantendo-se na íntegra a decisão da matéria de facto constante da 1ª Instância.

Na 1ª Instância resultaram provados os seguintes factos:

1. A sociedade VASL - Veículos Automóveis do Sado, Lda. detinha o direito ao estabelecimento destinado a Stand e assistência de automóveis, sito na Av. D. Afonso Henriques, n° 37-A e 37-C, no Barreiro até 31.01.2006.

2. O primeiro Autor, VS…, foi admitido ao serviço da VASL - Veículos Automóveis do Sado, Lda., em 1 de Agosto de 1986, para sob as suas ordens direcção e fiscalização, exercer as funções, ultimamente, em 31 de Janeiro de 2006, inerentes à categoria de director comercial, mediante a contrapartida pecuniária de €1.500 mensais acrescido de subsídio de alimentação no valor de €5,75 por dia de trabalho.

3. O 2° Autor, MP…, foi admitido ao serviço da VASL - Veículos Automóveis do Sado, Lda., em 4 de Maio de 1990, para sob as suas ordens direcção e fiscalização, exercer as funções, ultimamente, em 31 de Janeiro de 2006, inerentes à categoria de mecânico de automóveis, mediante a contrapartida pecuniária de €945 mensais, acrescido de subsídio de alimentação no valor de €5,75 por dia de trabalho.

4. O 3° autor JS…, foi admitido ao serviço da VASL - Veículos Automóveis do Sado, Lda., em 1 de Agosto de 2002, para sob as suas ordens direcção e fiscalização, exercer as funções, ultimamente, em 31 de Janeiro de 2006, inerentes à categoria de electricista auto, mediante a contrapartida pecuniária de €610 mensais, acrescido de subsídio de alimentação no valor de €5,75 por dia de trabalho.

5. O 4° autor, AA…, foi admitido ao serviço da VASL - Veículos Automóveis do Sado, Lda., em 1 de Fevereiro de 1999, para sob as suas ordens direcção e fiscalização, exercer as funções, ultimamente, em 31 de Janeiro de 2006, inerentes à categoria de ajudante de mecânico, mediante a contrapartida pecuniária de €385 mensais, acrescido de subsídio de alimentação no valor de €5,75 por dia de trabalho.

6. Correu termos no Serviço de Finanças do Barreiro, o processo de execução fiscal, n° 2160200107000928, contra a VASL - Veículos Automóveis do Sado, Lda., no âmbito do qual foi penhorado o direito ao estabelecimento comercial destinado a stand e assistência automóveis, sito na Av. D. Afonso Henriques, n° 37-A e 37-C, Verderena, no Barreiro, composto por Stand e WC com 85m2 e oficina e WC com 575m2, ao abrigo de contrato de arrendamento comercial celebrado com o réu.

7. Mais foram penhorados os bens constantes das verbas n° 2 a 22 que constam do título de adjudicação junto a fls. 20 e 21 dos autos que aqui se dá por integralmente reproduzido.

8. No que toca aos direitos e bens identificados nos pontos 6 e 7 acima, adquiridos pelo réu no âmbito do referido processo, através de venda judicial por meio de proposta em carta fechada, pelo valor do preço de €63.000, montante que foi depositado em 6 de Janeiro de 2003.

9. Em face de interposição de acção de impugnação judicial da venda judicial dos mesmos, que correu termos no Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada, o Título de Adjudicação foi emitido em 10 de Janeiro de 2006.

10. No âmbito do processo de execução fiscal, nº 2160200107000926, o 1º autor foi nomeado fiel depositário, tendo sido notificado pelo Serviço de Finanças do Barreiro por carta de 17 de Janeiro de 2006, para proceder à entrega dos bens ao réu.

11. Em 19 de Janeiro de 2006, por carta registada, o 1° autor comunicou ao réu que, a partir dessa data estava disponível para proceder à entrega dos bens.

12. E por carta de 26 de Janeiro de 2006, na qualidade de fiel depositário, o 1º autor designou o dia 31 de Janeiro de 2006 para proceder à entrega do estabelecimento e restantes bens.

13. O réu não compareceu naquele dia, mas designou um representante para in loco, verificar da existência de todos os bens, tendo-os confirmado positivamente.

