Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
| Processo: |
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| Relator: | CARLOS CASTELO BRANCO (VICE-PRESIDENTE) | ||
| Descritores: | SUSPEIÇÃO ADMISSÃO DE PROVA MEIO PROCESSUAL ADEQUADO NULIDADES ACTO PROCESSUAL IMPARCIALIDADE IGUALDADE DEVER DE URBANIDADE | ||
| Nº do Documento: | RL | ||
| Data do Acordão: | 05/10/2024 | ||
| Votação: | DECISÃO INDIVIDUAL | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Texto Parcial: | N | ||
| Meio Processual: | SUSPEIÇÃO | ||
| Decisão: | INDEFERIMENTO | ||
| Sumário: | 1) Não se mostra necessária ou pertinente a audição das duas testemunhas arroladas pelo requerente da suspeição, pois, tratando-se de testemunhas já inquiridas (cuja gravação respetiva se encontra acessível e foi, aliás, transcrita em parte pela requerente do incidente) e dizendo respeito o incidente a circunstâncias já temporalmente delimitadas, nenhum interesse para a sua decisão, traria a sua audição. 2) O incidente de suspeição – a apreciar por outra entidade que não o juiz a quem foi distribuído o processo (ou seu substituto, em função do incidente de suspeição deduzido) não constitui o meio legal para conseguir a alteração de decisões proferidas (sendo o meio cabível a reclamação ou a interposição de recurso ou outro meio impugnatório) ou para conhecer de nulidades decorrentes de atos processuais já ocorridos. 3) Perante os elementos disponíveis e o contexto em que teve lugar a intervenção da Sra. Juíza – que não tem alguma relação com as partes e demais intervenientes no processo, senão, em virtude deste - , não se conclui que, objetiva e subjetivamente, se mostre posta em causa a imparcialidade do julgador, sendo que, não se evidencia que tenha havido tratamento desigualitário ou discriminatório de uma parte face a outra, apenas sucedendo que, no desenrolar da tramitação do processo, conforme explicita a Sra. Juíza, a mesma entendeu exercer os respetivos poderes – instrutórios, decisórios e inquisitórios – nos termos que concretizou, culminando na prolação de decisões sobre as pretensões respetivas das partes e sobre a gestão dos atos de inquirição a que presidiu, que resultaram no respetivo conteúdo fundamentador e no dispositivo decisório que exteriorizou. 4) Nenhuma falta de urbanidade do julgador se infere relativamente à testemunha mencionada pela requerente, sendo certo que esta, mesmo a verificar-se, não legitimaria, por si só, a procedência do incidente de suspeição respeitando a quebra de imparcialidade com uma ou ambas as partes. | ||
| Decisão Texto Parcial: | |||
| Decisão Texto Integral: | I. “A” – ré no processo n.º 21933/22.8T8SNT, que corre termos no Juízo do Trabalho de Sintra – Juiz “X” - veio apresentar, por intermédio da sua advogada, incidente de suspeição, nos termos do disposto no artigo 120.º, n.º 1, do CPC, relativamente à Sra. Juíza “B”, considerando que “o modo como foi produzida e permitida a prova, mas também o comportamento da Exma. Senhora. Dra. Juiz de Direito, que evidencia comportamentos distintos face à Autora e face a Ré em situações idênticas, como também violou a urbanidade como foi tratada a testemunha da Ré, e a permissão que foi dada para exercício do contraditório, em manifesta violação do princípio da igualdade de armas”, o justifica. Para tanto invocou, em síntese, que: - O processo versa sobre a pretensão da Autora a ver reconhecida a realização de horas suplementares, declaração do início do contrato de trabalho a 08-10-2019 e declaração do enquadramento da relação laboral no contrato colectivo de trabalho celebrado entre (…) e (…), resultando na condenação do Réu ao pagamento de créditos laborais no montante de 2.936,68 €; - Não tendo havido acordo em audiência de partes, na contestação, “o R. deduziu a condenação da A. à litigância de má-fé, tendo em vista que a Autora peticiona receber horas suplementares referente ao período de encerramento do estabelecimento por determinação governamental (em razão do COVID-19)”; - No dia 23-02-2023 “a Autora apresenta requerimento a manifestar-se sobre o pedido de litigância de má-fé, tendo deduzido pedido de condenação do R. como litigância de má-fé, bem como inserido factos que não foram suscitados na petição inicial, e, que eram do seu conhecimento antes de ser intentada a presente acção judicial, tendo o R. exercido o contraditório a 03-03-2023”; - “No dia 16-03-2023 a A. apresenta outro requerimento probatório a requerer expedição de ofício ao Centro de Emprego, sendo proferido despacho saneador a deferir a diligência probatória com fundamento na busca da verdade material”; - “no dia 09-10-2023 pelas 09:30 horas, foi realizada a primeira audiência de sessão e julgamento, momento em que se indiciam comportamentos anómalos por parte do julgador”; - Procedeu-se “à audição da testemunha “C”, marido da Autora, requerido pelo R. a desistência da inquirição da testemunha “D”, e, realizada a audição de “E”, ex-trabalhadora do Réu, sendo proferido o seguinte despacho: “A coberto do disposto no art.