Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
4381/2003-7
Relator: PIMENTEL MARCOS
Descritores: ACÇÃO DE DESPEJO
FUSÃO DE EMPRESAS
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 07/01/2003
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO.
Decisão: PROCEDENTE.
Sumário: A fusão de sociedades consiste na reunião de duas ou mais sociedades, a qual determina a dissolução de todas elas ou de alguma ou algumas, para dar lugar a outra sociedade com uma nova individualidade jurídica, pelo que a essência da fusão de sociedades consiste em juntar os elementos pessoais e patrimoniais de duas ou mais sociedades preexistentes, de tal modo que passe a existir um só sociedade.
A fusão pode ser feita por incorporação ou por constituição de uma nova sociedade.
No primeiro caso dá-se uma transferência global do património de uma ou mais sociedades para outra e a atribuição aos sócios daquelas sociedades (incorporadas) de partes, acções ou quotas desta (a incorporante). No segundo caso, a fusão faz-se mediante a constituição de uma nova sociedade, para qual se transferem globalmente os patrimónios das sociedades fundidas, sendo aos respectivos sócios atribuídas igualmente partes, acções ou quotas da nova sociedade.
Não é necessário o consentimento do senhorio para a transmissão do direito ao arrendamento da sociedade incorporada para a sociedade incorporante (em caso de fusão de sociedades por incorporação).
Todavia é necessário que ao locador seja comunicada, no prazo de 15 dias, aquela transmissão, nos termos da al. g) do art. 1038º do CC, sob pena de a mesma ser ineficaz em relação a ele.
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa.

A propôs acção de despejo com processo sumário
Contra
B e C
Alega para tanto, em síntese, que:
 por carta de 23.05.97 tomou conhecimento de que em 08.11.96 se realizou a fusão, por incorporação, da 1ª na 2ª R, mediante a transferência global do património da sociedade incorporada para a incorporante, tendo o respectivo registo na CRC sido feito em 08.11.96, e não em 02.04.97 como constava dessa mesma carta;
a autora não reconheceu nem reconhece ou aceita a transmissão do direito ao arrendamento da 1ª para a 2ª ré;
à autora não foi comunicado atempadamente a transferência desse arrendamento, pelo que tem direito a resolver o contrato nos termos da alínea f) do nº 1 do artigo 64º do RAU, por violação das alíneas f) e g) do artigo 1038º do CC.
*
A ré C foi devidamente citada e contestou, dizendo, em síntese, que:
a 1ª ré é parte ilegítima em virtude da transmissão do direito ao arrendamento resultante da fusão, pois a mesma ficou extinta e não tem interesse directo em contradizer;
não existe obrigação de comunicar ao senhorio a transmissão do direito ao arrendamento em virtude da fusão.
*
Relativamente à ré B a autora desistiu da instância, a qual foi julgada válida por despacho de fls. 89.

Procedeu-se a audiência de julgamento, tendo sido respondido aos dois artigos da base  instrutória conforme consta de fls. 146.

Seguidamente foi proferida a competente sentença, com absolvição da ré no pedido, com o fundamento de que as RR não tinham obrigação de comunicar à autora a fusão das sociedades.
Nela foi referido nomeadamente:
A obrigação da locatária (art. 1038° CC) é a de não proporcionar a outrem o gozo do andar por meio de cessão onerosa ou gratuita. No caso poderia duvidar-se da existência de alteridade: o outrem é ela mesma, unida à incorporante. A questão todavia não é debatida, invocando-se apenas a falta da comunicação da vicissitude da locatária.
O que sucedeu no caso foi a transferência das relações da incorporada para a incorporante na globalidade, não se confundindo com nenhuma das situações identifica das no artigo 1038°. A obrigação prevista na alínea. g) só existe, como nela se diz, quando a cedência se faz por algum dos títulos referidos na alínea anterior, ou seja por cessão onerosa ou gratuita (...) a palavra cessão está empregada em sentido específico e não no sentido genérico de transn1issão do gozo da coisa, para a qual o código utiliza a palavra cedência.  A transmissão prevista no artigo tem fonte voluntária, é a título singular (...) a incorporação (...) produz directamente a transmissão, a título universal, do património da incorporada ( ...) a fusão não se íntegra em nenhum dos títulos referidos nas alíneas 1) e g) do artigo 1038

          Da sentença recorreu a autora, formulando as seguintes conclusões:

A)  obrigação de comunicação, estatuída no art. 1038° do Código Civil, existe em qualquer caso de transmissão da posição contratual do locatário, incluindo a transmissão por incorporação.
B) Tendo-se verificado uma fusão por incorporação, a transmissão do direito ao arrendamento não carecia do consentimento da senhoria, mas aquela transmissão devia ter-lhe sido comunicada, dentro de 15 dias a partir da data em que se consumou. Assim já se entendeu neste Tribunal superior .
C) Não tendo sido efectuada, atempadamente, a notificação da transmissão do direito de arrendamento, esta transmissão é ineficaz em relação à senhoria, que, como tal, pode resolver o contrato de arrendamento.
D) Assim não se entendendo, estaríamos perante a permissão de uma intolerável violação ao direito de propriedade, " escancarando-se" as portas a situações verdadeiramente fraudulentas e abusivas.
E) O Tribunal a quo violou por má interpretação e aplicação o disposto nos artigos 1038° al. g) do Código Civil, bem como a alínea f) n° 1 do art. 64° do R.A.U.