14. A entrega da chave das instalações a que respeita o direito ao estabelecimento e bens adquiridos veio a realizar-se no dia 8 de Fevereiro de 2006, na presença dos autores e demais trabalhadores que desempenhavam funções no estabelecimento.

15. Os autores e os demais trabalhadores permaneceram no seu local de trabalho até ao termo do horário de trabalho, a saber: até às 18:00 horas.

16. No dia seguinte, os autores e demais trabalhadores compareceram no seu local de trabalho, pelas 9:00 horas, hora de entrada do período normal de trabalho, encontrando as instalações afectas ao estabelecimento comercial, local de trabalho de todos, encerradas. Esta situação sucedeu nos dias seguintes, tendo os autores comparecido sempre e cumprido o respectivo horário de trabalho, permanecendo as instalações encerradas.

17. Os autores sofreram stress e angústia em face da situação referida no ponto 16.

18. Em 8 de Fevereiro de 2006, as instalações sitas na Avenida D. Afonso Henriques, n° 37-A e 37-B, no Barreiro tinham no interior, apenas, os bens identificados no ponto 7 acima.

19. No dia 31 de Janeiro de 2006, a EDP recepcionou um pedido da sociedade VASL - Veículos Automóveis do Sado, Lda., solicitando o desligamento da energia nas instalações do estabelecimento comercial, sito na Av. D. Afonso Henriques, n° 37-A e 37-C, no Barreiro, o qual foi efectuado no dia 01 de Fevereiro de 2006.

20. Em 20.10.2006, encontra-se activa na PT - Comunicações, em nome da VASL - Veículos Automóveis do Sado, Lda., a conta n° 1007110898, com a atribuição de dois números de telefone a funcionar nas instalações sitas na Av. D. Afonso Henriques, n° 37-A e 37-C, no Barreiro.

21. No dia 31.01.2006 foi cessado o fornecimento de água, nas instalações estabelecimento comercial, sito na Av. D. Afonso Henriques, n° 37-A e 37-C, no Barreiro, em nome da VASL - Veículos Automóveis do Sado, Lda.

22. E a instalação eléctrica apresentava alguns cabos e condutores degradados, corroídos ou à vista; falta de botões num dos quadros eléctricos e vários locais com humidade onde passava a corrente eléctrica.

23. A VASL - Veículos Automóveis do Sado, Lda. ordenou que fossem retiradas as armaduras e suportes das lâmpadas e todos os equipamentos eléctricos que não se encontravam penhorados, tendo para tanto sido cortados os respectivos cabos eléctricos que os forneciam na zona terminal.

24. Em 28 de Fevereiro de 2003 foi registada a firma Vítor Soares & Soares Comércio de Automóveis, Lda., com sede na Rua 10 de Maio Lote 15-B, Novo - Pinhal da Areia, na Moita, com o capital social de €5.000, sendo titular de uma quota no valor de €2.500, o 1º autor e da restante quota o cônjuge deste, ambos com residência no local designado como sede da empresa, com o objecto social de reparação e pintura de viaturas, lavagens auto, comércio de acessórios automóveis ligeiros e pesados compra e venda de automóveis, conforme teor da matrícula a fls. 68 a 70, cujo teor se dá por reproduzido.

25. Em 23 de Dezembro de 2002, por assembleia geral extraordinária de ambos os sócios da firma Vítor Soares & Soares, Comércio de Automóveis, Lda., foi deliberado que a designação da sede social da empresa constante da escritura de constituição está errada, devido a lapso, porquanto, “na realidade (...) a sede da firma situa-se na Rua 1° de Maio Lote 15-B, Novo — Pinhal da Areia, na Moita”, conforme teor de fls. 120 que se dá por reproduzido.

26. A firma Vítor Soares & Soares, Comércio de Automóveis, Lda., iniciou a actividade em 13 de Fevereiro de 2003, no serviço de Finanças do Barreiro, indicando como sede a Av. D. Afonso Henriques, nº 37-A e 37-C, no Barreiro e em 20 de Dezembro de 2005, passou para o serviço de Finanças da Moita, indicando como sede a Rua 10 de Maio Lote 15-B, Novo — Pinhal da Areia, na Moita, conforme teor de informação das finanças a fls. 146, que se dá por reproduzido.


