Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
237/08.4GTCSC.L1-5
Relator: JOSÉ ADRIANO
Descritores: PROCESSO ABREVIADO
NULIDADE
ACTA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 04/10/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: NÃO PROVIDO
Sumário: - Segundo o n.º 4 do artigo 389.º-A CPP, em processo abreviado, quando a audiência, a requerimento do arguido, tiver decorrido na sua ausência, caso em que sentença obedece aos requisitos do art. 389.º-A, por força do disposto no art. 391.º-F, ambos do CPP, sendo a mesma proferida oralmente e sendo o respectivo dispositivo ditado para a acta, deve ser sempre entregue cópia da gravação ao arguido, ao assistente e ao MP no prazo de 48 horas, salvo se aqueles expressamente declararem prescindir da entrega,. 

- O não cumprimento deste normativo não traduz nulidade, mas apenas irregularidade, a invocar pelos interessados, nos termos do art. 123.º, do CPP, não tendo esta sido invocada, no presente caso.

Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam, em conferência, na 5.ª Secção (Criminal) da Relação de Lisboa:

I. RELATÓRIO:

1. Em processo abreviado, foi submetido a julgamento, no Juízo Local de Pequena Criminalidade de Sintra (J2), Comarca de Lisboa Oeste, o arguido M., tendo sido condenado nos seguintes termos (transcrição do dispositivo da sentença):
«Pelo exposto, por factos ocorridos em 27-04-2008 decido:
A. Condenar o arguido M. pela prática, como autor material, de um crime de condução sem habilitação, p. e p. pelo artigo 3.°, ns.° 1 e 2, do Decreto-Lei n.° 2/98, de 3 de Janeiro, na pena de 6 (seis) meses de prisão;
B. Suspender a pena na sua execução pelo período de 1 (um) ano, nos termos dos artigos 50°, n.° 1 e n.° 5 do Código Penal.
Condenar o arguido no pagamento das custas do processo, fixando a taxa de justiça em 1 UC, art.° 513.°, n.°s 1, 2 e 3, 514.° todos do C. P. Penal e art.° 8o, n° 9, do RCJ e tabela III anexa a esse mesmo diploma.»

***

2. Não se conformando com a decisão, o arguido M. interpôs recurso, que motivou, formulando as seguintes conclusões:
1      O recorrente no dia 14 de Novembro de 2017, foi notificado oralmente da leitura de sentença e no mesmo dia foi depositada a sentença na secretaria do Tribunal.
2      Sucede que, o arguido solicitou através do seu mandatário cópia da sentença, para que a pudesse analisar e desta forma mas apenas recebeu cópia da acta de leitura da sentença.
3       Ora, o mandatário não teve acesso à sentença para que pudesse analisar se a sentença continha nulidades, quais os factos provados e os factos não provados, a identificação dos arguidos e qual a convicção na qual o Tribunal se baseou para condenar o recorrente, a sentença não tem os requisitos exigidos pelo artigo 374.° CPP.
4      Ora, tal facto configura uma nulidade da sentença por violação dos artigos 374 n.º 2 e n.º 3 e do artigo 379.º n.º 1 alínea a) todos do CPP.
5 O arguido desconhece totalmente em que base e quais os depoimentos de quais testemunhas, e outras provas nas quais a convicção do Tribunal a quo terá assentado.
6 Uma vez que, no acórdão o Tribunal "a quo" não especifica como é sua obrigação, não faz nenhuma exposição tanto quanto possível completa, ainda que concisa, dos motivos, de facto e de direito, que fundamentam a decisão, com indicação e exame crítico das provas que serviram para formar a convicção do tribunal e para condenar o arguido, conforme exige o artigo 374.° n.°2 do CPP.
7 Consequentemente, a ausência de fundamentação do acórdão impossibilita a defesa do arguido em sede de recurso, uma vez que o arguido desconhece totalmente quais as provas documentais ou testemunhal que serviram para condenar o arguido.
8 Pelo exposto, nos termos do artigo 379.° n.° l alínea a) do CPP determina que o acórdão recorrido é nulo, que não contiver as menções do n.° 2 do artigo 374.° como acontece nos presentes autos.
9 Porém, caso assim não se entenda, o depoimento da testemunha Carlos Alberto de Almeida Gonçalves; que depôs de forma pouco credível, obscura, confusa, o mesmo não se lembrava de pormenores relevantes, sobre a raça do arguido, a descrição física entre outras quando estávamos a discutir a eventual autoria do crime por parte do arguido.
10 O arguido está acusado da prática do crime de condução sem habilitação legal, e conforme os documentos que foram juntos nessa data o arguido estava a trabalhar em Inglaterra
11 Aliás, da experiência comum e geral neste tipo de casos, é do conhecimento público que um rapaz que é de nacionalidade guineense, e está em Inglaterra a trabalhar como poderá o mesmo estar nesse mesmo dia em Portugal conforme vem descrito na acusação e praticar os factos dados como provados?????
12    Só por mero erro na acusação que nem sequer foi confirmado na audiência de discussão e julgamento é que foi deduzida a acusação e foi provada a acusação e consequentemente o arguido foi condenado, pelo facto de o arguido ter sido identificado por engano quando o mesmo estava em Inglaterra.
13 Pelo exposto, não se pode considerar de alguma forma que o arguido tivesse praticado qualquer tipo de crime pelo facto de nos dias da acusação o arguido encontrava-se em Inglaterra, consequentemente o arguido não praticou nenhum crime sobre o qual foi condenado.

