Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | JOSÉ EDUARDO SAPATEIRO | ||
Descritores: | INJUNÇÃO VALOR RECONVENÇÃO ADMISSIBILIDADE EXCEPÇÃO PEREMPTÓRIA COMPENSAÇÃO | ||
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Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 07/02/2009 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | CONFIRMADA A DECISÃO | ||
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Sumário: | I - O regime especial aprovado pelo Decreto-Lei n.º 269/98 de 1/09 e contido no correspondente anexo, aplica-se aos procedimentos destinados “a exigir o cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos de valor não superior à alçada da Relação”, respeitando os artigos 1.º a 5.º do mesmo à acção declarativa de natureza especial e os artigos 7.º e seguintes ao processo de injunção (sem prejuízo de algumas normas deste Capítulo II que são aplicáveis também ao processo especial de natureza judicial que resultar da injunção). II - A nossa jurisprudência acerca da natureza jurídica do procedimento injuntivo, qualifica-o como administrativo (e não judicial ou pré-judicial), só assumindo, verdadeiramente, uma índole judicial com a sua distribuição no tribunal competente, fixando-se a competência do tribunal no momento da respectiva distribuição do processo. III - A alçada dos Tribunais da Relação, de acordo com o artigo 24.º da Lei n.º 3/99 de 13/01 é de € 14.963,94, constatando-se que o pedido injuntivo em análise é inferior a esse montante delimitativo da competência dos tribunais judiciais em razão do valor (artigos 62.º e 68.º do Código de Processo Civil). IV - O artigo 18.º do Decreto-Lei n.º 269/98 de 1/09 determina quanto ao valor processual da injunção e subsequente acção declarativa de índole especial: “o valor processual da injunção e da acção declarativa que se lhe seguir é o do pedido, atendendo-se, quanto aos juros, apenas aos vencidos até à data da apresentação do requerimento”. V - Esta disposição é, manifestamente, uma norma especial que se sobrepõe ao regime geral (artigos 305.º e seguintes do Código de Processo Civil), em tudo que não coincida com este último, ou seja, afasta o dispositivo de carácter geral constante do número 2 do artigo 308.º do Código de Processo Civil, repondo, de alguma forma e em termos absolutos, o número 1 da mesma disposição legal. VI - Logo, o valor processual que há a atender, para efeitos de prosseguimento da injunção como processo especial ou comum, é o do montante do pedido injuntivo e juros de mora vencidos até à apresentação do respectivo requerimento-tipo, não tendo qualquer influência sobre o mencionado valor (em termos do seu aumento quantitativo) aquele que vier a ser aditado por uma eventual reconvenção que venha a ser formulada na oposição do requerido, como é a situação suscitada nos presentes autos. VII - O regime processual especial espraiado nos artigos 1.º a 5.º do Decreto-Lei n.º 269/98 de 1/09 traduz-se, inequivocamente, em dois únicos articulados (petição inicial e contestação, numa simplificação processual que o aproxima da forma adjectiva sumaríssima (artigos 795.º e seguintes do Código de Processo Civil) e das acções de natureza laboral com valor inferior à alçada do tribunal, onde não é admitido um terceiro articulado, ainda que haja a arguição de excepções, ou se pretenda deduzir reconvenção, em nome da celeridade, prontidão e eficácia da justiça laboral (cf. artigos 30.º e 60.º do Código de Processo do Trabalho), nunca tendo tais regimes processuais simplificados sido encarados como inconstitucionais, por violarem o acesso ao direito e aos tribunais (em rigor, tais direitos constitucionais nunca estariam afectados, nos moldes perseguidos pela recorrente, dado esta poder sempre lançar mão de uma acção declarativa de condenação com processo comum, com vista a reclamar da Autora as verbas que se arroga, sem prejuízo do accionamento da excepção peremptória de compensação no quadro destes autos). (JES) | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam neste Tribunal da Relação de Lisboa: I – RELATÓRIO PROJECTOS INFORMÁTICOS, LDA, com sede na Amadora, intentou no Tribunal da Comarca da Amadora uns autos de Injunção, com processo especial, para cumprimento de obrigações pecuniárias de natureza comercial emergentes de contrato de fornecimento de bens e serviços, ao abrigo do Decreto-Lei n.