Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | JOSÉ ADRIANO | ||
Descritores: | PROCESSO ABREVIADO NULIDADE ACTA | ||
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Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 04/10/2018 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Texto Parcial: | N | ||
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Meio Processual: | RECURSO PENAL | ||
Decisão: | NÃO PROVIDO | ||
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Sumário: | - Segundo o n.º 4 do artigo 389.º-A CPP, em processo abreviado, quando a audiência, a requerimento do arguido, tiver decorrido na sua ausência, caso em que sentença obedece aos requisitos do art. 389.º-A, por força do disposto no art. 391.º-F, ambos do CPP, sendo a mesma proferida oralmente e sendo o respectivo dispositivo ditado para a acta, deve ser sempre entregue cópia da gravação ao arguido, ao assistente e ao MP no prazo de 48 horas, salvo se aqueles expressamente declararem prescindir da entrega,.
- O não cumprimento deste normativo não traduz nulidade, mas apenas irregularidade, a invocar pelos interessados, nos termos do art. 123.º, do CPP, não tendo esta sido invocada, no presente caso. | ||
Decisão Texto Parcial: | ![]() | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência, na 5.ª Secção (Criminal) da Relação de Lisboa:
I. RELATÓRIO: 1. Em processo abreviado, foi submetido a julgamento, no Juízo Local de Pequena Criminalidade de Sintra (J2), Comarca de Lisboa Oeste, o arguido M., tendo sido condenado nos seguintes termos (transcrição do dispositivo da sentença): *** 2. Não se conformando com a decisão, o arguido M. interpôs recurso, que motivou, formulando as seguintes conclusões: 14 Porém, no limite o arguido deveria ter sido absolvido pelo princípio de "in dúbio pro reo". I. Perante as conclusões do recurso que delimitam o objecto do mesmo, as questões a decidir consistem em saber se a sentença enferma de nulidade “por violação dos artigos 374º, nº 1, 2 e 3, e do artigo 379º, nº 1, al. a), todos do CPP”, se o tribunal “a quo” errou na apreciação e valoração que fez da prova produzida e violou o princípio do “in dubio pro reo” bem como a escolha e a determinação da pena em que o arguido foi condenado. II. Resulta do teor da acta da audiência de julgamento de 14 de Novembro de 2017 que foram observados todos os requisitos enunciados pelos artigos 389º-A e 391º-F do Código de Processo Penal, aplicáveis ao processo abreviado, como sucede nos presentes autos, pelo que a sentença não enferma de qualquer nulidade. III. Ademais, tendo o arguido requerido que a audiência tivesse lugar na sua ausência (cf. refª 10613178) e sendo representado, para todos os efeitos possíveis, pelo seu defensor, nos termos do artigo 334º, nº 2 e 4, do Código de Processo Penal, foi notificado do teor da sentença (e da respectiva fundamentação) na pessoa deste. IV. O recorrente manifesta discordância relativamente à decisão proferida sobre a matéria de facto da sentença condenatória proferida nos autos, exclusivamente ancorado nos documentos que juntou aos autos e desprezando completamente as declarações da testemunha (agente autuante) e da demais prova documental carreada para os autos. V. Impugna, na realidade, a convicção do tribunal fazendo tábua rasa do princípio da livre apreciação da prova, consagrado no artigo 127º do Código de Processo Penal, e pretendendo contrapor a convicção que alcançou sobre os factos como a que a Meritíssima Juíza “a quo”, livremente e segundo as regras da experiência comum, formou sobre os mesmos. VI. A documentação junta aos autos pelo arguido – declaração da entidade patronal da qual consta que trabalha em Inglaterra desde Dezembro de 2003 e dois recibos de vencimento dos meses de Janeiro e Fevereiro de 2004 – não impõe a conclusão de que, em 27 de Abril de 2008 (data em que foi fiscalizado), era impossível estar em Portugal. VII. Tal documentação reporta-se a um período temporal distinto, o arguido mantinha (à data) laços com Portugal, tendo indicado uma morada em território nacional aquando da tomada de termo de identidade e residência, o mesmo sucedendo recentemente num pedido de emissão de passaporte formulado em 8 de Novembro de 2017, e assume especial relevo o facto de ter sido detido em flagrante delito e a sua identificação confirmada pelo agente autuante através do respectivo bilhete de identidade. VIII. O acervo factual dado como provado é o que resulta da análise da prova produzida, temperada com os princípios de processo penal convergentes na área, e não merece qualquer censura nem impunha uma decisão diversa da proferida. IX. Da prova produzida em audiência de julgamento resultou