Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | FARINHA ALVES | ||
Descritores: | LIQUIDAÇÃO EM EXECUÇÃO DE SENTENÇA LIQUIDAÇÃO EM EXECUÇÃO INCIDENTE INOMINADO ERRO NA FORMA DO PROCESSO REQUERIMENTO EXECUÇÃO | ||
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Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 07/16/2009 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | REVOGADA PARCIALMENTE A DECISÃO | ||
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Sumário: | I- A liquidação da sentença deve ser promovida nos termos dos art. 378.º n.º 2 e 471.º, n.º 2, ambos do CPC, em incidente deduzido na acção onde foi proferida a sentença a liquidar, com renovação da respectiva instância, se já finda. II- A determinação da decisão no sentido de a liquidação ser efectuada em execução de sentença não está abrangida pelo âmbito do respectivo caso julgado. III- Tendo o Exequente optado por promover imediatamente a execução, liquidando ali a dívida exequenda, julga-se que se está perante um simples erro na forma do processo, que pode ser enquadrado na previsão do art. 199.º do CPC. E, como a liquidação promovida em sede de execução não oferece menores garantias do que a processada em incidente deduzido na acção declarativa, admite-se que esse simples facto não devesse inviabilizar a apreciação do pedido de liquidação deduzido no próprio requerimento executivo, como preliminar da execução. (Sumário do Relator - FA) | ||
Decisão Texto Parcial: | ![]() | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa Por sentença proferida pela Secção da Vara Cível de Lisboa em 18/01/2005, transitada em julgado, foi a ora apelada condenada a: - Retirar quaisquer floreiras que nas suas varandas ou terraços ainda se encontrem construídas, bem como a proceder à impermeabilização das ditas varandas de molde a evitar a ocorrência de infiltrações através das mesmas para a fracção do autor; - Pagar ao autor as obras de reparação na sua fracção em consequência das ditas infiltrações, avaliadas no montante de €1.496,39; - Pagar ao autor o valor dos quatro pares de sapatos, dois blazeres, dois pares de calças, lençóis e roupa de cama estragados em consequência das referidas infiltrações, cujo valor será apurado em sede de execução de sentença; - A pagar ao autor o montante relativo à reparação e envernizamento dos móveis descritos na alínea J), a liquidar em execução de sentença; Em execução dessa sentença, o ora apelante requereu o pagamento da quantia total de € 8 431,53, sendo: - € 4 681,53 das obras de reparação. - € 2 250,00 do valor dos quatro pares de sapatos, dois blazeres, dois pares de calças, lençóis e roupa de cama; - € 1 500,00, da reparação e envernizamento dos móveis. A executada deduziu oposição a tal execução, pretendendo que a quantia exequenda seja limitada ao montante de € 1 496,39, estabelecido na sentença condenatória para as obras de reparação. No mais, defende que o exequente tinha de ter começado por requerer a liquidação do julgado, justificando concretamente o valor dos bens que sofreram danos e o custo da reparação dos móveis, liquidação que, em rigor, deveria ter sido requerida nos termos do art.378.º do C. P.Civil. Recebida a oposição, o exequente contestou alegando, em síntese, que a lei permite liquidar o pedido em execução de sentença, tal como resulta da própria sentença, defendendo que foi isso que fez, e os termos em que o fez. No seguimento, foi proferida decisão a limitar o prosseguimento da execução ao montante de € 1.496,39 e juros, respeitante a obras, julgando-a extinta no mais, por não estar liquidada esta parte da dívida exequenda, e a liquidação não depender de simples cálculo aritmético. E, nos termos do art. 819.º do CPC, foi o exequente condenado em multa no montante de 10 UC. Inconformado, o exequente apelou do assim decidido, tendo apresentado alegações onde formula as seguintes conclusões: 1 - A douta sentença de 18 de Janeiro de 2005 não condenou a Executada a pagar ao Exequente apenas a quantia de € 1.496,39. 2 - Essa sentença condenou também a Executada a pagar ao Exequente: a) - o valor dos quatro pares de sapatos, dois blazeres, dois pares de calças, lençóis e roupa de cama estragados em consequência das referidas infiltrações, cujo valor será apurado em execução da sentença, b) - e o montante relativo à reparação e envernizamento de vários armários existentes no quarto de cama, da sala de jantar e na sala de estar do Autor danificados pela água, a liquidar em execução de sentença. 