Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | AMÉLIA ALVES RIBEIRO | ||
Descritores: | REGULAÇÃO DO PODER PATERNAL ACORDO TRANSACÇÃO JUDICIAL SENTENÇA RECURSO | ||
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Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 10/06/2009 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | CONFIRMAR O DECIDIDO | ||
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Sumário: | I. Não obstante nele poder haver um conflito de opiniões ou representações acerca do mesmo interesse, o acordo celebrado no âmbito de uma acção de regulação do poder paternal, que não é um processo de partes, não configura uma simples transacção nos termos do disposto no art.º 1248.º do CC, enquanto manifestação da autonomia da vontade. II. A sentença homologatória desse acordo, tem de acautelar, acima de tudo, o designado superior interesse dos menores, subtraído, pois, à lógica privatística (art.º 1905.º n.º 1 do CC e art.ºs 177.º n.º1 e 180.º OTM). III. Se, aquando do acordo, os pais tiverem declarado prescindir do prazo de recurso, a sentença de homologação transita em julgado logo que proferida. A notificação posterior aos interessados, tem apenas a virtualidade de lhes dar conhecimento de que foi proferida sentença, a fim de os habilitar a fazerem um controlo formal da decisão e não para dar início ao decurso do prazo de recurso. IV. A modificabilidade desse acordo dependerá, tão só, da dedução de eventual incidente de alteração ou de incumprimento, previstos nos arts.º 181.º e 182.º n.º1 da O.T.M.. (Sumário da Relatora) | ||
Decisão Texto Parcial: | ![]() | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam na Relação de Lisboa Apelante/ Requerido: A Apelada/Requerente: B I. A requereu a regulação do exercício do poder paternal nos termos dos arts.º 174º e 183 da OTM, relativamente às menores C e D, filhas da Requerente e do Requerido. Após a realização a conferência de pais, foi celebrado acordo extrajudicial de regulação de exercício do poder paternal (fls. 146 a 152) onde é requerida a homologação do mesmo e a extinção dos autos por inutilidade superveniente da lide, tendo ambos os progenitores declarado prescindir do prazo de recurso. Foi proferida a sentença de fls. 156 dos presentes autos que homologou o acordo de regulação do poder paternal, condenando as partes a cumpri-lo nos precisos termos. A fls. 160 a 161, veio o requerido formular pretensão no sentido de que o Tribunal desse sem efeito tal acordo e, consequentemente, a sua homologação. Baseou-se na sua falta de capacidade económica, surgida no período de 2 de Julho a 29 de Agosto de 2007, o que o levava a discordar do acordo apresentado, bem como no facto de não ter ainda havido a homologação do referido acordo. O despacho de fls. 204 indeferiu tal pretensão, com base em que o acordo de regulação do poder paternal foi, de facto, homologado por sentença proferida a 11.07.2007, pelo que a mesma não poderia então ser dada sem efeito, sendo que a única forma de alterar o teor do acordo seria através de um incidente de alteração do poder paternal. Inconformado o requerido, no recurso, apresentou as conclusões que a seguir se sintetizam: 1. O apelante é pai das menores, C e D, nascidas a 20 de Março de 1998 e 5 de Janeiro de 2001, respectivamente, fruto do seu casamento com B, de quem se encontra separado de facto desde Julho de 2006. 2. Todavia, em consequência da pressão existente, involuntariamente, em torno das suas filhas e da instabilidade familiar inevitavelmente criada, o apelante viu-se obrigado a aceitar a proposta apresentada pela apelada, quanto à regulação do exercício do poder paternal. 3. Tal acordo foi assinado um ano após a ruptura definitiva do casal, nomeadamente a 2 de Julho de 2007, tendo dado entrada em Tribunal a 3 de Julho de 2007. 4. Pelo exposto, o apelante presumiu, erradamente, que a situação familiar fosse melhorar e estabilizar após a transacção relativa ao exercício do poder paternal, com as cedências que tinha feito. 5. Todavia, revelou-se apenas e só uma presunção uma vez que, a vivência familiar só piorou, o que implicou que o acordo fosse completamente inútil e inadequado para uma sã convivência com as suas filhas. 6. Ou seja, aquando da transacção relativa ao exercício do poder paternal, o apelante não teve real noção da dimensão do compromisso assumido, relativamente à quantia acordada a título de pensão de alimentos, face à sua efectiva falta de capacidade económica. 