Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | PEREIRA RODRIGUES | ||
Descritores: | USUCAPIÃO | ||
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Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 04/26/2007 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | REVOGADA A DECISÃO | ||
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Sumário: | I. A posse susceptível de conduzir à usucapião, tem de revestir sempre duas características, quais são as de ser pública e pacífica (arts. 1293°, al. a), 1297° e 1300°, n.° 1). II. As restantes características que a posse eventualmente revista, como ser de boa ou de má fé, titulada ou não titulada, recair sobre móvel ou imóvel e estar ou não inscrita no registo, tem influência apenas no prazo necessário à usucapião. III. O tempo necessário é mais curto ou mais longo conforme exista boa ou má fé e conforme os restantes caracteres permitam inferir uma maior ou menor probabilidade da existência do direito na titularidade do possuidor e uma maior ou menor publicidade da relação de facto. IV. Assim, tratando-se de imóveis, o prazo de usucapião é menor se o possuidor estiver de boa fé e se houver registo, quer do título, quer da mera posse (arts. 1294º a 1296°); tratando--se de móveis sujeitos a registo, aquele prazo é mais curto se houver boa fé do possuidor e título de aquisição registado (art. 1298°); tratando-se, finalmente, de outras coisas móveis, o prazo da usucapião é mais breve no caso de haver boa fé e título de aquisição (art. 1299°). V. O prazo da usucapião varia, ainda, conforme a posse incida sobre coisas móveis ou imóveis: é mais curto em relação às primeiras por se entender que, tratando-se de bens negociados amiúde e cuja exacta situação jurídica é, em regra, mais difícil de averiguar do que a dos imóveis, deve ser decidido em prazo não muito dilatado o conflito entre o titular do direito e aquele que exerce um poder de facto sobre a coisa como se, em relação a ela, dispusesse de um direito real definitivo. VI. A usucapião, uma vez verificados todos os seus pressupostos, não opera ipso jure, nem pode ser conhecida ex officio pelo julgador, pois que necessita de ser invocada por aquele a quem aproveita, pelo seu representante ou, tratando-se de incapaz, pelo Ministério Público (art. 303°, aplicável por força do disposto no art. 1292º). VII. Invocada triunfantemente a usucapião, os seus efeitos retrotraem-se à data do início da posse (art. 1288°). (P.R.) | ||
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Decisão Texto Integral: | ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA: I. OBJECTO DO RECURSO. No Tribunal Judicial da Comarca de Sintra, Ivone, José, Maria, Sérgio e Paula moveram contra Hermínia, Manuel, José e Emília, a presente acção declarativa, com processo comum, sob a forma ordinária, pedindo: - se declare serem os Autores os donos do prédio a que se referem os arts. 2°, 5° e 7° da petição inicial, por o haverem adquirido por usucapião; - se ordene o cancelamento da inscrição G-2 de aquisição do mesmo prédio a favor da Ré Hermínia, casada com o Réu Manuel; - se condene todos os Réus a reconhecerem o direito de propriedade dos Autores sobre o mesmo prédio, abstendo-se de qualquer acto que contenda com tal direito; - se condene os Réus a retirarem a demarcação que efectuaram do lado poente do seu lote 15, desse modo respeitando os limites do lote 14. Para tanto invocam os Autores, em síntese, que: São herdeiros de Alcino, falecido em 6-8-99, o qual, em 17-2-71, deu o montante de 15.000$00 a Delfim, como sinal e princípio de pagamento de um terreno que este havia desanexado de um outro de que era proprietário. A escritura pública não se veio a realizar pelo facto de este prédio se encontrar onerado por hipoteca constituída pelo seu então proprietário a favor de um credor. Não obstante a não realização da escritura pública, o referido Alcino tomou de imediato posse do terreno, passando a cultivá-lo e a tomar conta dele como seu proprietário, de forma ininterrupta e à vista de toda a gente, o que foi prosseguido pelos ora Autores. Quando os Autores pretenderam delimitar o terreno colocando uma cerca de rede, foram