º 411 do CPC, determina-se a notificação à Ré para juntar aos autos em 10 dias: a) cópia dos mapas de horários de trabalho de todos os seus trabalhadores no período que mediou entre 1 de outubro de 2019 e 10 de janeiro de 2022; b) identificar todos os seus trabalhadores no período que mediou entre 1 de outubro de 2019 e 10 de janeiro de 2022.”; - “Por sua vez, o Ilustre Mandatário da A. requer: “Em face do depoimento da testemunha “E” afigura-se essencial e imprescindível que seja concedido prazo para a Autora poder juntar aos autos fotografias dos eventos entre as educadoras e auxiliares realizados com as crianças no ultimo trimestre de 2019, para o que se requer prazo de 10 dias para o fazer.’’, tendo concedido o contraditório ao Ilustre Mandatário do Réu, e, deferida a sua junção”; - “o julgador declarou que a prova requerida poderia não bastar para demonstrar os factos que a Autora pretendia”; - “No fim da sessão de julgamento, sem gravação, a Sra. Juíza, perante os Ilustres Mandatários da Autora e Réu, da testemunha do Réu “E” e da advogada da ré, alertou às partes que “(...) era uma juíza muito interventiva", e, se fosse necessário, convocaria os pais das crianças inscritas na creche para serem ouvidos”; - “apesar de atípico, uma vez que poderia conduzir a um entendimento de uma decisão pré-definida por parte da Mm.a Juíza, não foi suficiente para desconfiar da imparcialidade da julgadora”; - “no dia 30-10-2023 o Réu é surpreendido com um novo requerimento por parte da Autora, a exercer um contraditório do requerimento do R., ferindo o disposto do n.º 3 do artigo 60.º do CPT, bem como a requerer: 1- Seja a R. notificada para informar os autos quem são as crianças que se encontravam nas fotografias juntas pela A., com a indicação do nome dos seus progenitores, e serem os mesmos notificados para virem depor em juízo (disponibilizando-se a A. para facultar as fotografias com as crianças identificadas); 2- Seja a gerente da R. notificada para informar o processo quando realizou o seu matrimónio, se este coincidiu com a celebração do copo de água a que correspondem as fotografias que juntou. 3- Seja a R. notificada para vir aos autos informar quais os valores que recebeu pelo benefício do apoio à contratação da A. (candidatura ID (…)29)”; - “(…) na insuficiência manifesta da prova requerida, este novo pedido de produção de prova visa tão-somente provar o que as fotografias juntas pela Autora não conseguiram, pelo que deveria ter sido indeferido, mas foi proferido despacho – a 03-11-2023 – de deferimento da produção de prova intempestiva por parte da Autora, sem qualquer indicação de superveniência dos factos”; - “no mesmo despacho a Sra. Juíza não se pronuncia sobre o primeiro pedido da Autora e, numa autêntica antecipação de convicção, é ainda ordenado a audição de três testemunhas, nomeadamente “F”, “G”, e, inclusive a testemunha que o Réu tinha dispensado, a Sra. “E””; - “Novamente, apesar de invulgar, tal conduta do julgador não levou ao Réu a desconfiar de nada, pois há meio próprio para questionar a decisão judicial”; - “contrariamente aos requerimentos da Autora, a prova requerida pelo Réu é indeferida por ora: “Considerando que do alegado pela Ré não resulta, pelo menos por ora, uma impossibilidade (definitiva) de dar cumprimento ao determinado quanto à junção dos mapas de horário de trabalho, mas tão-só dificuldade em proceder a essa junção no prazo fixado para o efeito, concede-se um prazo adicional de 10 dias para que a Ré junte aos autos esses documentos ou, sendo esse o caso, para que venha informar se foram “descartados"." - “começa a evidenciar-se uma predisposição do julgador para uma das partes da contenda, admitindo prova intempestiva à Autora, salvo melhor opinião, e, indeferindo a junção de prova ao Réu”; - “Contemporaneamente ao referido despacho, encontrava-se em curso prazo para exercício do contraditório sobre os esclarecimentos requeridos pela Autora junto do IEFP sobre o seu processo de recrutamento. O qual (…) se revelou perentório quanto a data de celebração do contrato de trabalho (…)”; - “causou estranheza ao Réu ter sido deferida nova produção de prova da Autora, com a finalidade de comprovar que estava a trabalhar para o Réu em outubro de 2019, uma vez que a prova documental requerida pela própria A. a desmentiu”; - “adicionámos aos indícios de um tratamento