7. Pelo exposto, o apelante apresentou requerimento datado de 28 de Agosto de 2007 no qual requereu ao Tribunal a quo a revogação do acordo com fundamento em que o mesmo teve por base “a defesa da estabilidade e do bem-estar das menores, esperando o requerente que após a sua celebração, o convívio com as menores voltassem à normalidade”, mas que “durante este período ocorreram determinadas situações, incluindo a falta de capacidade económica do pai requerente para pagar tal pensão, que levam o requerente agora a não concordar com o acordo de poder paternal que foi apresentado”. Assim, e uma vez que o mencionado acordo ainda não foi sequer homologado pelo Tribunal, requer-se a V. Exa. que dê sem efeito tal acordo e consequentemente a sua homologação, seguindo o processo litigioso de regulação do poder paternal das menores os seus termos.” 8. O tribunal a quo proferiu o despacho de indeferimento, em 07.09.2007, com fundamento em que o requerimento foi apresentado em momento posterior à homologação, pelo que a sentença não poderia então já ser dada sem efeito. 9. Contudo o apelante só foi notificado da sentença de homologação a 31.08.2007, conforme consta nos presentes autos. 10. Ora, as decisões só se tornam eficazes a partir do momento que as partes tomam conhecimento do seu conteúdo, conforme o disposto no n.º2 do art.º 228º do CPC, a saber: “A notificação serve para, em quaisquer outros casos, chamar alguém em juízo ou dar conhecimento de um facto”. 11. Ora, tal princípio de eficácia das decisões após o seu conhecimento encontra-se igualmente sufragado no n.º1 do art.º 224º do C.C., a saber “a declaração negocial que tem um destinatário torna-se eficaz logo que chegue ao seu poder ou é dele conhecida, as outras, logo que a vontade do declarante se manifesta de forma adequada”. 12. Bem como, é entendimento da doutrina que: “A violação de algumas normas processuais determina a ineficácia formal da decisão: é o que sucede se, por exemplo, a decisão não for notificada às partes (cfr. 685º, n.º1 1ª parte)”, in Teixeira de Sousa, Estudos Sobre o Novo processo Civil, Lisboa, 1997, página 218. 13. Ou seja, assim concluímos que, até à notificação do apelante, datada de 30.08.07 e recebida a 31.08.07, a sentença homologatória era ineficaz porque dela o apelante não tinha conhecimento. 14. No mesmo sentido aponta os n.ºs 1 e 2 do art.º 230 do CC. 15. Defende que o despacho em crise está ferido de nulidade pois, não tendo o Tribunal a quo observado o intervalo temporal entre o requerimento apresentado a 28.08.2007 e a data da notificação da sentença homologatória a 30.08.2007, recebida pelo apelante a 31.08.2007, sendo certo que tal irregularidade influiu na decisão da causa, tornando-o nulo, nos termos do n.º1 do art.º 201 do CPC. 16. Inequivocamente, segundo afirma, a sentença homologatória não atingiu o seu fim visto que, no momento em que o Tribunal a quo não observou o intervalo temporal e indeferiu o requerimento do apelante (ou seja, não respeitou as regras processuais relativamente ao momento a partir do qual os actos se tornam eficazes), homologou uma transacção que não expressa a vontade de ambas as partes, vinculando o apelante a uma transacção que no devido tempo foi revogada, pelos motivos explanados no enquadramento da questão. 17. O tribunal violou o princípio da autonomia das partes, num domínio que apenas lhe compete fiscalizar. 18. Além disso, sustenta ainda que a transacção é o único negócio processual que pode ser revogado após a sentença homologatória, conforme nos ensina o Prof. Teixeira de Sousa no seu manual Estudos sobre o Novo Processo Civil, Lisboa 1997, a saber: “ os negócios processuais pelos quis as partes conformam a decisão da causa podem extinguir-se por iniciativa delas, observadas as condições aplicáveis a qualquer acto negocial. Mas também há que considerar a relevância e os efeitos da sentença homologatória desses negócios (300/3). Assim depois dessa homologação, só a transacção pode ser revogada, resolvida ou rescindida). O autor que desistir do pedido ou da instância ou o réu que confessou o pedido não podem revogar esses actos depois do trânsito em julgado da sentença homologatória”. 19. Isto é, a decisão relativa ao acordo da regulação do poder paternal só se torna definitiva após o trânsito em julgado da sentença homologatória do referido acordo. 20. Assim se conclui que, o Tribunal a quo não só excedeu as suas competências de mera fiscalização do Acordo bem como limitou a autonomia contratual do Apelante quando recusou o pedido de revogação da transacção pelo que, o Despacho encontra-se ferido de nulidade nos termos do n.