impedidos pelos 1°s Réus, que se arrogaram seus proprietários por este lhes haver sido adjudicado no âmbito de um processo de execução fiscal movido contra Delfim. Os referidos Réus já antes haviam intentado uma acção contra Delfim e sua mulher por via da qual obtiveram a declaração de que haviam adquirido por usucapião o lote n° 15, contíguo ao lote 14° a que aludem os Autores como sendo o seu. E fizeram-no por se encontrar o aludido prédio onerado da mesma forma que o lote 14 a que se referem os Autores, pelo que não eram estes desconhecedores da situação de detenção por parte dos Autores. Por outro lado, os 2° e 3° Réus adquiriram por compra, em 2002, o lote 15, que confronta a Poente com o lote 14 a que aludem os Autores, cancelada que fora a penhora e hipoteca que incidiam sobre o prédio. Estes, porém, delimitaram a propriedade por si adquirida na extrema poente entrando dentro do terreno a cuja propriedade os Autores se arrogam. Os Réus apresentaram contestação, alegando, em suma, que: Os AA eram conhecedores do processo de execução fiscal que correu contra Delfim, sendo que os Réus vêm cultivando o terreno em causa desde que o adquiriram em 1996, o que fizeram à vista de toda a gente e com o conhecimento de todos que por ali passavam, sem que nem os AA, ou antes deles Alcino, manifestassem qualquer oposição. Ainda, no que respeita ao lote 15, esclarecem os Réus que a extrema dos dois prédios se encontra traçada há pelo menos 30 anos, sem que tenha sido objecto de qualquer reclamação por parte de quem quer que fosse e ainda que o lote 15, contrariamente ao que consta da respectiva descrição predial, tem a área de 365,5 metros quadrados e não 400 metros Concluem peticionando a condenação dos Autores em multa e numa indemnização aos Réus no valor de 1.500 Euros, como litigantes de má fé, por deduzirem pretensão cuja falta de fundamento não deviam ignorar. Prosseguiram os autos os seus trâmites, sendo proferido despacho saneador e elaborada a especificação e a base instrutória e, por fim, procedeu-se a audiência de discussão e julgamento, sendo depois proferida sentença, julgando a acção parcialmente procedente e, em consequência: - declarando serem os Autores os proprietários do prédio urbano, terreno para construção, sito em … Sintra, designado por lote …, descrito na 1.ª Conservatória do Registo Predial de Sintra sob o n.° …., por o haverem adquirido por usucapião; - ordenando o cancelamento da inscrição G-2 de aquisição do mesmo prédio a favor da Ré Hermínia, casada com o Réu Manuel ; - condenando todos os Réus a reconhecerem o direito de propriedade dos Autores sobre o mesmo prédio, procedendo os Réus Hermínia e Manuel à sua restituição aos Autores; - absolvendo os Réus José e mulher Emília do pedido relativo à demarcação que efectuaram no lado poente do seu lote 15. | Inconformados com a decisão, vieram os RR. interpor recurso para este Tribunal da Relação, apresentando doutas alegações, com as seguintes CONCLUSÕES: 1°. - Os factos constantes dos números 1 a 5 da matéria de facto resultante da instrução da causa não traduzem, de acordo com as exigências da lei, a existência de posse boa para usucapião. 2°. — Resumindo-se a relação do Alcino, antecessor dos Apelados, com o prédio ajuizado, a um acordo verbal de compra estabelecido com o então proprietário, a posse efectiva do prédio por parte do referido Alcino apenas poderia ser adquirida por inversão do título de posse. 3°. - Somente se podendo iniciar a contagem do tempo que possibilitaria a aquisição da propriedade por usucapião após se ter operado tal inversão. 4°. — Da matéria provada não resulta que o Alcino tenha agido com "animus possidendi" em relação ao prédio ajuizado, ou sequer que em relação a ele tenha praticado quaisquer actos de posse. 5°. — Não configurando tal "animus" a "autorização" que prestou ao André de Carvalho para este, no mencionado prédio, cultivar produtos agrícolas. 