desproporcional e desfavorável, quando a Mm.a Juíza determina a inquirição de três testemunhas para apreciar o pedido de litigância de má-fé”; - “o R. fundamenta o pedido de litigância de má-fé numa razão aritmética e objectiva, qual seja, a A. está a pedir quantitativamente horas suplementares no período que estava em casa, porque as creches foram encerradas por determinação governamental, ao passo que a A. requerer a condenação da R. por litigância de má-fé pelo facto de que estava a trabalhar para a mesma de Outubro de 2019”; - “A prova documental produzida, a pedido da Autora, faz prova plena e demonstra que a A. não estava a trabalhar para o R. em Outubro de 2019”; - “De facto, corrobora com o suscitado na contestação no artigo 8., que o marido da A. contou para o marido da gerente do R. que estava a receber o subsídio de desemprego, pois nos termos da documentação referenciada a A. deu entrada no pedido de subsídio de desemprego a 07 de outubro de 2019”; - “Porquanto, é pouco compreensível a razão pela qual é deferida prova para atacar o ofício do IEFP, excepto se aceitarmos que o julgador vê algum fundamento para não atribuir o devido valor probatório a este documento. (…) O que não se sustenta porque o documento não foi impugnado por nenhuma das partes”; - “Como também as testemunhas solicitadas pelo tribunal, se desvincularam do Réu antes de 2020 ou no início de 2020, o seu depoimento somente poderia incidir sobre o início da relação laboral”; - “Denota-se que a prova requerida pelo julgador é uma prova que visa única e exclusivamente atacar um documento. (…) Função essa que não compete ao juiz, mas sim as partes”; - “(…) esta prova que foi requerida pela Autora, a uma entidade externa sem interesse na resolução dos presentes autos e ter declarado expressamente a data da colocação da trabalhadora”; - “não obstante o conjunto de indícios incomuns na esfera processual, não resulta ainda evidência de parcialidade do julgador, séria e grave que justifique o presente incidente”; - “A Autora confrontada com uma prova que não lhe é favorável, apresenta requerimento a 06-11 - 2023 a requerer, mais uma vez, nova prova. Veja-se: - Seja notificada a Associação (…), I.P.S.S., com sede em (…) Amadora, para vir aos autos juntar cópias das comunicações remetidas para a A. referente à oferta de emprego junto da R. (…), indicando que o contacto naquela altura foi estabelecido pela A. com a Dra. “G” (…). 59.Ou seja, a Autora que até então tinha sempre referido que tinha sido encaminhada pelo IEFP, I.P., vem agora dar o dito pelo não dito, desmentindo o que disse em duas ocasiões distintas, e, alegar que foi encaminhada pela Associação (…). 60.Ora, a manifesta contradição foi arguida pelo Réu. 61.E para imensa surpresa veja-se o novo despacho datado de 10-11-2023: Ref. Citius (…)34. de 6.11.2023: Tomei conhecimento. Indefere-se o agora, requerido pela Autora, ponderando, desde logo. nada ter sido alegado, nem existir qualquer evidência de que a Autora não pudesse obter as informações e/ou os documentos referentes às informações pretendidas pelos seus próprios meios (tanto mais que a si respeitariam) (cfr. artigo 7.º, n.° 4 a contrario do Código de Processo Civil) (sem que deixe de se registar que. em momento algum, até este momento, fez a Autora qualquer menção à entidade a que. agora, se reporta). Notifique. Ref. Citius (…)66, de 3.11.2023: Tomei conhecimento. Não obstante a argumentação vertida no requerimento em apreço deverá a Ré dar cumprimento ao determinado pelo Tribunal no despacho de 3.11.2023, que se mantém, quanto a "indicar as datas em que ocorreram os eventos em que foram tiradas as fotografias cuja junção aos autos requer, a saber, a celebração do "aniversário do filho da gerente ” (a que, alegadamente, se reportam as fotografias juntas como Doe. I) e a celebração do “casamento da gerente da Ré " (a que, alegadamente, se reportam as fotografias juntas como Doc. 2) ", sob pena de não o fazendo não ser admitida a junção aos autos dos referidos documentos. Notifique”. - “É manifesta a desproporção do despacho”; - “a Autora apresenta um documento, que o próprio julgador reconhece como sendo um elemento novo nunca referido, e indefere-o por ora”; - “os requerimentos e documentos juntos pelo Réu são frequentemente indeferidos”; - “esta situação adensa-se na realização da segunda audiência de discussão e julgamento, ocorrida no dia 27-11-2023, pelas 09:30 horas”; - “durante o interrogatório da testemunha da Autora “G”, as perguntas do mandatário do Réu são constantemente rejeitadas pelo julgador1: “J: 12:14 – 12:25 - Senhor Doutor, essa matéria não foi questionada pelo seu colega, até agora tenho lhe permitido essas perguntas