          Em contra-alegações  formulou a ré as seguintes conclusões:

1. A fusão, por incorporação, da B na C, com transferência total do património para esta não configura qualquer trespasse.
2. Não há, assim, lugar a qualquer autorização do senhorio em tal situação, e não sendo exigência legal a comunicação da fusão da inquilina ao senhorio, as sociedades envolvidas na fusão não têm, nem tinham que fazer tal comunicação.
3. Na figura da fusão, não se verifica qualquer cessão de posição contratual.
4. A fusão não se integra em nenhum dos títulos referidos nas alíneas f) e g) do art.º 1038° do Código Civil, uma vez que a previsão destas alíneas apenas abrange a cessão onerosa ou gratuita da posição do arrendatário, sublocação ou comodato.
5. A douta sentença recorrida fez correcta interpretação e aplicação das normas legais aplicáveis ao caso vertente.
**
Colhidos os vistos legais cumpre apreciar e decidir.

Da 1ª instância vêm provados os seguintes factos:
a) Em 8 de Novembro de 1996 foi registada a fusão por incorporação de B em C com transferência total do património para esta.
h) Por escritura de 4 de Junho de 1973, o primeiro andar do prédio com o número 70 da Rua... em Lisboa, foi, com destino a escritório comercial, dado de arrendamento a M pelo prazo de seis meses, renovável por iguais períodos e com início a 1 de Abril de 1973.
c) E como contrapartida pela utilização do andar foi combinada a quantia mensal de 9.000$00, à data da petição fixada em 31.941$00, e a entrega da mesma em casa da senhoria, ou em local que esta indicasse, no primeiro dia útil do mês anterior àquele a que respeitasse.
d) B passou a ocupar a posição de M.
e) C comunicou à autora, por carta datada de 23 de Maio de 1997, que no dia 2 de Abril de 1997 havia sido registada na conservatória do registo comercial a fusão por incorporação de B.
f) Até à carta referida em e), a ré nunca deu conhecimento da fusão à autora.
g) A autora tem registado a seu favor a aquisição do andar em causa.

O DIREITO.
I
O que está essencialmente em causa é saber se existia a obrigação de comunicação da fusão das sociedades à autora (senhoria da 1ª ré) e a consequente transmissão do arrendamento para a sociedade incorporante.

Como ficou provado, essa comunicação foi feita pela apelada (sociedade incorporante) em 23.05.97: B comunicou à autora, por carta datada de 23 de Maio de 1997, que no dia 2 de Abril de 1997 havia sido registada na conservatória do registo comercial a fusão por incorporação de B na ré (alínea e) dos factos provados).
E até ao recebimento desta carta, nunca a ré ou a anterior arrendatária tinham dado conhecimento à autora da fusão das sociedades. Todavia, o seu registo já tinha sido efectuado em 08.11.96 na competente conservatória.
*
Nos termos do artigo 1038º do CC são obrigações do locatário:
...
f) não proporcionar a outrem o gozo total ou parcial da coisa por meio de cessão onerosa ou gratuita da sua posição jurídica, sublocação ou comodato, excepto se a lei o permitir ou o locador o autorizar.
g) comunicar ao locador, dentro do prazo de 15 dias, a cedência do gozo da coisa por algum dos referidos títulos, quando permitida ou autorizada.
Prevêem-se aqui duas obrigações do locatário: não proporcionar a outrem o gozo da coisa (excepto se a lei o permitir ou o locador o autorizar) e comunicar ao senhorio a sua cedência, quando permitida ou autorizada, no prazo de 15 dias.
Nos presentes autos não é posta em causa a legalidade da cedência do direito ao arrendamento para a sociedade incorporante, em virtude da fusão das duas sociedades, sem necessidade de autorização por parte da senhoria (na verdade, não é necessária a autorização do senhorio para a fusão da sociedade arrendatária com outra).
Portanto, está assente que não é necessário o consentimento do senhorio para a transmissão do direito ao arrendamento da sociedade incorporada para a sociedade incorporante (em caso de fusão de sociedades por incorporação, como é o caso).
Todavia, a autora entende que era obrigação da ré fazer tal comunicação no prazo de 15 dias .... E, por isso, instaurou a presente acção com fundamento na alínea f) do artigo 64º do RAU, o qual estabelece que o senhorio pode resolver o contrato se o arrendatário sublocar ou emprestar, total ou parcialmente, o prédio arrendado, ou ceder a sua posição contratual, nos casos em que estes actos são ilícitos, inválidos por falta de forma ou ineficazes em relação ao senhorio, salvo o disposto no artigo 1049º do Código Civil.
Portanto, a autora teria direito à resolução do contrato em virtude de a cedência ser ineficaz em relação a ela por não lhe ter sido dado conhecimento da fusão no prazo legal de 15 dias.