3 - A liquidação feita pelo Exequente quanto ao valor das obras de reparação teve suporte nas duas facturas correspondentes ao custo dessas obras no valor de € 4.681,53 conforme documentos n.º 2 e 3 juntos com o Requerimento Executivo. 4 - Quanto à reparação e envernizamento dos móveis danificados pela água e quanto aos quatro pares de sapatos, dois blazeres, dois pares de calças, lençóis e roupa de cama estragados em consequência das referidas infiltrações, a liquidação tem suporte na sentença condenatória de 18 de Janeiro de 2005, que relegou a fixação do respectivo valor para a execução da sentença. 5 - A lei permite liquidar os pedidos em execução de sentença, tal como resulta da própria sentença. 6 - Foi isso que o Exequente fez no Requerimento Executivo. 7 - Atento o disposto nos Artigos 802.°, 805.° n.º 1 e 810.º n.º 3 alínea c) e do C. P. C. é possível fazer a liquidação dos pedidos no Requerimento Executivo. 8 - O Mmo. Juiz a quo não atendeu devidamente à sentença de 18 de Janeiro de 2005 e interpretou erradamente o disposto nos Artigos 47.°, 378.° n.º 2 e 379.°, 661 e 805.° do C. P. C. 9 - Ao condenar o Exequente a uma multa de 10 UC por alegada falta de prudência o Mmo. Juiz aplicou erradamente o disposto no Artigo 819.° do C. P. C. Não foram apresentadas contra-alegações. Sendo o objecto dos recursos delimitado pelas conclusões, está em causa na presente apelação saber: - Se a liquidação da dívida exequenda, na parte respeitante a obras, encontra fundamento na sentença em execução. - Se pode ser atendida a liquidação das demais obrigações que foi feita no requerimento executivo. O que passa por saber se a liquidação pode ser requerida no próprio requerimento de execução e, na afirmativa, se o requerimento de liquidação pode ser considerado apto a suportar o pedido formulado. - Se não deve ser mantida a condenação em multa. Com interesse para a decisão importa ter em conta os termos da decisão que serve de fundamento à execução e os termos do requerimento executivo. Na parte relevante, a sentença em execução condenou a ré a: - Pagar ao autor as obras de reparação na sua fracção em consequência das ditas infiltrações, avaliadas no montante de €1.496,39; - Pagar ao autor o valor dos quatro pares de sapatos, dois blazeres, dois pares de calças, lençóis e roupa de cama estragados em consequência das referidas infiltrações, cujo valor será apurado em sede de execução de sentença; - A pagar ao autor o montante relativo à reparação e envernizamento dos móveis descritos na alínea J), a liquidar em execução de sentença; E o requerimento executivo foi formulado nos seguintes termos: Por douta sentença de 18 de Janeiro de 2005 já transitada em julgado, foi a Executada condenada a pagar ao Exequente: a) - as obras de reparação na sua fracção sita …. em Lisboa, em consequência das infiltrações causadas pela colocação de floreiras e falta de impermeabilização das varandas existentes na fracção pertencente à Executada. b) - o valor de quatro pares de sapatos, dois blazeres, dois pares de calças e lençóis e roupa de cama estragados em consequência das referidas infiltrações, cujo valor será apurado em execução de sentença; c) - o montante relativo à reparação e envernizamento de vários armários existentes no quarto de cama, na sala de jantar e na sala de estar do Exequente danificados pela água, a liquidar em execução de sentença. Quanto à alínea a) o custo das obras de reparação na fracção do Exequente em consequência das infiltrações causadas pela Executada foram avaliadas em € 1.496,39 no âmbito de uma peritagem efectuada em Novembro de 1998 num Incidente de Produção Antecipada de Prova que antecedeu a acção declarativa de condenação iniciada pelo Exequente contra a Executada. Desde essa data já decorreram cerca de 7 anos e meio, estando por isso o custo das obras de reparação subavaliado, pelo aumento do custo da mão-de-obra e dos materiais. O Exequente já efectuou as obras de reparação que o Executado foi condenado a pagar tendo nessas obras dispendido a quantia de € 4.681,53 conforme facturas que se anexam. Quanto à alínea b) o custo dos quatro pares de sapatos, dois blazeres, dois pares de calças e lençóis e roupa de cama estragados com as infiltrações importam em € 2.250,00 valor que