Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
| Processo: |
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| Relator: | EDUARDO PETERSEN SILVA | ||
| Descritores: | SEGURO DE CRÉDITOS MEDIAÇÃO DE SEGUROS BANCO EXCLUSÃO DA CLÁUSULA DEVER DE INFORMAR INCAPACIDADE PARA O TRABALHO DURAÇÃO DA COBERTURA | ||
| Nº do Documento: | RL | ||
| Data do Acordão: | 11/07/2024 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Texto Parcial: | N | ||
| Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
| Decisão: | IMPROCEDENTE | ||
| Sumário: | I - A falta de cumprimento do dever de informação relativo a cláusula contratual geral inserta em contrato de adesão, por parte da instituição bancária tomadora do seguro e simultaneamente mediadora, reflecte-se no domínio da relação entre esta e a seguradora, mas não exonera a seguradora, em acção intentada pela pessoa segura, da condenação no pagamento da cobertura segurada. II - A exclusão da cláusula que fixa o limite de duração temporal da cobertura – 12 prestações mensais em caso de doença incapacitante para o trabalho – por violação do dever de informação, não exclui a existência de cobertura no subsistente contrato singular, e o limite não tem de ser encontrado por via de integração do negócio jurídico, podendo coincidir com o próprio risco coberto – a subsistência da incapacidade por doença – sobretudo quando a condenação não se afigura sequer desproporcionada face ao equilíbrio contratual. | ||
| Decisão Texto Parcial: | |||
| Decisão Texto Integral: | Acordam os juízes que compõem este colectivo da 6ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa: I. Relatório[1] C, com os sinais dos autos, instaurou contra D - Companhia de Seguros, S.A., e E Banco, S.A., a presente acção declarativa com processo comum, peticionando a final que se declare a nulidade das cláusulas do contrato de seguro que não foram explicadas ao Autor e que se condene a primeira Ré a pagar ao Segundo Réu a quantia de €28.332,34 referente ao valor da dívida reclamada ao Autor por este. Alegou em síntese que celebrou com a 2ª Ré um contrato de crédito ao consumo, pelo valor de €24.172,72 e pelo prazo de setenta e dois meses, e que a mesma 2ª Ré intermediou junto da 1ª um contrato de seguro de proteção de crédito denominado PROTEÇÃO MAIS associado ao crédito contratado, nele figurando a 2ª Ré como tomadora do seguro e o Autor como pessoa segura. O seguro visava cobrir, além do mais, a incapacidade temporária absoluta para o trabalho por doença, e o valor do prémio foi pago na íntegra, aquando da celebração do contrato, tendo sido incluído no valor do capital em dívida. Já depois de ter contratado o mútuo e o seguro, em 19.01.2018, o Autor sofreu enfarte do miocárdio tendo sido internado de urgência no Hospital … no dia 20, onde se manteve internado até dia 03.02.2018, veio a ser indicado para cirurgia que se realizou em 06.08.2018, tendo estado de baixa médica por doença desde Janeiro de 2018, situação que se mantinha à data de interposição da acção, e situação que lhe provocou baixa de rendimentos e que levou a que não pudesse pagar as prestações devidas à 2ª Ré. Participado o sinistro à 1ª Ré, esta declinou a sua responsabilidade, e já em segundo esclarecimento à mandatária do Autor, informou que o sinistro havia ocorrido no período de carência. No momento da celebração do contrato o Autor não foi advertido para o facto de haver um período de carência, nem tão pouco, em que consistiria tal período, tendo sido omitidas, por parte dos funcionários do Banco mediador, tais informações. De qualquer modo, ultrapassado o período de carência e mantendo-se o Autor com incapacidade temporária absoluta a Ré deveria ter procedido ao pagamento do valor das prestações do contrato de crédito, o que não fez. * Contestou a Ré … Banco, pugnando pela improcedência, e sustentando ter cumprido os seus deveres de informação e dever fazer-se uma interpretação actualista quer dos artºs 236º e ss. do Código Civil, quer do DL 446/85, de 25/10, na sua globalidade, no sentido de exigir ao homem médio uma maior responsabilidade, conhecimento e percepção nas declarações negociais que subscreve pois que o homem médio é muito mais habilitado, culto e preparado, tanto assim que o regime das cláusulas contratuais gerais já leva mais de trinta anos de existência. * A Ré Seguradora …, contestou, invocando a incompetência territorial, discorrendo extensamente sobre os documentos apresentados pelo Autor, impugnando que o Banco não tivesse cumprido os deveres de informação e invocando, a admitir-se que assim tivesse acontecido, que o responsável perante o Autor é o Banco, e não ela, que não tem de beneficiar um (mediador) infractor que é simultaneamente o beneficiário do seguro. Sustentou ainda que tendo o acidente cardíaco acontecido no período de carência, toda a doença subsequente é mera sequela do acidente, não constituindo o risco coberto. * Após notificação do Autor, que não se pronunciou, foi declarada a incompetência territorial do Juízo Local Cível de … e ordenada a remessa dos autos ao Juízo Local Cível de Lisboa. Neste, o tribunal proferiu despacho saneador, fixou o valor da acção em €28.332,34, e além do mais, identificou o objeto do litígio e enunciou os temas de prova. Realizou-se a audiência final, com gravação das declarações de parte do A. e dos depoimentos das três testemunhas inquiridas, sendo seguidamente proferida sentença de cuja parte dispositiva consta: “Pelo exposto, julga-se parcialmente procedente esta ação e condena-se a ré seguradora a pagar ao banco réu as prestações que não foram pagas ao banco réu pelo autor de 20.1.2018 a 19.1.2020, no âmbito do contrato de crédito ao consumo, a liquidar posteriormente. Custas pelo autor e pelas rés, na proporção do respetivo decaimento”. * Inconformada, a seguradora interpôs o presente recurso, formulando, a final, as seguintes conclusões: “Vem este recurso de apelação interposto da sentença que julgou parcialmente procedente a ação e condenou a Ré Seguradora a pagar ao Banco Réu as "prestações que não foram pagas ao Banco pelo Autor de 20.1.2018 a 19.1.2020 no âmbito do contrato de crédito ao consumo, a liquidar posteriormente". A Rte. discorda da matéria de facto e respetiva motivação indicada nos pontos 10, 11, 22, 23, 24, 25, e 26 e sua fundamentação. Discorda ainda, no plano dos factos e do direito, de não ter sido considerado pelo Tribunal Rdo. que a cobertura do seguro por Incapacidade Temporária Absoluta para o Trabalho do Autor por Doença estava limitada, no máximo, ao reembolso de 12 meses das prestações pecuniárias do crédito pelo sinistro reclamado pelo Autor, ao invés dos 24 meses e prestações correspondentes em que foi condenada. No plano do direito, a Rte, entende que, ainda que esse Venerando Tribunal viesse a decidir no sentido de manter a decisão sobre matéria de facto (o que apenas se concebe, sem conceder), o responsável civil pelo incumprimento dos deveres de informação era o Réu … Banco como Tomador, Beneficiário e Intermediário (Mediador) na colocação do seguro, nos termos dos n°s. 1 e 4 do art° 78° e art° 79° ambos da Lei do Contrato de Seguro (Dec° Lei 72/2008 de 16 de Abril), que não foram aplicados devendo tê-lo sido. E, finalmente, que a sentença é nula por omissão de pronúncia sobre esta última matéria que foi suscitada na contestação da aqui Rte. (art°s 41° a 48) e não teve qualquer resposta na sentença, nulidade que decorre da alínea d) do n° 1 do art° 615° do C.P.C.. Quanto à matéria de facto: O Tribunal recorrido errou ao considerar como Provados os Factos constantes dos pontos 10, 11, 22, 23, 24, 25 e 26, infirmando a respetiva fundamentação de erro quando ponderou que “as testemunhas afirmaram que não assistiram à reunião e à celebração dos contratos”. Conforme se vê dos extratos acima das transcrições dos depoimentos das testemunhas M, (e N - adiante) esta esclareceu que trabalhou na agência de … do … Banco e quando da assinatura do contrato foi ela mesma quem