º 269/98, de 1/09, contra SOCIEDADE UNIPESSOAL, LDA, com sede em Lisboa, pedindo, em síntese, o pagamento pela Requerida da importância de Euros 9.907,28 acrescida de Euros 451,28 de juros de mora, às taxas sucessivas de 10,58% e de 11,07%, vencidos desde 28/03/2007 até 27/09/2007, bem como dos vincendos até integral pagamento, e de Euros 96,00 a título de taxa de justiça e suportando tais pretensões em 6 facturas vencidas entre 31/03/2007 e 11/07/2007. * Notificada a Requerida SOCIEDADE UNIPESSOAL, LDA, através de carta registada com Aviso de Recepção (fls. 8 e 8-A) veio a mesma apresentar oposição dentro do prazo legal, nos seguintes moldes, na parte que nos interessa (fls. 9 e seguintes): (…) * Face a tal oposição, o Secretário de Justiça do Tribunal Judicial da Amadora determinou a distribuição dos presentes autos, tendo os mesmos sido distribuídos ao 1.º Juízo Cível desse mesmo Tribunal. Foi proferido, a fls. 108 a 111, despacho saneador, onde foi declarado competente em razão do território o Tribunal da Comarca da Amadora e decidido o seguinte quanto ao pedido reconvencional deduzido pela Ré: “A presente injunção tem o valor de € l0 454,56, valor esse que é inferior ao da alçada da Relação. Trata-se de injunção apresentada na sequência de operação emergente de transacção comercial, ao abrigo do Decreto-Lei n.º 32/2003, de 17.2. Dispõe o art.º 7.º, n.º 4, do Decreto-Lei n.º 32/2003 (com a redacção introduzida pelo DL 107/2005, de 1.7) que as acções destinadas a exigir o cumprimento das obrigações pecuniárias emergentes de transacções comerciais de valor não superior à alçada da Relação seguem os termos da acção declarativa especial para cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contrato. Tal acção está prevista no Decreto-Lei n.º 269/98, de 1.9. Essa acção é simplificada e admite unicamente dois articulados, a saber a petição inicial e a contestação sendo que esta apenas é notificada ao Autor aquando da designação de data para julgamento. Tem sido discutida na doutrina e jurisprudência a questão da admissibilidade da reconvenção no processo sumaríssimo. Dada a similitude desta acção simplificada com o processo sumaríssimo as considerações feitas nesta forma de processo a propósito da inadmissibilidade da reconvenção valem por igualdade ou até maioria de razão na acção especial simplificada. A reconvenção traduz-se numa acção cruzada do Réu contra o Autor. Ora, para que a mesma fosse admissível necessário seria permitir à parte contrária um articulado de resposta a fim de se poder defender do pedido que contra ela é formulado. Na medida em que não há outros articulados para além da contestação não é possível admitir a reconvenção. Admiti-la e permitir a consequente dedução de posteriores articulados seria desvirtuar a natureza simplificada da acção. No mesmo sentido, veja-se Salvador da Costa in “A injunção e as Conexas Acção e Execução”, 2.ª Edição, pág. 61 e segs. Nestes termos, não admito a reconvenção formulada pela ré. Custas da reconvenção pela Ré. Notifique.” * A Ré SOCIEDADE UNIPESSOAL, LDA veio interpor recurso dessa sentença (fls. 121 e 122), que foi correctamente admitido como agravo, a subir de imediato, nos próprios autos e com efeito suspensivo (fls. 145). A Agravante apresentou, a fls. 148 e seguintes, alegações de recurso e formulou as seguintes conclusões: (…) * A Autora, apesar de notificada para o efeito, não veio apresentar contra-alegações dentro do prazo legal. * O tribunal recorrido, a convite do relator do recurso, proferiu despacho de sustentação do despacho impugnado. (…) II – OS FACTOS A factualidade que releva para a decisão do objecto do presente recurso de agravo é a que se acha descrita no relatório do presente Aresto e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido. III – OS FACTOS E O DIREITO É pelas conclusões do recurso que se delimita o seu âmbito de cognição, nos termos do disposto nos artigos 690.º e 684.º n.º 3, ambos do Código de Processo Civil, salvo questões do conhecimento oficioso (artigo 660.º n.º 2 do Código de Processo Civil). A única questão que se suscita no quadro do presente recurso é se, ao contrário do que foi decidido pelo tribunal da 1.ª instância, o pedido reconvencional deduzido pela Ré na sua oposição à Injunção requerida pela Autora deveria ter sido admitido. Verifica-se, com efeito, que notificada a Requerida do pedido injuntivo, nos termos e para os efeitos do artigo 13.