Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
6528/07-9
Relator: JOÃO CARROLA
Descritores: VIGILÂNCIA ELECTRÓNICA
INIBIÇÃO DA FACULDADE DE CONDUZIR
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 10/11/2007
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: REJEITADO
Sumário: 1. O uso do radar foi notificado à C.N.P.D. apenas em 5/5/06, ao abrigo do DL 207/05, de 29/11.
2. A contra-ordenação ocorreu em 14/7/05, ou seja, antes da entrada em vigor do referido D.L..
3. A imagem obtida pelo radar foi utilizada dentro do estritamente necessário para a finalidade pretendida e legalmente admitida, não se identificando sequer a pessoa do condutor.
4. Não pode, pois, concluir-se, quanto ao seu uso, e face à falta de comunicação à C.N.P.D. ( que não existia à data dos factos e que a lei não estabelece com prazo peremptório ), que tenha sido utilizado um método proibido de prova, nos termos previstos no art. 126.º do C.P.P., tanto mais que a falta daquela comunicação é sancionada apenas com contra-ordenação - art. 37.º da mesma Lei.
(sumariado em pgdl)
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: (...)

Perante a improcedência da impugnação judicial, vem o recorrente, pelo presente recurso, expressar, no essencial, as mesmas pretensões, apesar de fazer uma diferenciação no pedido final em que propugna pela dispensa de sanção acessória de inibição de conduzir.
No tocante a estes, importará sempre relembrar ao recorrente que por força do disposto no art.º 75º n.º 1 do Regime Geral das Contra-Ordenações aprovado pelo DL 433/82 de 27/10, alterado pelos DL 356/89 de 17/10 e 244/95 de 14/09, este tribunal (de recurso) apenas conhecerá da matéria de direito, sendo portanto inócuas quaisquer referências que o recorrente faz quanto aos factos alegados e que foram, ou não foram, provados pelo tribunal recorrido.

Apreciaremos, em primeiro lugar, a invocada nulidade da decisão.
Neste particular, a dissenção do recorrente relativamente à sentença começa por invocar a nulidade da decisão administrativa por ausência na mesma de menção ao número de radar, quando foi calibrado e se o mesmo foi ou não reconhecido e aprovado pelo IPQ.
Independentemente do recurso se dirigir à sentença resultante da impugnação judicial e não à decisão administrativa, sempre diremos que não assiste a mínima razão ao recorrente. Desde logo, porque na decisão administrativa é claramente mencionado que a velocidade do veículo do arguido foi controlada pelo cinemómetro radar, marca Multanova, modelo MUVR-6FD, aprovado em 28.4.2003 pela DGV através do despacho/ofício n.º 8036, tal como já constava do auto de contra-ordenação para que remete a decisão administrativa e a sentença, ora recorrida, na parte em que conheceu dessa questão.
A decisão é clara quanto à indicação do meio de prova utilizado e a respectiva aprovação sendo que ”(..) os aparelhos utilizados na fiscalização da velocidade estão sujeitos à aprovação da Direcção Geral de Viação (artigo 5.º, n.º 5 do C.E., na redacção do DL n.º 44/2005, de 23.02), aprovação essa que tem necessariamente que ser precedida de controlo metrológico a cargo do Instituto Português da Qualidade para a verificação da qualidade metrológica dos mesmos”.
Em suma, as deficiências que o recorrente invoca não existem.

Suscita o recorrente a validade do meio de prova obtido através do uso do radar por, na sua perspectiva, não ter sido efectuada a notificação relativa à utilização de radares junto da Comissão0 Nacional de Protecção de Dados.
Nesta matéria importa reter o seguinte:
Refere a decisão recorrida que, na sequência de requerimento do recorrente no âmbito do disposto no art.º 315.º, n.º1 do CPP em que solicitava que o tribunal notificasse a CNPD do documento de autorização para comprovação da autorização do sistema de vídeo-vigilância, a DGV veio informar que o modelo radar em causa foi notificado à CNPD apenas em 5.5.2006, ao abrigo do DL n.º 207/05, de 29.11.
Ora, a infracção foi praticada em 14.7.2005, ou seja, antes da entrada em vigor do referido Decreto-Lei, quando não era obrigatório a notificação à CNPD, ou seja, a notificação ocorreu efectivamente em data (05.05.2006) posterior à data da prática da contra-ordenação em discussão nos presentes autos (14.07).
Como a infracção foi cometida antes da existência daquela obrigação de comunicação, a problemática suscitada pelo recorrente não tem qualquer razão de ser.
