Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
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| Relator: | MARIA MANUELA GOMES | ||
| Descritores: | TÍTULO EXECUTIVO ACTAS ASSEMBLEIA DE CONDÓMINOS | ||
| Nº do Documento: | RL | ||
| Data do Acordão: | 11/08/2007 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
| Decisão: | CONFIRMADA | ||
| Sumário: |
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| Decisão Texto Parcial: | |||
| Decisão Texto Integral: | Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa. 1. Por apenso à execução para pagamento de quantia certa, fundada numa acta da Assembleia de Condóminos, que o Condomínio do prédio urbano em Lisboa, através da sua administradora S, Serviços de Administração de Propriedades e Condomínios, Lda, intentou no Tribunal Cível de Lisboa (9º Juízo – 3ª Secção) contra J, Administração e Participações, Lda veio esta, em 16.03.2001, deduzir oposição à execução, invocando fundamentalmente a ilegitimidade (activa) da S, a insuficiência do título executivo por falta de concretização do valor da dívida e de requisitos formais daquele e ainda a nulidade da deliberação. Apresentada a resposta pela parte contrária e frustrada uma tentativa de conciliação entre as partes, veio a embargante apresentar articulado superveniente com o teor constante de fls. 94 e seguintes, defendendo a novação objectiva da obrigação. Logo de seguida, tendo sido entendido que o processo continha já todos os elementos necessários ao conhecimento de mérito da causa, foi proferido despacho saneador-sentença que, após ter julgado improcedente a excepção da ilegitimidade deduzida, concluiu que a acta apresentada não constituía título executivo contra a embargante, por lhe faltar o montante da obrigação a suportar pela condómina executada (faltava a fixação da quota-parte devida por cada condómino) e absolveu a executada/embargante da instância executiva, considerando prejudicadas as demais questões suscitadas (fls. 124 a 130). Inconformada com o assim decidido, recorreu a embargada, recurso que, após enunciar como questões a apreciar a suficiência ou insuficiência do título executivo por lhe faltar o requisito da liquidez da obrigação exequenda e a eventual nulidade da decisão por omissão de pronuncia, por acórdão de 15.05.2003, veio a ser julgado procedente e a determinar a revogação da decisão recorrida que deveria ser substituída por outra que ordenasse a “prossecução normal da tramitação dos autos”, (fls. 199 a 205) Regressados os autos à 1ª instância, rejeitada a oposição superveniente apresentada por despacho transitado em julgado (fls. 212 e 213), veio a ser proferido despacho saneador que, após conhecer da matéria das excepções, tida como prejudicada - atinente à falta de requisitos formais do título, por falta de assinatura da acta por todos os participantes na assembleia de condóminos e da nulidade da deliberação por falta de quórum deliberativo – que julgou improcedentes, passou a enunciar os factos tidos como assentes e os controvertidos. Dizendo-se, uma vez mais, inconformada com o despacho saneador, a embargante interpôs novo recurso de agravo, admitido com subida diferida e efeito meramente devolutivo. Alegou e, no final, formulou, em síntese, as seguintes conclusões: - Do disposto no art. 1º nº 1 do DL nº 268/94, de 25 de Outubro, decorre, de forma expressa e inequívoca, a exigência de que as actas da assembleia de condóminos, para constituírem título executivo, carecem de ser subscritas por todos os condóminos que nela hajam participado; - A acta nº 34, que fundamenta os autos principais de execução, não se encontra subscrita por todos os condóminos que participaram na respectiva assembleia de condóminos, realizada em 10.12.1998, como evidenciam os factos provados: - Essa acta não reúne, assim, os requisitos que o dito artigo exige para que à mesma seja atribuída força executiva; - A decisão recorrida viola as normas constantes do art. 46º nº 1 do CPC e os artigos 1º nº 1 e 6º nº1 do DL nº 268/94; Terminou pedindo a revogação da decisão que julgou improcedente a excepção da falta de requisitos formais do título. A embargada contra-alegou, invocando, basicamente, a existência de caso julgado, porquanto este Tribunal da Relação decidira já, por acórdão transitado em julgado, a questão da insuficiência do título executivo e ainda que era irrelevante o facto da acta não estar subscrita por todos os condóminos que participaram na reunião a que a mesma respeita e ainda que tal só teria relevância para os condóminos que participaram na assembleia. E acrescentou ainda que o dito vício consubstancia apenas uma irregularidade, sanada, por não ter sido impugnada em devido tempo. Realizada a audiência de julgamento, com gravação da prova oral produzida, para apuramento dos factos atinentes a uma outra questão suscitada pela embargante – saber se era responsável, como a generalidade dos condóminos, pelas aprovadas despesas com a reparação da fachada e na empena do prédio, situando-se a sua fracção na cave - veio o tribunal a decidir que a embargante era responsável por tal pagamento, nos termos do art. 1424º do C. Civil e, consequentemente, foram os embargos julgados improcedentes (fls. 312 a 325). A embargante, não conformada, interpôs recurso de apelação, dizendo fazê-lo, todavia só para motivar a subida e apreciação da questão suscitada no anterior recurso de agravo, que mantinha interesse em ver apreciado. E em sede de conclusões da alegação do recurso de apelação, formulou conclusões idênticas à do dito recurso de agravo. Terminou pedindo a revogação da sentença e a procedência dos embargos. A exequente/ embargada repetiu a contra-alegação do agravo. Colhidos os vistos legais, cumpre decidir. Matéria de Facto. 