Fundamentação de direito

Quanto ao recurso de agravo

Alega o Recorrente que o Mº Juiz ao indeferir a realização da diligência de inquirição das testemunhas no local da controvérsia, violou o disposto no nº 3 do art. 265º do CPC, já que tal diligência se revestia de carácter absolutamente necessário para o apuramento da verdade.
O art. 622º do CPC permite que as testemunhas sejam inquiridas no local da questão quando o tribunal, por sua iniciativa ou a requerimento das partes, o julgue conveniente.
A possibilidade que inquirição das testemunhas no local da questão encontra justificação na “conveniência de tirar do depoimento a maior utilidade possível (cfr. Prof. Alberto dos Reis, in Código de Processo Civil Anotado, Vol. IV, 1987, pag. 374).
Acontece que a conveniência da realização desse tipo de diligências deve ser aferida casuisticamente, em face das circunstâncias concretas de cada caso, e quem está em melhor posição para aferir dessa conveniência é o juiz da causa.
No presente caso, a Mº Juiz indeferiu a diligência por considerar que “não decorre do requerimento razão ponderosa que convença o tribunal de que as testemunhas serão incapazes de prestar o seu depoimento nesta sala com recurso ao seu conhecimento pessoal, apelando às suas memórias”.
Não vemos razão plausível para não atender a esta justificação, tanto mais que no decurso dos depoimentos das referidas testemunhas não se suscitaram dúvidas resultantes do facto dos depoimentos não estarem a decorrer no local em questão.
Entende-se, por isso, que o indeferimento da referida diligência de inquirição das testemunhas no local não afectou a descoberta da verdade, não se mostrando violado o disposto no art. 265º nº 3 do CPC.
Face ao exposto nega-se provimento ao agravo.

Quanto ao recurso de apelação

Nas conclusões do recurso suscita-se, essencialmente, a questão de saber se os bens entregues ao Recorrente em 8/Fevereiro/2006, constantes do título de adjudicação de fls. 20 e 21, integram o conceito de estabelecimento comercial e se isso acarretou a transmissão da posição jurídica de empregador relativamente aos Autores, nos termos do art. 318º, n.º 1, do Código do Trabalho.
Resulta dos factos provados que em Janeiro de 2003 o Recorrente adquiriu, através de venda judicial, os bens constantes do título de adjudicação junto a fls. 20-21 doa autos, os quais, porém, só em 8 de Fevereiro de 2006 lhe foram entregues, por entretanto ter havido impugnação da venda.
À data da compra judicial, em Janeiro de 2003, vigorava o art. 37º da LCT (regime jurídico do contrato individual de trabalho, aprovado pelo Dec-Lei 49.408 de 24.11.69), que dispunha o seguinte:
"A posição que dos contratos de trabalho decorre para a entidade patronal transmite-se ao adquirente, por qualquer título, do estabelecimento onde os trabalhadores exerçam a sua actividade, salvo se, antes da transmissão, o contrato de trabalho houver deixado de vigorar nos termos legais, ou se tiver havido acordo entre o transmitente e o adquirente, no sentido de os trabalhadores continuarem ao serviço daquele noutro estabelecimento sem prejuízo do disposto no artigo 24.º".
Embora esta norma não nos diga o que deve entender-se por transmissão de estabelecimento, com a utilização da expressão “por qualquer título” pretendeu consagrar-se um conceito amplo por forma a abranger todas as hipóteses em que a titularidade do estabelecimento comercial ou industrial se transfere de um sujeito para outro.
Conforme referem Mário Pinto, Furtado Martins e Nunes de Carvalho, em Comentário às Leis Laborais, Vol. I, Lex, pag. 176 e segs. "A casuística consideravelmente importante que se tem desenvolvido a propósito deste preceito engloba no conceito de transmissão uma multiplicidade de hipóteses, tais como: o trespasse do estabelecimento; a transmissão decorrente da venda judicial do mesmo, designadamente no decurso do processo de falência; a mudança de titularidade do estabelecimento por força da fusão ou cisão de sociedades; a aquisição de uma empresa privada por uma pessoa colectiva de direito público; e até casos de transmissão inválida (...) julgamos que a aplicação do art. 37.º não pode prejudicar a invalidade da transmissão, mas a destruição do negócio pelo qual o estabelecimento foi transmitido também não obstará à eficácia dos contratos de trabalho com o transmissário relativamente ao tempo em que os mesmos forem executados".
Também a jurisprudência tem entendido que o art. 37.º da LCT, contempla conceitos amplos de transmissão e de estabelecimento, pelo que também a venda judicial fica abrangida por este preceito.
No que se refere à definição de empresa, o Tribunal de Justiça da Comunidade Europeia adoptou como critério para aplicação da directiva 98/50/CE a existência de uma “unidade económica que mantenha a sua identidade depois da transmissão, entendendo-se como identidade da empresa o conjunto de meios organizado com o objectivo de prosseguir uma actividade económica. E na determinação do conceito de unidade económica o TJCE tem vindo a enunciar critérios relevantes como o tipo de estabelecimento, a transferência de bens corpóreos, a continuidade da clientela, o grau de semelhança da actividade exercida antes e depois da transmissão, a assunção de efectivos, a estabilidade da estrutura organizativa, variando a ponderação dos critérios de acordo com cada caso. Mas, nas empresas cuja actividade assenta essencialmente na mão-de-obra, como nas áreas de serviços, o factor determinante para se considerar a existência da mesma empresa pode ser o da manutenção dos efectivos, ou, na interpretação mais recente do TJCE, “um conjunto organizado de trabalhadores que executa de forma durável uma actividade comum pode corresponder a uma unidade económica” (cfr. Joana Simão em A Transmissão de Estabelecimento na Jurisprudência do Trabalho Comunitária e Nacional, publicado em Questões Laborais, n.º 20, pág. 203.