º1 do art.º 201º do CPC. 21. Em suma, o acordo de regulação do poder paternal apenas se torna definitivo após a notificação à partes da sentença homologatória, podendo o recorrente revogar a sua decisão de aceitar o acordo de regulação do poder paternal antes da decisão definitiva: isto é, antes da notificação da sentença homologatória do referido acordo. Conclui pela procedência do recurso. Por sua vez, a apelada contra-alegou, tendo apresentado as conclusões que a seguir se sintetizam: 1. Em 2 de Julho de 2007 foi celebrado entre a apelada e apelante, o acordo de Regulação de Exercício do Poder Paternal junto aos autos a fls.146 e segs., através de requerimento que deu entrada nesse mesmo dia, subscrito também por ambos os mandatários, que requerem a homologação do acordo extra judicial alcançado pelos seus constituintes e acima extinção dos autos, por inutilidade superveniente da lide. 2. Requerimento em que se contém que as partes, expressamente, prescindem do prazo de recurso. 3. Em 11 de Julho de 2007 foi proferida a fls. 156 dos presentes autos, a sentença que homologou o acordo de Regulação do Poder Paternal apresentado, condenando as partes a cumpri-lo nos seus precisos termos. 4. Por requerimento de 29 de Agosto de 2007 de fls. 160 e 161, veio o ora apelante requerer ao tribunal que dê sem efeito tal acordo e consequentemente a sua homologação, fundamentando-se, erradamente, que “ainda não fora sequer o mesmo homologado”..., quando o mesmo havia já sido homologado em 11 de Julho de 2007. 5. Para além de fundamentar a sua pretensão na “sua falta de capacidade económica nesse período – de 2 de Julho a 29 de Agosto de 2007 – o que, refere, “... o leva a não concordar com o acordo do poder paternal que foi apresentado” entendeu não pagar as pensões de alimentos devidas às menores referentes aos meses de Julho e Agosto de 2007. 6. Foi proferido despacho de indeferimento, a fls. 204. 7. Muito embora não corresponda à verdade a factualidade alegada em sede de “Enquadramento da Questão”, não tem qualquer oportunidade, em sede de recurso, por se tratar de matéria nova. 8. Ora, só é lícito ao Tribunal de Recurso apreciar a matéria alegada e decidida em 1ª instância, o que não é o caso! 9. A questão colocada pelo apelante reduz-se assim à oportunidade da peticionada revogação de um acordo, homologado por sentença proferida em 11 de Julho de 2007, isto por – na tese do recorrente – apenas ter sido notificado da referida sentença homologatória em 31 de Agosto de 2008! 10. A Sentença homologatória não constitui uma “declaração negocial com um destinatário” tal como pretende o apelante no item 18 e, ao contrário do que defende, a Sentença tornou-se eficaz com a sua prolação. 11. Com a prolação da referida Sentença esgotou-se o poder jurisdicional da Senhora Juiz, o que decorre expressamente do art.º 666º n.º1 do CPC. 12. Tendo o acordo sido homologado por sentença proferida em 11 de Julho de 2007 – ainda que a mesma só tenha sido notificada às partes em 30.08.2007 – o que apenas relevaria, se as partes não tivessem renunciado ao recurso, em termos do trânsito em julgado da mesma – à Senhora Juiz apenas seria licito, nos termos do n.º2 do art,º 666º do citado diploma legal, rectificar erros materiais, suprir nulidades, esclarecer dúvidas existentes na sentença ou reformá-la, quanto a custas, a multa e a erros de julgamento manifestos, bem como repará-la quando dela tiver sido interposto recurso de agravo, nos termos previstos na lei – o que não é o caso nos presentes autos. 13. Acresce que, quer no requerimento de 2 de Julho quer no requerimento de 6 de Julho de 2007, requerente e requerido, prescindem do prazo de recurso, ou seja existe nos autos uma declaração expressa e inequívoca, de ambas as partes – apelante e apelada – de renúncia ao recurso – art.º 681º do CPC. 14. A Sentença homologatória, de acordo aliás como requerido expressamente pelas próprias partes, transitou de imediato em julgado, produzindo a extinção da instância – art.º 287º n.º3 – uma vez que tal decisão, por força da renúncia prévia e bilateral do prazo de recurso, não era sequer passível de recurso. 15. Tendo as partes renunciado ao recurso, - renuncia essa que foi antecipada e bilateral nos termos do art.º 681 n.º1 – tal obsta a que possa ser interposto recurso dessa decisão. 16. No caso da renúncia ao recurso, isso constitui fundamento para que o tribunal a quo o rejeite – art.º 687º n.º3 do CPC e para que o Tribunal ad quem se recuse a conhecer do seu objecto – art.