porque podem de alguma forma estar a ver com a credibilidade que merece o depoimento da testemunha. Agora esta última já não. J: 12:37 – 12:46 - Senhor Doutor, a testemunha foi indicada pelo autor. O autor fez a sua inquirição, e o senhor doutor só pode pedir esclarecimentos relativamente às perguntas do seu colega. As perguntas que tem feito até agora não estão dentro do âmbito dos esclarecimentos, mas eu tenho lhes permitido porque podem ter a ver com a credibilidade do depoimento da testemunha, portanto é esta a linha. Dentro desta linha senhor doutor, faça o favor. J: 14:24 – 14:32 - Senhor doutor, essa pergunta não. Senhor doutor, vai me desculpar. Não vou repetir até à exaustão, esclarecimentos as perguntas que foram feitas pelo seu colega muito bem, tudo o que extravase isso, não... J: 14:53 – 15:21 - Oh senhor doutor, a mim é me absolutamente irrelevante porque é que a senhora recusou a proposta de contrato, não estamos aqui a julgar o processo da senhora. Portanto o que eu sei é que os factos que a senhora tem conhecimento localizam-se no tempo, segundo a própria testemunha, entre 1 de junho de 2021 e 30 de agosto de 2021. Pronto. Porque é que a testemunha recusou ou não recusou celebrar um contrato de trabalho, não tem qualquer utilidade para a instrução e discussão desta causa. Portanto senhor doutor pode continuar se tem mais alguma pergunta. J: 15:35 – 15:40 - Senhor doutor outra vez? Não vou repetir, a pergunta não é permitida.” - a Mm.ª Juíza indeferiu as perguntas apresentadas pelo Mandatário do Réu, sob a alegação que não foi questionada pelo Colega, que só poderia fazer perguntas dentro do âmbito das questões apresentadas pelo Mandatário da Autora, ou, o facto de ser irrelevante”; - “Pese embora o Mandatário da Autora tenha inquirido a testemunha directamente, o que é possível se permitido pelo julgador, o mesmo não sucedeu com o Mandatário do Réu, que era interrompido constantemente, sendo indeferidas às perguntas a testemunha da Autora”; - “O que é deveras estranho, pois se na sessão anterior afirmou perante todos que era uma juíza interventiva, que buscava a verdade dos factos, por qual motivo indeferiu a actuação do Mandatário do Réu na busca desta verdade?”; - “a postura da julgadora contrastou gritantemente com o seu comportamento na audiência de discussão e julgamento realizada no dia 09-10-2023, onde foi permitido ao Mandatário da Autora inquirir a testemunha do Réu com todos os tipos de questões, inclusive totalmente fora do objecto da inquirição do Réu”; - “Nenhuma pergunta do mandatário da Autora foi indeferida”; - “Mas se até então, havia alguma dúvida acerca da mácula da imparcialidade do julgador, veja-se o que sucede com a testemunha que tinha sido dispensada pelo Réu, a Srª. “E”, que é novamente chamada pelo Tribunal, não obstante ter assistido ao julgamento de 09-10-2023 após ter sido dispensada de tal função: “J: 20:23 – 20:32 - Olhe vou-lhe mostrar outra fotografia. Agora já estou no documento 3 tá bem? Esta fotografia aqui. Quem é que são as pessoas que estão presentes nessa fotografia? Juiz – Que é a “H”? Maria Helena – Que é a “H”. Juiz– Eu digo que é a dona “H” porque já foi falado muitas vezes aqui neste julgamento.””. - “Isso porque não só a Mm.ª Juíza reconhece de imediato, na fotografia, sem qualquer indicação de nome na foto, que a cozinheira do Réu chamada “H”. (…) Como também imediatamente tem a necessidade de justificar este reconhecimento “(…) já foi falado muitas vezes aqui neste julgamento.” (…) O que infelizmente se revela falso, pois como consta das gravações de ambas as audiências de discussão e julgamento, ocorridas nos dias 09-10-2023 e 27-11-2023, respectivamente, o nome “H” só foi referido uma única vez, sendo que a sua profissão não foi descrita (…)”; - “Se requer ainda a atenção para tempo decorrido, cerca de 31:58s, desde a única vez que o nome “H” foi referido no julgamento, face a vez que foi referido pelo julgador (…).Não sendo expectável face ao lapso de tempo decorrido que tenha sido captado e mantido o nome de uma pessoa que para os autos se afigura um elemento não essencial ou até mesmo incidental. (…).Mas não só o julgamento se caracterizou por uma impressionante memória do julgador, como se poderá admitir que foi coadjuvante do Mandatário da Autora na inquirição de testemunha “E”, veja-se a transcrição da audiência de 27-11-2023: Mandatário da Autora: 30:50 – 31:06 - Aquele email que ela dirigiu a dizer com a seguinte… J - Oh Sr. Dr. eu vou mostrar porque eu não mostrei eu falei no geral. Não se importa de chegar aqui à frente? É só para testemunha saber o que Sr. está a se referir”; - “(…) Nem a pergunta que é formulada, sequer estava no âmbito das