A apelada entende que não era necessária tal comunicação.
E embora esta (comunicação) tenha sido feita pela ré/apelada, a verdade é que o foi muito para além dos referidos 15 dias após o registo da fusão, pelo que nunca poderia ser eficaz em relação à senhoria.
Efectivamente, na aludida carta (de 23.05.97) dizia-se que o registo tinha sido feito em 02.04.97. A ser assim já teriam decorrido mais de 15 dias (sendo embora certo que o registo é anterior, isto é, de 08.11.96), pelo que a cedência sempre seria ineficaz em relação à senhoria, ora apelante. Aliás, a ré não apresentou qualquer  justificação para só ter comunicado a fusão nessa data.
Na 1ª instância foi decidido que não existia a obrigação de comunicar a fusão das sociedades à autora e que, portanto, não havia fundamento para a resolução do contrato, uma vez que o arrendamento teria sido transferido para a ora ré válida  e eficazmente. Para tanto, parece louvar-se o M.º juiz no parecer do Prof. Pessoa Jorge in “O DIREITO” Ano 122 II-465 e s.s. e no acórdão do TRC de 04.06.97 (CJ 1997- III -36 e s.s.)
Mas na mesma douta sentença reconhece-se ter sido decidido em sentido contrário no acórdão desta Relação, de 25.10.94, comentado favoravelmente por Henrique Mesquita na RLJ Anos 127º, pag. 378 e 128º, pag. 59 e. ss.

II
Vejamos.

Como ficou provado, em 8 de Novembro de 1996 foi registada a fusão por incorporação da sociedade “Ecolab Portugal Produção e Comercialização de Detergentes Industriais Ldª “ na sociedade “Henkel Ecolab S.A.”, com transferência total do património daquela para esta (al. a) dos factos assentes).
Estabelece o nº 1 do artigo 97º do CSC que duas ou mais sociedades, ainda que de tipo diverso, podem fundir-se mediante a sua reunião numa só.
E nos termos do seu nº 4, a fusão pode realizar-se:
a) Mediante a transferência global do património de uma ou mais sociedades para outra e a atribuição aos sócios daquelas de partes, acções ou quotas desta (fusão por incorporação);
b) Mediante a constituição de uma nova sociedade, para qual se transferem globalmente os patrimónios das sociedades fundidas, sendo aos sócios desta atribuídas partes, acções ou quotas da nova sociedade (fusão simples ou fusão por concentração, ou fusão propriamente dita)

A fusão consiste, pois, na reunião de duas ou mais sociedades, a qual determina a dissolução de todas elas ou de alguma ou algumas, para dar lugar a outra sociedade com uma nova individualidade jurídica (e assim se reúnem as disponibilidades económicas de todas elas).
Portanto, “a essência da fusão de sociedades consiste em juntar os elementos pessoais e patrimoniais de duas ou mais sociedades preexistentes, de tal modo que passe a existir um só sociedade[1]. E pode ser feita por incorporação ou por constituição de uma nova sociedade.
No primeiro caso dá-se uma transferência global do património de uma ou mais sociedades para outra e a atribuição aos sócios daquelas sociedades (incorporadas) de partes, acções ou quotas desta (a incorporante) (é a fusão por incorporação em que a sociedade incorporante não se extingue, ou seja, só alguma ou algumas sociedades fundidas se extinguem). A sociedade que se mantém conserva a sua personalidade jurídica.
No segundo caso, a fusão faz-se mediante  a constituição de uma nova sociedade, para qual se transferem globalmente os patrimónios das sociedades fundidas, sendo aos respectivos sócios atribuídas igualmente partes, acções ou quotas da nova sociedade. Trata-se de uma fusão por constituição de uma nova sociedade, pois todas as sociedades preexistentes se fundem na nova sociedade entretanto criada.
No caso, a fusão operou-se por incorporação, com transferência global do património da Ecolab Portugal para a HENKEL ECOLAB SA (sucursal de Portugal).
Como determina o artº 111º do CSC,  decorrido o prazo previsto no artigo 107º, nº 2, sem que tenha sido deduzida oposição...., deve a administração de qualquer das sociedades participantes na fusão ou da nova sociedade pedir a inscrição da fusão no registo comercial.
É, pois, necessária a inscrição da fusão das sociedades no registo comercial.
E como estabelece a alínea a) do artigo 112º, com a inscrição da fusão no registo comercial extinguem-se as sociedades incorporadas ou, no caso de constituição de nova sociedade, todas as sociedades fundidas, transmitindo-se os seus direitos e obrigações para a sociedade incorporante ou para a nova sociedade.
Portanto, no presente caso, com a inscrição da fusão no registo comercial extinguiu-se a sociedade incorporada (a arrendatária) transmitindo-se os seus direitos e obrigações para a ora apelada (soc. incorporante), designadamente o direito ao arrendamento.
A própria ré alega que a fusão foi inscrita na respectiva CRC e que, por isso, nos termos do artigo 112º do CSC, se lhe transmitiram os direitos e obrigações decorrentes do arrendamento (artigo 28 da contestação).
Com a inscrição da fusão no registo comercial produzem-se, assim, simultaneamente, os seguintes efeitos [2]:
a) Extinção das sociedades incorporadas, ou, no caso de constituição de nova sociedade, todas as sociedades fundidas;
b) Transmissão dos seus direitos e obrigações para a sociedade incorporante ou para a nova sociedade;
c) Os sócios das sociedades extintas tornam-se sócios da sociedade incorporante ou da nova sociedade.