A partir de 1.12.2003 entrou em vigor o Código do Trabalho, aprovado pela Lei 99/2003 de 27.08, que no seu artigo 318º e seguintes regulamenta a matéria da transmissão da empresa ou estabelecimento, transpondo, aliás, para o nosso ordenamento a Directiva nº 2001/23/CE do Conselho de 12 de Março de 2001, relativa à aproximação das legislações dos Estados Membros respeitantes à manutenção dos direitos dos trabalhadores em caso de transferência de empresas ou de estabelecimentos, ou de partes de empresas ou de estabelecimentos ( Sobre esta Directiva ver Júlio Vieira Gomes, em Direito do Trabalho, I, Coimbra editora, pag. 808 e seguintes. ) ( Esta Directiva substituiu a Directiva nº 77/187/CEE do Conselho de 14 de Fevereiro de 1977, com a redacção dada pela Directiva nº 98/50/CE do Conselho de 29 de Junho de 1998.).
E o art. 318º do Código do Trabalho (CT), na parte que aqui interessa, dispõe o seguinte:
“1. Em caso de transmissão, por qualquer título, da titularidade da empresa, do estabelecimento ou de parte da empresa ou estabelecimento que constitua uma unidade económica, transmite-se para o adquirente a posição jurídica de empregador nos contratos de trabalho dos respectivos trabalhadores”.
(...)
4. Considera-se unidade económica o conjunto de meios organizados com o objectivo de exercer uma actividade económica, principal ou acessória”.
Continua a vigorar a noção ampla de transmissão de empresa ou estabelecimento, ou parte deles, definindo-se, agora, que se entende por unidade económica (embora a Directiva se refira a “entidade económica”).
De acordo com este preceito, a transmissão da posição jurídica de empregador relativamente aos respectivos trabalhadores ocorre sempre que há uma transferência de uma unidade económica que mantém a sua identidade, entendida esta como um conjunto de meios organizado com objectivo de prosseguir uma actividade económica, seja ela essencial ou acessória.
Assim, de importância central para a existência de uma transferência é que a entidade económica mantenha a sua identidade.
Segundo Júlio Gomes ( Direito do Trabalho, I, pag. 821.), “decisiva para o Tribunal de Justiça é sempre a manutenção da entidade económica e para se verificar se essa entidade continuou a ser a mesma, o tribunal destacou que há que recorrer a múltiplos elementos cuja importância pode, de resto, variar no caso concreto, segundo o tipo de empresa ou estabelecimento, a sua actividade, ou métodos de gestão, sendo que estes elementos devem ser objecto de uma apreciação global, não sendo em princípio decisivo nenhum deles. Numa indicação meramente exemplificativa podem ser relevantes elementos como a transmissão de bens do activo da entidade, designadamente, bens imóveis, ou equipamentos, mas também bens incorpóreos como a transmissão de know-how, a própria manutenção da maioria ou do essencial dos efectivos, a duração de uma eventual interrupção da actividade desenvolvida antes e a actividade desenvolvida depois da transferência” - (ver a este propósito o Ac. desta Relação de 24/5/2006, proc. 869/06, disponível em www.dgsi.pt., bem como os Ac do STJ de 5.11.2008, de 28.03.2007 e de 24.05.2006, todos disponíveis em www.dgsi.pt.
Pode assim concluir-se que o regime laboral de transmissão do estabelecimento, previsto quer no n.º 1 do artigo 37.º da LCT quer no art. 318º do CT, envolve a transmissão automática para o adquirente do estabelecimento das posições activa e passiva dos contratos de trabalho celebrados pelos trabalhadores que à data da transferência nele exerçam a sua actividade, ou seja, o adquirente do estabelecimento fica sub-rogado ope legis na posição contratual do alienante e, assim, no complexo de direitos e deveres que a integram.
Pretende-se com este regime, por um lado, acautelar os interesses do cessionário em receber uma empresa funcionalmente operativa; mas, por outro lado, proteger a manutenção dos contratos de trabalho existentes à data da transmissão para a nova entidade, garantindo a subsistência dos seus contratos e a manutenção dos seus direitos.
Posto isso analisemos o caso concreto.
O Recorrente não discorda das obrigações legais que decorrem do regime da transmissão de estabelecimento, nomeadamente, a transmissão da posição jurídica de empregador nos contratos de trabalho dos respectivos trabalhadores em caso de venda judicial. A sua discordância reside, essencialmente, em saber se aquilo que lhe foi entregue, em 8.02.2006, integrava ou não uma unidade jurídico-económica qualificável como “estabelecimento” ou “empresa”, para efeitos do disposto no art. 318º do CT.