aqui se liquida e que a Executada deve ao Exequente. Quanto à alínea c) o custo da reparação e envernizamento dos móveis que a Executada foi condenada a pagar totaliza o montante de € 1.500,00 valor que aqui também se liquida e que a Executada deve ao Exequente. Deve assim a Executada ao Exequente a quantia de € 8.431,53 e juros. Vejamos: 1 – O valor da condenação respeitante a obras de reparação Como se viu, a aqui executada foi condenada a pagar ao autor as obras de reparação na sua fracção em consequência das ditas infiltrações, avaliadas no montante de €1.496,39; Pretende saber-se se estamos perante uma condenação no pagamento de quantia determinada – o indicado montante de €1.496,39 – ou se, como pretende o Apelante, aquela condenação tem por objecto o pagamento do custo das obras, sendo admissível a discussão desse custo em sede de liquidação do julgado. A resposta a esta questão não será inteiramente inequívoca, e a fundamentação da sentença não ajuda ao seu esclarecimento. Pois que a avaliação referida na decisão condenatória não está minimamente reflectida na matéria de facto provada, onde, no que respeita aos danos em causa, apenas consta que «as infiltrações de água destruíram o estuque dos tectos e paredes do andar do A.», sem qualquer outra especificação, seja quanto à dimensão das áreas a reparar, seja quanto ao respectivo custo. A avaliação ali referida, diz agora o Exequente, terá sido feita em Novembro de 1998. E, para além disso, não se sabe o que é que foi alegado e submetido a prova, sabendo-se apenas que a matéria de facto provada não permitia fixar o custo das obras, nem a dimensão destas. Pelo que, em bom rigor, o tribunal da decisão deveria ter relegado a liquidação deste dano para momento posterior, nos mesmos termos em que decidiu em relação aos demais danos que julgou provados, sem ter conseguido determinar o seu valor. Mas, vistos os termos da decisão, em especial no confronto dos seus diversos segmentos, julga-se que não foi isso que o tribunal fez, tendo antes condenado no pagamento de quantia determinada. Pois que, quando quis remeter a liquidação dos danos para momento posterior, afirmou-o expressamente, como, de resto, lhe competia. E, no caso da condenação fundada na necessidade de obras, não só não remeteu a sua liquidação para execução de sentença, como indicou o respectivo valor, por referência a uma determinada avaliação. Trata-se, pois, de uma condenação em montante líquido. E, uma vez que a decisão assim proferida transitou em julgado, impõe-se a ambas as partes e ao próprio tribunal, que não a pode alterar. Ou seja, a decisão ora recorrida não merece censura quando limitou a dívida exequenda, na parte respeitante à realização de obras, ao montante de € 1496,39 estabelecido na decisão condenatória. 2 – A liquidação das demais obrigações. Como se viu, na acção declarativa a Ré foi ainda condenada a: - Pagar ao autor o valor dos quatro pares de sapatos, dois blazeres, dois pares de calças, lençóis e roupa de cama estragados em consequência das referidas infiltrações, cujo valor será apurado em sede de execução de sentença; - A pagar ao autor o montante relativo à reparação e envernizamento dos móveis descritos na alínea J), a liquidar em execução de sentença; Ou seja, tendo julgado provada a existência dos danos assim identificados, e não dispondo de elementos para a determinação do seu valor, o tribunal relegou essa determinação para momento posterior. Estamos, pois, perante obrigações cuja liquidação tinha de ser promovida pelo credor. Na decisão em causa consignou-se que essa liquidação haveria de ser feita em sede de execução de sentença. Mas tal não é exacto. Como vem referido nos autos, a liquidação da sentença deve ser promovida nos termos dos art. 378.º n.º 2 e 471.º, n.º 2, ambos do CPC, em incidente deduzido na acção onde foi proferida a sentença a liquidar, com renovação da respectiva instância, se já finda. A determinação da decisão no sentido de a liquidação ser efectuada em execução de sentença não está, segundo se julga, abrangida pelo âmbito do respectivo caso julgado. Ou seja, não pode ser considerado decidido, com força de caso julgado, que a liquidação da sentença seria feita em sede de execução. Nesta parte, julga-se que o efeito de caso julgado será limitado à determinação da necessidade de posterior liquidação, não abrangendo a determinação do meio processual da sua realização. E este era, o já referido incidente de liquidação, a deduzir na acção declarativa. Tendo o Exequente, de resto induzido pelos termos da decisão, optado por promover imediatamente a execução, liquidando aqui a dívida exequenda, julga-se que se está perante um simples erro na forma do processo, que pode ser enquadrado na previsão do art. 199.