perguntas feitas pela Sra. Dra. Juiz de Direito, que se limitou a fazer perguntas sobre os Doc. 1, 2 e 3 (juntos intempestivamente mediante requerimento, salvo melhor opinião), que correspondiam a fotografias, nunca se referindo ao Doc. 4, um email. (…) Pelo que, em tese, não poderia o mandatário da Autora formular, uma vez que não se tratava de um esclarecimento. (…) No entanto, em situação idêntica, demonstrando dois pesos e duas medidas, mas revelando uma predisposição em não permitir as perguntas do Mandatário do Réu (…): “Mandatário do Réu: 40:00 – 40:07 - Diga-me só uma coisa: era comum… Você disse que abria, era comum a senhora dona “I” faltar ou chegar atrasada? J: Senhor doutor eu não perguntei nada disso à testemunha, portanto a pergunta não é admitida.”; - “Ainda no âmbito da inquirição da testemunha “E”, numa preterição evidente dos princípios de urbanidade que todos os agentes da justiça deveriam preservar, é dito pelo julgador, publicamente, diante de todos os presentes: ““E”: 26:48 – 27:20 – Não sei doutora, não me recordo. A minha cabeça não está muito bem. Desde que a minha mãe partiu, há coisas que se apagaram da minha memória, e eu não me recordo. Aliás tive que deixar a creche, porque já não conseguia lá estar. Gostava muito de ajudá-la e não consigo. J: – Dona “E”, quanto ao “não me recordo”, eu vou-lhe ser muito honesta, não acredito que não se recorde. Mas eu nada posso fazer quanto a isso. “E”. – Eu compreendo doutora. J: – Oh dona “E”, é a minha convicção. A minha íntima convicção é que a senhora se recorda, não quer é falar. Mas eu não posso, uma testemunha diz que não se recorda, quanto a isso não posso contrariar. Agora, a minha convicção é que a senhora sabe bem e não quer falar. Portanto posto isto eu não tenho mais nenhuma pergunta. Senhor doutor, algum esclarecimento? (Bold nosso)” 98. a testemunha tem 67 anos e não merecia ter sido hostilizada enquanto prestava o seu depoimento que durou 41:08s! 99.um homem médio que assistisse a aludida sessão de julgamento, não poderia concluir outra coisa a não ser que a decisão já estaria tomada”; - A “MM.ª Juíza Titular demonstrou ter uma convicção formada e os actos praticados no âmbito da audiência de sessão e julgamento revelaram um pendor a favor da parte Autora”; e - Considera que devem ser declarados “nulos os actos praticados a partir da primeira sessão de julgamento sucedida no dia 09-10-2023, pelo que deverão ser repetidos, tendo em vista que resulta prejuízo para a justiça da decisão do processo”. Em 12-12-2023, a Sra. Juíza apresentou resposta, concluindo pela improcedência do incidente suscitado, pronunciando-se, em suma, no sentido de que: - Os requerimentos apresentados pelas partes foram sendo apreciados, nos termos documentados nos referidos autos; - Todos os despachos proferidos foram devidamente fundamentados à luz do direito aplicável; - Todas as diligências instrutórias oficiosamente determinadas se afiguram pertinentes para a descoberta da verdade material e boa decisão da causa, agindo a signatária no exercício dos poderes/deveres que sobre si recaem na condução do processo (cfr. artigos 6° e 411° do Código de Processo Civil); - Os factos que se visam apurar/esclarecer com as diligências constituem matéria de que é lícito conhecer; - Não tratou de forma diferenciada as partes, limitando-se a conduzir o processo e a audiência, no uso das suas competências, indeferindo o que não tinha cabimento legal/processual, o que era impertinente e/ou irrelevante e admitindo e/ou determinando o que, em consciência, considerou pertinente, necessário e/ou relevante (cfr. artigos 6°, 443° e 602° do Código de Processo Civil); - Parte das críticas que lhe são apontadas assentam na valoração que fez de um elemento de prova junto aos autos e da sua suficiência para a demonstração de uma realidade; - Sem embargo da valoração que, oportunamente, seja feita de um elemento de prova, a sua convicção terá que ser, oportunamente, formada no confronto com todos os meios de prova produzidos e na ponderação dos mesmos, devendo praticar os actos que se lhe afigurem necessários para que a decisão a proferir reflicta a verdade material e não, apenas, a verdade processual; - Prepara, com o que considera zelo e diligência, os processos e as audiências de julgamento, tomando notas no decurso da audiência dos depoimentos e declarações, de que se socorre não só no momento da elaboração da sentença mas também no decurso da produção da prova testemunhal, para além de ler os requerimentos apresentados e analisar os documentos juntos de uma forma conjugada; - Qualquer julgador, para o exercício dessa função, tem que ter uma memória preservada, ainda que, se necessário, apoiada