º 701º n.º1 do citado diploma legal, o que desde já se requer. II.1. Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir fundamentalmente a questão de saber se a sentença homologatória do acordo celebrado entre as partes já havia transitado em julgado aquando do requerimento de fls. 161. II.1.1.Com relevo para a decisão da causa, mostram-se provados os seguintes factos: 1. Em 2 de Julho de 2007, apelante e apelada, subscreveram o acordo Extrajudicial de Regulação do Exercício do Poder Paternal, relativamente às menores em causa e junto aos autos através de requerimento que deu entrada em 3 de Julho (fls. 146 a 152), requerendo a homologação do mesmo e, bem assim, a extinção dos autos, por inutilidade superveniente da lide. 2. Nesse mesmo requerimento as partes, expressamente, declaram prescindir do prazo de recurso. 3. Em 11 de Julho de 2007 foi proferida sentença que homologou o acordo de Regulação do Poder Paternal apresentado (fls. 204). 4. Em 29 de Agosto de 2007, o apelante veio requerer ao Tribunal que desse sem efeito tal acordo, uma vez que tinham ocorrido “…determinadas situações, incluindo a falta de capacidade económica do Pai / Requerente para pagar tal pensão, que levam o requerente agora a não concordar com o acordo do poder paternal que foi apresentado…”, tanto mais que ainda não tinha sido feita a sua homologação (fls. 160 a 161). 5. Em 30 de Agosto de 2007, procedeu-se ao registo da sentença homologatória (fls. 163). 6. Em 30.08.2007, foram expedidas as notificações da referida sentença às partes, sendo igualmente dela notificado o MP (fls. 164 a 166). 7. Por despacho proferido fls. 204, foi decidido que o acordo de regulação do poder paternal tinha sido, de facto, homologado por sentença proferida em 11.07.2007, pelo que a mesma não podia agora ser dada sem efeito, afigurando-se que a única forma de alterar o teor do acordo é mediante um incidente de alteração do poder paternal, e indeferindo-se, assim, o requerido. 8. A Requerente Mãe, ora apelada, veio deduzir incidente de incumprimento das prestações de alimentos nos termos dos arts.º 189º e 157º da O.T.M, autos que correm por apenso a estes. II.2. Apreciando: Contrariamente ao alegado pelo apelante, o acordo de regulação do poder paternal alcançado, e posteriormente homologado nos presentes autos, não configura uma simples transacção nos termos do disposto no art.º 1248.º do CC. A acção de regulação do poder paternal não é um processo de partes que vise solucionar ou compor um conflito de interesses disponíveis (cfr. art.º 1249.º do CC). O art.º 147.º-A da OTM, referindo-se aos princípios orientadores dos processos tutelares cíveis, indica que os mesmos deverão atender, prioritariamente, aos interesses e direitos das crianças e dos jovens. Assim, a acção de regulação do exercício do poder paternal destina-se a assegurar que os interesses do menor que merecem tutela jurisdicional se encontram acautelados, permitindo não só assegurar a situação presente como, em casos futuros, a possibilidade de dedução de incidente de incumprimento. Por outro lado, o acordo dos pais relativo ao exercício do poder paternal, após o divórcio, quer se trate de um divórcio litigioso quer de um divórcio por mútuo consentimento, está sempre sujeito a controlo judicial. Nos termos do art.º 1905.º n.º 1 do CC, o acordo dos pais está sujeito a homologação do tribunal, a qual será recusada se o acordo não corresponder ao interesse do menor. Na falta de acordo, o tribunal decidirá de harmonia com o interesse do menor. Já nos divórcios por mútuo consentimento, o acordo dos cônjuges sobre o exercício do poder paternal constitui um requisito prévio do divórcio, o qual não será decretado se o MP recusar a homologação do acordo em virtude de este não acautelar devidamente o interesse dos filhos. Da mesma forma, o acordo obtido no âmbito de uma acção de regulação do exercício do poder paternal está sujeito a apertado controlo judicial. O acordo depende de homologação, a qual só será concedida se o juiz considerar que o exercício do poder paternal está de harmonia com os superiores interesses dos menores (cfr. art.º 177.º n.º1 e art.º 180.º OTM). O processo de regulação do poder paternal é, pois, um processo de jurisdição voluntária (art.º 150.