falou com o Autor (pelo menos uma vez, quando da assinatura dos contratos). Também afirmou que explicou ao Autor de forma clara as condições dos seguros que este subscreveu, principalmente em virtude do valor do prémio ser incluído no capital mutuado, tornando o crédito mais oneroso. E disse como o faziam - ela e os demais colaboradores - ao balcão do Banco: à medida que o cliente vai lendo, passando e rubricando cada página do documento de adesão ao seguro (no caso «as Condições Gerais e Especiais do Seguro de Proteção ao Crédito”, referidas no Facto Provado 2) vão explicando o que consta das condições do seguro, designadamente as diversas coberturas e os valores e limites cobertos em caso de sinistro de incapacidade por doença, de forma pormenorizada dando aos clientes o máximo de informação possível, como ocorreu neste caso. Confirmou igualmente que a Cobertura de Incapacidade Temporária para o Trabalho por Doença tinha neste seguro um período de carência e que isso foi explicado ao Autor, como é sempre explicado aos clientes por ser “sempre questão muito importante dos seguros". Também a testemunha N declarou ser à data dos factos gerente do Balcão de … do … Banco, e que conhecia pessoalmente o Autor da sua relação como cliente, recordando ter estado com ele no Balcão de …. Confirmou ter tido intervenção direta no processo do crédito e seguro e que assinou, ele mesmo, os documentos contratuais não conseguindo lembrar-se se estes foram assinados pelo Autor na sua presença ou só na presença da testemunha M ou na presença de ambos. Declarou, sem margem para dúvidas ou hesitações, que aquando da assinatura do seguro é sempre explicado ao cliente o período de carência e as coberturas, neste caso da incapacidade por doença. Quanto à matéria dos Factos incorretamente julgados provados pelo Tribunal sob os n°s 22, 25 e 26, a testemunha N afirmou perentoriamente que o Autor, após ter deixado de pagar as prestações mensais de reembolso do crédito, lhe disse apenas que deixara de ter rendimentos e condições para pagar, nunca lhe tendo dito que seria o seguro a pagar ou fazendo referência ao seguro que subscrevera. Por esta razão o ‘espanto” do Autor quando recebeu a resposta negativa da Seguradora devida ao sinistro ter ocorrido no período de carência (Facto 22), que tinha a convicção de que as coberturas entravam em vigor com a assinatura do contrato (Facto 25) e que o Autor acreditava, por falta de esclarecimento, que estaria salvaguardado caso fosse alvo de algum infortúnio - são desmentidas pelo gerente do Banco a quem este nunca referiu tal espanto, convicção ou crença de que as prestações estavam cobertas pelo seguro, dizendo-lhe apenas que deixara de ter condições para pagar as prestações. De acordo com as mais elementares regras da experiência comum qualquer pessoa de médio entendimento, numa situação de incumprimento do empréstimo, teria referido ao responsável local do Banco a existência de um seguro caso tivesse a convicção de que ele era válido e cobria as prestações em atraso. A fundamentação da prova destes pontos e todos os outros pontos de facto acima impugnados baseou-se exclusivamente nas declarações de parte do Autor, tomadas ao abrigo do art° 466° do C.P.C, o qual tem o maior interesse em obter ganho na causa, ao arrepio e contrariamente aos depoimentos das testemunhas do … Banco a quem é totalmente indiferente o resultado desta ação. Ao contrário das testemunhas, o depoente Autor não presta juramento e limitou-se neste caso a repetir o que já dissera na petição inicial não devendo nem podendo o seu depoimento ser valorado em detrimento da prova testemunhal. Por estas razões, devem ser julgados como não provados os factos n°s 10, 11, 22, 23, 24, 25, e 26 e dar-se como provados os factos 31 e 33, ou seja que “Foram cumpridos pelo réu banco os deveres de informação quanto às cláusulas do contrato de seguro (31)" e que “(33) Todas as condições da apólice de seguro foram explicadas ao autor pelo funcionário do banco réu". Quanto ao valor da cobertura por Incapacidade Temporária Absoluta para o Trabalho por Doença (matéria de facto e de direito) Ainda que esse Venerando Tribunal não viesse a alterar a matéria de facto acima impugnada (o que apenas se concebe, sem conceder) a cobertura do seguro em nenhum caso pode considerar-se excluída do contrato uma vez que tal conduziria à inexistência de cobertura para este sinistro ou à fixação de um valor totalmente arbitrário, para além dos limites garantidos pela Seguradora, como se verifica na sentença recorrida (24 prestações mensais e não 12). A matéria dos Pontos 2 e 3 dos Factos Provados fundamenta-se nos documentos juntos aos autos especificamente nas “Condições Gerais e Especiais do Seguro de Proteção ao Crédito”, o qual, na garantia Não Vida de Incapacidade Temporária Absoluta para o Trabalho por Doença, a Seguradora se obriga, durante a vigência da adesão e quando a incapacidade se prolongue por mais de 30 dias, a pagar mensalmente ao beneficiário … Banco o valor correspondente à prestação pecuniária devida por conta do contrato de crédito por cada mês de duração do sinistro (...) e a assegurar que “o reembolso continuará a ser feito até que a pessoa segura volte a trabalhar ou até que seja atingido o valor máximo de 12 (doze) meses por sinistro ou 36 meses por agregado de sinistros". Conforme resulta dos Pontos 14, 15 e 16 da matéria de facto provada e não impugnada, o sinistro foi um único e teve início em 19.01.2028 (a assinatura do contrato de seguro ocorreu em 05.01.2018) e, tendo em conta a doença coronária grave de que o Autor ficou a padecer, foi subsequentemente sujeito a cirurgia em 06.08.2018, tendo estado de baixa médica com incapacidade para o trabalho entre 20.01.2018 e 19.01.2020. O Tribunal condenou a Seguradora a pagar ao banco as prestações que não foram pagas ao … Banco pelo Autor de 20.01.2018 até 19.01.2020 isto é 24 meses/prestações ao invés do limite máximo desta cobertura que era de 12 meses. Na petição inicial, embora o Autor tenha peticionado o pagamento da totalidade do capital em dívida ao Banco, deixa entender, nomeadamente nos art°s 28°, 18° e 31° que compreendeu perfeitamente que esta garantia de ITA cobria tão somente as prestações mensais devidas ao Banco para reembolso da dívida. 10. Dispõe o n° 1 do art° 9º do Decreto Lei 446/85 que, nos casos de cláusulas que se considerem excluídas dos contratos singulares por não comunicação adequada, vigorarão as normas supletivas aplicáveis, com, recurso, se necessário, às regras de integração dos negócios jurídicos. 11.Ora neste caso a integração do “negócio jurídico” tem de ser feita em conformidade com o texto escrito da Apólice que está transcrito no documento rubricado e assinado pelo Autor, designado “Condições Gerais e Especiais do Seguro de Proteção ao Crédito”, e é neste documento e Apólice que estão estabelecidos os riscos, suas coberturas e limitações, nomeadamente os limites de indemnização por incapacidade temporária absoluta por doença, no caso do sinistro dos autos, ao máximo de 12 meses/prestações mensais de reembolso do crédito. Acresce que o cálculo do valor dos prémios a suportar pelas pessoas seguras tem base actuarial em função dos valores dos riscos cobertos, e do seu potencial aleatório de verificação, neste caso a incapacidade temporária absoluta por doença. E é o texto escrito dessa apólice (conforme disposição imperativa do art° 37°, n° 3, al b) do Dec° Lei 72/2008 de 16.4), vertido no referido documento entregue ao Autor, que integra a garantia do seguro, ou seja o negócio jurídico que está em questão, e não qualquer valor arbitrário ou a inexistência de qualquer valor garantido. A sentença recorrida viola assim o disposto nos art°s. 8º, al. a) e 9º do Decreto Lei 446/85, bem como o art° 37°, n° 3, al. b) do Decreto Lei 72/2008, sendo que o limite máximo da cobertura do sinistro de incapacidade temporária absoluta por doença sofrida pelo Autor não pode exceder os 12 meses fixados no documento