De qualquer modo e acerca do efeito da falta de comunicação, mesmo que já fosse obrigatória na data da prática dos factos, quanto à validade da prova obtida através do mencionado radar, sempre diremos so seguinte.
A Comissão Nacional de Protecção de Dados é uma entidade administrativa independente, que tem como atribuição controlar e fiscalizar o cumprimento das disposições legais e regulamentares em matéria de protecção e dados pessoais e cujas competências, sempre relacionadas com o tratamento e a protecção de dados pessoais, se encontram elencadas no artigo 23º da Lei 67/98 de 26 de Outubro.
Cumprindo-lhe assim, em qualquer circunstância, a vigilância e protecção, exclusivamente, da utilização de “dados pessoais”.
Definindo o artigo 3º, al. a) do mesmo diploma os dados pessoais como “qualquer informação, de qualquer natureza e independentemente do respectivo suporte, incluindo som e imagem, relativa a pessoa singular identificada ou identificável titular de dados que possa ser identificada, directa ou indirectamente, designadamente por referência a um número de identificação ou a um ou mais elementos específicos da sua identidade física, fisiológica, psíquica, económica, cultural ou social”.
As entidades responsáveis pelo tratamento de dados pessoais têm que notificar a referida Comissão antes da realização de qualquer tratamento, de acordo com o disposto no artigo 27º n.º1 daquela Lei, sob pena de incorrerem na prática da contra-ordenação prevista e punida pelo artigo 37º da mesma Lei.
Está assim em causa o tratamento de dados pessoais e não – por consequência – dados relativos à condução automóvel na via pública.
Conclui-se que a consequência estabelecida para o não cumprimento da notificação é uma sanção de natureza administrativa, que não a invalidade ou a nulidade da utilização, sem mais.
Por outro lado, a utilização de câmaras de vídeo pelas forças e serviços de segurança em locais públicos de utilização comum foi, inicialmente, regulada pela Lei n.º 1/2005, de 10 de Janeiro, que foi objecto de alterações pontuais pela Lei n.º 39-A/2005, de 29 de Julho, alterações que mereceram o consenso alargado em sede parlamentar.
Posteriormente, surgiu o Decreto-Lei n.º 207/2005 de 29.11 que “visa regular o regime especial autorizado pelo artigo 13º da Lei n.º 1/2005, de 10 de Janeiro, na redacção decorrente da Lei n.º 39-A/2005, de 29 de Julho” – cfr. art. 1º.
No processo legislativo que conduziu à aprovação do mencionado DL 207/2005 foi ouvida previamente a Comissão Nacional de Protecção de Dados.
Aquele diploma legal define, além do mais (art. 1º),:
a) Os procedimentos a adoptar na instalação, pelas forças de segurança, de sistemas de vigilância electrónica rodoviária;
b) As formas e condições de utilização pelas forças de segurança (…);
c) Os procedimentos a adoptar para o tratamento da informação recolhida e o eficaz registo de acidentes, infracções ou quaisquer ilícitos;
d) As formas através das quais as forças de segurança se coordenam para a eficaz interacção com as empresas, cujos equipamentos estão legalmente autorizadas a utilizar.”
Por seu turno, o art. 2.º postula:
1 - Com vista à salvaguarda da segurança das pessoas e bens na circulação rodoviária e à melhoria das condições de prevenção e repressão das infracções estradais, as forças de segurança podem recorrer:
a) A meios de vigilância electrónica próprios;
b) A sistemas de vigilância rodoviária e de localização instalados ou a instalar pela entidade competente para a gestão das estradas nacionais e pelas concessionárias rodoviárias nas respectivas vias concessionadas.
2 – (…)
Estabelecendo o artigo 3º que: “a instalação dos meios de vigilância electrónica bem como a captação de imagens devem ser direccionadas, tanto quanto tecnicamente possível, para os veículos que sejam objecto da acção de prevenção ou de fiscalização; os meios de vigilância, designadamente câmaras digitais, de vídeo ou fotográficas, e sistemas de localização adquiridos pelas forças de segurança para os efeitos previstos no presente decreto-lei constam de inventário próprio e são notificados à Comissão Nacional de Protecção de Dados (CNPD).”
E o art. 5º:
1 - As forças de segurança responsáveis pelo tratamento de dados e pela utilização dos meios de vigilância electrónica notificam a CNPD das câmaras fixas instaladas, com identificação do respectivo modelo, características técnicas e número de série e dos locais públicos que estas permitem observar, bem como do nome da entidade responsável pelo equipamento e pelos tratamentos de dados.