2. Para a apreciação dos recursos importa realçar os seguintes factos dados como provados: 1. A embargada é administradora do condomínio do prédio urbano sito na Rua Capitão Ramires, n.º 19, em Lisboa, eleita na assembleia de condóminos realizada a 07/06/99. 2. A embargante é condómina do mesmo prédio, da fracção autónoma designada pela letra “B”, correspondente a uma loja do referido prédio, com permilagem de 152 (15,2%), do valor do imóvel. 3. A Embargada deu à execução a acta n.º 34, da qual consta entre outros que “aos dez dias do mês de Dezembro de 1998, pelas vinte e uma horas, reuniu (...) em sessão extraordinária, a assembleia de condóminos (...) Estiveram presentes ou devidamente representados, os condóminos proprietários das fracções D, E, G, I, M, P, R, U e V, totalizando 29,97% do valor do imóvel (...). A ordem dos trabalhos era a seguinte: Ponto único 1 – discussão e aprovação dos orçamentos para obras no edifício (....) Após os esclarecimentos dados pela comissão e trocas de impressões entre os condóminos presentes, foi aprovado o orçamento da casa dos Asfaltos, que fará parte integrantes desta acta, nas seguintes condições: A)1 – Reabilitação da cobertura especificação B (alternativa) – 1.148 750$00 2 – fachada principal especificação C – 2.865 000$00 3 – fachada tardoz especificação D – 690.520$00 4 – Empena especificação E (alternativa) – 915.398$00 IVA a 17% - 955.344$00, sendo o total de 6.575 012$00. B) Este valor vai ser debitado pela administração a todos os condóminos no valor da sua permilagem. C) O pagamento deverá ser feito em duas prestações. A primeira prestação a liquidar até 30 de Janeiro de 1999 e a segunda até 28 de Fevereiro seguinte. (...)”. 4. Tal acta mostra-se assinada pelos condóminos das fracções autónomas E, G, M, P e U. 5. A área total da fachada principal do prédio é de 568 m2. 6. A fracção da embargante localiza-se na cave do edifício. 7. O edifício em causa carece de obras urgentes e o condomínio foi, em 1998, objecto de intimação camarária para as realizar. 8. A executada embargante recebeu cópia da acta n.º 34, através de carta datada de 05/05/99. 9. A fracção B não é servida nem pela fachada a tardoz nem pela empena. 10. A fracção B confina e é lateralmente demarcada pela fachada principal do prédio em 25,50 m2, correspondentes a 4,49% da sua área total. O Direito. 3. Vistas as conclusões da alegação da recorrente em qualquer dos recursos, a questão fulcral a apreciar traduz-se em saber se a acta da Assembleia de Condóminos apresentada como título executivo, não tendo sido subscrita por todos os condóminos presentes na assembleia, possui, ou não, os requisitos legalmente impostos para poder ser considerada como tal e fundamentar a execução. Antes de entrar na análise dessa questão há, todavia, que fazer uma referência sintética à “questão prévia” do caso julgado suscitada pela embargada em sede de contra alegação. Invocou esta que a questão dos requisitos formais do título executivo - a acta da assembleia em causa – tinha já sido definitivamente resolvida pelo acórdão desta Relação, proferido em 15.05.2003 e acima referido. Mas sem razão. A decisão de 1ª instância, sobre que recaiu o dito acórdão, pronunciou-se apenas pela não verificação do requisito formal do título por falta do requisito da liquidez do montante da obrigação exequenda face ao título apresentado, dando por prejudicado o conhecimento das restantes questões suscitadas. E, por essa razão, o acórdão da Relação que reapreciou o decidido, também só sob esse aspecto ponderou, como aliás evidencia a enumeração das questões ditas nele a apreciar. Aliás não podia ser de outra maneira, a não ser que fosse caso do Tribunal da Relação decidir em substituição do tribunal recorrido, o que não era seguramente o caso. Posto isto, vejamos. 