no tribunal “a quo” a certeza da prática, pelo arguido, dos factos que integram os elementos objectivos e subjectivos do ilícito criminal pelo qual foi condenado não tendo havido qualquer violação do princípio “in dubio pro reo”. X. O tribunal recorrido teve em atenção todos os elementos disponíveis no processo que interessavam em sede de escolha e graduação da pena sendo avaliada a conduta do arguido em função dos parâmetros legais, que foram respeitados, em especial as elevadas exigências de prevenção geral e especial, a mediana ilicitude da conduta do arguido, o dolo directo, a existência de diversos antecedentes criminais (incluindo três condenações pela prática do mesmo ilícito criminal com penas de grau crescente de privação da liberdade), a antiguidade dos factos (mitigada pela situação de contumácia) e a sua inserção familiar, social e profissional no Reino Unido. XI. Valorados os factores apontados na sentença recorrida para a escolha e a determinação da medida da pena haverá de concluir-se não assistir razão ao recorrente pois tal pena – ao ser fixada no primeiro terço da pena abstractamente aplicável (seis meses de prisão) – está longe de ultrapassar a medida da sua culpa, correspondendo ao mínimo de pena imprescindível à tutela dos bens jurídicos e das expectativas comunitárias, e só na medida fixada poderão ser adequadas a satisfazer a sua função de socialização. XII. Esta é a quarta condenação do arguido pela prática do mesmo ilícito criminal e já havia sido condenado – só no que se reporta a tal ilícito – numa pena de multa e em duas penas de prisão (uma substituída por multa e uma suspensa na sua execução) sendo certo que as mesmas não foram suficientemente dissuasoras da prática dos factos pelos quais foi condenado nos presentes autos. XIII. Não obstante, ponderando em especial o longo período temporal decorrido após a prática dos factos sem existir notícia da prática de novos factos ilícitos em território nacional e a aparente inserção familiar, social e profissional do arguido, não merece qualquer censura o juízo de prognose realizado pelo tribunal recorrido no sentido de que a presente condenação poderá trazer o arguido de volta ao respeito pelo cumprimento da Lei e que a sua eventual reincidência será prevenida com a simples ameaça da prisão. XIV. Pelo exposto, a sentença recorrida não merece qualquer censura pois bem ajuizou da prova produzida em audiência, fazendo uma correcta e adequada ponderação dos factores de escolha e determinação da medida concreta da pena e não padece de qualquer vício. 4. Neste Tribunal da Relação, o Sr. Procurador-Geral Adjunto pronunciou-se igualmente pela improcedência do recurso. 5. Cumprido o art. 417.º, n.º 2, do CPP, o recorrente nada acrescentou. 6. Efectuado o exame preliminar e colhidos os vistos a que se refere o art. 418.º, n.º 1, do mesmo Código, teve lugar a conferência, cumprindo decidir. *** II. FUNDAMENTAÇÃO: 2.1. Não se vislumbrando que - numa apreciação oficiosa da matéria - a decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum, padeça de quaisquer vícios de entre os elencados no art. 410.º, n.º 2, do CPP, passemos à apreciação da nulidade invocada. Segundo o arguido, há nulidade da sentença, nos termos dos artigos 374.º, n.º 2 e 379.º, n.º 1 al. a), do CPP, por dela não ter sido notificado o seu mandatário e por não conter fundamentação, no que concerne às provas em que o tribunal fez assentar a respectiva convicção, desconhecendo-se os motivos de facto e de direito da decisão proferida, o que impossibilita o exercício do direito de defesa em sede de recurso. Tal como explica o MP na sua resposta (embora com errada identificação da referência do respectivo requerimento, a qual é 26704839, de que se juntou cópia aos autos), o arguido requereu que a audiência tivesse lugar na sua ausência, o que ocorreu, ao abrigo do art. 334.º, n.ºs 2 e 4, do CPP, tendo o mesmo sido notificado dos respectivos actos e da sentença, na pessoa do seu defensor. Estamos perante um processo abreviado, no qual a sentença obedece aos requisitos do art. 389.º-A, por força do disposto no art. 391.º-F, ambos do CPP. Nessa conformidade, a sentença foi proferida oralmente, tendo o respectivo dispositivo sido ditado para a acta respectiva. Foi aquela documentada, nos termos dos artigos 363.º e 364.º, do mesmo Código, conforme determina o n.º 3 do mencionado artigo 389.º-A. Segundo o n.º 4 do mesmo artigo, «é sempre entregue cópia da gravação ao arguido, ao assistente e ao MP no prazo de 48 horas, salvo se aqueles expressamente declararem prescindir da entrega, …». O não cumprimento deste normativo não traduz nulidade, mas apenas irregularidade, a invocar pelos interessados, nos termos do art. 123.