14    Porém, no limite o arguido deveria ter sido absolvido pelo princípio de "in dúbio pro reo".
15    Porém, caso assim não se entenda o recorrente foi condenado "pela prática, em autoria material de 1 crime de condução sem habilitação legal de conduzir previsto e punido pelos artigos 121.0 n.01; artigo 122. ° n.° 1 e artigo 123.0 n. ° 1 do Código da Estrada; na pena de prisão de 6 meses e suspensa na sua execução pelo período de um ano.
16     Atenta a matéria de facto apurada na sua globalidade, esta aponta eventualmente para uma situação de alguma diminuição da ilicitude, atento o circunstancialismo da prática dos factos, a idade do arguido que era menor de 21 anos deveria ter beneficiado do regime de jovens delinquentes, sendo que o arguido nesta parte se socorre do recurso para a instância superior na busca nem que seja na substituição de penas de prisão por penas de multa ou por outra pena benevolente prevista no regime de jovens delinquentes ou suspensão da pena de prisão mediante regime de prova.
17    Consequentemente, salvo o devido respeito a pena de 6 meses de prisão suspensa pelo período de 1 ano, salvo o devido respeito é exagerada, desequilibrada e desajustada.
18    Consideramos a pena exagerada porque, aquando da avaliação global da culpa, ter sido apenas praticada em apenas em um dia, sendo a ilicitude do arguido, a idade do arguido na data dos factos, perfilhando-se aquela que é a jurisprudência fixada pelo Douto Supremo Tribunal de Justiça, o regime penal dos jovens delinquentes, previsto no Decreto-Lei n° 401/82, de 23 de Setembro, constitui o regime penal regra aplicável a jovens entre os 16 e os 21 anos, não sendo a aplicação deste regime uma faculdade, mas um poder-dever vinculado que o juiz deve usar sempre que se verifiquem os respectivos pressupostos, conforme consta do acórdão do STJ de 28 de Novembro de 2011.
19    Para tanto, o juiz tem de averiguar, mesmo oficiosamente, se existem pressupostos de facto que imponham a aplicação do regime previsto no referido diploma, sempre que a pessoa submetida a julgamento tenha, ao tempo dos factos, idade que se integre dentro dos limites objectivos de aplicação.
20   Assim sendo consideramos que a pena em que o arguido acabou condenado neste processo é manifestamente exagerada porque excedeu em muito a medida da culpa, já que esta não reflete o verdadeiro grau de ilicitude violou o disposto nos artigos 40.° número 2 e 71.° número 2 do Código Penal, o que desde já aqui referimos para os termos e efeitos do disposto no artigo 412.° número 2 alíneas a) e b) do Código Processo Penal, deveria ter sido aplicado o Decreto-Lei n° 401/82, de 23 de Setembro, constitui o regime penal regra aplicável a jovens entre os 16 e os 21 anos.
21   No caso vertente, as condenações que foram aplicadas ao arguido que actualmente está socialmente, familiarmente integrado não satisfazem minimamente o disposto no artigo 40.° número 1 do Código Penal, que, a finalidade das penas de prisão, visa a proteção dos bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade, pelo que o princípio da reparação dos danos respeita à teleologia do sistema, e é também uma forma de proteção dos bens jurídicos.
22    Consequentemente, a não aplicação ao arguido de uma pena privativa da liberdade ainda que suspensa na sua execução, que não teve em conta a idade do arguido à data da prática dos factos, o facto de o arguido não fazer do crime modo de vida, não ter sido aplicado o regime dos jovens delinquentes, e de neste momento as razões de prevenção geral e especial serem baixas já que o arguido se encontra a trabalhar, deve a pena aplicada ao arguido ser reformulada por, ser exagerada, desequilibrada e desajustada nos termos da lei penal e ser aplicada pena suspensa ou eventualmente uma pena menos gravosa.
23    Com a prolação da sentença foram violados os artigos 374.° n° 1 alínea d) e artigo 374.° n.º 2, ambos do CPP, artigo 379° n.° 1 alínea c) do CPP; entre outros o n.° 6 do Art. 328° do C.P.P; alínea d) do n.º 2 do art. 120° do C.P.P.; Art. 122°, n.° 1 do CPP.; o artigo 379.° n.° 1 alínea a) do CPP; artigos 26.° e 210° n.° 1 e n.° 2 alínea b) por referência à alínea b) do n. 7 e ás alíneas f) e g) do n.° 2 do artigo 204.°, todos do Código Penal; artigos 26.°, 210.0 n.° 1 e n.° 2 alínea b) por referência à alínea b) do n.º 7 e ás alíneas f) e g) do n.° 2 do artigo 204.° todos do Código Penal; artigos 22.°, 23.° e 26.°; 72.°, 73.°, 210.º n.º 7 e n.° 2 alínea b) por referência à alínea b) do n.º 7 e ás alíneas f) e g) do n.° 2 do artigo 204.0 todos do Código Penal; artigos 40.° número 2 e 71.° número 2 do Código Penal, artigo 412.° número 2 alíneas a) e b) do Código Processo Penal, deveria ter sido aplicado o Decreto-Lei n° 401/82, de 23 de Setembro, constitui o regime penal regra.
      Termos em que, invocando-se o douto suprimento do Venerando Tribunal, deverá o presente recurso ser julgado procedente e, em consequência, serem julgadas procedentes as nulidades invocadas; o arguido ser absolvido da prática do crime sobre o qual foi acusado ou caso assim não se entenda seja revogada a pena aplicada ao arguido, pelo facto de a pena aplicada ter sido exagerada, desequilibrada e ajustada e ser substituída por uma pena não privativa da liberdade.
 