6°. — Sabendo-se que o André cultivou tais produtos no prédio após o ano de 1971, o que fez durante alguns anos até ao ano de 1991, não se sabe igualmente durante quantos anos o fez. 7°. — A circunstancia de o uso que o André fez do terreno ajuizado ter ocorrido à vista de todos e sem oposição de ninguém, designadamente do Delfim de Magalhães, apenas pode relevar de uma mera situação de tolerância e não mais do que isso. E sendo assim, não se encontram provados os requisitos, nem sequer temporais, de que a lei faz depender a aquisição da posse por usucapião, pelo que deve ser revogada a decisão recorrida. Os AA. contra-alegaram, pugnando pela manutenção da decisão recorrida. Admitido o recurso na forma, com o efeito e no regime de subida devidos, subiram os autos a este Tribunal da Relação, sendo que nada obstando ao conhecimento do mesmo, cumpre decidir. A questão a resolver é a de saber se se mostram, ou não, reunidos os requisitos para aquisição da posse por usucapião. | II. FUNDAMENTOS DE FACTO. (…) | III. FUNDAMENTOS DE DIREITO. Estabelece o art. 1287° do CC que a posse do direito de propriedade ou de outros direitos reais de gozo mantida por certo lapso de tempo, faculta ao possuidor, salvo disposição em contrário, a aquisição do direito a cujo exercício corresponde a sua actuação: é o que se chama usucapião. Para que se verifique a aquisição do direito de propriedade com base na usucapião é indispensável se reúnam os seguintes requisitos: a) a posse do bem; b) o decurso de certo período de tempo e c) a invocação triunfante desta forma de aquisição. A usucapião é uma forma originária de aquisição do direito de propriedade baseada na posse, numa posse em nome próprio, de uma intenção de domínio, e uma intenção que não deixe dúvidas sobre a sua autenticidade V. Prof. Orlando de Carvalho, Introdução à Posse, Revista de Legislação e Jurisprudência, 122, pág. 67.. Como decorre do art. 1251° CC posse é o poder que se manifesta quando alguém actua por forma correspondente ao exercício do direito de propriedade ou de outro direito real. Nesta definição legal de posse se insere a nota do "corpus" - quando alguém actua - e a nota do "animus" - por forma correspondente ao exercício do direito de propriedade ou de outro direito real. E uma relação entre "corpus", enquanto exercício de poderes de facto que encerre uma vontade de domínio, e "animus", enquanto intenção jurídica ou vontade de agir como titular de um direito real V. Durval Ferreira, Posse e Usucapião, pág. 126 e seg, Almedina.. A posse susceptível de conduzir à usucapião, tem de revestir sempre duas características, quais são as de ser pública e pacífica (arts. 1293°, al. a), 1297° e 1300°, n.° 1). As restantes características que a posse eventualmente revista, como ser de boa ou de má fé, titulada ou não titulada e estar ou não inscrita no registo, tem influência apenas no prazo necessário à usucapião. O lapso de tempo necessário à usucapião é variável conforme a natureza móvel ou imóvel dos bens sobre que a posse incida e conforme os caracteres que esta revista. O tempo necessário é mais curto ou mais longo conforme exista boa ou má fé e conforme os restantes caracteres permitam inferir uma maior ou menor probabilidade da existência do direito na titularidade do possuidor e uma maior ou menor publicidade da relação de facto. Assim, tratando-se de imóveis, o prazo de usucapião é menor se o possuidor estiver de boa fé e se houver registo, quer do título, quer da mera posse (arts. 1294º a 1296°); tratando--se de móveis sujeitos a registo, aquele prazo é mais curto se houver boa fé do possuidor e título de aquisição registado (art. 1298°); tratando-se, finalmente, de outras coisas móveis, o prazo da usucapião é mais breve no caso de haver boa fé e título de aquisição (art. 1299°). O prazo da usucapião varia ainda conforme a posse incida sobre coisas móveis ou imóveis: é mais curto em relação às primeiras por se entender que, tratando-se de bens negociados amiúde e cuja exacta situação jurídica é, em regra, mais difícil de averiguar do que a dos imóveis, deve ser decidido em prazo não muito dilatado o conflito entre o titular do direito e aquele que exerce um poder de facto sobre a coisa como se, em relação a ela, dispusesse de um direito real definitivo V. M Henrique Mesquita, in Direitos Reais, pg. 97 e ss. e L. A. Carvalho Fernandes in Lições de Direitos Reais, 4.