Com a fusão passa a existir um único património e um único conjunto de sócios. A transmissão do património da incorporada para a incorporante é automática e a título universal, sendo esta, no entender do  Prof. Pessoa Jorge[3], uma das razões para não lhe ser aplicável o regime específico da transmissão de cada uma das relações jurídicas que integram esse património (obra citada também no ac. TRC)
É discutível a natureza jurídica da inscrição da fusão no registo: tem carácter constitutivo ou meramente declarativo?
O Prof. Raul ventura defende que entre nós a inscrição da fusão no registo comercial tem natureza constitutiva, como resulta dos artºs 5º e 212º do CSC [4].
Henrique Mesquita, pelo contrário defende que “tal como o registo predial, o registo mercantil não reveste natureza constitutiva, destinado-se apenas a tornar eficazes em relação a terceiros os factos a ele sujeitos”[5].
Para o caso não tem esta questão qualquer interesse uma vez que a comunicação feita pela ré à autora ocorreu muito para além do prazo de 15 dias após o registo definitivo na CRC de Cascais, como se disse (fls. 35 e 40).
III
No citado acórdão do TRL foi decidido o seguinte:
Sendo uma sociedade, arrendatária de parte de um prédio urbano, incorporada, mediante fusão, noutra sociedade, a transmissão para a sociedade incorporante, do direito ao arrendamento não carece do consentimento do senhorio, mas tem de ser-lhe notificada, constituindo a falta de notificação fundamento de despejo (artº 1038º al. g) do CC e artº 64º, nº 1 al. f) do RAU.
Em princípio, o contrato de locação caduca “por morte do locatário ou, tratando-se de pessoa colectiva, pela extinção desta, salvo convenção escrita em contrário” (artºs 1051º do CC).
Mas esta regra não se aplica quando a sociedade arrendatária se extingue pela fusão, em virtude da disposição excepcional da alínea a) do artigo 112º já citado, segundo o qual, com a inscrição da fusão no registo comercial todos os direitos e obrigações da sociedade incorporada se transmitem para a sociedade incorporante (ou para a nova sociedade nos casos de fusão por concentração, onde é criada uma nova sociedade) nomeadamente o direito ao arrendamento.
Portanto, a fusão por incorporação, como é o caso, origina a extinção da sociedade incorporada (a arrendatária) e a transmissão de todos os seus direitos e obrigações para a sociedade incorporante. Assim, por mero efeito da fusão, o direito ao arrendamento transmitiu-se para a sociedade incorporante, a ora apelada, sem necessidade, portanto, de autorização ou consentimento da senhoria.
Todavia é necessário que ao locador seja comunicada, no prazo de 15 dias, aquela transmissão, nos termos da alínea g) do citado artigo 1038º, sob pena de a mesma ser ineficaz em relação a ele, salvo melhor opinião em sentido contrário.
Um dos casos em que não é necessária a autorização do senhorio para a transmissão por acto entre vivos da posição do arrendatário é o trespasse do estabelecimento comercial (artº 115º do RAU). Mas o arrendatário tem a obrigação, nos termos da alínea g) do artº 1038º, de lhe comunicar, dentro de 15 dias, a cedência do gozo do prédio, sob pena de a transmissão ser ineficaz em relação ao senhorio, podendo este resolver o contrato nos termos da alínea f) do artº 64º do RAU (excepto se tiver reconhecido o beneficiário da cedência como tal ou se aquela comunicação lhe tiver sido feita por este - artº 1049º do CC).
Esta comunicação destina-se a proporcionar ao senhorio o conhecimento do negócio pelo qual se tenha operado a cedência da coisa, permitindo-lhe averiguar desse modo se corresponde a alguma das hipóteses em que a lei dispensa a sua autorização ou se, pelo contrário, se trata de uma cedência ilícita, contra a qual possa reagir. Destina-se, no fundo, a fornecer-lhe a identidade do novo inquilino e a possibilidade de aferir da legalidade da cedência a fim de poder defender os seus eventuais direitos resultantes da fusão.
Diz a ré que “não existindo necessidade de autorização da senhoria, também não existe necessidade de comunicação ao senhorio”.
Mas se a transmissão do arrendamento por efeito da fusão é permitida sem consentimento do senhorio, de forma alguma se justificaria que não houvesse obrigação de comunicar tal transmissão ao locador, salvo sempre o devido respeito por opinião contrária. A transmissão do arrendamento em virtude da fusão resulta directamente da lei. Mas isso não significa que não haja obrigação de comunicar os factos que  originam tal transmissão.
Diz a apelada:
- A apelante entende que “a incorporação da sociedade arrendatária implica a transmissão para a sociedade incorporante do direito ao arrendamento”. Mas não é assim.
- A transmissão do direito ao arrendamento em causa, por virtude da fusão por incorporação, não configura, ao contrário do que diz a apelante, qualquer trespasse, pois trata-se de figuras jurídicas diferentes;
- Como não estamos perante um trespasse, é igualmente evidente que não há necessidade de autorização do senhorio para a transmissão do direito ao arrendamento decorrente de um negocio de fusão;
- Porque se verificou a fusão por incorporação, não existe necessidade de comunicação ao senhorio, como decidiu a jurisprudência conhecida, v.g.  o ac. TRL de 17.04.97- CJ Ano 1997, tomo 2, pag. 105, no qual se escreveu: “não sendo exigência da lei a comunicação ao senhorio da fusão da inquilina com outra ou outras sociedades não terão que fazer essa comunicação, nem a sociedade incorporada nem a sociedade incorporante”. No mesmo sentido o ac. TRC de 24.06.97 - CJ Ano 1997, II, 38.
- A fusão não se integra em nenhum dos títulos referidos nas alíneas f) e g) do art° 1038° do Código Civil, uma vez que a previsão destas alíneas apenas abrange a cessão onerosa ou gratuita da posição do arrendatário, sublocação ou comodato.