º OTM), o que significa que nele só há um interesse a regular, embora possa haver um conflito de opiniões ou representações acerca do mesmo interesse[1]. Portanto, o acordo em apreço não pode ser considerado como resultado de uma manifestação da autonomia da vontade, nos termos alegados pelo apelante. Estamos perante um acordo que só produzirá efeitos depois de homologado, o que só ocorre, após investigação do tribunal e verificação, por este, de que o clausulado do mesmo acautela devidamente os superiores interesses e direitos dos menores, afinal os únicos interesses atendíveis nos presentes autos. Por outro lado, o “…cumprimento ou o incumprimento pelas partes de alguma ou de todas as cláusulas…” estipuladas no acordo alcançado “…não pode ser objecto de recurso interposto da respectiva sentença homologatória…”[2], muito menos por quaisquer alegadas circunstâncias supervenientes que tornem necessário alterar o que estiver estabelecido, como pretende o apelante ao invocar uma falta de capacidade económica para pagar a pensão de alimentos estipulada. Sucede que o acordo de regulação do poder paternal poderá sempre ser modificado, sim, mas através dos incidentes próprios de alteração e de incumprimento previstos nos arts.º 181.º e 182.º n.º1 da O.T.M.. De qualquer modo, e mais importante que tudo, resulta claramente dos autos que o referido acordo já havia sido homologado por sentença proferida a 11.07.2007, ou seja, muito antes da entrada do requerimento do apelante a 29.08.2007, embora, é certo, só tenha sido notificado aos seus subscritores em 30.08.2007, após o registo da respectiva sentença (fls. 163 a 166). Terá tal atraso do Tribunal as consequências que o apelante pretende retirar, ou seja “a ineficácia formal” da sentença até à sua efectiva notificação? Salvo melhor opinião, a resposta afigura-se-nos negativa. Na verdade, e como também resulta dos presentes autos, requerente e requerido prescindiram expressamente do prazo de recurso, ou seja, renunciaram antecipadamente ao direito de recorrer, renúncia essa perfeitamente válida, uma vez que se tratou de uma declaração de vontade provinda de ambas as partes, bilateral, expressa e total (art.º 681.º, n.º1, do CPC). Neste caso, é indiferente que nos encontremos no domínio de direitos juridicamente indisponíveis, devido ao facto de “…a interposição de recurso constituir uma faculdade e não um dever; a parte vencida nunca é obrigada a recorrer. Se goza da liberdade de recorrer ou deixar de recorrer, deve ser igualmente livre de renunciar à impugnação da decisão…”[3]. Significa isto, muito simplesmente, que a sentença homologatória transitou logo em julgado assim que foi proferida, ou seja, em 11.07.2007, uma vez que é essa, precisamente, a consequência da renúncia antecipada ao recurso. Dito de outra maneira, “…o efeito prático da renúncia ao recurso manifesta-se essencialmente através da antecipação do trânsito em julgado da decisão, sem necessidade de esperar pelo decurso do prazo previsto para a impugnação, o que pode revelar-se importante, por exemplo, nos casos de transacção judicial, em que a renúncia promove a consolidação da decisão homologatória e impede que alguma das partes interponha recurso para evitar o trânsito em julgado…”[4]. É, pois, completamente indiferente que a notificação de tal decisão tenha ocorrido mais de um mês depois e já depois de ter dado entrada o requerimento do apelante, pedindo a revogação do acordo. Transitada em julgado a sentença, impedido ficou o requerente de fazer cessar o acordo (não fazendo, assim, sentido o alegado pelo Requerente no ponto 16. do seu requerimento de fls. 311 a 314). A legal notificação não podia, pois, ter outro sentido que não fosse dar conhecimento às partes do conteúdo da sentença homologatória, mas nunca o de dar início ao decurso do prazo de interposição de recurso, dada a renúncia que as partes manifestaram. Assim, tendo a sentença judicial em apreço transitado em julgado, produziu-se a extinção da instância, nos termos do art.º 677.º e 287.º, d), do CPC, pelo que não podia vir a ser dada sem efeito. III. Pelo exposto, e de harmonia com as disposições legais citadas, nega-se provimento ao presente recurso, mantendo-se a decisão recorrida. Custas pelo requerido, em ambas as instâncias. Lisboa, 6 de Outubro de 2009 Amélia Alves Ribeiro Graça Amaral Ana Resende --------------------------------------------------------------------------------------- [1] Cfr. Maria Clara Sottomayor, Regulação do Exercício do poder Paternal nos Casos de Divórcio, pag. 25 [2] Cfr. Ac. RE, de 15.01.1975, BMJ, 244.º - 331. [3] Cfr. Luís Correia de Mendonça e Henrique Antunes, Dos Recursos, Quid Juris, p.166, 2009. [4] Cfr. António Santos Abrantes Geraldes, Recursos em Processo Civil (Novo Regime), Almedina, p. 68, 2007. |