º do citado diploma legal, veio a mesma deduzir oposição à pretensão em causa, o que implicou que o processo injuntivo em causa fosse, por determinação do Sr. Secretário Judicial, distribuído, tendo-o sido no mesmo tribunal judicial onde havia corrido tal processo de injunção (a Ré veio arguir, na sua oposição, a excepção de incompetência territorial, que foi, contudo, indeferida, por despacho judicial já transitado em julgado, que entendeu o Tribunal Judicial da Amadora como legalmente competente). Chegados aqui, importa realçar, em primeiro lugar, que estamos perante uma obrigação emergente de transacção comercial, nos termos e para os efeitos do Decreto-Lei n.º 32/2003 de 17/03, sendo certo que o mesmo também sofreu alterações de acordo com o acima referido Decreto-Lei n.º 107/2005 de 1/7, que começaram a produzir efeitos em 15/9/2005, rezando o seu artigo 7.º o seguinte: (…) Por outro lado, o regime especial aprovado pelo Decreto-Lei n.º 269/98 de 1/09 e contido no correspondente anexo, aplica-se aos procedimentos destinados “a exigir o cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos de valor não superior à alçada da Relação”, respeitando os artigos 1.º a 5.º do mesmo à acção declarativa de natureza especial e os artigos 7.º e seguintes ao processo de injunção (sem prejuízo de algumas normas deste Capítulo II que são aplicáveis também ao processo especial de natureza judicial que resultar da injunção). Importa ainda recordar o que a nossa jurisprudência refere acerca da natureza jurídica do procedimento injuntivo, qualificando-a como administrativa (e não judicial ou pré-judicial), só assumindo, verdadeiramente, uma índole judicial com a sua distribuição no tribunal competente, bem como no que concerne ao momento em que se fixa a competência do tribunal que receba tal expediente, situando-a no momento da respectiva distribuição (cf., relativamente a esses diversos aspectos, os Acórdãos do Tribunal da Relação de Lisboa de 05/06/2000, Granja da Fonseca, processo 6055236, de 10/10/2000, Azadinho Loureiro, processo 0016971 e de 30/01/2007, Isoleta Almeida Costa, processo 8750/2006-1 e do Tribunal da Relação do Porto de 8/2/2001, Teles de Menezes, processo 6031700, de 26/06/2001, Emídio Costa, processo 0120334, de 3/1272002, Fernando Samões, processo 0120505 e 16/05/2005, Fonseca Ramos, processo 0552527, que podem ser encontrados em www.dgsi.pt). Ora, tendo em consideração que a alçada dos Tribunais da Relação, de acordo com o artigo 24.º da Lei n.º 3/99 de 13/01 é de € 14.963,94 (a alteração introduzida pelo artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 303/2007, de 24/08, só produz efeitos em 1/01/2008, não sendo aplicável aos processos pendentes à data da sua entrada em vigor, sendo certo que estes autos, na sua fase injuntiva e declarativa, foram respectivamente instaurados e distribuídos em 27/09/2007 e 12/11/2007 – cf. fls. 2) pode, desde logo, constatar-se que o pedido injuntivo em análise é inferior a esse montante delimitativo da competência dos tribunais judiciais em razão do valor (artigos 62.º e 68.º do Código de Processo Civil). Impõe-se referir a este propósito, face ao teor das alegações da recorrente e ao estatuído em termos gerais nos artigos 305.º e seguintes do Código de Processo Civil, o que o artigo 18.º do Decreto-Lei n.º 269/98 de 1/09 determina quanto ao valor processual da injunção e subsequente acção declarativa de índole especial: “o valor processual da injunção e da acção declarativa que se lhe seguir é o do pedido, atendendo-se, quanto aos juros, apenas aos vencidos até à data da apresentação do requerimento”. Esta disposição é, manifestamente, uma norma especial que se sobrepõe ao regime geral, em tudo que não coincida com este último (uma expressão deste princípio está contida no artigo 7.º, número 3, do Código Civil, no que concerne à revogação da regra especial pela regra geral posterior – cf. Oliveira Ascensão, “O Direito – Introdução e Teoria Geral”, 13.ª Edição Refundida, Março de 2005, Almedina, páginas 527 e seguintes), ou seja, afasta o dispositivo de carácter geral constante do número 2 do artigo 308.