Parece-nos não haver qualquer dúvida de que não se verifica in casu a figura do trespasse. E é certo que estamos em presença de figuras jurídicas diferentes, embora o resultado prático seja o mesmo em relação ao senhorio, como melhor se verá.
Mas não é pelo facto de não existir  um trespasse que não há necessidade de autorização do senhorio para a transmissão do direito ao arrendamento. Esta transmissão resulta directamente de lei desde que observados os necessários pressupostos.
Relativamente ao trespasse ninguém põe em causa a obrigação de o locatário comunicar ao senhorio, no prazo de 15 dias, a cedência do gozo da coisa locada, sob pena de este poder resolver o contrato (artigos 1038º, al. g. do CC e 64º, nº 1, f. do RAU).
O trespasse é o contrato pelo qual se transmite definitiva, e em princípio onerosamente, para outrem, juntamente com o gozo do prédio, a exploração de um estabelecimento comercial ou industrial nele instalado[6]. O que implica a transferência, em conjunto, das instalações, utensílios, mercadorias ou outros elementos que integram o estabelecimento...
E também no trespasse é permitida a transmissão da posição do arrendatário, sem autorização do senhorio. Mas o arrendatário tem por obrigação fazer a comunicação a que alude a alínea g) do artigo 1038º, sob pena de, não o fazendo, poder aquele resolver o contrato com esse fundamento.
E não se pode dizer, salvo o devido respeito, que em virtude de se ter verificado a fusão por incorporação, não existe necessidade de comunicação ao senhorio.
Aqui, a razão de ser é a mesma que se verifica relativamente ao trespasse. É que a transmissão do direito ao arrendamento pela fusão tem os mesmos efeitos que o trespasse, relativamente ao senhorio, embora se trate de figuras jurídicas diferentes. O património da sociedade incorporada transmite-se como universalidade; os bens pertenciam a uma sociedade e passam a pertencer a outra, com os direitos e obrigações correspondentes.
É certo que se decidiu no acórdão do TRC de 24.06.97 (CJ Ano de 1997, tomo III (e não II como, por lapso, se escreveu na sentença) pag 36 a 39:
I - A transmissão do direito ao arrendamento, decorrente de um negócio de fusão de sociedades, não necessita de autorização do senhorio e/ou de lhe ser comunicada a fusão.
II- O legislador, na alínea f) do artigo 1038º do CC, utiliza a expressão “cessão” no sentido específico de cessão da posição contratual, não estando assim incluída em tal expressão( e na obrigação decorrente de tal alínea) a figura da fusão.
Mas escreveu-se também nesse douto acórdão: “Pensamos que não terá interesse digno de protecção legal o conhecimento por parte do senhorio de que o seu locatário ampliou o seu património fundindo-se com outra ou outras sociedades congéneres e a nova identificação também não terá um interesse relevante, uma vez que muitas vezes e em princípio até serão os mesmos empregados que se integraram na nova sociedade que lhe continuarão a entregar as rendas”.
Salvo o devido respeito não podemos concordar com esta justificação.
Já dissemos, qual a razão de ser do preceituado na alínea g) do artigo 1038º. O interesse do locador em ter conhecimento da fusão, é, pois, digno de protecção jurídica, uma vez que, com o seu registo, como se disse, se transmite o direito ao arrendamento. E o contrato de arrendamento é um contrato intuitus persona, sendo certo que a arrendatária se extinguiu.
Se ao senhorio não for comunicado o novo arrendatário poderá estar vários anos sem saber quem é o seu inquilino, sobretudo quando, como in casu, se trata duma sociedade comercial. Ora, como se poderá defender que o locador não tem interesse em conhecer o seu locatário? É que não está apenas em causa o pagamento das rendas e muito menos a pessoa que o faz. O senhorio tem todo o direito de saber quem ocupa o local arrendado e em que circunstâncias o faz. Imagine-se, por exemplo, que lhe consta que o locatário cedeu a sua posição contratual a terceiros por um meio não permitido por lei. Se desconhecer a fusão das sociedades irá, obviamente, propor a acção de despejo contra quem pensa ser o seu arrendatário. O certo é que proporá essa acção contra uma entidade que não é já a sua inquilina. E o mesmo se diga se, por exemplo, pretende obter alguma informação e não souber onde se dirigir, pois o local onde se situava a sede  da sociedade incorporada poderá já não existir (é que a sede social pode situar-se em local diferente do local arrendado)
Diz-se ainda naquele acórdão do TRC: «afigura-se-nos que o legislador utilizou a palavra “cessão” em sentido específico de cessão da posição contratual e sendo assim, nela não estará incluída a figura da fusão uma vez que não se trata efectivamente de uma verdadeira cessão contratual, como se referiu, mas de uma simples transferência da sua posição na sociedade fundida para a nova sociedade. Como se deixou dito, não houve uma verdadeira extinção, mas uma transformação». E na verdade já antes se havia referido nesse douto aresto que embora o artigo 112º diga que pela fusão se extinguem as sociedades incorporadas, não se trata de uma verdadeira extinção das sociedades fundidas, uma vez que a personalidade jurídica dessas sociedades se transforma, não desaparecendo.
Como melhor se dirá, também não se concorda com esta conclusão, apesar de se reconhecer (tal como no acórdão) que, em virtude da fusão, se transfere para a sociedade incorporante não só o património, mas também os sócios das sociedades fundidas. “Passa a existir um único património e um único conjunto de sócios”.
IV
Resulta do preceituado nas alíneas f) e g) do artº 1038º que sempre que o arrendatário ceda licitamente a outrem o gozo da coisa locada “por meio de cessão onerosa ou gratuita da sua posição jurídica, sublocação ou comodato”, deve comunicar essa cedência ao locador no prazo de 15 dias a partir da data da celebração do respectivo negócio jurídico.
“Na cessão onerosa ou gratuita da posição jurídica do locatário, a que faz referência a alínea f), abrangem-se todos os negócios através dos quais se transmita o direito ao arrendamento, pois a cessão de uma posição contratual é um negócio de causa variável, podendo ter na base uma compra e venda, uma troca, uma doação em cumprimento, um trespasse, uma fusão de sociedades, etç”[7].
Justifica-se que o CSC, no caso de fusão, dispense a autorização do senhorio, pelas razões referidas.
Mas nada justificaria que se dispensasse o dever de comunicar a transmissão do direito ao arrendamento (o senhorio não intervém na fusão e a dita comunicação nem sequer envolve para as sociedades intervenientes especiais encargos, pois de uma simples comunicação se trata, sem necessidade  sequer da observância de qualquer formalismo)
A alínea g) do artigo 1038º abrange todas as hipóteses de cedência lícita do gozo da coisa locada (ver alínea f) do mesmo artigo), nomeadamente no caso de transmissão universal do património do arrendatário, como sucede com a fusão de sociedades.
É indiscutível que o direito ao arrendamento se transferiu para uma entidade diferente, com personalidade jurídica própria, assumindo as obrigações resultantes da fusão.
“A obrigação de comunicação ao locador, nos casos de cedência do gozo da coisa, existe em qualquer caso de transmissão da posição contratual de locatário ou de sublocação”[8]. E as consequências dessa omissão cessam se o locador reconhecer o cessionário como tal ou se a comunicação lhe tiver sido feita por este, o que não se verifica no caso a que os autos se reportam.