2 - São igualmente notificados os meios portáteis disponíveis, com identificação do respectivo modelo, características técnicas e número de série.”

Como refere o Decreto-Lei n.º 207/2005 de 29.11 no respectivo preâmbulo, a utilização dos radares constitui um importante instrumento no quadro das políticas de prevenção e de segurança rodoviárias, bem como na detecção de infracções estradais, no sentido de inverter as estatísticas relativas ao número de acidentes nas estradas portuguesas, com índices dos mais elevados a nível europeu, ainda que com alguma tendência decrescente. Com efeito tais meios constituem um instrumento de dissuasão de comportamentos de risco, bem como de melhoramento (e de controlo) da acção das forças de segurança que têm por missão salvaguardar a segurança de pessoas e bens.
Daí a validade constitucional do seu uso depois de ponderado o potencial lesivo dos direitos liberdades e garantias dos cidadãos que a sua utilização pode representar - artigo 18.º da C.R.P..
Por outro lado os registos, a gravação e o tratamento de dados pessoais têm lugar, apenas, para as finalidades, específicas determinadas na lei (cfr. art. 10º):
- Detecção de infracções rodoviárias e aplicação das correspondentes normas estradais;
- Controlo de tráfego, prevenção e socorro em caso de acidente; - Localização de viaturas furtadas ou procuradas pelas autoridades judiciais ou policiais para efeitos de cumprimento de normas legais, designadamente de carácter penal, bem como a detecção de matrículas falsas em circulação;
-Prova em processo penal ou contra-ordenacional nas diferentes fases processuais.
Estabelecem-se ainda limites à captação, gravação e tratamento (cfr. art.12º) no sentido de que devem corresponder estritamente ao tipo de acção desenvolvida e à finalidade a que se destina, devendo as forças de segurança adoptar as providências necessárias à eliminação dos registos ou os dados pessoais destes constantes que se revelem excessivos ou desnecessários para a prossecução dos procedimentos penais ou contra-ordenacionais.
Dos preceitos legais reproduzidos resulta que a lei exige o inventário e notificação dos equipamentos à CNPD.
Não se encontrando qualquer previsão legal, quer nesta sede, quer no diploma que criou e regulamenta a actividade de CNPD, que fixe a consequência da ausência desta notificação como implicando a ilegalidade ou impossibilidade de “utilização” dos mesmos para efeito do controlo da velocidade dos veículos automóveis na via pública. Muito menos que comine a nulidade da prova por falta da referida notificação.
Aliás a CNPD não detém competência exclusiva da fiscalização da violação dos mencionados direitos, liberdades e garantias, essa função também cumpre, por expressa determinação legal e por maioria de razão, aos tribunais a quem compete, em última instância, fiscalizar as decisões da própria C.N.P.D. Como entidade administrativa independente que funciona junto da Assembleia da República, tem como atribuição genérica controlar e fiscalizar o processamento de dados pessoais, em rigoroso respeito pelos direitos do homem e pelas liberdades e garantias consagradas na Constituição e na lei.
Acresce que o acto omitido (notificação) se esgota na simples comunicação, não exigindo “aprovação”, “homologação” ou “autorização” por parte da CNPD.
Não resultando da ausência dessa notificação, só por si, que tenha sido violada qualquer disposição imperativa de natureza material ou substantiva quer sobre a avaliação técnica e certificação do equipamento quer relativa à sua aprovação pelas entidades competentes, após certificação do IPQ.
De resto, a imagem recolhida foi dirigida ao veículo, mais detalhadamente à sua matrícula. Não se identificando sequer, minimamente, a pessoa do condutor – cfr. fotografia tirada pelo radar junta a fls. 2.
O único dado obtido foi a identificação do veículo, a hora da ocorrência e a velocidade que era imprimida ao veículo. A identificação do titular do direito de propriedade e do condutor apenas foi obtida, a posteriori, a partir do registo correspondente à matrícula da viatura e notificação do titular do registo do direito de propriedade.
O mesmo é dizer, a imagem obtida pelo radar foi utilizada dentro do estritamente necessário para a finalidade pretendida e legalmente admitida: fiscalização da circulação rodoviária para detecção, no caso, da velocidade do veículo, em espaço público, com a finalidade de acautelar o superior interesse público (também do recorrente) na segurança da circulação rodoviária.