O recorrente começa por suscitar a questão de saber se o penhorado “direito ao estabelecimento”, transmitido em 8.02.2006, pretendia incidir sobre um estabelecimento em funcionamento ou apto a funcionar, ou se, pelo contrário, a penhora incidia sobre o direito a um estabelecimento a implantar. É que se o conteúdo da penhora era o próprio estabelecimento enquanto unidade jurídica, então não se pode afirmar que os bens retirados do seu interior previamente à entrega, referidos no nº 23 dos factos provados, além de outros, não tinham sido alvo de penhora, pois isso significaria admitir que o direito ao estabelecimento se referia a um estabelecimento a instalar.
Antes de mais há que referir que a penhora do direito ao estabelecimento foi efectuada nos termos previstos no art. 862-A do CPC que refere que a penhora do estabelecimento comercial se faz por auto no qual se relacionam os bens que essencialmente o integram.
No caso vertente foi penhorado e adjudicado ao Recorrente (fls. 20/21) o “direito ao estabelecimento comercial, destinado a stand e assistência a automóveis, sito na Av. D. Afonso Henriques, nº 37-A e 37-C, Verdena, composto por … (descrevendo-se em seguida diversos bens), que depois se voltam a discriminar, cada um deles, nas verbas nº 2 a 22.
Assim, parece inquestionável que o bem penhorado, que foi adjudicado ao recorrente, foi o “direito ao estabelecimento comercial destinado a stand e assistência a automóveis”, que estava instalado na Av. D. Afonso Henriques, nº 37ª e 37C, em Verdena, Barreiro, o qual existia e estava a funcionar, situação que o Recorrente não podia deixar de conhecer, pois que até era o proprietário das instalações onde o referido estabelecimento estava instalado.
O facto de nas instalações em causa existirem alguns bens que não foram objecto de penhora e que foram retirados do seu interior antes da entrega, e o nº 23 dos factos provados refere-nos que foram retirados armaduras e suportes de lâmpadas e outros equipamentos eléctricos, não constitui motivo suficiente para descaracterizar o complexo de bens transmitidos como sendo um estabelecimento comercial. É que não está provado que esses bens fossem indispensáveis ao funcionamento do estabelecimento comercial, já que os bens essenciais que integravam o estabelecimento eram os descritos no auto de adjudicação. Na verdade, não se sabe que aparelhos eléctricos foram retirados e qual a sua importância para o estabelecimento, sendo que as armaduras e suportes de lâmpadas que foram retiradas por ordem da VASL poderiam ser facilmente substituídos, sem grandes custos para a adquirente do estabelecimento.
Questão diferente mas que não cabe aqui apreciar é a de saber se foi lícita a conduta da VASP que, antes da entrega do estabelecimento de que era proprietária, mandou retirar esses aparelhos e armaduras, sabendo que sobre o estabelecimento incidia a penhora.
Alega o recorrente que o que lhe foi transmitido, em 8.02.06, não foi um estabelecimento apto a funcionar porque não tinha luz eléctrica nem água, pois no dia 31 de Janeiro de 2006 foi cancelado o fornecimento de água e pedido o desligamento da energia eléctrica, tendo efectivamente sido desligada a luz eléctrica no dia 1.02.2006 (factos provados nº 19 e 21).
É certo que no dia 31.01.06 a anterior titular do estabelecimento solicitou às respectivas entidades a cessação do fornecimento de energia eléctrica e de água. Acontece que esse era o dia marcado para a entrega do estabelecimento ao adquirente e só devido ao facto deste não ter comparecido é que a entrega só foi efectuada no dia 8.02.06. Mas, nesse dia 31.01.2006, o adquirente enviou um representante ao local onde funcionava o estabelecimento o qual verificou a existência e o funcionamento de todos os bens integrantes do título de adjudicação.
Quanto ao fornecimento da água, como o próprio Recorrente reconhece, não existia qualquer dificuldade, pois bastava pedir a respectiva ligação para que o fornecimento de água se efectivasse de imediato. Já quanto à energia eléctrica, face ao seu desligamento ocorrido, a respectiva ligação poderia estar condicionada à sua certificação pela CERTIEL, face às normas de segurança em vigor, mas, ainda assim, mesmo que fosse necessária a certificação, entendemos que isso poderia ser obtido em relativamente pouco tempo, não sendo esse facto descaracterizador do estabelecimento em causa.
Por outro lado, também entendemos que o interregno que existiu na laboração entre os dias 31.01.2006 e 8.02.2006, não é significativo, sendo certo que o mesmo só ao adquirente é imputável, pois não compareceu na data marcada para a entrega.
Desta forma, conclui-se que o conjunto de bens entregues ao recorrente, em 8.02.06, eram essencialmente os mesmos que integravam o estabelecimento na data da sua aquisição judicial, pelo que este mantinha a sua identidade e unidade, apesar das citadas vicissitudes.