Como o Prof. Pessoa Jorge reconhece no aludido parecer, na fusão as sociedades fundem-se numa só (nos seus elementos pessoal e patrimonial), na qual passa a haver um único património. Da fusão resulta efectivamente uma única pessoa colectiva, uma só entidade jurídica.
Nessa obra  (“O Direito” ano 122 vol. II pag 465) escreve: «..esta extinção é, pois, uma consequente é uma consequência de técnica jurídica, resultante da impossibilidade de subsistirem, no mesmo substrato pessoal e patrimonial, uma pluralidade de pessoas colectivas, com características diferenciadas...Mas, no plano económico-social, a vida das sociedades “extintas” não só prossegue, como tende a desenvolver-se (pelo menos é para isso que os sócios, em regra, querem a incorporação ou fusão): no intento prático das partes e no plano económico, a finalidade prosseguida não é pôr fim à sociedade incorporada ou fundida, mas, pelo contrário, dar-lhe novo alento, vida nova e mais pujante».
A verdade é que a sociedade incorporada se extingue.
E com a extinção da sociedade incorporada opera-se a transmissão para a incorporante dos elementos patrimonial e pessoal daquela.
Como estabelece o artigo 5º do CSC as sociedades gozam de personalidade jurídica e existem como tais a partir da data do registo definitivo do contrato pelo qual se constituem, sem prejuízo do disposto quanto à constituição de sociedades por fusão, cisão ou transformação de outras.
Portanto, as sociedades comerciais têm personalidade jurídica própria independente dos sócios, a partir do registo definitivo do acto constitutivo, “sem prejuízo do disposto quanto à constituição de sociedades por fusão, cisão ou transformação de outras”. Mas, nomeadamente no caso da fusão, deve entender-se que as novas sociedades (resultantes dessa fusão) também adquirem personalidade jurídica com o registo respectivo.
Antes da fusão, ambas as sociedades tinham personalidade jurídica própria, independentemente da pessoas dos sócios, a qual se mantinha, mesmo que houvesse, por exemplo, cessão da quotas a favor de terceiros e/ou que o ramo de negócio passasse a ser completamente diferente e o seu património se modificasse.
Diz o Prof. Pessoa Jorge (pag. 477): “a obrigação prevista na alínea g) só existe, como nela se diz, quando a cedência do gozo da coisa se faz por algum dos títulos referidos na alínea anterior, ou seja, por cessão onerosa ou gratuita da posição de arrendatário, sublocatário ou comodato. A menção a estes títulos jurídicos mostra que a palavra cessão está empregada em sentido específico (de cessão na posição contratual) e não no sentido genérico de transmissão do gozo da coisa, para o qual o código utiliza a palavra cedência [como  faz na alínea g)]: a cedência do gozo da coisa não é um título jurídico, mas o efeito comum a vários e distintos  títulos”.
E depois acrescenta que a transmissão prevista no artigo 1038º  tem fonte voluntária e é a  titulo singular. E logo a seguir: “ora, como se viu, a inscrição da incorporação no registo comercial produz directamente a transmissão, a título universal, do património da incorporada para o da incorporante, incluindo os direitos aos arrendamentos de que aquela seja parte” (pag. 478) .E conclui dizendo que a incorporação não se integra em nenhum dos títulos referidos naquelas alíneas f) e g).
“Consequentemente, não existe para a sociedade incorporada, que se extingue, nem para a incorporante, que àquela sucede, a obrigação de comunicar ao locador que o gozo da coisa se transferiu para a segunda, pois se está fora do campo de aplicação das transcritas alíneas do artigo 1038º” (pag. 478)
Com o devido respeito não se concorda com esta conclusão.
Antes de mais dir-se-á que o CSC não inclui a fusão nas causas de dissolução das sociedades (artº 141º e 142º), ao contrário do que acontecia com o artigo 120º, nº 7 do C. Com., nos termos do qual as sociedades comerciais se dissolviam “pela fusão com outras sociedades”.
E a dissolução duma sociedade é consequência da fusão e não seu antecedente, pelo que não faz sentido, com o novo CSC, o apelo à dissolução e liquidação das sociedades para os efeitos em causa (ao contrário do que acontecia com o C. Com em que a fusão era uma das causas de dissolução das sociedades).
Na fusão só as sociedades incorporadas ou todas as sociedades participantes se extinguem (conforme o tipo de fusão) sem dissolução e sem liquidação, em sentido técnico-jurídico. Mas estas desaparecem em virtude da fusão (ipso factu)
Sobre esta questão escreve o prof. Raúl Ventura: “Assim, voltando á extinção das sociedades, é ela o mais claramente possível expressa na lei e com ela deve contar-se qualquer construção jurídica da fusão. E não tem cabimento distinções subtis sobre aquilo que se extingue: Extingue-se a pessoa jurídica, extinguem-se as participações dos sócios; extinguem-se as participações dos sócios nessas sociedades. Mas também não podem esquecer-se as finalidades dessas extinções; não se extingue tudo isso como um fim em si mesmo – extingue-se para substituir, extingue-se para renovar. Certamente são aproveitados os elementos pessoais, patrimoniais e até imateriais das sociedades participantes que se extinguem, mas extinção não implica desaproveitamento”[9]
E não vale o argumento de que ao efectuar-se a fusão não se pretende extinguir a(s) sociedade(s), mas antes revitalizá-las e dar-lhes melhores condições para prosseguirem os seus objectivos (uma vez que o património da sociedade incorporada se transmite como universalidade; os bens pertenciam a uma sociedade e passam a pertencer a outra, com os direitos e obrigações correspondentes). É que, não obstante todas as vantagens que possam resultar da fusão, a verdade é que juridicamente apenas ficará a subsistir uma sociedade, extinguindo-se a outra ou outras, conforme as circunstâncias.
Seja qual for a intenção dos sócios de ambas as sociedades do ponto de vista económico e financeiro e da sua estratégica de desenvolvimento, a verdade é que pela fusão se sujeitam aos ditames da lei sobre as suas consequências.
E uma dessas consequências é a extinção  da(s) sociedade(s) (incorporadas) (ou de todas elas - na fusão por constituição de nova sociedade) e a transmissão global do património, mas sem dissolução e sem liquidação em sentido técnico-jurídicos. Não obstante esta extinção, como vimos,  são aproveitados os elementos pessoais, patrimoniais e até imateriais das sociedades participantes. Aqueles bens pertenciam a um determinado sujeito e passam a pertencer a um sujeito juridicamente distinto, continuando, porém, a ser os mesmos direitos e obrigações.
Mas em relação  ao senhorio o direito ao arrendamento passou exactamente para a titularidade deste “novo sujeito”.
Ora, tendo-se operado uma fusão por incorporação, nenhuma dúvida pode haver de que a posição  jurídica de que era titular a incorporada, designadamente na qualidade de arrendatária, se transmitiu para a sociedade incorporante
Se, nos casos em que a cessão se opera por simples contrato e a transmissão é feita a título singular, como sucede no trespasse, por que razão não haveria de ficar sujeito ao mesmo regime nos casos em que, como na fusão, existe uma transmissão universal do património do arrendatário?