Aliás nem o recorrente refere que tenha havido, por qualquer forma, intromissão na sua vida privada ou dos seus dados pessoais – e está em causa apenas o modo de utilização de um veículo automóvel, em local público, o que obriga todos aqueles que utilizam esse espaço público a assumir o risco inerentes ao “convívio” com os demais que tenham necessidade ou queiram utilizar a mesma estrada. Estando assim o espaço de liberdade de cada um reduzido pela “comunhão” forçada na utilização do espaço aberto ao universo de todos os cidadãos.
Sendo certo que em matéria de provas – como em todo o ordenamento jurídico em geral – vigora o princípio da ponderação dos interesses conflituantes, dando prevalência àquele que em concreto surge como preponderante, no caso, em espaço público, o interesse público na segurança da circulação rodoviária.
Não pode assim concluir-se, salvo melhor opinião, que, pela falta de comunicação (que não existia à dada dos factos, como acima se disse, e a lei não estabelece prazo peremptório para o efeito) que, tendo o radar em causa sido homologado e aprovado após certificação pelo IPQ, foi utilizado um método proibido de prova, nos termos previstos no art.º 126.º do Código de Processo Penal, isto porque não cominada a proibição, quer porque os interesses materialmente pressupostos pela proibição dos meios de prova (protecção da intimidade/reserva dos dados pessoais) não se inscreverem no âmbito da protecção da norma violada (mero inventário/notificação.

Resta-nos finalmente a questão relativa á aplicação da sanção acessória de inibição de condução, dirigindo o recorrente a sua pretensão a uma dispensa da mesma nos termos do art.º 141º Código da Estrada.
Vejamos.
Na decisão recorrida são mencionados os argumentos, de facto e de direito, que conduzem à aplicação de sanção acessória de inibição de condução no presente caso, argumentos com os quais concordamos e que atenta a respectiva clareza e adequação aqui nos abstemos de reproduzir.
Por sua vez, o art.º 141º do CE estipula que:
1-Pode ser suspensa a execução da sanção acessória aplicada a contra-ordenações graves no caso de se verificarem os pressupostos de que a lei penal geral faz depender a suspensão da execução das penas, desde que se encontre paga a coima, nas condições previstas nos números seguintes.
2-Se o infractor não tiver sido condenado, nos últimos cinco anos, pela prática de crime rodoviário ou de qualquer contra-ordenação grave ou muito grave, a suspensão pode ser determinada pelo período de seis meses a um ano.
3-A suspensão pode ainda ser determinada, pelo período de um a dois anos, se o infractor, nos últimos cinco anos, tiver praticado apenas uma contra-ordenação grave, devendo, neste caso, ser condicionada, singular ou cumulativamente:
a) À prestação de caução de boa conduta;
b) Ao cumprimento do dever de frequência de acções de formação, quando se trate de sanção acessória de inibição de conduzir;
c) Ao cumprimento de deveres específicos previstos noutros diplomas legais.
4-A caução de boa conduta é fixada entre € 500 e € 5000, tendo em conta a duração da sanção acessória aplicada e a situação económica do infractor.
5-Os encargos decorrentes da frequência de acções de formação são suportados pelo infractor.
6-A imposição do dever de frequência de acção de formação deve ter em conta a personalidade e as aptidões profissionais do infractor, não podendo prejudicar o exercício normal da sua actividade profissional nem representar obrigações cujo cumprimento não lhe seja razoavelmente exigível.”
Verifica-se, pois, uma remissão para o instituto da suspensão de execução da pena constante do Código de Processo Penal.
Segundo o art. 50°, n.º 1, do Cód. Penal, «o tribunal suspende a execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a 3 anos (5 anos, na versão introduzida pela Lei 59/2007 de 4 de Setembro) se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição».
O pressuposto material de aplicação da suspensão da execução da pena é que o tribunal, atendendo à personalidade do agente e às circunstâncias do facto, conclua por um prognóstico favorável relativamente ao comportamento do arguido - que a simples censura do facto e a ameaça da pena, acompanhada, ou não, da imposição de deveres e (ou) regras de conduta, bastarão para o afastar da criminalidade.
No caso da sanção acessória de inibição de conduzir, o pressuposto material da suspensão da sanção acessória preenche-se sempre que seja possível concluir que a simples censura do facto e a ameaça da sanção de inibição de conduzir, acompanhada ou não da imposição de certos deveres, bastarão para a emenda cívica do condutor.