º, do CPP, não tendo esta sido invocada, no presente caso. No que concerne à ausência de fundamentação, o recorrente não tem razão. Ouvida a sentença, constata-se que esta contém todos os requisitos enunciados no art. 374.º, n.º 2, do CPP, não padecendo da nulidade invocada. Contrariamente ao alegado pelo recorrente, o tribunal não declarou provada «a acusação deduzida pelo Ministério Público no processo», antes elencou os factos que considerou provados - que são os alegados na acusação pública -, as provas, fazendo o respectivo exame crítico, e fundamentou em termos de direito, quer a subsunção jurídica dos aludidos factos, quer a pena que àquele foi aplicada. 2.2. Quanto à impugnação da matéria de facto, é ela manifestamente improcedente. Funda-se o requerente no facto de estar a residir e a trabalhar em Inglaterra, onde se encontrava à data dos factos. Todavia, aquele facto não obsta a que ele se desloque a Portugal de vez em quando, não impedindo que estivesse no nosso país na data dos factos, ou seja, em 27/04/2008. O que compromete, irremediavelmente, a sua estratégia de defesa, não o impossibilitando de ter cometido o crime em causa, na mencionada data. A testemunha confirmou o quadro por si relatado no auto de notícia, apesar de já não se lembrar dos pormenores dado o tempo entretanto decorrido, assegurando que as coisas se passaram como ali é relatado. O tribunal valorou tal depoimento, conjugado com o aludido auto de notícia, inexistindo razões válidas para deixar de o valorar. Na ausência de outras provas, a conclusão a tirar é de que o arguido cometeu os factos que lhe foram imputados, tal como decidido pelo tribunal de primeira instância. 2.3. Terá o tribunal recorrido incorrido em violação do princípio in dúbio pro reo? Obviamente que não. Sendo aquele princípio uma decorrência da presunção de inocência do arguido até ao trânsito em julgado da sentença condenatória - princípio que tem consagração constitucional no art. 32.º, n.º 2, da CRP -, tal significa que, se a prova produzida, depois de avaliada segundo as regras da experiência e a liberdade de apreciação da prova, tiver conduzido «à subsistência no espírito do Tribunal de uma dúvida positiva e invencível», outra alternativa não é deixada ao julgador que não seja aplicar o aludido princípio, dando por não provados os factos. O in dubio pro reo, com efeito, «parte da dúvida, supõe a dúvida e destina-se a permitir uma decisão judicial que veja ameaçada a concretização por carência de uma firme certeza do julgador» (Cristina Líbano Monteiro, «In Dubio Pro Reo», Coimbra, 1997). Todavia, no presente caso, não resulta da fundamentação da decisão de facto que o julgador tenha ficado com dúvidas, sérias e razoáveis, quanto à verificação ou não dos factos provados e modo como eles ocorreram, assim como quanto à autoria dos mesmos pelo ora recorrente, de molde a justificar a aplicação daquele princípio. Diversamente, da aludida fundamentação extrai-se que a decisão de facto foi proferida no pleno convencimento de que os factos ocorreram nos moldes relatados na sentença, transparecendo uma firme convicção por parte do julgador, assente no teor das provas que foram produzidas em audiência e já acima mencionadas. Conclusão que, também a nós, nos parece inquestionável. Pelo que, inexistindo violação do aludido princípio e das regras de direito probatório e não impondo aquelas provas decisão diversa da recorrida no que concerne aos factos declarados provados, improcede a respectiva impugnação, considerando-se os mesmos definitivamente assentes. 2.4. A qualificação jurídica dos factos provados também não foi colocada em crise e não nos merece qualquer reparo, sendo a conduta do arguido subsumível ao crime de condução de veículo sem habilitação legal, previsto no art. 3.º, n.ºs 1 e 2, do DL 2/98, de 3/01, punível com pena de prisão até 2 anos ou com pena de multa até 120 dias. Passemos, pois, ao conhecimento das questões atinentes à escolha e medida da respectiva pena. Inexistem quaisquer circunstâncias de relevo que não tenham sido ponderadas pelo tribunal recorrido e que justifiquem qualquer redução da pena aplicada, de seis meses de prisão, a qual, por isso, mantemos, tendo em conta o circunstancialismo invocado na decisão recorrida, para o qual remetemos. O tribunal recorrido procedeu à substituição daquela pena pela suspensão da execução da prisão, pelo período de um ano, ao abrigo do art. 50.º, n.º 1, do Código Penal. É, por isso, destituído de sentido o afirmado na conclusão 22, onde se pugna precisamente pela suspensão da execução da pena, que já foi concedida. *** III. DECISÃO: * Notifique. Lisboa, 10 de Abril de 2018 |