Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | FERREIRA DE ALMEIDA | ||
Descritores: | COMPETÊNCIA MATERIAL CONCORRÊNCIA DESLEAL TRIBUNAL CÍVEL TRIBUNAL DE COMÉRCIO | ||
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Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 05/20/2010 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | REVOGADA A DECISÃO | ||
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Sumário: | O julgamento de acção, cuja causa de pedir assenta em actos de concorrência desleal resultantes da violação das regras da concorrência, desvio de funcionários para outras empresas, actos de confusão no mercado e utilização de informação confidencial, é da competência dos tribunais cíveis, e não dos tribunais de comércio (Sumário do Relator) | ||
Decisão Texto Parcial: | ![]() | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa : 1. SV, SA, veio propor, contra SO, Lda, ST, SA, N, SR, B, J, SB, I, C, CL, P, M, AF, CV, Lda, providência cautelar, distribuída à Vara Cível de Lisboa, pedindo se reconheça a existência da prática pelos requeridos de actos de concor- rência desleal, susceptíveis de causar à requerente lesão grave e dificilmente reparável, e se decretem medidas adequadas a inibir violação iminente ou a continuação da violação dos seus direitos. No despacho liminar, considerou-se o tribunal incompetente, em razão da matéria, indeferindo-se a providência. Inconformada, veio a requerente interpor o presente recurso de apelação, cujas alegações terminou com a formulação das seguintes conclusões : - A decisão do Tribunal a quo que julgou o tribunal cível materialmente incompetente para apreciação do procedimento cautelar cuja causa de pedir se consubstancia em actos de concorrência desleal e, em consequência, indeferiu liminarmente o mesmo, assentou numa errada interpretação da al. f) do n°1 do art. 89° da LOTJ. - A apreciação da concorrência desleal não se inscreve na esfera de competências dos tribunais de comércio, pois que “a concorrência não é, ela própria, propriedade industrial, é antes a sanção de formas anómalas de concorrência”. - É entendimento pacífico, na doutrina e jurisprudência, que a concorrência desleal constitui instituto autónomo, tendo a protecção contra os actos de concorrência desleal, entre nós, um tratamento jurídico distinto da protecção dispensada aos direitos privativos da propriedade industrial, sem prejuízo de existirem claros pontos de encontro. - Assim, quando o legislador, no art. 89°, n°1 al. f), da LOFTJ, alude às “modalidades de propriedade industrial”, concluímos que apenas pretendeu abarcar acções em que seja invocada a violação de direitos privativos, como o são os que tutelam invenções e patentes, modelos de utilidade, modelos e desenhos industriais, marcas, nomes e insígnias de estabelecimentos e logotipos. - Na esteira do defendido por Oliveira Ascenção e por uma franja maioritária da jurisprudência, entendemos que o art. 89°, n°1 al. f), da LOFTJ excluiu do seu âmbito de aplicação as acções em que a causa de pedir se consubstancie em actos de concorrência desleal, que não impliquem violação de direitos privativos (neste sentido, entre outros, ac. STJ, de 10/2/2005, proc. n° 04134611; ac. STJ, de 6/7/2004, proc. n° 042303; ac. RP, de 17/1/.2005, proc. n° 0534963; ac. RL, de 16/12/2003, proc. n° 9426/2003.7; ac. RP, de 19/2/2002, proc. n° 0121979; ac. RP, de 4/4/2002, proc. n° 0230040, todos disponíveis em www.dgsi.pt.; ou ainda ac. RL, de 5/12/2002, in CJ, ano XXVII, t. 5). - Se o legislador quisesse incluir na competência dos tribunais de comércio as acções fundadas nos prejuízos resultantes de todos e quaisquer actos integradores da prática de concorrência desleal, tê-lo-ia feito expressamente, não se ficando pela referência redutora “às modalidades de propriedade industrial previstas no CPl”, tanto mais que, ao contrário de uma formulação genérica de atribuição de competência, procedeu a uma exaustiva discriminação das situações determinativas desta e não parece defensável a confusão entre concorrência desleal e propriedade industrial. - Face a tudo o que ficou exposto, entende a ora recorrente ser das Varas Cíveis de Lisboa e não do Tribunal do Comércio de Lisboa a competência para apreciar e julgar a presente providência cautelar, uma vez que a causa de pedir versa sobre actos de concorrência desleal, como é aliás assumido no despacho recorrido. - Nestes termos, deve o presente recurso ser considerado procedente e, em consequência, a decisão que indeferiu liminarmente o procedimento cautelar, por incompetência absoluta do tribunal, ser substituída por outra que o admita, por ser o tribunal cível competente para o apreciar. Cumpre, pois, decidir. 2. Nos termos dos arts. 684º, nº3, e 690º, nº1, do C.P.Civil, o objecto do recurso acha-se delimitado pelas conclusões do recorrente. A questão a decidir resume-se, assim, à apreciação da competência material do tribunal recorrido para conhecimento da requerida providência. Fundou-se a decisão impugnada no entendimento de que, estando em causa a violação de normas respeitantes à concorrência desleal, contidas nos arts. 317º e 318º do C.P.Industrial, seriam para o efeito competentes, por força do disposto no art. 89º, nº1 f), da LOFTJ, os tribunais de comércio, e não os tribunais cíveis. De acordo com este último preceito são, nomeadamente, da competência dos tribunais de comércio as acções declarativas em que a causa de pedir verse sobre propriedade industrial. Todavia, conforme, reportando-se a situação similar, se escreveu em acórdão do STJ, de 6/7/2004 (www.dgsi.pt - SJ200407060023036) - e traduz, aliás, orientação jurisprudencial dominante - constituem realidades distintas “a defesa dos vários sinais distintivos do comércio, que constitui uma protecção específica, mas limitada às violações da exclusividade do uso daqueles sinais, conferida ao respectivo titular, e a proibição da concorrência desleal, que por ser dotada de uma maior amplitude, desempenha uma função de protecção complementar daquela, e cujas normas têm por escopo a tutela da empresa do industrial ou do comerciante ou se preferirmos, da actividade empresarial, que se traduz no exercício da empresa”. Assim, “a concorrência desleal não é, ela própria, propriedade industrial, é antes a sanção de formas anómalas de concorrência, como tal escapando à previsão do nº1 al. f) do art. 89º da LOFTJ”. Pelo que “o julgamento de uma acção de indemnização, cuja causa de pedir assenta em actos de concorrência desleal que, em resumo, resultam da violação das regras da concorrência, desvio de funcionários para outras empresas, actos de confusão no mercado e utilização de informação confidencial, é da competência dos tribunais cíveis, que não dos tribunais de comércio”. Contrariamente ao decidido, se haverá, pois, de concluir pela inaplicabilidade, no caso, da invocada norma e consequente competência do tribunal recorrido. 3. Pelo acima exposto, se acorda em, concedendo provimento ao recurso, revogar a decisão recorrida, ordenando-se a sua substituição por outra que, julgando o tribunal competente, conheça do objecto da providência. Custas a fixar a final. Lisboa, 20 de Maio de 2010 Ferreira de Almeida – relator Silva Santos - 1º adjunto Bruto da Costa - 2º adjunto |