Portanto, sempre que o arrendatário cede licitamente a outrem o gozo da coisa locada “por meio de cessão onerosa ou gratuita da sua posição jurídica, sublocação ou comodato” deve comunicar essa cedência ao locador no prazo de 15 dias.
V
A propósito do preceituado na alínea f) do nº 1 do artigo 1093º do CC então em vigor (agora 64º, nº 1- f. do RAU) já dizia Pinto Furtado que a enumeração das três causas que facultam a resolução do contrato pelo senhorio devia ser entendida a título meramente exemplificativo[10].
E nesse mesmo sentido o ac. TRE, de 10.05.84 (CJ ano 1984, III, 319): é exemplificativa a indicação dos negócios jurídicos constantes dos artigos 1038º, al. g) e 1093º, al. f) do C.C.. E ainda Henrique Mesquita in RLJ Ano 126-345: “a alínea f) do artigo 1038º deve interpretar-se no sentido de que a enumeração que nela se faz, dos actos relativos ao gozo da coisa locada, que ao locatário é vedado praticar não reveste carácter taxativo”.
Em sentido contrário o Conselheiro Aragão Seia[11], dizendo que a enumeração (da alínea f) do artigo 64º do RAU) das situações que permitem ao senhorio a resolução do contrato é taxativa[12].
Mas seja qual for a interpretação a dar a este artigo nesta parte, parece-nos que se chegará sempre a este resultado por interpretação extensiva.
Na verdade, nenhuma razão haveria para manter o senhorio na ignorância da transmissão do arrendamento para outra entidade em virtude da fusão de sociedades. A razão de ser é a mesma. E em qualquer dos casos se verifica a transmissão da posição do arrendamento para uma entidade juridicamente diferente.
A cessão da posição contratual é a transmissão da posição do arrendamento a terceiros. Como estabelece o artigo 424º, nº 1 do CC, nos contratos com prestações reciprocas, qualquer das partes tem a faculdade de transmitir a terceiro a sua posição contratual, desde que o  outro contraente, antes ou depois da celebração do contrato, consinta na transmissão. Mas se o consentimento for anterior à cessão, esta só produz efeitos a partir da sua notificação (ou reconhecimento) (nº 2 do mesmo artigo).
Portanto, não obstante este consentimento, para que a cessão seja eficaz torna-se necessária a sua notificação ou reconhecimento pelo outro contraente.
O contrato de cessão da posição contratual tem como principal efeito a substituição do cedente pelo cessionário na relação contratual, tal como existia à data da cessão.
Face ao referido não haveria qualquer justificação para não existir a obrigação de comunicação ao senhorio, uma vez que o arrendamento foi transmitido a uma nova entidade.
É que mesmo quando permitidos, os actos de cedência do gozo da coisa podem ser ineficazes em relação ao senhorio, se lhe não tiver sido feita essa comunicação no prazo legal.
VI
Por todo o exposto acorda-se em julgar procedente a apelação, revogando-se a sentença recorrida, e em consequência:
a) declara-se resolvido o contrato de arrendamento relativo ao 1º andar com entrada pelo nº 70 do prédio urbano situado na Rua Sampaio Pina, nºs. 68-70, em Lisboa.
b) Condena-se a ré  a despejar imediatamente o andar, entregando-o à autora livre e devoluto.
Custas pela ré em ambas as instâncias.