ª Ed., pg. 232 e ss.. Refira-se ainda que a usucapião, uma vez verificados todos os seus pressupostos, não opera ipso jure, nem pode ser conhecida ex officio pelo julgador, pois que necessita de ser invocada por aquele a quem aproveita, pelo seu representante ou, tratando-se de incapaz, pelo Ministério Público (art. 303°, aplicável por força do disposto no art. 1292º). Invocada triunfantemente a usucapião, os seus efeitos retrotraem-se à data do início da posse (art. 1288°). Por outro lado, é preciso ter presente que a base de toda a nossa ordem imobiliária não está no registo, mas na usucapião. Esta como claramente resulta do art. 7° do C.R. Predial em nada é prejudicada pelas vicissitudes registrais. Por isso, o que se fixou no registo passa à frente dos títulos substantivos existentes, mas nada pode contra a usucapião V. Prof. Oliveira Ascensão, in Direito Civil Reais, 5.ª ed. pág. 382.. E com estas considerações se pensa contribuir para clarificar a questão essencial a resolver no caso em recurso, que é a de saber se se mostram, ou não, reunidos os requisitos para aquisição da posse por usucapião. Na douta sentença recorrida entendeu-se que se mostravam reunidos tais requisitos, com a seguinte fundamentação: “Resultou provado nos autos que no ano de 1971, Alcino acordou com Delfim comprar-lhe o supra referido lote 14. Após a data referida, Alcino autorizou André a cultivar produtos agrícolas, como batatas e legumes, no mencionado lote, o qual o fez, sempre com a autorização de Alcino, durante alguns anos, antes do ano de 1991. Dos factos descritos resulta que o falecido Alcino agia como sendo o proprietário do terreno, assumindo deter o poder de autorizar, como fez, o seu cultivo. A posse que o falecido exercia por intermédio do terceiro a quem autorizara a cultivar o terreno era pública e pacífica, já que os factos descritos ocorriam à vista de todos e sem oposição de ninguém, designadamente do Delfim e dos familiares deste. A situação manteve-se nos termos que se encontram descritos até à data em que a Autora pretendeu depositar no terreno materiais de construção - ou, no mínimo, até Junho de 1996, sendo que posteriormente a tal data, a dada altura os Réus terão iniciado o seu cultivo -tendo sido impedida pelos Réus Hermínia e Manuel, que os impediram de o fazer, invocando ter adquirido a propriedade sobre o terreno. Assim, o lapso de tempo decorrido de posse exercida sobre o imóvel, pelos AAs. E pelos seus ante-possuidores, é susceptível de atribuir aos AAs um título originário de aquisição - a usucapião - uma vez que ultrapassa o período máximo necessário que a lei prevê para que os seus efeitos possam operar (arts. 1287° e segs. do Código Civil), tendo-se esta por invocada contanto que seja alegado e provado o complexo fáctico que lhe é subjacente”. Dissentem deste entendimento os Apelantes, alegando que resumindo-se a relação do Alcino, antecessor dos Apelados, com o prédio ajuizado, a um acordo verbal de compra estabelecido com o então proprietário, a posse efectiva do prédio por parte do referido Alcino apenas poderia ser adquirida por inversão do título de posse. Somente se podendo iniciar a contagem do tempo que possibilitaria a aquisição da propriedade por usucapião após se ter operado tal inversão. Alegando mais que da matéria provada não resulta que o Alcino tenha agido com "animus possidendi" em relação ao prédio ajuizado, ou sequer que em relação a ele tenha praticado quaisquer actos de posse. Não configurando tal "animus" a "autorização" que prestou ao André para este, no mencionado prédio, cultivar produtos agrícolas. Sabendo-se que o André cultivou tais produtos no prédio após o ano de 1971, o que fez durante alguns anos até ao ano de 1991, não se sabe igualmente durante quantos anos o fez. Invocando ainda que a circunstância de o uso que o André fez do terreno ajuizado ter ocorrido à vista de todos e sem oposição de ninguém, designadamente do Delfim, apenas pode relevar de uma mera situação de tolerância e não mais do que isso. Ora, parece que aos Apelantes assiste razão. Com efeito, a matéria de facto com relevo para a decisão da causa é apenas a seguinte: No ano de 1971, Alcino … acordou com Delfim … comprar-lhe o