escrito (apólice) entregue ao Autor. Quanto à matéria de direito exclusivamente: Admitindo que esse Venerando Tribunal não altera a matéria de facto (o que apenas se concebe, sem conceder) a sentença recorrida, ao condenar a Seguradora e não o co-Réu … Banco SA, violou o disposto nos n°s. 1 e 3 do art° 78° e no art° 79° do Dec° Lei 72/2008 de 16 de Abril e ainda no art° 30°, alíneas b) e f) do art° 30° da Lei de Mediação de Seguros (Lei 7/2019). No ponto 2 dos Factos Provados deu-se como assente - com base em documentos, nomeadamente nas Condições Gerais e Especiais do Seguro de Proteção ao Crédito e nos Deveres de Informação do Mediador … Banco S.A.. que é o Doc. 1 junto à p.i. de fls 22 e 23 e Doc° 2 no citius - que o co-Réu … Banco é o Tomador, Beneficiário e Mediador do seguro em causa. A Rte. aceitou logo na contestação que o contrato de seguro de grupo que está em causa nos autos é um contrato dito de adesão e que foi apresentado ao Autor enquanto mutuário do Banco co-R. mediante um espécimen elaborado pela Seguradora. Estes contratos estão sujeitos, quer à disciplina do Decreto-Lei 446/85, quer às normas especiais que disciplinam a atividade seguradora e à informação a dar aos segurados constantes do Decreto-Lei n° 72/2008 de 16 de Abril (na atual redação - Lei do Contrato de Seguro) e às disposições regulamentares e instruções emanadas da Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões (ASF) que exigem a produção das informações escritas que, neste caso, foram dadas e entregues ao segurado. 19. O co-Réu … Banco agiu na qualidade de Tomador da apólice de seguro de grupo, à qual aderiu o A., colocou o seguro nessa qualidade de Tomador e de Mediador e seria o Beneficiário das prestações a pagar pela Seguradora. Conforme disposto em especial para os seguros de grupo nos n°s. 1 e 3 do art° 78° do Dec° Lei 72/2008 de 16 de Abril (normas violadas pela sentença) o … Banco, na qualidade de Tomador deste seguro, estava obrigado a “informar os segurados sobre as coberturas contratadas e as suas exclusões, as obrigações e direitos em caso de sinistro, bem como sobre as alterações ao contrato, em conformidade com um espécimen elaborado pelo segurador – tendo ainda o ónus de provar que forneceu ao Autor e segurado estas informações. Dispõe o art° 79 do referido Dec°-Lei 72/2008: (norma violada pela sentença) que “o incumprimento do dever de informar faz incorrer aquele sobre quem o dever impende em responsabilidade civil nos termos gerais”. Foi o co-Réu … Banco quem não cumpriu as regras de informação, comunicação e subscrição deste seguro, e deveria ter sido este co-Réu em aplicação das citadas normas do DL 72/2008 e das alíneas b) e f) do art° 30° da Lei de Mediação de Seguros (Lein0 7/2019 de 16.01) o único responsável civil perante o Autor pelos danos causados e que correspondem à garantia de Incapacidade Temporária Absoluta por Doença reclamada pelo Autor. É este o entendimento que tem sido acolhido pelos nossos tribunais superiores, no sentido de ser diretamente responsabilizada a Instituição Financeira Tomadora e Beneficiária dos seguros de grupo e que os coloca junto dos seus mutuários quando se verifique o incumprimento dos deveres de informação - conforme, a jurisprudência do S.T.J. que exemplificativamente ficou acima indicada. Não faria qualquer sentido que a Seguradora fosse responsabilizada pela omissão de prestação de informação cuja violação não lhe é imputável e muito menos poderá ser condenada a pagar ao suposto infrator desses deveres de informação, isto é ao … Banco SA, enquanto Beneficiário o valor das coberturas do seguro que seriam devidas apenas por violação de deveres por parte deste Banco. Nenhuma responsabilidade ou pagamento pode ser imputado à Seguradora aqui Rte. por tal omissão ou incumprimento por parte do co- Réu … Banco SA. Acresce que isto mesmo já fora alegado pela Rte. em sede de contestação (art°s 41° a 48°), não se encontrando qualquer pronúncia ou fundamentação em sentido contrário na sentença recorrida, que, por isso, padece também de nulidade por omissão de pronúncia nesta matéria em conformidade com a alínea d) do n° 1 do art° 615° do CPC. Termos em que deverão Vossas Excelências: Revogar a sentença recorrida julgando Não Provados os Factos constantes dos pontos 10, 11, 22, 23, 24, 25 e 26, bem como o erro na respetiva fundamentação com base nos depoimentos testemunhais transcritos e julgar, de acordo com a mesma prova, como Provados os Fatos constantes dos pontos 31 e 33. Ou quando assim não entenda esse Venerando Tribunal: Revogar a sentença recorrida na parte que condenou no pagamento das prestações mensais não pagas ao Banco pelo Autor no período de 24 meses entre 20.01.2018 e 19.01.2020, por violação do disposto nos art°s. 8º, al. a) e 9º do Decreto Lei 446/ 85, bem como do art° 37°, n° 3, al. b) do Decreto Lei 72/2008, sendo que o limite máximo da cobertura do sinistro de incapacidade temporária absoluta por doença sofrida pelo Autor não pode exceder os 12 meses fixados no documento escrito (apólice) entregue ao Autor e que deve servir de base à integração do negócio jurídico referente à cobertura do sinistro. Revogar a sentença recorrida, ao condenar a Seguradora e não o co-Réu … Banco SA, por violação do disposto nos n°s. 1 e 3 do art° 78° e no art° 79° do Dec° Lei 72/2008 de 16 de Abril e ainda no art° 30°, alíneas b) e f) do art° 30° da Lei de Mediação de Seguros (Lei 7/2019), visto que nenhuma responsabilidade ou pagamento pode ser imputado à Seguradora aqui Rte. pela omissão ou incumprimento por parte do co-Réu … Banco SA dos deveres de informação, d) Declarar a nulidade por omissão de pronúncia sobre a matéria referida na alínea anterior — que oportunamente fora suscitada ao Tribunal – em conformidade com a alínea d) do n° 1 do art° 615° do CPC”. * O Réu … Banco veio apresentar Resposta às Alegações, nos seguintes termos: 1. Mal andou o Tribunal a quo ao julgar mal a matéria de facto quanto aos pontos 10, 11, 22, 23,2 4, 25, e 26, ao julgar provados os mesmos, quando deveriam ter sido julgados como não provados, face a toda a prova documental e testemunhal produzida, e cuja transcrição pela Recorrente aqui se dá por integrada e reproduzida. 2. Também mal andou o Tribunal a quo ao considerar como não provado a matéria fáctica dos pontos 31 e 33, face também face a toda a prova documental e testemunhal produzida, e cuja transcrição pela Recorrente aqui se dá por integrada e reproduzida 3. Assiste pois total razão à Recorrente quanto ao mau julgamento da matéria fáctica supra identificada 4. Face ao pedido deduzido pelo Autor, não poderia o Réu … Banco ser condenado, sob pena de nulidade da sentença proferida, de acordo com o disposto no artº 609 do Código de Processo Civil. Nestes termos e nos melhores de direito, deverá: Ser julgado parcialmente improcedente o recurso, na parte que se considere desfavorável ao … Banco” * Contra-alegou o Autor, formulando a final as seguintes conclusões: “1. A presente ação teria, necessariamente de ser julgada parcialmente procedente, desde logo, pelos motivos e razões apontados na douta decisão recorrida. 2. No que respeita à matéria de facto dada como não provada e cuja prova cabia aos Réus, as testemunhas, M e N não se conseguiram recordar do momento exato em que tinham tido intervenção no processo de crédito do Recorrido, e nenhuma logrou afirmar que a assinatura dos contratos tinha sido feita na sua presença e com a sua intervenção. Ambos falaram sobre a forma como normalmente são tratados estes processos e o que geralmente é dito aos clientes. 3. Ou seja, do depoimento das referidas testemunhas percebe-se que estas não podiam afirmar ter estado com o cliente no momento da assinatura do contrato. Por essa razão, limitam-se a descrever o que seria o procedimento normal de assinatura dos contratos, sem conseguir descrever o que se passou com o contrato dos autos. 4. Por isso, outra não podia ser a conclusão do tribunal a quo senão a de concluir que nenhuma destas testemunhas esteve presente no momento da celebração dos contratos de seguro. 