º do Código de Processo Civil (“Exceptua-se o caso de o réu deduzir reconvenção ou de haver intervenção principal, em que o valor do pedido formulado pelo réu ou pelo interveniente, quando distinto do deduzido pelo autor, se soma ao valor deste; mas este aumento de valor só produz efeitos no que respeita aos actos e termos posteriores à reconvenção ou à intervenção”), repondo, de alguma forma e em termos absolutos, o número 1 da mesma disposição legal (“Na determinação do valor da causa, deve atender-se ao momento em que a acção é proposta”). Logo, o valor processual que há a atender, para efeitos de prosseguimento da injunção como processo especial ou comum, é o do montante do pedido injuntivo e juros de mora vencidos até à apresentação do respectivo requerimento-tipo, não tendo qualquer influência sobre o mencionado valor (em termos do seu aumento quantitativo) aquele que vier a ser aditado por uma eventual reconvenção que venha a ser formulada na oposição do requerido, como é a situação suscitada nos presentes autos. Por outro lado, o que não é nada despiciendo em termos de análise desta questão, o regime processual especial espraiado nos artigos 1.º a 5.º do Decreto-Lei n.º 269/98 de 1/09 traduz-se, inequivocamente, em dois únicos articulados (petição inicial e contestação que, em nosso entender, são sempre susceptíveis de serem aperfeiçoados por determinação judicial, sendo que tal faculdade se acha expressamente prevista para as acções declarativas resultantes da “conversão” da injunção apresentada à distribuição – artigos 16.º e 17.º, números 1 a 3 do mesmo diploma legal – cf. Acórdãos do Tribunal da Relação de Lisboa de 5/6/2008 e 3/2/2009, processos números 539/2008-1 e 10740/2008-7, relatores: Rui Vouga e Maria José Simões, ambos em www.dgsi.pt), numa simplificação processual que, como bem se diz no despacho recorrido, o aproxima da forma adjectiva sumaríssima (artigos 795.º e seguintes do Código de Processo Civil) e, dizemos nós, das acções de natureza laboral com valor inferior à alçada do tribunal, onde não é admitido um terceiro articulado, ainda que haja a arguição de excepções, ou se pretenda deduzir reconvenção, em nome da celeridade, prontidão e eficácia da justiça laboral (cf. artigos 30.º e 60.º do Código de Processo do Trabalho), nunca tendo tais regimes processuais simplificados sido encarados como inconstitucionais, por violarem o acesso ao direito e aos tribunais (em rigor, tais direitos constitucionais nunca estariam afectados, nos moldes perseguidos pela recorrente, dado esta poder sempre lançar mão de uma acção declarativa de condenação com processo comum, com vista a reclamar da Autora as verbas que se arroga, sem prejuízo do accionamento da excepção peremptória de compensação no quadro destes autos). Somos conhecedores da polémica jurisprudencial que neste campo (admissibilidade da reconvenção no quadro do aludido processo especial – artigos 1.º a 5.º do Decreto-Lei n.º 269/98 de 1/09) tem-se se vindo a verificar mas, nesta matéria, subscrevemos a doutrina que ressalta dos seguintes Arestos dos nossos tribunais superiores, todos publicados em www.dgsi.pt: - Supremo Tribunal de Justiça - Acórdão de 18/12/2008, processo n.º 08B388, relator: Salvador da Costa (por exclusão de partes ou “a contrario sensu”); - Tribunal da Relação de Lisboa - Acórdão de 12/07/2006, processo n.º 5904/2006-7, relator: Orlando Nascimento (muito embora proferido num quadro legal diferente do nosso, a tese aí defendida é idêntica à por nós aqui propugnada); - Acórdão de 17/01/2008, processo n.º 10606/2007-8, relator: Ilídio Sacarrão Martins; - Tribunal da Relação de Coimbra - Acórdão de 18/05/2004, processo n.º 971/04, relator: António Piçarra (muito embora proferido num quadro legal diferente do nosso, a tese aí defendida é idêntica à por nós aqui propugnada). A ser assim, tendo havido oposição à injunção por parte da Requerida, houve lugar ao cumprimento do disposto no artigo 16.º daquele Decreto-Lei n.º 269/98 de 1/09 e, atento o valor do pedido (injuntivo e judicial), à distribuição dos presentes autos como acção declarativa de condenação com processo especial para cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contrato de valor não superior à alçada do Tribunal da Relação, obedecendo tal processo ao disposto nos artigos 17.º e 1.º, número 4 e 3.º e 4.º do mesmo diploma legal e não permitindo pedido reconvencional, andou bem o tribunal da 1.ª instância ao não admitir a reconvenção deduzida pela Ré e aqui Agravante. Logo, pelos motivos expostos, o presente Agravo tem de ser julgado improcedente. IV – DECISÃO Por todo o exposto e tendo em conta os artigos 713.º e 749.º do Código do Processo Civil, acorda-se neste Tribunal da Relação de Lisboa em não conceder provimento ao recurso de agravo interposto por SOCIEDADE UNIPESSOAL, LDA, confirmando, nessa medida e integralmente, o despacho proferido pelo tribunal da 1.ª instância. Custas do recurso pela Agravante. Notifique e Registe. Lisboa, 2 de Julho de 2009 (José Eduardo Sapateiro) (Teresa Soares) (Rosa Barroso) |