lote em litígio e após esta data o primeiro, Alcino, autorizou André a cultivar produtos agrícolas, como batatas e legumes, no mencionado lote, o que este, André, fez, sempre com a autorização de Alcino, durante alguns anos, antes do ano de 1991, sendo que o lote em questão esteve delimitado com estacas em madeira. Os factos descritos ocorriam à vista de todos e sem oposição de ninguém, designadamente do Delfim e dos familiares deste. Acontece que no ano de 2002, a Autora Ivone pretendia depositar materiais de construção numa parte do terreno que entende integrar o lote em apreço, mas os RR. Hermínia e Manuel impediram-na de o fazer, tendo-se referido à aquisição do mesmo lote. Como se constata, os factos que resultaram assentes da discussão da causa são manifestamente insuficientes para que os AA pudessem invocar com êxito a usucapião como forma de aquisição do lote de terreno em disputa nos autos, ou seja, para que a procedência da acção pudesse ter lugar. Com efeito, não se provou que os AA., ora Apelados, Ivone, José e Sérgio, únicos e universais herdeiros de Alcino, falecido a 6 de Agosto de 1999, tenham exercido quaisquer actos de posse, pública, pacífica e por forma correspondente ao exercício do direito de propriedade sobre o aludido lote de terreno. Provou-se tão-só que no ano de 2002, a Autora Ivone pretendia depositar materiais de construção numa parte do terreno que entendia integrar o lote em questão e que os RR., ora Apelantes, Hermínia e Manuel, impediram-na de o fazer, tendo-se referido à aquisição do mesmo lote. Mesmo em relação ao Alcino não se provou que o mesmo tenha exercido sobre o terreno dos autos posse que tenha ido além de uma posse precária, baseada na mera tolerância do dono do terreno Delfim, pois que, muito embora o primeiro tenha acordado com o segundo comprar-lhe o lote em litígio, não se mostrou que tal compra se tenha concretizado, nem até que tenha sido liquidada por parte do primeiro qualquer importância a título de pagamento do respectivo preço. É certo que após aquele acordo, Alcino, autorizou André a cultivar produtos agrícolas, como batatas e legumes, no mencionado lote (que esteve delimitado com estacas), o que este, André, fez durante alguns anos, sempre com a autorização de Alcino e sem oposição do Delfim. Sucede que tudo pode ter acontecido por mera tolerância do dono do terreno com vista à realização do contrato da compra e venda do terreno, que afinal nunca se veio a concretizar. E, a ser assim, o Alcino não poderia adquirir por usucapião, a não ser após se achar invertido o título da posse, mas neste caso o tempo necessário para a usucapião só começaria a correr após a inversão do título (art. 1290º). De qualquer modo, estaríamos perante uma posse não titulada, que se presume de má fé e que teria de verificar-se por mais de vinte anos para com base na mesma pudesse operar a usucapião (art.s 1260º/2 e 1296º) e no caso não se provou durante quanto tempo o André, com a autorização de Alcino e sem oposição do Delfim, cultivou o terreno em discussão, pois que a prova se quedou pela referência a alguns anos. Convenhamos que seria necessário que os factos traduzissem uma “conditio possidentis” por parte dos AA, ora Apelados, e do seu antecessor Alcino, mais persuasiva que aquela que resultou provada para que se pudesse concluir por uma intenção de domínio dilatada no tempo sobre o lote de terreno litigado, por aqueles exercida, que não deixasse dúvidas sobre a verificação dos necessários pressupostos para a aquisição da propriedade com fundamento na usucapião. Tal não se verifica no caso em apreciação no presente recurso, pelo que há que dar razão aos Apelantes e de revogar a douta sentença, para julgar a acção improcedente. Procedem, por isso, as conclusões do recurso, sendo de revogar a decisão recorrida. | IV. DECISÃO: Em conformidade com os fundamentos expostos, concede-se provimento à apelação e revoga-se a sentença recorrida, julgando-se a acção improcedente por não provada e absolvendo-se os RR, ora Apelantes, do pedido. Custas nas instâncias pelos Apelados. Lisboa, 26 de Abril de 2007. FERNANDO PEREIRA RODRIGUES FERNANDA ISABEL PEREIRA MARIA MANUELA GOMES |