5. A testemunha N vem ainda informar que quando contacta o Autor por causa a falta de pagamento das prestações do crédito, este nada referiu quanto a ser a seguradora a pagar as mesmas. 6. Note-se que desta afirmação não se pode retirar que o Autor sabia que existia um período de carência contratado! Tanto mais que participou o sinistro e enviou para o banco as baixas médicas, para este as reencaminhar para a seguradora. 7. É aliás provável que esta conversa tivesse ocorrido em data posterior ao recebimento da carta da Ré seguradora, em que esta lhe comunicou que não assumiria o sinistro em virtude das garantias do contrato ainda não terem entrado em vigor. 8. Ou seja, os Réus não provaram - nem poderiam ter provado por tal não corresponder à verdade - que ao Recorrido foram explicadas as cláusulas do contrato de seguro, mormente a que respeitava a um período de carência. 9. Por outro lado e no que respeita ao valor fixado pelo tribunal para pagamento da incapacidade temporária absoluta a que esteve sujeito o Autor, tendo em conta que se provou que as condições contratuais não foram cabalmente explicadas ao mesmo, cabe total razão ao tribunal quando condena a Ré seguradora no pagamento ao Réu banco da totalidade das prestações do crédito vencidas do período em que o Autor esteve de baixa médica. 10. Assim, e por tudo o exposto, tem de confirmar-se a decisão em crise, (…)”. * Corridos os vistos legais, cumpre decidir: II. Direito Delimitado o objecto do recurso pelas conclusões da alegação - artigo 635.º, n.º 3, 639.º, nº 1 e 3, com as excepções do artigo 608.º, n.º 2, in fine, ambos do Código de Processo Civil – as questões a decidir são, pela ordem metodológica que se nos afigura mais correcta, as seguintes: 1 - A nulidade de sentença por omissão de pronúncia sobre a questão suscitada pela 1ª Ré sobre dever ser condenada a 2ª Ré, sob pena de violação do disposto nos n°s. 1 e 3 do art° 78° e no art° 79° do Dec° Lei 72/2008 de 16 de Abril e ainda no art° 30°, alíneas b) e f) do art° 30° da Lei de Mediação de Seguros (Lei 7/2019); 2 – A impugnação de decisão sobre a matéria de facto, no que diz respeito aos factos provados constantes dos números 10, 11, 22, 23, 24, 25 e 26, e aos não provados constantes dos números 31 e 33, (matéria relativa ao cumprimento dos deveres de informação) e, a procederem as alterações pretendidas, a absolvição da 1ª Ré. 3 – Saber se deve ser condenada a 2ª Ré e não a 1ª, por aplicação do disposto nos n°s. 1 e 3 do art° 78° e no art° 79° do Dec° Lei 72/2008 de 16 de Abril e ainda no art° 30°, alíneas b) e f) do art° 30° da Lei de Mediação de Seguros (Lei 7/2019). 4 – A não procederem as questões anteriores, a revogação da sentença na parte que condenou no pagamento das prestações mensais não pagas ao Banco pelo Autor no período de 24 meses entre 20.01.2018 e 19.01.2020, por violação do disposto nos art°s. 8º, al. a) e 9º do Decreto Lei 446/ 85, bem como do art° 37°, n° 3, al. b) do Decreto Lei 72/2008, sendo que o limite máximo da cobertura do sinistro de incapacidade temporária absoluta por doença sofrida pelo Autor não pode exceder os 12 meses fixados na apólice. * III. Matéria de facto A decisão do tribunal de primeira instância em matéria de facto é a seguinte: “Factos provados: 1. A fls. 11 a 12 e 13 verso, encontra-se documento assinado pelo autor, com o assunto: “Crédito ao consumo … BANCO, condições gerais”, com data de 5.1.2018, pelo valor de €24.172,72 pelo prazo de setenta e dois meses, sendo a prestação mensal de €425,11, com início em 2.2.2018, sendo o prémio de seguro de €2.582,13. 2. A fls. 94-95 verso, 27-30, 19 verso-21, encontra-se documento, “Condições gerais e especiais do seguro de proteção ao crédito.”, assinado pelo autor na qualidade de pessoa segura, e pelo réu banco na qualidade de tomador do seguro/beneficiário e intermediário da ré seguradora, cf. fls. 96, com as seguintes coberturas: Incapacidade Temporária Absoluta para o trabalho por Acidente ou Doença (ITA), Desemprego Involuntário (DI), Hospitalização (H) e Salários em atraso (SA). 3. No mesmo documento consta: “4.1. Sem prejuízo da verificação do preenchimento das condições de elegibilidade em caso de sinistro e do prévio pagamento do prémio, a cobertura dos riscos inicia-se relativamente à pessoa segura, a partir das 0 (zero) horas do dia seguinte àquele no qual a pessoa segura se constituiu devedora perante o tomador do seguro, conforme estabelecido no contrato de crédito e que não pode ser anterior à data da assinatura deste último. (…). 5. PERÍODO DE CARÊNCIA DE FRANQUIA RELATIVA E REQUALIFICAÇÃO. As garantias deste contrato estão sujeitas a: a) um período de carência de 60 (sessenta) dias; b) Um período de franquia relativa de 30 (trinta) dias para as coberturas ITA e DI, de 7 (sete) para a cobertura de H e de 90 (noventa) dias para SA. (…) 13. ÂMBITO/GARANTIAS COBERTAS. Em caso de ITA por acidente e ou doença da pessoa segura ocorrida durante a vigência da adesão e que se prolongue por um período superior a 30 (trinta) dias consecutivos, o segurador pagará mensalmente ao beneficiário o valor correspondente à prestação pecuniária devida por conta do contrato de crédito por cada mês de duração da situação de sinistro, com o limite máximo mensal de €1.700.00 (mil e setecentos euros), independentemente do valor mensal da prestação pecuniária. O reembolso continuará a ser feito até que a pessoa segura volte a trabalhar ou até que seja atingido o valor máximo de 12 (doze) meses por sinistro ou 36 (trinta e seis) meses por agregado de sinistros.” 4. O Autor dirigiu-se a agência do banco réu, tendo acordado um crédito ao consumo, no valor de €24.172,00. Disseram que posteriormente o contactavam. 5. Uns dias depois, o autor foi contactado para se dirigir novamente à agência. 6. O Autor regressou à agência do banco réu e apercebeu-se que o montante financiado era superior ao acordado. 7. O mesmo funcionário do banco réu informou o autor que tal montante a mais era debitado da sua conta para pagamento de seguro, em caso de doença, desemprego, incapacidade do autor. 8. O valor dos prémios relativos ao contrato de seguro foi pago na íntegra, no montante de €2.582,13, aquando da celebração do contrato, tendo sido incluído no valor do capital em dívida. 9. A referência ao seguro e respetivo custo apenas foi referida nesta 2.ª vez em que o autor se dirigiu à agência do banco réu, sendo explicado que o seguro de proteção de crédito era obrigatório. 10. Perante esta exigência e perante a necessidade de contrair o empréstimo, o Autor mais não fez do que anuir e assinar a documentação que lhe foi fornecida. 11. Nem no momento da assinatura, nem posteriormente, o Autor foi informado das demais condições relativas ao contrato de seguro, nomeadamente as relativas a eventuais períodos de carência e as cláusulas referidas em 3.. 12. Trata-se de um contrato de adesão, porquanto constam de impressos previamente elaborados pelas rés, que os aderentes se limitam a aceitar ou não, sem possibilidade de conformar as cláusulas dos mesmos à sua vontade. 13. Tratam-se de cláusulas elaboradas sem prévia negociação individual, que proponentes ou destinatários indeterminados se limitam a subscrever ou aceitar. 14. Em 19.01.2018, o Autor veio a sofrer um enfarte do miocárdio tendo sido internado de urgência no Hospital … no dia 20, onde se manteve internado até dia 03.02.2018, cf. fls. 31-32. 15. Tendo em conta a doença coronária grave de que ficou a padecer, o Autor foi indicado para realizar cirurgia coronária no Hospital de …, cirurgia esta que veio a ter lugar no passado dia 06.08.2018, cf. fls. 31 a 40. 16. O Autor esteve de baixa médica, com incapacidade temporária absoluta para o exercício da sua atividade profissional de 20.1.2018 a 19.1.2020, cf. fls. 44 a 56. 17. Tal reduziu substancialmente os seus rendimentos. 18. O Autor ainda pagou as primeiras prestações do contrato de crédito. 