3. Admitido o recurso, o MP respondeu ao mesmo, concluindo do seguinte modo:

I. Perante as conclusões do recurso que delimitam o objecto do mesmo, as questões a decidir consistem em saber se a sentença enferma de nulidade “por violação dos artigos 374º, nº 1, 2 e 3, e do artigo 379º, nº 1, al. a), todos do CPP”, se o tribunal “a quo” errou na apreciação e valoração que fez da prova produzida e violou o princípio do “in dubio pro reo” bem como a escolha e a determinação da pena em que o arguido foi condenado.

II. Resulta do teor da acta da audiência de julgamento de 14 de Novembro de 2017 que foram observados todos os requisitos enunciados pelos artigos 389º-A e 391º-F do Código de Processo Penal, aplicáveis ao processo abreviado, como sucede nos presentes autos, pelo que a sentença não enferma de qualquer nulidade.

III. Ademais, tendo o arguido requerido que a audiência tivesse lugar na sua ausência (cf. refª 10613178) e sendo representado, para todos os efeitos possíveis, pelo seu defensor, nos termos do artigo 334º, nº 2 e 4, do Código de Processo Penal, foi notificado do teor da sentença (e da respectiva fundamentação) na pessoa deste.

IV. O recorrente manifesta discordância relativamente à decisão proferida sobre a matéria de facto da sentença condenatória proferida nos autos, exclusivamente ancorado nos documentos que juntou aos autos e desprezando completamente as declarações da testemunha (agente autuante) e da demais prova documental carreada para os autos.

V. Impugna, na realidade, a convicção do tribunal fazendo tábua rasa do princípio da livre apreciação da prova, consagrado no artigo 127º do Código de Processo Penal, e pretendendo contrapor a convicção que alcançou sobre os factos como a que a Meritíssima Juíza “a quo”, livremente e segundo as regras da experiência comum, formou sobre os mesmos.