Finalmente, o recorrente alega que a anterior titular do estabelecimento, a firma VASP – Veículos Automóveis Sado, Ldª, em 31.01.2006, requereu na Câmara Municipal por motivo de encerramento da actividade a anulação da actividade económica, sita na Av. Afonso Henriques, 37-A e 37-C, Verdena, Barreiro, o que foi deferido por despacho de 19.02.2006 e comunicado à requerente em 1.03.2006, e junta com as alegações uma certidão emitida pela Câmara Municipal do Barreiro, em 28.02.2008 a pedido do Recorrente, para prova dos referidos factos, referindo, ainda, que tal situação só há cerca de um ano veio ao seu conhecimento.
Desse documento consta o seguinte despacho “…foi anulado o processo de actividade económica …tendo em conta que foi verificado que a actividade a que se refere o presente processo não está a ser exercida”.
O Recorrente alega que este facto determinava a caducidade dos licenciamentos existentes o que impedia a reatamento da actividade, sem recurso aos trâmites previstos no Dec-Lei 370/99 de 18.9, com vista à obtenção de um novo licenciamento.
O Recorrido alega que a junção do documento é extemporânea e que bastaria ao adquirente requerer à Câmara que fosse averbado ao respectivo alvará o novo titular.
Vejamos:
Nos termos do nº 1 do art. 706º do CPC as partes podem juntar documentos às alegações nos casos excepcionais a que se refere o art. 524º ou no caso de a junção apenas se tornar necessária em virtude do julgamento proferido em 1ª Instância. E o nº 2 refere que os documentos supervenientes podem ser juntos até se iniciarem os vistos dos juízes.
O art. 524º nº 1 do CPC refere que depois do encerramento da discussão só são admitidos, no caso de recurso, os documentos cuja apresentação não tenha sido possível até àquele momento. E o nº 2 dispõe que os documentos destinados a provar factos posteriores aos articulados, ou cuja apresentação se tenha tornado necessária por virtude de ocorrência posterior, podem ser oferecidos em qualquer estado do processo.
A junção de prova documental deve ser feita na 1ª Instância, com os respectivos articulados, nos termos do art. 63º do CPT, ou quando muito até ao termo da audiência de discussão e julgamento nos termos permitidos pelo art. 72º do mesmo código.
Em sede de recurso é legítimo às partes juntar documentos com as alegações cuja apresentação não tenha sido possível até esse momento, ou quando se destinem a provar factos posteriores aos articulados, ou cuja apresentação se tenha tornado necessária por virtude de ocorrência posterior ao julgamento da 1ª instância.
Ora, no presente caso, não é admissível a junção do documento em causa por diversas ordens de razões.