3.1. Prevê o art. 46°, al. d) do CPC, que, entre outros, podem servir de base à execução os documentos a que, por disposição especial, seja atribuída força executiva. Disposição de tal natureza é a que se mostra prevista no art. 6°, n° 1, do DL 268/94, de 25/10, que estatui que "A acta da reunião da assembleia de condóminos que tiver deliberado o montante de contribuições devidas ao condomínio ou quaisquer despesas necessárias à conservação e, fruição das partes comuns e ao pagamento de serviços de interesse comum, que não devam ser suportadas pelo condomínio, constitui título executivo contra o proprietário que deixar de pagar, no prazo estabelecido, a sua quota-parte". Como vem sendo dito e resulta do preâmbulo do diploma citado, teve-se em vista com o mesmo, procurar soluções que tornem mais eficaz o regime da propriedade horizontal, facilitando simultaneamente o decorrer das relações entre os condóminos e terceiros. Com o objectivo de alcançar tal desiderato, um dos instrumentos de que o legislador se socorreu foi o de atribuir força executiva às actas das reuniões das assembleias de condóminos, nas quais se fixem os montantes das contribuições devidas ao condomínio, o prazo de pagamento e a fixação da quota-parte de cada condómino. Mas logo no artigo 1º do mesmo diploma, sob a epígrafe “Deliberações da assembleia de condóminos” estatuiu-se o seguinte: “1- São obrigatoriamente lavradas actas das assembleias de condóminos, redigidas e assinadas por quem nelas tenha servido de presidente e subscritas por todos os condóminos que nelas hajam participado. 2 – As deliberações devidamente consignadas em acta são vinculativas tanto para os condóminos como para os terceiros titulares de direitos relativos às fracções”. Não tendo todos os condóminos, ditos participantes na assembleia, assinado a respectiva acta, coloca-se a questão de saber se a mesma vale ou não como título executivo, de harmonia com o disposto no artigo 6º do citado D.L.nº 268/94. A resposta da jurisprudência, tanto quanto se conhece e alguma dela invocada pela embargada, tem sido sempre em sentido afirmativo. Invoca-se geralmente que a acta da assembleia de condóminos é uma formalidade ad probationem e a falta de assinatura de condóminos que nela participaram é uma mera irregularidade que, não sendo oportunamente reclamada, não afecta a deliberação tomada nem a exequibilidade do título. E fundamenta-se, essencialmente, na circunstância de que o condómino presente que não assinou a acta ou a não quis ou não a pode assinar e que não impugnou a deliberação, ou não suscitou a questão oportunamente, não pode disso prevalecer-se tendo em conta o instituto do abuso de direito previsto no artigo 334° do Código Civil, porque a ela deu causa ou não quis remediar. E argumenta-se ainda que nos termos do disposto no art.° 1413° do Código Civil as deliberações contrárias ou não à lei ou regulamentos anteriormente aprovados tomam-se definitivas se não for requerida a anulação por qualquer condómino que as não tenha aprovado nos prazos e pelo modo aí referidos. Tornando-se definitivas, as deliberações devidamente consignadas em acta são vinculativas tanto para os condóminos como para os terceiros titulares de direitos relativos às fracções – n° 2 do art.° 1° do Dec.-Lei n° 268/94. Para além disso é recorrentemente invocado que a lei não sancionou expressamente a falta de assinatura de algum ou alguns dos condóminos que tenham participado na assembleia, não tendo, designadamente, cominado com a inexistência, a ineficácia ou a nulidade uma acta lavrada sem tais assinaturas. E acrescenta-se que não se compreenderia que a acta seja vinculativa para os condóminos que faltem à assembleia (uma vez que lhes sejam comunicadas) e não se considerar a mesma válida e eficaz no caso de haver condóminos que, tendo estado presentes, por qualquer motivo não assinaram a acta (v., entre muitos outros, acórdão da Relação de Lisboa, de 15.02.2007, in www.dgsi.pt/jtrl, processo n° 9207/2006-2, que referencia vários acórdãos desta e de outras Relações sobre a matéria e ainda os acórdãos da Relação do Porto de 19.03.2001, de 6.03.2003, de 18.12.2003 e mais recentemente de 16.05.2007, também publicados em www.dgsi.pt/jtrp). Ora, não obstante se ter como aparentemente mais sedutora uma interpretação mais rígida do estatuído no art. 1º nº 1 do DL 268/94 (face ao próprio teor do seu nº 2 e sobretudo à sua inserção naquele diploma - que visou essencialmente atribuir força executiva à acta das assembleias de condóminos –) afigura-se-nos porém que, atentas as razões de simplificação enunciadas no preâmbulo e as demais razões invocadas pela jurisprudência citada, não pode deixar de se entender que a qualidade de título executivo das actas das assembleias de condóminos decorre tão só das mesmas conterem os requisitos indicados no art. 6º, basicamente atinentes à liquidez e exigibilidade das dívidas. A omissão das exigências formais constantes do dito art. 1º constituem meras irregularidades, que ficam sanadas se não houver tempestiva impugnação da deliberação tomada, (art. 1432º nºs 6, 7 e 8 do C. Civil), o que no caso os autos não evidenciam que tenha acontecido. Improcede, pelo exposto, o núcleo central da argumentação da agravante. E como o objecto da discordância da recorrente é comum ao agravo e à apelação, como antes já se deixou dito, ambos os recursos têm de improceder. Decisão. 4. Termos em que se acorda em negar provimento tanto ao recurso de agravo como de apelação. Custas pela recorrente. Lisboa, 8 de Novembro de 2007. (Maria Manuela B. Santos G. Gomes) (Olindo dos Santos Geraldes) ( Fátima Galante ) |