19. Tendo em conta a redução de rendimento decorrente da incapacidade temporária, o Autor deixou de conseguir cumprir o pagamento das prestações. 20. O Autor participou o sinistro à Ré seguradora informando que se encontrava em situação de Incapacidade Temporária Absoluta, cf. fls. 93 verso. 21. A esta participação a Ré seguradora respondeu por carta datada de 2.3.2018: “Após análise de toda a documentação em nosso poder, verificamos que a situação que motivou o sinistro não está coberta pelas garantias do contrato de seguro, pelo que não poderá a companhia aceitar o pagamento de qualquer indemnização. Conforme condições gerais da apólice, por carência entende-se, o período com início na data da celebração do contrato de seguro e durante o qual a garantia dos riscos cobertos não produz efeitos. Mais informamos que as garantias só entram em vigor 60 dias após a data de adesão ao seguro e ainda que qualquer situação que ocorra durante o período acima referido não esta coberta pela apólice. Assim, após devida análise, concluímos que a situação apresentada ocorreu dentro do período de carência, não dando lugar a qualquer reembolso.”, cf. fls. 41. 22. Aquando da receção da referida missiva, muito foi o espanto do Autor ao ser informado de que a ré seguradora não assumiria o sinistro em virtude de as garantias do contrato ainda não terem entrado em vigor. 23. De facto, quando subscreveu o contrato de seguro não foi transmitida ao Autor qualquer informação e/ou esclarecimento sobre as respetivas cláusulas, sem prejuízo do acima referido em 4 a 9. 24. No momento da celebração do referido contrato, o Autor não foi advertido para o facto de haver um período de carência, nem tão pouco em que consistiria tal período, tendo sido omitidas, por parte dos funcionários do Banco, tais informações. 25. Por essa razão, o Autor criou a convicção de que o seguro entraria em vigor a contar da data da sua assinatura, com todas as suas consequências legais impostas a ambas as partes da relação contratual, tanto mais que sabia ter pago a totalidade do prémio do seguro. 26. O Autor acreditava, por falta de esclarecimento, que estaria salvaguardado caso fosse alvo de algum infortúnio. 27. Em Maio de 2018, o Autor voltou a interpelar a ré seguradora, desta vez por intermédio da Ilustre Mandatária, para o pagamento da indemnização prevista no contrato, ou seja, o pagamento das prestações do crédito, cf. fls. 42. 28. A esta missiva a ré seguradora respondeu ao Autor, por carta datada de dia 04 de Junho de 2018, voltando a afirmar que como o sinistro havia ocorrido no período de carência, não poderiam assumir o risco, cf. fls. 43 - apesar do período de incapacidade se prolongar para além do referido período. 29. Em 18.12.2018, o Autor foi notificado pelo réu banco da denúncia do contrato e que iria proceder ao preenchimento da livrança pelo valor das prestações vencidas e do capital em dívida, cf. fls. 62. 30. Foram entregues ao autor os documentos juntos com a petição inicial a fls. 11 a 30. * Com relevância para a decisão da causa, não se provaram outros factos, nomeadamente: 31. Foram cumpridos pelo réu banco os deveres de informação quanto às cláusulas do contrato de seguro. 32. É de conhecimento universal e geral, que os contratos de seguro têm na sua execução, um período de carência. 33. Todas as condições da apólice de seguro foram explicadas ao autor pelo funcionário do banco réu. * Motivação. Em geral: O Tribunal fundou a convicção, relativamente à factualidade provada e não provada, no conjunto da prova produzida nos autos, analisada conjugada e criticamente. Para o efeito, foram considerados os documentos juntos aos autos, o acordo das partes nos articulados, as declarações de parte do autor, os depoimentos das testemunhas M, N, H. Em síntese: A factualidade provada em 1., 2., 3., 20., 21., 27., 28., 29., 30., deve-se ao teor dos respetivos documentos. A factualidade provada em 4., 5., 6., 7., 9., 10., 11., 17., 18., 19., 22., 23., 24., 25., 26., e factualidade não provada (31., 32., 33.) resulta das declarações de parte do autor. As testemunhas afirmaram que não assistiram à reunião e à celebração dos contratos. A factualidade provada em 8., resulta das declarações de parte do autor e das testemunhas M e N. A factualidade provada em 12., 13., resultou do acordo entre as partes, nos articulados. A factualidade provada em 14., 15., 16., foi referida pelo autor, em declarações de parte e consta dos documentos”. * IV. Apreciação 1ª questão: - da nulidade de sentença por omissão de conhecimento. Compulsada a fundamentação jurídica da sentença, é facto que não se encontra referência à questão suscitada pela 1ª Ré, que não pode ser vista meramente como um argumento nem o conhecimento das questões que foi feito na sentença prejudicou a apreciação dessa questão. Ocorre assim a nulidade invocada, nos termos do artigo 615º nº 1 al. d) do CPC, devendo este tribunal de recurso pronunciar-se, o que faremos adiante, nos termos do artigo 665º do mesmo diploma. 2ª questão: - impugnação de decisão sobre a matéria de facto. Estão em causa os factos (Provados) 10. Perante esta exigência e perante a necessidade de contrair o empréstimo, o Autor mais não fez do que anuir e assinar a documentação que lhe foi fornecida. 11. Nem no momento da assinatura, nem posteriormente, o Autor foi informado das demais condições relativas ao contrato de seguro, nomeadamente as relativas a eventuais períodos de carência e as cláusulas referidas em 3.. 22. Aquando da receção da referida missiva, muito foi o espanto do Autor ao ser informado de que a ré seguradora não assumiria o sinistro em virtude de as garantias do contrato ainda não terem entrado em vigor. 23. De facto, quando subscreveu o contrato de seguro não foi transmitida ao Autor qualquer informação e/ou esclarecimento sobre as respetivas cláusulas, sem prejuízo do acima referido em 4 a 9. 24. No momento da celebração do referido contrato, o Autor não foi advertido para o facto de haver um período de carência, nem tão pouco em que consistiria tal período, tendo sido omitidas, por parte dos funcionários do Banco, tais informações. 25. Por essa razão, o Autor criou a convicção de que o seguro entraria em vigor a contar da data da sua assinatura, com todas as suas consequências legais impostas a ambas as partes da relação contratual, tanto mais que sabia ter pago a totalidade do prémio do seguro. 26. O Autor acreditava, por falta de esclarecimento, que estaria salvaguardado caso fosse alvo de algum infortúnio. (Não provados) 31. Foram cumpridos pelo réu banco os deveres de informação quanto às cláusulas do contrato de seguro. 33. Todas as condições da apólice de seguro foram explicadas ao autor pelo funcionário do banco réu. Começar por dizer que o “facto” 31 não é um facto, mas uma conclusão de direito, pois será em face das concretas acções tomadas pelo réu banco que o tribunal, sondando as normas que regulam o dever de informação, chegará à conclusão sobre se o banco réu cumpriu ou não os deveres de informação. Deste modo, não se procede à reapreciação pedida, visto que não é lícito incluir na decisão da matéria de facto conclusões de direito – artigo 607º do Código de Processo Civil. Improcede esta parte da pretensão. Este tribunal ouviu atentamente a audiência de discussão e julgamento. Ouvimos o autor, em declarações de parte, e as testemunhas M, N e H, sendo a primeira gestora, ao tempo, nos balcões da 2ª Ré de … e …. e a segunda gerente do balcão de …, e sendo a terceira profissional de seguros. Claríssimo é que a terceira testemunha não sabe rigorosamente nada sobre o que se passa nos balcões da instituição bancária, limitando-se a afirmar que é obrigação dos funcionários informar. Quanto à primeira testemunha, ficamos a saber pela segunda que era a gerente do Autor, e que terá sido ela quem recebeu a proposta de crédito e a processou – isto é certo, do depoimento da segunda testemunha – mas é a própria primeira testemunha que não tem