VI. A documentação junta aos autos pelo arguido – declaração da entidade patronal da qual consta que trabalha em Inglaterra desde Dezembro de 2003 e dois recibos de vencimento dos meses de Janeiro e Fevereiro de 2004 – não impõe a conclusão de que, em 27 de Abril de 2008 (data em que foi fiscalizado), era impossível estar em Portugal.

VII. Tal documentação reporta-se a um período temporal distinto, o arguido mantinha (à data) laços com Portugal, tendo indicado uma morada em território nacional aquando da tomada de termo de identidade e residência, o mesmo sucedendo recentemente num pedido de emissão de passaporte formulado em 8 de Novembro de 2017, e assume especial relevo o facto de ter sido detido em flagrante delito e a sua identificação confirmada pelo agente autuante através do respectivo bilhete de identidade.

VIII. O acervo factual dado como provado é o que resulta da análise da prova produzida, temperada com os princípios de processo penal convergentes na área, e não merece qualquer censura nem impunha uma decisão diversa da proferida.

IX. Da prova produzida em audiência de julgamento resultou no tribunal “a quo” a certeza da prática, pelo arguido, dos factos que integram os elementos objectivos e subjectivos do ilícito criminal pelo qual foi condenado não tendo havido qualquer violação do princípio “in dubio pro reo”.

X. O tribunal recorrido teve em atenção todos os elementos disponíveis no processo que interessavam em sede de escolha e graduação da pena sendo avaliada a conduta do arguido em função dos parâmetros legais, que foram respeitados, em especial as elevadas exigências de prevenção geral e especial, a mediana ilicitude da conduta do arguido, o dolo directo, a existência de diversos antecedentes criminais (incluindo três condenações pela prática do mesmo ilícito criminal com penas de grau crescente de privação da liberdade), a antiguidade dos factos (mitigada pela situação de contumácia) e a sua inserção familiar, social e profissional no Reino Unido.

XI. Valorados os factores apontados na sentença recorrida para a escolha e a determinação da medida da pena haverá de concluir-se não assistir razão ao recorrente pois tal pena – ao ser fixada no primeiro terço da pena abstractamente aplicável (seis meses de prisão) – está longe de ultrapassar a medida da sua culpa, correspondendo ao mínimo de pena imprescindível à tutela dos bens jurídicos e das expectativas comunitárias, e só na medida fixada poderão ser adequadas a satisfazer a sua função de socialização.

XII. Esta é a quarta condenação do arguido pela prática do mesmo ilícito criminal e já havia sido condenado – só no que se reporta a tal ilícito – numa pena de multa e em duas penas de prisão (uma substituída por multa e uma suspensa na sua execução) sendo certo que as mesmas não foram suficientemente dissuasoras da prática dos factos pelos quais foi condenado nos presentes autos.

XIII. Não obstante, ponderando em especial o longo período temporal decorrido após a prática dos factos sem existir notícia da prática de novos factos ilícitos em território nacional e a aparente inserção familiar, social e profissional do arguido, não merece qualquer censura o juízo de prognose realizado pelo tribunal recorrido no sentido de que a presente condenação poderá trazer o arguido de volta ao respeito pelo cumprimento da Lei e que a sua eventual reincidência será prevenida com a simples ameaça da prisão.

XIV. Pelo exposto, a sentença recorrida não merece qualquer censura pois bem ajuizou da prova produzida em audiência, fazendo uma correcta e adequada ponderação dos factores de escolha e determinação da medida concreta da pena e não padece de qualquer vício.
     Deverá, pois, manter-se a douta sentença.

4. Neste Tribunal da Relação, o Sr. Procurador-Geral Adjunto pronunciou-se igualmente pela improcedência do recurso.

5. Cumprido o art. 417.º, n.º 2, do CPP, o recorrente nada acrescentou.

6. Efectuado o exame preliminar e colhidos os vistos a que se refere o art. 418.º, n.º 1, do mesmo Código, teve lugar a conferência, cumprindo decidir.

***

II. FUNDAMENTAÇÃO:
1. Perante as conclusões com que o recorrente encerra a respectiva motivação - as quais, como sabemos, delimitam e fixam o objecto do recurso -, as questões pelo mesmo suscitadas são as seguintes:
- Nulidade da sentença;
- Impugnação da matéria de facto;
- Violação do in dubio pro reo;
- Atenuação especial da pena;
- Medida concreta da pena.
2. Apreciando:

2.1. Não se vislumbrando que - numa apreciação oficiosa da matéria - a decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum, padeça de quaisquer vícios de entre os elencados no art. 410.º, n.º 2, do CPP, passemos à apreciação da nulidade invocada.

