Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
1779/20.9T9ALM-B.L1-9
Relator: ELEONORA VIEGAS (VICE-PRESIDENTE)
Descritores: PRESCRIÇÃO
SUBIDA DO RECURSO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 06/09/2025
Votação: DECISÃO INDIVIDUAL
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: RECLAMAÇÃO
Decisão: PROVIDO
Sumário: O recurso da parte do despacho que declara prescrito o procedimento criminal relativamente a um dos dois crimes pelos quais a arguida é acusada, deve subir imediatamente, sob pena de poder vir a ser absolutamente inútil pelo decurso do tempo entretanto ocorrido.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: I. Relatório

AA, assistente nos autos, veio reclamar, nos termos do art. 405.º do CPP, do despacho que admitiu o recurso que interpôs com subida a final.
Alega, em síntese, que o recurso, que tem por objecto o despacho que declarou prescrito o procedimento criminal por um dos dois crimes de difamação de que a arguida foi acusada, deve ser admitido com subida imediata, nos próprios autos e efeito suspensivo daquela parte do despacho, sob pena de a sua retenção o poder vir a tornar inútil com o decurso do tempo.
Cumpre apreciar.
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II. Fundamentação
Da consulta dos autos resultam os seguintes factos com relevância para a decisão:
1. Em 16.05.2025 foi proferido despacho julgando extinto o procedimento criminal contra a referida arguida, por efeito de prescrição, relativamente ao primeiro crime de difamação agravado que lhe é imputado, cometido em 7.05.2020, determinando que “Os autos prosseguem para julgamento com vista a apreciar da responsabilidade criminal da arguida pela prática do outro crime difamação agravado que lhe é imputado, cometido em 12/06/2020, e quanto ao pedido cível”, e designando o dia 10.07.2025 para a realização da audiência de julgamento;
2. Em 18.05.2025 a assistente interpôs recurso do despacho, na parte em que julgou extinto o procedimento criminal relativamente ao primeiro crime de difamação;
3. Sobre o que foi proferido o seguinte despacho (reclamado):
Por estar em tempo, ter legitimidade, ser a decisão recorrível, admite-se o recurso interposto pela assistente que antecede, que deu entrada em 18/05/2025, a subir conjuntamente com o recurso interposto da decisão que puser termo à causa e com efeito devolutivo (cfr. artigos 399º, 400º, nº1, “a contrario”, 401º, nº 1, alínea b), 411º, nº 1, a) e 3; 406º, nº 1, 407º, nº 3, e 408º, a contrario, todos do Código de Processo Penal).
Notifique.
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Dispõe o artigo 407.º do CPP sobre o momento da subida dos recursos:
1 - Sobem imediatamente os recursos cuja retenção os tornaria absolutamente inúteis.
2 - Também sobem imediatamente os recursos interpostos:
a) De decisões que ponham termo à causa;
b) De decisões posteriores às referidas na alínea anterior;
c) De decisões que apliquem ou mantenham medidas de coacção ou de garantia patrimonial, nos termos deste Código;
d) De decisões que condenem no pagamento de quaisquer importâncias, nos termos deste Código;
e) De despacho em que o juiz não reconhecer impedimento contra si deduzido;
f) De despacho que recusar ao Ministério Público legitimidade para a prossecução do processo;
g) De despacho que não admitir a constituição de assistente ou a intervenção de parte civil;
h) De despacho que indeferir o requerimento para a abertura de instrução;
i) Da decisão instrutória, sem prejuízo do disposto no artigo 310.º;
j) De despacho que indeferir requerimento de submissão de arguido suspeito de anomalia mental à perícia respectiva.
k) De despacho proferido ao abrigo do disposto nos n.ºs 2, 3 e 5 do artigo 328.º-A.
3 - Quando não deverem subir imediatamente, os recursos sobem e são instruídos e julgados conjuntamente com o recurso interposto da decisão que tiver posto termo à causa.
Não vem posto em causa que o despacho recorrido não se insere em nenhuma das alíneas do n.º2 do preceito citado, cabendo apreciar se a retenção do recurso interposto pela assistente o tornará absolutamente inútil.
A retenção do recurso gera inutilidade absoluta sempre que o despacho recorrido produza um resultado irreversível, seja qual for a decisão do tribunal ad quem, não bastando uma mera inutilização de actos processuais, ainda que contrária ao princípio da economia processual1.
Estando a arguida acusada da prática de dois crimes de difamação, pelo despacho recorrido foi declarado extinto, por prescrição, o procedimento criminal relativamente ao primeiro dos dois crimes, prosseguindo os autos para julgamento relativamente ao segundo.
A assistente recorreu por entender não ter ocorrido a prescrição do procedimento criminal declarada no despacho.
Ocorrendo a prescrição do procedimento criminal por efeito do decurso de determinado período de tempo sobre a prática do crime (arts. 118.º a 121.º do Código Penal), a sua retenção pode vir a tornar o recurso em questão absolutamente inútil. Em caso de procedência do recurso e revogação do despacho proferido em 16.05.2025, pode ocorrer que, quando venha a ser proferido novo despacho em substituição do revogado, a prescrição possa, de facto, ter-se verificado entretanto por efeito do tempo decorrido.
Pelo que a reclamação deve ser julgada procedente.
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III. Decisão
Pelo exposto, julgo procedente a reclamação apresentada.
Sem custas.
Notifique.
***
Lisboa, 9.06.2025
Eleonora Viegas
(Vice-Presidente, com competências delegadas)

1. Cfr. Comentário Judiciário do Código de Processo Penal, Tomo V, Almedina, 2024, p. 157 e autores e aí citados