nenhuma ideia sobre se foi ela que contratou com o autor, porque nesse tempo estaria em itinerância entre … e …, e nos seus impedimentos entraria a segunda testemunha, afirmando, várias vezes no seu depoimento, que tinha ideia de ter recebido os boletins de baixa e de os ter reencaminhado para a seguradora 1ª Ré. Donde, é claro que a primeira testemunha não tem conhecimento directo sobre os termos da assinatura do contrato (nem de crédito, nem de seguro). Finalmente, da segunda testemunha, percebemos que também não assegura ter sido ele quem contratou, e que, portanto, não tem conhecimento directo. Disse e é verdade pelo seu número de funcionário, que assinou todos os documentos, mas não se recordava se o fez na presença de M, na presença do autor, ou na presença de ambos, ou se não o fez na presença de nenhum deles, porque lhe competia, como gerente do balcão, assinar todos os contratos. A partir daqui, o que temos, quer da primeira quer da segunda testemunha, é um depoimento sobre o que acham que, com as devidas cautelas por mudança de pormenores de procedimentos ao longo dos anos, na altura, aconteceu, em termos de assinatura de contrato. Não vale dizer às testemunhas que a cláusula de carência é a mais importante ou é uma das mais importantes. Porque elas vão dizer que sim, como disseram, mas isso não garante a credibilidade do seu depoimento. Podíamos até ficar na dúvida, mas no caso concreto não ficamos. O depoimento da testemunha N é perfeitamente esclarecedor (e a testemunha M não lhe ficou atrás), explicam o que é importante para o cliente: - essencialmente o que diz respeito ao contrato de crédito, e sendo incluído no valor do mútuo o valor do prémio do seguro – que é um valor elevado, segundo a primeira testemunha – então têm de explicar porque é que é tão elevado (visto que, por exemplo, se o cliente tiver um crédito habitação, o valor do seguro é mais baixo). Ora, esta explicação é feita por via das coberturas. Depreende-se, é caro porque cobre muitos riscos. Ainda mais claro é N, a documentação para assinar, entre contrato de crédito ao consumo e seguro associado, são (para aí) 50 páginas. Donde, se pode admitir-se, em teoria, e com M, para a generalidade das situações, que se vão dando informações à medida que o cliente vai rubricando as folhas, é absolutamente evidente – e N reconheceu – que o cliente não tem tempo de ler tudo, e que não lê tudo, e é também evidente que não lhe é lido dito, nem lhe é dito tudo – até porque, diz M, o cliente pode levar para casa e ler sossegadamente em casa, e tem um prazo para revogar o contrato. Resulta assim manifestamente que não foi lido tudo, nem há prova nenhuma de ter sido prestada concretamente a informação sobre a cláusula de carência. E de nada vale, com o devido respeito, afirmar-se que estes contratos de crédito ao consumo têm todos um seguro associado com período de carência, não pode cobrir-se o risco de desemprego e no mês seguinte estar-se desempregado, porque o problema do conhecimento generalizado da exigência de cláusulas de carência é que há situações de risco em que tal carência faz sentido, e há situações em que não faz sentido nenhum, sobretudo quando estamos no ramo não vida. Mas, para rematar a inexistência de qualquer dúvida razoável sobre a explicação aos clientes, em abstracto, e ao cliente autor, em concreto, é N que nos diz que as pessoas não estão à espera de ficarem doentes, de terem acidentes, e portanto quando contratam, e quando lhe estão a ser dadas explicações, é evidente que não fazem perguntas sobre eventualidades que não estão na sua mente. Ora, servindo as explicações para explicar o que é mais importante, ao longo de cinquenta páginas, é claro que a cláusula de carência não é uma das cláusulas que seja explicada em abstracto e não é uma das cláusulas sobre as quais os clientes façam perguntas. Não há assim prova alguma que permita alterar os factos provados 10, 11, 22 e 23 nem que permita dar como provado o facto não provado 33. Quanto aos factos restantes, sobre o espanto do Autor e sobre o seu convencimento de que o risco estava coberto, porque é o Autor havia de responder a N, quando lhe perguntou meses depois sobre o incumprimento das prestações, algo mais do que “estou doente, não estou a trabalhar, não tenho rendimento suficiente”? É a resposta correcta e completa a dar. A resposta correcta não é “e além do mais o seguro paga”. O facto do Autor não ter dito isto, não revela que soubesse que o seguro não pagava porque o sinistro havia ocorrido no período de carência. É bastante razoável pensar o contrário: - senão, porque haveria o Autor de enviar os boletins de baixa a M? Em suma, entendemos que nada justifica alterar a decisão sobre a matéria de facto, que assim se confirma. Improcede esta segunda questão. 3ª questão: - da condenação da 2ª Ré e não a 1ª, por aplicação do disposto nos n°s. 1 e 3 do art° 78° e no art° 79° do Dec° Lei 72/2008 de 16 de Abril e ainda no art° 30°, alíneas b) e f) da Lei de Mediação de Seguros (Lei 7/2019). Para a recorrente, a não se alterar a decisão sobre a matéria de facto, o responsável pela violação do dever de informação é a 2ª Ré, na qualidade de tomadora e mediadora do contrato de seguro, pelo que a sentença haveria de ter condenado a 2ª Ré e não a primeira. Dispõem os preceitos referidos: “Artigo 78º 1 - Sem prejuízo do disposto nos artigos 18.º a 21.º, que são aplicáveis com as necessárias adaptações, o tomador do seguro deve informar os segurados sobre as coberturas contratadas e as suas exclusões, as obrigações e os direitos em caso de sinistro, bem como sobre as alterações ao contrato, em conformidade com um espécimen elaborado pelo segurador. 2 - No seguro de pessoas, o tomador do seguro deve ainda informar as pessoas seguras do regime de designação e alteração do beneficiário. 3 - Compete ao tomador do seguro provar que forneceu as informações referidas nos números anteriores. 4 - O segurador deve facultar, a pedido dos segurados, todas as informações necessárias para a efectiva compreensão do contrato. 5 - O contrato de seguro pode prever que o dever de informar referido nos n.ºs 1 e 2 seja assumido pelo segurador”. Artigo 79º “O incumprimento do dever de informar faz incorrer aquele sobre quem o dever impende em responsabilidade civil nos termos gerais”. Já na Lei 7/2019 o artigo 30º dispõe: “1 - Sem prejuízo de outros deveres fixados no presente regime, são deveres do mediador de seguros para com os clientes ou potenciais clientes: a) Atuar em conformidade com os melhores interesses dos seus clientes, de forma honesta, correta e profissional; b) Informar, nos termos fixados por lei e respetiva regulamentação, dos direitos e deveres que decorrem da celebração de contratos de seguro; c) Respeitando as necessidades e exigências do cliente e as informações por este prestadas, informar, de modo correto e pormenorizado e de acordo com o exigível pela respetiva categoria de mediador, com a complexidade do tipo de produto proposto e com o tipo de cliente, sobre o contrato ou os contratos de seguro mais convenientes à transferência de risco ou ao investimento, de modo a permitir que o cliente tome uma decisão informada; d) Não praticar quaisquer atos relacionados com um contrato de seguro sem informar previamente o respetivo tomador do seguro e obter a sua concordância; e) Transmitir à empresa de seguros, em tempo útil, todas as informações e instruções, no âmbito do contrato de seguro, que o tomador do seguro solicite; f) Prestar ao tomador do seguro todos os esclarecimentos relativos ao contrato de seguro previamente à sua celebração, durante a sua execução e durante a pendência dos conflitos dele derivados; g) Não fazer uso de outra profissão ou cargo que exerça para condicionar a liberdade negocial do cliente. 2 - O mediador de seguros que exerça a atividade de distribuição de produtos de investimento com base em seguros deve ainda observar o disposto na subsecção ii da presente secção. 