Segundo o arguido, há nulidade da sentença, nos termos dos artigos 374.º, n.º 2 e 379.º, n.º 1 al. a), do CPP, por dela não ter sido notificado o seu mandatário e por não conter fundamentação, no que concerne às provas em que o tribunal fez assentar a respectiva convicção, desconhecendo-se os motivos de facto e de direito da decisão proferida, o que impossibilita o exercício do direito de defesa em sede de recurso.

Tal como explica o MP na sua resposta (embora com errada identificação da referência do respectivo requerimento, a qual é 26704839, de que se juntou cópia aos autos), o arguido requereu que a audiência tivesse lugar na sua ausência, o que ocorreu, ao abrigo do art. 334.º, n.ºs 2 e 4, do CPP, tendo o mesmo sido notificado dos respectivos actos e da sentença, na pessoa do seu defensor.

Estamos perante um processo abreviado, no qual a sentença obedece aos requisitos do art. 389.º-A, por força do disposto no art. 391.º-F, ambos do CPP.

Nessa conformidade, a sentença foi proferida oralmente, tendo o respectivo dispositivo sido ditado para a acta respectiva. Foi aquela documentada, nos termos dos artigos 363.º e 364.º, do mesmo Código, conforme determina o n.º 3 do mencionado artigo 389.º-A.

Segundo o n.º 4 do mesmo artigo, «é sempre entregue cópia da gravação ao arguido, ao assistente e ao MP no prazo de 48 horas, salvo se aqueles expressamente declararem prescindir da entrega, …».

O não cumprimento deste normativo não traduz nulidade, mas apenas irregularidade, a invocar pelos interessados, nos termos do art. 123.º, do CPP, não tendo esta sido invocada, no presente caso.

No que concerne à ausência de fundamentação, o recorrente não tem razão.

Ouvida a sentença, constata-se que esta contém todos os requisitos enunciados no art. 374.º, n.º 2, do CPP, não padecendo da nulidade invocada.

Contrariamente ao alegado pelo recorrente, o tribunal não declarou provada «a acusação deduzida pelo Ministério Público no processo», antes elencou os factos que considerou provados - que são os alegados na acusação pública -, as provas, fazendo o respectivo exame crítico, e fundamentou em termos de direito, quer a subsunção jurídica dos aludidos factos, quer a pena que àquele foi aplicada.

2.2. Quanto à impugnação da matéria de facto, é ela manifestamente improcedente.

Funda-se o requerente no facto de estar a residir e a trabalhar em Inglaterra, onde se encontrava à data dos factos.

Todavia, aquele facto não obsta a que ele se desloque a Portugal de vez em quando, não impedindo que estivesse no nosso país na data dos factos, ou seja, em 27/04/2008.

O que compromete, irremediavelmente, a sua estratégia de defesa, não o impossibilitando de ter cometido o crime em causa, na mencionada data.

A testemunha confirmou o quadro por si relatado no auto de notícia, apesar de já não se lembrar dos pormenores dado o tempo entretanto decorrido, assegurando que as coisas se passaram como ali é relatado. O tribunal valorou tal depoimento, conjugado com o aludido auto de notícia, inexistindo razões válidas para deixar de o valorar.

Na ausência de outras provas, a conclusão a tirar é de que o arguido cometeu os factos que lhe foram imputados, tal como decidido pelo tribunal de primeira instância.

2.3. Terá o tribunal recorrido incorrido em violação do princípio in dúbio pro reo?

Obviamente que não.

Sendo aquele princípio uma decorrência da presunção de inocência do arguido até ao trânsito em julgado da sentença condenatória - princípio que tem consagração constitucional no art. 32.º, n.º 2, da CRP -, tal significa que, se a prova produzida, depois de avaliada segundo as regras da experiência e a liberdade de apreciação da prova, tiver conduzido «à subsistência no espírito do Tribunal de uma dúvida positiva e invencível», outra alternativa não é deixada ao julgador que não seja aplicar o aludido princípio, dando por não provados os factos.