Tal juízo favorável tem de se fundar em motivos positivos, de real importância, que sustentem um prognóstico favorável relativamente ao comportamento rodoviário do condutor. Para a sua formulação o tribunal deverá atender especialmente às circunstâncias do facto, à conduta do condutor anterior e posterior ao facto e às suas condições de vida, designadamente, ao reflexo do cumprimento da sanção na vida quotidiana do condutor.
Ora este aspecto particular já foi objecto de apreciação na sentença recorrida que faz apelo a argumentos fácticos relativos à existência de anteriores contra-ordenações praticadas pelo recorrente, sendo uma delas determinativa da reincidência a que alude o art.º 143º CE.
O comportamento rodoviário do recorrente, expresso pelas condenações anteriores sofridas, constitui razão séria para duvidar da capacidade do recorrente para se comportar como um condutor prudente e respeitador das regras da circulação rodoviária.
Sendo a finalidade político-criminal que a lei visa com o instituto da suspensão da execução da sanção acessória de inibição de conduzir o afastamento do condutor, no futuro, da prática de novas infracções rodoviárias, um prognóstico favorável fundamentador da suspensão não se mostra sustentado no caso.
O comportamento rodoviário do recorrente, anterior aos factos, constitui razão séria para duvidar da capacidade do recorrente de, com a mera ameaça de cumprimento da sanção acessória de inibição de conduzir, mesmo que com a sua submissão a outros deveres, interiorizar as exigências cívicas de adequar a sua condução à observância das regras de circulação rodoviária, o que afasta a prognose social favorável ao arguido que os tratadistas exigem – veja-se o Prof. Jescheck (in "Tratado de Derecho Penal", ed. em língua espanhola, vol. 11, pág. 1154):
«A prognose social favorável do arguido, que sempre se deverá ver ficar, consiste na esperança de que o condenado sentirá a condenação como uma advertência e não cometerá no futuro nenhum delito... Esperança não significa certeza. O tribunal deve estar disposto a assumir um risco prudente, mas se existem dúvidas sérias sobre a capacidade do condenado para compreender a oportunidade de ressocialização que lhe é oferecida, a prognose deve ser negativa, o que de facto supõe um “in dubio contra reum" A prognose exige uma valoração total de todas as circunstâncias que tornam possível uma conclusão sobre a conduta futura do arguido. Estas circunstâncias são, a sua personalidade (por ex. inteligência e carácter), a sua vida anterior (por ex., outros delitos anteriormente cometidos da mesma ou de outra natureza), as circunstâncias do delito (por ex., motivações e fins), o seu comportamento depois de ter cometido o crime (por ex., reparação do dano, arrependimento), as circunstâncias da sua vida (por ex. profissão, casamento e família) e os efeitos que se esperam da suspensão... Não há nenhuma razão para excluir regularmente do beneficio da suspensão da pena determinados grupos de crimes como... os crimes violentos... A gravidade da ilicitude e da culpa só deve tomar-se em conta no facto julgado quando dele possa derivar um perigo de reincidência. A prognose deve ser entendida num sentido puramente preventivo especial, e não tendo em conta os critérios de prevenção geral.”
Da ponderação e valoração global de todas as apontadas circunstâncias e condições pode concluir-se que as mesmas não permitem, agora, esperar que o arguido, tendo já sentido, até pela medida e espécie de sanções a que foi sujeito, a censura e condenação da sua conduta, tomará a nova sanção acessória, agora sem a possibilidade de qualquer dúvida, como uma advertência séria, muito séria até, e não cometerá no futuro mais nenhum delito.
Isto é, inexistem razões para crer que, em concreto, «...a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição».
Nem mesmo a alegada necessidade de conduzir em função da profissão, uma vez que já preexistia à data da contra-ordenação ora em apreço e tal não inibiu o recorrente no respectivo cometimento, não seria de molde a, no quadro dado, enfraquecer as exigências de prevenção especial, tanto mais que não ficou provado que o cumprimento da sanção acessória venha a comprometer irremediavelmente o seu posto de trabalho, e não são susceptíveis de, por si só, suportar um juízo sobre o carácter favorável da prognose.
Termos em que também, nesta parte, é por demais evidente a ausência de razão por parte do recorrente.
III.
Termos em que, por unanimidade e manifesta improcedência, se rejeita o recurso, confirmando a decisão recorrida.
Custas a cargo do recorrente fixando a taxa de justiça em 6 UC's de (art.º 87.º n.º1 al. c) e 3 do CCJ aprovado pelo DL 324/2003 de 27/12) e em 3 UC’s a importância a que alude o art.º 420º n.º 3 CPP.