3 - Nos casos legalmente admissíveis em que o tomador do seguro coincide com o mediador do seguro, os direitos do tomador do seguro transferem-se para os segurados”. Invoca ainda a recorrente jurisprudência em seu favor, louvando-se num acórdão do Supremo Tribunal de Justiça nº STJ_651/04.4TBETR.P1.S1 de 17-06-2010. Tal acórdão, e os que igualmente se pronunciaram no mesmo sentido, foram, a nosso ver, muito bem analisados no acórdão da Relação do Porto de 27.9.2018 (Rel. Araújo de Barros), no trecho que passamos a expor e com o qual inteiramente concordamos e que entendemos ter inteira aplicação ao caso dos autos, no qual se não discute que o contrato de seguro celebrado entre as partes é um contrato de adesão sujeito ao regime jurídico das cláusulas contratuais gerais plasmado no DL 446/85, de 25 de Outubro e alterações subsequentes. Escreveu-se em tal acórdão: “O presente recurso cinge-se à discussão da questão conexa com o alcance dos deveres de comunicação e de informação impostos pelos artigos 5º e 6º do DL nº 446/85 no que concerne às condições do Contrato de Seguro de Vida Grupo. Mais concretamente, ao saber se tais deveres perante o segurado se impõem não só ao tomador do seguro como também ao segurador. Dispõe o artigo 5º do DL nº 446/85, de 25 de Outubro, sob a epígrafe “comunicação”: «1 - As cláusulas contratuais gerais devem ser comunicadas na íntegra aos aderentes que se limitem a subscrevê-las ou a aceitá-las; 2 - A comunicação deve ser realizada de modo adequado e com a antecedência necessária para que, tendo em conta a importância do contrato e a extensão e complexidade das cláusulas, se torne possível o seu conhecimento completo e efectivo por quem use de comum diligência; 3 - O ónus da prova da comunicação adequada e efectiva cabe ao contratante que submeta a outrem as cláusulas contratuais gerais». E o artigo 6º, sob a epígrafe “dever de informação”: «1 - O contratante determinado que recorra a cláusulas contratuais gerais deve informar, de acordo com as circunstâncias, a outra parte dos aspectos nelas compreendidos cuja aclaração se justifique; 2 - Devem ainda ser prestados todos os esclarecimentos razoáveis solicitados». Sendo que, nos termos do artigo 8º do mesmo diploma, «consideram-se excluídas dos contratos singulares: a) As cláusulas que não tenham sido comunicadas nos termos do artigo 5º; b) As cláusulas comunicadas com violação do dever de informação, de molde que não seja de esperar o seu conhecimento efectivo». Está nos autos dado como não provado que a autora e o falecido D... tivessem conhecimento da cláusula que excluía a responsabilidade da seguradora no caso de morte por suicídio durante os primeiros dois anos a contar da data de adesão da pessoa segura. Assim, atenta a natureza do contrato e o ónus da prova que sobre a ré impenderia, nos termos do referido nº 3 do artigo 5º, teria de se considerar não cumprido aquele dever, consequentemente se excluindo do contrato a cláusula que afastava a sua aplicação no caso de morte por suicídio do segurado até dois anos a contar da data de adesão da pessoa segura. Entende, no entanto, a sentença recorrida que, nos seguros de grupo, as obrigações de comunicação e de informação recaem sobre a tomadora do seguro e não sobre a seguradora. Louva-se para tal na jurisprudência dos acórdãos do STJ de 12 de Outubro de 2010 (Sebastião Póvoas) e de 14 de Abril de 2015 (Maria dos Prazeres Beleza), in www.dgsi.pt. Ao que acrescentaríamos o acórdão do STJ de 21.02.1013 (Silva Gonçalves), ibidem. O argumento que essencialmente se esgrime é o de que o DL nº 176/95, de 26 de Julho, bem como o actual DL nº 72/2008, de 16 de Abril, estabelece disciplina diferente do regime geral previsto no DL nº 446/85. Assim, existindo lei especial para os contratos de seguro, não haveria que lançar mão do regime geral consagrado neste diploma. No último dos arestos aludidos, há um voto de vencido, do senhor conselheiro Pires da Rosa. Sucinto mas expressivo – “uma coisa é a sua exclusão - que se verifica - outra a responsabilidade perante a seguradora do tomador de seguro - o Banco G... - por não cumprir o dever de informação”. Efectivamente, aquela jurisprudência incorre quanto a nós em evidente equívoco. O preceito do artigo 4º, nº 1, do DL nº 176/95, e do actual artigo 78º, nº 1, do Regime Jurídico do Contrato de Seguro, instituído pelo DL nº 72/2008, de 16 de Abril, não colide com o regime do DL nº 446/85, quanto à obrigação de informação. Na verdade, o seu alcance restringe-se às relações entre o segurador e o tomador. Como decorre claramente do preâmbulo daquele primitivo diploma, em trecho cujas implicações não parecem ter sido correctamente apreendidas – “Pretende-se, assim, definir algumas regras sobre a informação que, em matéria de condições contratuais e tarifárias, deve ser prestada aos tomadores e subscritores de contratos de seguro pelas seguradoras que exercem a sua actividade em Portugal. Pretende-se igualmente com esta nova regulamentação reduzir o potencial de conflito entre as seguradoras e os tomadores de seguro, minimizando as suas principais causas e clarificando direitos e obrigações”. Posto o que, não podemos duvidar de que o dever de informação impende sobre a seguradora. Simplesmente, para reduzir o potencial conflito entre tomadores e seguradoras, clarificaram-se os direitos e obrigações. Nas relações entre estes, como é óbvio. Pelo que, entendida necessariamente com esse restrito âmbito, a obrigação que recaía sobre o tomador de, nos termos do artigo 4º, nº 1, do DL nº 176/95 informar “os segurados sobre as coberturas e exclusões contratadas, as obrigações e direitos em caso de sinistro e as alterações posteriores que ocorram neste âmbito, em conformidade com um espécimen elaborado pela seguradora” nunca poderia implicar uma conexa dispensa de tal dever de informação da seguradora para com o segurado, a este validamente oponível por aquela. Tal preceito veio a ser revogado pelo artigo 6º do DL nº 72/2008, de 16 de Abril. Que todavia consagrou norma equivalente no artigo 78º, nº 1, do Regime Jurídico do Contrato de Seguro que instituiu, no seu Capítulo VII, relativo ao Seguro de Grupo - «o tomador do seguro deve informar os segurados sobre as coberturas contratadas e as suas exclusões, as obrigações e os direitos em caso de sinistro, bem como sobre as alterações ao contrato, em conformidade com um espécimen elaborado pelo segurador». Destacaremos a observação constante do acórdão do STJ de 14 de Abril de 2014 (Clara Sottomayor), in dgsi.pt, de que “a intenção do legislador, dada a particular vulnerabilidade do aderente, não pode deixar de ter sido a de reforçar o dever de informação de uma das partes do contrato de seguro de grupo – o Banco – e não a de dispensar a seguradora de um dever que, de qualquer forma, já resultava dos artigos 5.º e 6.º do DL n.º 446/85 e do princípio da boa fé consagrado nos artigos 227.º, 239.º e 762.º, n.º 2, do CC”. Doutro passo fazendo ressaltar que “a classificação de uma norma como norma especial não é um dado apriorístico, mas pressupõe uma prévia interpretação da mesma, de acordo com os cânones de interpretação fixados na lei (artigo 9.º do Código Civil)”. Sendo que “a prossecução deste objectivo implica necessariamente um reforço da protecção do aderente e não a sua diminuição, pelo que não podemos considerar o DL n.º 176/95 como uma lei especial que derroga o diploma que fixa o regime das cláusulas contratuais gerais, enquanto lei geral ou comum; até porque não se pode considerar que o DL n.