O in dubio pro reo, com efeito, «parte da dúvida, supõe a dúvida e destina-se a permitir uma decisão judicial que veja ameaçada a concretização por carência de uma firme certeza do julgador» (Cristina Líbano Monteiro, «In Dubio Pro Reo», Coimbra, 1997).

Todavia, no presente caso, não resulta da fundamentação da decisão de facto que o julgador tenha ficado com dúvidas, sérias e razoáveis, quanto à verificação ou não dos factos provados e modo como eles ocorreram, assim como quanto à autoria dos mesmos pelo ora recorrente, de molde a justificar a aplicação daquele princípio. Diversamente, da aludida fundamentação extrai-se que a decisão de facto foi proferida no pleno convencimento de que os factos ocorreram nos moldes relatados na sentença, transparecendo uma firme convicção por parte do julgador, assente no teor das provas que foram produzidas em audiência e já acima mencionadas. Conclusão que, também a nós, nos parece inquestionável.

Pelo que, inexistindo violação do aludido princípio e das regras de direito probatório e não impondo aquelas provas decisão diversa da recorrida no que concerne aos factos declarados provados, improcede a respectiva impugnação, considerando-se os mesmos definitivamente assentes.

2.4. A qualificação jurídica dos factos provados também não foi colocada em crise e não nos merece qualquer reparo, sendo a conduta do arguido subsumível ao crime de condução de veículo sem habilitação legal, previsto no art. 3.º, n.ºs 1 e 2, do DL 2/98, de 3/01, punível com pena de prisão até 2 anos ou com pena de multa até 120 dias.

Passemos, pois, ao conhecimento das questões atinentes à escolha e medida da respectiva pena.
Quanto à escolha da pena, na ponderação feita ao abrigo do art. 70.º, do CP, o tribunal recorrido afastou a aplicação da multa, optando pela aplicação de prisão, condenando o arguido, pelo supra referido crime, em 6 (seis) meses de prisão, cuja execução foi declarada suspensa por um ano.
A escolha da prisão em detrimento da multa, é uma solução que se impõe claramente no presente caso e que, por isso, não podemos deixar de subscrever, sem quaisquer reticências, pelas razões apontadas na decisão recorrida e que se prendem com as condenações já sofridas anteriormente pelo arguido, nomeadamente por crimes da mesma natureza, e para as quais remetemos, sem necessidade de maiores considerações a tal propósito.
Está, assim, demonstrado, de modo inequívoco, que, a pena de multa já não satisfaz minimamente, de forma adequada e suficiente, as finalidades da punição.
As exigências de prevenção, quer geral, quer especial, são manifestamente elevadas, perante o elevado número de crimes do mesmo tipo que são diariamente cometidos, sendo certo que o ora arguido já sofreu condenações por razões idênticas.
Por outro lado, contrariamente ao afirmado na motivação de recurso e respectivas conclusões, na data dos factos ora em apreciação o arguido já tinha 23 anos de idade, não estando em condições de beneficiar do regime aplicável aos jovens imputáveis, aprovado pelo DL n.º 401/82, de 23/09, para o qual, só é jovem o agente do crime que ainda não tiver completado 21 anos de idade.
Também não se verifica qualquer condicionalismo que permita tal atenuação, ao abrigo do art. 72.º, do CP, nem tal é alegado.
Consequentemente, a pena deve ser fixada tendo em conta a moldura normal prevista na respectiva norma, a qual, como dissemos, é de prisão de um mês a dois anos.

Inexistem quaisquer circunstâncias de relevo que não tenham sido ponderadas pelo tribunal recorrido e que justifiquem qualquer redução da pena aplicada, de seis meses de prisão, a qual, por isso, mantemos, tendo em conta o circunstancialismo invocado na decisão recorrida, para o qual remetemos.

O tribunal recorrido procedeu à substituição daquela pena pela suspensão da execução da prisão, pelo período de um ano, ao abrigo do art. 50.º, n.º 1, do Código Penal.

É, por isso, destituído de sentido o afirmado na conclusão 22, onde se pugna precisamente pela suspensão da execução da pena, que já foi concedida.

***

III. DECISÃO:    
Em conformidade com o exposto, julga-se improcedente o presente recurso do arguido M., confirmando-se a decisão recorrida.
Custas pelo recorrente, com taxa de justiça em 3 (três) UC.

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Notifique.

Lisboa, 10 de Abril de 2018
José Adriano