º do CPC. E, como a liquidação promovida em sede de execução não oferece menores garantias do que a processada em incidente deduzido na acção declarativa, admite-se que esse simples facto não devesse inviabilizar a apreciação do pedido de liquidação deduzido no próprio requerimento executivo, como preliminar da execução. Mas, para isso, tinha de haver um verdadeiro pedido de liquidação das obrigações exequendas, o que, segundo se julga, não pode ser considerado no caso dos autos. É que, no que respeita aos danos concretos agora em causa, o Exequente limitou-se a acrescentar ao teor de cada um dos segmentos da decisão condenatória a alegação de que liquidava os danos ali referidos nos montantes de, respectivamente, € 2.250,00 e 1.500,00, sem aditar um único facto. Ou seja, apontou a conclusão que pretendia ver estabelecida, mas não alegou qualquer facto que a pudesse fundar. Quando lhe cabia alegar factos concretos, naturalmente para além dos que já constavam da decisão condenatória e que não tinham permitido fixar o valor dos danos. Sem factos, o pedido de liquidação está claramente votado ao insucesso e, por isso, não lhe pode ser dado seguimento. Nem se justifica ponderar a possibilidade do seu aperfeiçoamento uma vez que, não se tratando de aproveitar actividade processual já desenvolvida, se entende que a liquidação aperfeiçoada há-de ser requerida, se ainda for caso disso, no incidente próprio a deduzir na acção declarativa. Deve, pois, ser integralmente mantida a decisão recorrida, também nesta parte. 3 – A multa O exequente foi condenado em multa no montante de 10 UC ao abrigo do preceituado no art. 819 do CPC. Nos ternos deste preceito legal, «procedendo a oposição à execução sem que tenha tido lugar a citação prévia do executado, o exequente responde pelos danos a este culposamente causados e incorre em multa correspondente a 10% do valor da execução, ou da parte dela que tenha sido objecto de oposição, mas não inferior a 10 UC nem superior ao dobro do máximo da taxa de justiça, quando não tenha agido com a prudência normal, sem prejuízo da responsabilidade criminal em que também possa incorrer» Como decorre da previsão do preceito legal transcrito, só há lugar à aplicação das sanções nele estabelecidas nos casos em que a execução não deva começar pela citação do executado. Pois que se ele for previamente citado, tem a possibilidade de se defender prontamente da execução, sempre antes de poder ser atingido por actos de execução propriamente ditos, como é o caso da penhora. O mesmo se passará, naturalmente, na situação em que o executado deveria ter sido previamente citado, mas não o foi, por facto não imputável ao exequente. Não podem recair sobre o exequente os actos, ou as omissões de terceiros, designadamente do próprio tribunal. No caso da execução fundada em sentença não há, em regra, lugar a despacho liminar, nem a citação prévia do executado, nos termos dos art. 812.º a 812.º-B do CPC, sendo isso que, supostamente aconteceu. Mas, uma vez que o requerimento de execução era, para além do mais, integrado por uma liquidação, não simplesmente aritmética, de parte da dívida reclamada, crê-se que a situação em causa deveria ter sido submetida a despacho liminar que, se não fosse de imediato indeferimento parcial da execução, na parte não líquida, seria no sentido de ordenar a citação prévia da executada. E, em nenhum dos casos seria aplicável a sanção estabelecida no referido art. 819.º. Assim sendo, entende-se que não deve ser mantida a condenação em multa, fundada no referido preceito legal. Termos em que se acorda em julgar parcialmente procedente a apelação, revogando-se a condenação do apelante em multa feita na decisão recorrida, confirmando-se, no mais, a mesma decisão. Custas pelo Apelante, que decaiu na totalidade da oposição, não relevando para este efeito a questão da multa. Ou seja, na parte em que o processo dá lugar ao pagamento de custas, o Apelante decaiu. 16-07-2009 (Farinha Alves) (Tibério Silva) (Ezagüy Martins) |