º 446/85 seja lei geral ou comum, sendo antes uma lei especial em relação ao regime comum dos contratos e que o derroga; estaríamos, então, apenas perante duas leis especiais em relação ao regime geral dos contratos e cuja interpretação e aplicação deve ser harmonizada, sem que nenhuma delas afaste a outra”. Acertadamente concluindo que “o acto de adesão do segurado em relação às condições do contrato de seguro consubstancia uma manifestação de vontade de que é contraparte a seguradora, o que permite atribuir ao aderente uma protecção equivalente à do segurado num contrato individual, aplicando-se o DL 446/85, de 25/10, para regular as relações entre o segurado e a seguradora”. Com este entendimento, que temos por adequado, além da jurisprudência já aludida, os acórdãos deste Tribunal da Relação do Porto de 11.09.2008 (Fernando Batista) – “embora, numa primeira análise, seja o tomador do seguro (o banco mutuante) quem no seguro de grupo tem o dever de informação do teor das cláusulas, a falta de informação desse intermediário repercute-se na seguradora, não sendo essa falta oponível ao segurado, arcando, assim, a seguradora com as respectivas consequências, sem que possa invocar perante o segurado as cláusulas contratuais gerais a que essa falta respeita. Ou seja, responde perante o segurado, sem prejuízo de poder (eventualmente), depois, vir a accionar o intermediário (tomador do seguro de grupo) pelo prejuízo que tal falta de informação lhe tenha acarretado” - e do Tribunal da Relação de Lisboa de 5.03.2009 (Catarina Manso) – “tendo o Banco, tomador do seguro se limitado a entregar ao segurado o boletim de adesão, a culpa de falta de informação cabe-lhe a ele e às seguradoras que se foram sucedendo”, ambos in dgsi.pt. E, mais recentemente, ibidem, os acórdãos deste Tribunal da Relação do Porto de 27 de Fevereiro de 2014 (por nós relatado), do STJ de 29 de Novembro de 2016 (Fonseca Ramos) e do Tribunal da Relação de Guimarães de 25 de Janeiro de 2018 (Raquel Tavares). Ver todavia em sentido contrário, ainda ibidem, além dos citados na sentença recorrida, os acórdãos desta Relação do Porto de 31.01.2007 (Amaral Ferreira) e do STJ de 22.01.2009 (Custódio Montes). Por tudo o exposto, concluiremos que a exclusão da cláusula do contrato em apreço por omissão do dever de informação tem eficácia que se estende também à seguradora, desse modo se impondo a procedência da pretensão da autora e recorrente”. Do regime do mediador, isto é, da circunstância de o tomador ser mediador, não resulta qualquer diferença que impeça a aplicação desta jurisprudência, ou seja, que nos leve a negar que a questão da responsabilidade do tomador de seguro e mediador por violação do dever de informação se coloque fora do domínio da relação entre segurador e tomador de seguro ou mediador, em termos tais que possa tal violação ser oponível à pessoa segura. Este resultado, que é o que a recorrente defende que a sentença devia ter decidido, mostra-se absolutamente contrário ao regime das cláusulas contratuais gerais e à protecção por ele instituída. Improcede assim esta questão. 4ª questão: - saber se a recorrente não podia ser condenada a pagar mais do que 12 meses de prestações, sendo que a condenação a pagar no período de 24 meses entre 20.01.2018 e 19.01.2020, viola o disposto nos art°s. 8º, al. a) e 9º do Decreto Lei 446/ 85, bem como do art° 37°, n° 3, al. b) do Decreto Lei 72/2008. Sustenta, no corpo da alegação, que a exclusão duma cláusula por violação do dever de informação, impõe, na subsistência do contrato singular, que se recorra às regras de integração dos negócios jurídicos, sendo que não poderia ser excluída a cláusula de cobertura, e por conseguinte tem de haver uma cobertura – em rigor, um limite de cobertura – cuja fixação não pode ser arbitrária, antes deve corresponder precisamente àquela que consta da apólice, que é a que reflecte o equilíbrio entre o preço e a ponderação do risco aleatório no contrato entre a seguradora e o tomador de seguro. Embora a petição inicial refira, com precisão, como cláusula não explicada, a cláusula de carência, porque é aquela que foi invocada para a negação do pagamento por parte da seguradora, também ali se encontra que “31. Como é sabido, o seguro de proteção ao crédito tem como finalidade assegurar os encargos com empréstimos em caso de o titular ver os rendimentos reduzidos devido a baixa médica ou hospitalização, desemprego ou atraso no pagamento dos salários. Portanto, irá substituir o segurando na relação contratual por forma a assegurar o pagamento das prestações mensais devidas e para amortização da dívida; 32. É um produto que as instituições financeiras aconselham os consumidores a subscrever, com o objetivo de terem mais uma garantia de que o montante mutuado é pago; 33. Tratam-se, contudo, de contratos de adesão, porquanto constam de impressos previamente elaborados pela Ré, que os aderentes se limitam a aceitar ou não, sem possibilidade de conformar as cláusulas dos mesmos à sua vontade; 34. Significa, portanto, que não existe possibilidade de conformar as cláusulas dos mesmos à sua vontade; 35. Aliás, aquando da assinatura destes contratos, os aderentes estão focados nas condições do contrato de crédito e não nos contratos que lhe são assessórios cujas cláusulas, em rigor, desconhecem; 36. No caso em apreço, o Autor contratou um crédito ao consumo junto do … BANCO e foi o funcionário com quem contratou o crédito que lhe falou da exigência de um seguro de proteção de crédito; 37. Perante esta exigência e perante a necessidade de contrair o empréstimo, o Autor mais não fez do que anuir e assinar a documentação que lhe foi fornecida; 38. Nem no momento da assinatura, nem posteriormente, o Autor foi informado das condições relativas ao contrato de seguro, nomeadamente as relativas a eventuais períodos de carência” (sublinhado nosso). Esta alegação estende-se, portanto, também quanto à duração temporal da cobertura, e na realidade veio a receber o beneplácito da prova no facto provado nº “23. De facto, quando subscreveu o contrato de seguro não foi transmitida ao Autor qualquer informação e/ou esclarecimento sobre as respetivas cláusulas, sem prejuízo do acima referido em 4 a 9”. Assim, a cláusula que estabelece que a duração de cobertura é 12 prestações tem de considerar-se excluída do contrato singular. Podemos dizer que a condenação só poderia ser relativamente a 12 prestações, por via da integração do negócio jurídico referida no artigo 9º, e porque a cláusula tinha sido comunicada por escrito e em escrito mais visível – artigo 37º n° 3, al. b) do Decreto Lei 72/2008? Temos alguma dificuldade em perceber como é que uma cláusula excluída, por incumprimento do dever de informação - artigos 6º e 8º - é aplicável enquanto “espírito de coerência substancial e sistemática” activado pela tarefa de integração jurídica. Depois, temos de dizer que a exclusão do limite de duração da cobertura não leva à consideração de que estamos perante um contrato de seguro sem cobertura, mas apenas à consideração que não é aplicável o limite de duração de cobertura constante da apólice. A cobertura, em bom rigor, é a do pagamento das prestações durante o tempo em que se verifica o risco coberto – no caso, doença (e não acidente e suas sequelas) impeditiva do trabalho – e foi isso que a sentença fez. A integração do contrato foi feita por recurso à essência do risco coberto, e foi feita ainda com observação do equilíbrio contratual – recordemos que o prémio total foi pago pelo autor à cabeça, facto provado 8 – posto que, na mesma cláusula excluída, a previsão dos 12 meses era para o caso dum evento singular, mas na agregação de sinistros se podia ir até ao máximo de 36 meses. Quer isto dizer, a não consideração do limite de doze prestações mensais não excedeu a cobertura máxima total prevista, não tendo havido rompimento do dito equilíbrio. Termos em que improcede também esta questão, e o recurso na sua totalidade. Tendo nele decaído, é a recorrente responsável pelas custas – artigo 527º nº 1 e 2 do Código de Processo Civil. * V. Decisão Nos termos supra expostos, acordam os juízes que compõem este colectivo da 6ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa em negar provimento ao recurso e em consequência em confirmar a sentença recorrida. Custas pela recorrente. Registe e notifique. Lisboa, 24 de Outubro de 2024 Eduardo Petersen Silva Elsa Melo Cláudia Barata [1] Beneficia do relatório da decisão recorrida. |