Em primeiro lugar, por não se verificar nenhuma das situações previstas no art. 706º e 524º do CPC. Com efeito, o documento reporta-se a factos ocorridos em Janeiro a Março de 2006, anteriores, portanto, à propositura da acção, pelo que podia ser obtido e apresentado com os articulados da acção. O facto de o Recorrente afirmar que só há cerca de um ano chegou ao seu conhecimento, não releva, pois se agisse com a diligência devida poderia ter obtido o documento em causa na devida altura. Por outro lado a junção do documento não se tornou necessária pela decisão da 1ª Instância, já que tal possibilidade só ocorre quando a decisão da 1ª instância se revele de todo surpreendente relativamente ao que seria expectável face aos elementos já constantes do processo, o que não era manifestamente o caso.
Em segundo lugar, porque o recorrente, com o documento em causa, pretende provar um facto que não foi alegado nos articulados nem há notícia que tenha sido objecto de discussão na 1ª Instância. Na verdade, o Réu, ora Recorrente, nunca invocou na 1ª Instância a questão da anulação do licenciamento do estabelecimento, pelo que essa é uma questão nova que não pode ser apreciada em sede de recurso.
É que, como refere M. Teixeira de Sousa ( Estudos sobre o Novo Processo Civil, Lex, pag. 395. ), “os recursos ordinários visam a reapreciação da decisão proferida dentro dos mesmos condicionalismos em que se encontrava o tribunal recorrido no momento do seu proferimento. Isto significa que em regra o tribunal de recurso não pode ser chamado a pronunciar-se sobre matéria que não foi alegada pelas partes na instância recorrida”. A jurisprudência tem reiteradamente afirmado que os recursos são meios de impugnação de decisões judiciais e não ocasião para julgar questões novas – J. Lebre de Freitas, CPC Anotado, Vol. 3º, pag. 83.
A junção do referido documento com as alegações de recurso e a afirmação de que só tomou conhecimento da situação a que o mesmo alude há cerca de um ano, só revela que o recorrente nunca teve intenção de pôr em funcionamento o estabelecimento comercial que adquiriu, e onde laboravam os Autores, pois se tivesse intenção de pôr em funcionamento o dito estabelecimento, certamente não teria sido deferido o cancelamento da licença, visto que tal só ocorreu após vistoria realizada em 26.02.2006 a qual constatou que nenhuma actividade existia no local.
Não sendo admissível a junção do documento em causa com as alegações de recurso, não se toma conhecimento da questão de falta de licenciamento invocada pelo Recorrente em sede de recurso e que se fundamenta no aludido documento.
Conclui-se, assim, que por efeito da aquisição do estabelecimento em causa nestes autos, se transferiu para o Recorrente a posição jurídica de empregador nos contratos de trabalho dos Autores que laboravam no dito estabelecimento.
Não aceitando o Recorrente a prestação de trabalho dos Autores procedeu a um efectivo despedimento com as consequências assinaladas na decisão recorrida.
Improcedem, por isso, ou ficam prejudicadas as conclusões do recurso.

Decisão:
Pelo exposto, acorda-se em julgar improcedente o recurso e, em consequência, confirma-se a decisão recorrida.
Custas do recurso a cargo do recorrente.

Lisboa, 7 de Outubro de 2009

Hermínia Marques
Isabel Tapadinhas
Natalino Bolas (vencido conforme voto que junto)