Lisboa, 01.07.2003.

Pimentel Marcos
Jorge Santos.
Vaz das Neves
___________________________________________________________

[1] Raúl Ventura, in “Fusão, Cisão, Transformação de Sociedades”, pag. 14 e 15.
[2] Raúl Ventura ob. cit. Pag. 222
[3] O DIREITO Ano 122- 1990 - II Abril - Junho (pags. 463 a 480)
[4] ob. cit. Pag. 218 e 223.
[5] RLJ 128º, 61.
[6] Aragão Seia, in Arrendamento Urbano, pag. 531.
[7] Henrique Mesquita – RLJ 128º-59, fazendo referência aos ensinamentos de Pires de Lima e Antunes Varela no CC Anotado, 4ª edição, em anotação ao artº 425.
[8] Pires de Lima e Antunes varela em anotação ao artº 1038º.
[9] Ob. cit. Pag.230
[10] Curso de Direito dos Arrendamentos Vinculísticos, pag. 505.
[11] Ob. cit. pag. 351, onde cita no mesmo sentido o ac. STJ de 03.07.97 (BMJ 469-486).
[12] Entretanto, o Cons. Aragão Seia defende que a transmissão do direito ao arrendamento, em caso de fusão, deve ser comunicado no prazo de 15 dias, tal como vimos defendendo (pag. 535)