em anotações, não se alcançando, sequer, o que pretende a Requerente insinuar quando se refere à “impressionante memória do julgador”; - Nota e destaca que não conhece qualquer das partes, nem a legal representante da Requerente, nem nenhuma das testemunhas arroladas ou cuja inquirição foi oficiosamente determinada, nunca se tendo relacionado pessoalmente e, tanto quanto se recorda, sequer, profissionalmente, com qualquer destas pessoas, não tendo qualquer relação de amizade ou inimizade com qualquer uma delas; - Não tem qualquer relação de amizade ou inimizade ou intimidade com os Ilustres Mandatários, com os quais manteve e mantém apenas contactos no exercício das suas funções, que sempre considerou decorreram com cordialidade e urbanidade; - Não tem qualquer interesse no resultado do processo, sendo o seu único objectivo que se cumpra a lei; - O alegado no requerimento de suspeição não é, sequer, enquadrável no regime legal do incidente de suspeição, antes constituindo uma forma da Requerente manifestar a sua discordância quanto às decisões da signatária na condução do processo e da audiência de julgamento e de insurgir contra o exercício de poderes/deveres do julgador; - Considerou e continua a considerar que todas as diligências ordenadas são pertinentes, todos os despachos proferidos estão fundamentos e que está a conduzir a audiência de discussão e julgamento dentro dos poderes que lhe assistem. * II. Nos termos do disposto no nº. 1 do artigo 120.º do CPC, as partes podem opôr suspeição ao juiz quando ocorrer motivo, sério e grave, adequado a gerar desconfiança sobre a sua imparcialidade, o que ocorrerá, nomeadamente, nas situações elencadas nas suas alíneas a) a g). Com efeito, o juiz natural, consagrado na CRP, só pode ser recusado quando se verifiquem circunstâncias assertivas, sérias e graves. E os motivos sérios e graves, tendentes a gerar desconfiança sobre a imparcialidade do julgador, resultarão da avaliação das circunstâncias invocadas. O TEDH – na interpretação do segmento inicial do §1 do art.º 6.º da CEDH, (“qualquer pessoa tem direito a que a sua causa seja examinada, equitativa e publicamente, num prazo razoável por um tribunal independente e imparcial, estabelecido pela lei”) - desde o acórdão Piersack v. Bélgica (8692/79), de 01-10-82 (https://hudoc.echr.coe.int/fre?i=001-57557) tem trilhado o caminho da determinação da imparcialidade pela sujeição a um “teste subjetivo”, incidindo sobre a convicção pessoal e o comportamento do concreto juiz, sobre a existência de preconceito (na expressão anglo-saxónica, “bias”) face a determinado caso, e a um “teste objetivo” que atenda à perceção ou dúvida externa legítima sobre a garantia de imparcialidade (cfr., também, os acórdãos Cubber v. Bélgica, de 26-10-84 (https://hudoc.echr.coe.int/ukr?i=001-57465), Borgers v. Bélgica, de 30-10-91, (https://hudoc.echr.coe.int/fre?i=001-57720) e Micallef v. Malte, de 15-10-2009 (https://hudoc.echr.coe.int/fre?i=001-95031) ). Assim, o TEDH tem vindo a entender que um juiz deve ser e parecer imparcial, devendo abster-se de intervir num assunto, quando existam dúvidas razoáveis da sua imparcialidade, ou porque tenha exteriorizado relativamente ao demandante, juízos antecipados desfavoráveis, ou no processo, tenha emitido algum juízo antecipado de culpabilidade. A dedução de um incidente de suspeição, pelo que sugere ou implica, deve ser resguardado para casos evidentes que o legislador espelhou no artigo 120.º do CPC, em reforço dos motivos de escusa do juiz, a que se refere o artigo 119.º do CPC. A imparcialidade do Tribunal constitui um requisito fundamental do processo justo. “A imparcialidade, como exigência específica de uma verdadeira decisão judicial, define-se, por via de regra, como ausência de qualquer prejuízo ou preconceito, em relação à matéria a decidir ou às pessoas afectadas pela decisão” (assim, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 13-02-2013, Pº 1475/11.8TAMTS.P1-A.S1, rel. SANTOS CABRAL). O direito a um julgamento justo, não se trata de uma prerrogativa concedida no interesse dos juízes, mas antes, uma garantia de respeito pelos direitos e liberdades fundamentais, de modo a que, qualquer pessoa tenha confiança no sistema de Justiça. Do ponto de vista dos intervenientes nos processos, é relevante saber da neutralidade dos juízes face ao objeto da causa. Com efeito, os motivos sérios e válidos atinentes à imparcialidade de um juiz terão de ser apreciados de um ponto de vista subjetivo e objetivo. Sintetizando, referiu-se no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 24-11-2022 (Pº 38/18.1TRLSB-A, rel. ORLANDO GONÇALVES) que “de um modo geral, pode dizer-se que a causa da suspeição há de reportar-se a um de dois fundamentos: uma especial relação do juiz com alguns dos sujeitos processuais, ou algum especial contacto com o processo”. Dispõe, por seu turno, o artigo 123.º do CPC que: “1- Recebido o processo, o presidente da Relação pode requisitar das partes ou do juiz recusado os esclarecimentos que julgue necessários; a requisição é feita por ofício dirigido ao juiz recusado, ou ao substituto quando os esclarecimentos devam ser fornecidos pelas partes. 2 - Se os documentos destinados a fazer prova dos fundamentos da suspeição ou da resposta não puderem ser logo oferecidos, o presidente admite-os posteriormente, quando julgue justificada a demora. 3 - Concluídas as diligências que se mostrem necessárias, o presidente decide sem recurso; quando julgar improcedente a suspeição, apreciará se o recusante procedeu de má-fé.”. * III. Colocados os parâmetros enunciados que importa observar, analisemos a situação concreta apreciando se o incidente de suspeição deverá proceder ou improceder. Desde logo, importa reconhecer que não se mostra necessária ou pertinente a audição das duas testemunhas arroladas no requerimento de 07-12-2023, pois, tratando-se de testemunhas já inquiridas (cuja gravação respetiva se encontra acessível e foi, aliás, transcrita em parte pela requerente do incidente) e dizendo respeito o incidente a circunstâncias já temporalmente delimitadas, nenhum interesse para a sua decisão traria a sua audição. * IV. Por outro lado, o incidente de suspeição – a apreciar por outra entidade que não o juiz a quem foi distribuído o processo (ou seu substituto, em função do incidente de suspeição deduzido) não constitui o meio legal para conseguir a alteração de decisões proferidas (sendo o meio cabível a reclamação ou a interposição de recurso ou outro meio impugnatório) ou para conhecer de nulidades decorrentes de atos processuais já ocorridos. “I - No incidente de recusa de juiz não se aprecia a validade dos atos processuais em si mesma, nem a correção de determinados procedimentos adotados no processo pelo Juiz. II - A lei prevê mecanismos processuais para impugnar as decisões reputadas de “erradas” ou ilegais, não sendo estas, objetivamente, motivo suficiente para fundamentar o pedido de recusa. III - A não se entender assim, estaria aberto o caminho para, ao mínimo pretexto, como a prática de qualquer irregularidade ou nulidade processual, se contornar o princípio do juiz natural, constitucionalmente consagrado no artigo 32º, nº 9, da Constituição da República Portuguesa. IV - O que deve averiguar-se, no âmbito do pedido de recusa, é se existem ou não atitudes, no processo ou fora dele, significativas e relevantes, que permitam legitimamente desconfiar de uma intervenção objetivamente suspeita do Juiz” (assim, o Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 08-03-2018, Pº 13/18.6YREVR, rel. JOÃO AMARO). A peticionada declaração de nulidade de atos processuais não pode, pois, obter procedência, pelo que, consequentemente, se indefere. * V. Nesta linha, cumpre salientar a apreciação objetiva que irá ser feita, se prende tão só com a materialização ou não dos requisitos do incidente, e não, com qualquer apreciação de natureza jurisdicional ou substantiva referente ao mérito do processo a que se refere o incidente, a qual, não nos incumbe efetuar. No seu requerimento, a requerente referencia diversas situações processuais que, segunda a mesma, não revelam pertinência para o presente incidente, pelo que, as considerações tecidas em correspondência, nos pontos 12 a 57 do requerimento em apreço, não legitimam a procedência do incidente, sendo inócuas para a respetiva apreciação, pois, a própria requerente afasta algum efeito gerador de quebra da imparcialidade devida, em razão das mesmas. Quanto à demais alegação da requerente da suspeição, cumpre aferir se ocorre “motivo, sério e grave, adequado a gerar desconfiança” sobre a imparcialidade do julgador – cfr. artigo 120.º, n.º 1, do CPC. Segundo a requerente tal verifica-se em função da circunstância de a Sra. Juíza deferir requerimentos probatórios da autora e indeferir os correspondentes da ré, referenciando semelhantes condutas – que considera em benefício ou auxílio da autora e em seu (da ré) demérito – no decurso das inquirições que tiveram lugar. Ora, não constitui fundamento específico de suspeição o mero indeferimento de requerimento probatório (RL, 7-11-12, 5275/09) nem a inoportuna expressão pelo juiz sobre a credibilidade das testemunhas (RG 20-3-06, 458/06)” (assim, Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa; Código de Processo Civil Anotado, Vol. I, Almedina, 2018, p. 148). Conforme se lê neste último aresto, o fundamento para a recusa do juiz, “não pode basear-se em considerações de direito ou juízos de valor, como a afirmação de que a sra. juiz “manifestou inqualificável impaciência com as arguidas e testemunhas de defesa, em claro tratamento de desigualdade…”, que “a sra. juiz disse às arguidas e às testemunhas J, F, A e M que estavam a mentir” e que “a testemunha A (foi) ameaçada com processo crime por falsas declarações”, pois isso revela apenas um modo de exercício dos poderes de direção da audiência que não pode ser censurado pela Relação, no âmbito do pedido de recusa”. Lê-se no mesmo Acórdão que: “As simples expressões através das quais o juiz revele a credibilidade que dá a determinada declaração, ou a outro meio de prova, não bastam para deduzir a sua recusa e a violação de alguma das regras sobre a aquisição da prova pode ser impugnada por vários os meios (desde a arguição de irregularidades ou nulidades até à interposição de recurso), mas nenhum deles passa pela dedução do incidente da recusa do juiz. O processo de decisão do juiz não se inicia apenas depois de terminadas as alegações orais, pois, inevitavelmente, ele vai analisando e confrontando os diversos depoimentos e fazendo juízos sobre a credibilidade de cada um deles, mas o importante é que, até ao final das alegações, não feche o espírito à possibilidade de valorar todas as contribuições para a prova, quer confirmem ou infirmem os juízos que foi fazendo. As regras da boa prudência aconselham que o juiz não revele os seus juízos, mas (…), por vezes deve tomar decisões que, ao menos implicitamente, indicam a credibilidade que, até aí, lhe parece merecer determinado depoimento, sem que, em todo o caso, da circunstância da convicção já estar em processo de formação, possa ser tirada a conclusão de que já existia um «pré juízo»”. Ora, no caso em apreço, não resulta de qualquer das menções efetuadas pela Sra. Juíza no âmbito das decisões judiciais que proferiu, nem do modo conduziu os atos a que presidiu, nem igualmente, da forma como decorreram as inquirições probatórias efetuadas (cuja gravação foi integralmente ouvida) algum exorbitar que possa consubstanciar a verificação de motivo sério e grave que justifique o deferimento da suspeição requerida. A participação da Sra. Juíza nos atos processuais levados a efeito mostra-se circunscrita à respetiva finalidade apreciativa e decisória, ou seja, à observância do respetivo dever de administrar a Justiça (cfr. artigo 152.º, n.º 1, do CPC), não se patenteando nelas algum «pré-juízo» sobre a motivação decisória do mérito da causa ainda a apreciar. Com efeito, na economia de cada uma das decisões tomadas, nos vários atos processuais assinalados no requerimento, não é possível concluir, ao contrário do que o faz a requerente, que possa estar inquinado o processo de julgamento ainda a cargo do julgador, apenas sucedendo que, como tantas vezes ocorre, o juiz tem de, nas concretas circunstâncias de tramitação processual, de apreciar e decidir pretensões e incidentes interlocutórios, de dirigir as diligências a que preside (como sucedeu com as inquirições operadas pela Sra. Juíza nos dias 09-10-2023 e 27-11-2023, documentadas nas respetivas atas e gravações, consultadas e ouvidas, respetivamente, pelo signatário, com vista à decisão do presente incidente), mantendo a respetiva ordem (cfr., em geral, o disposto no artigo 150.º do CPC), exercendo os poderes de condução correspondentemente previstos na lei e, de acordo com os termos e fundamentação encontrada, aplicar o Direito, sem que isso possa revelar, em si mesmo, alguma quebra da imparcialidade devida pelo julgador, do respeito pela igualdade substantiva das partes (cfr. artigo 4.º do CPC), do dever de gestão processual, assegurando, nomeadamente o andamento célere da causa, promovendo oficiosamente as diligências necessárias ao normal prosseguimento da ação e recursando o que for impertinente ou meramente dilatório (cfr. artigo 6.º, n.º 1, do CPC) e mostrando-se ter observado, na condução e na intervenção formulada pelo julgador no processo, o princípio da cooperação processual, ínsito no artigo 7.º do CPC. Note-se, aliás, que estamos perante litígio de natureza laboral, onde o papel do princípio da descoberta da verdade pelo julgador – aliás, assinalado pela Sra. Juíza na fundamentação do despacho oralmente proferido na sessão de 09-10-2023 - encontra-se amplificado no artigo 72.º do Código do Processo do Trabalho, para além do que sucede, em geral, no âmbito do princípio do inquisitório, consagrado no artigo 411.º do CPC. Nesta medida, compreende-se no normal exercício das competências do julgador, a determinação de inquirição de “E”, não obstante ter sido prescindida, inicialmente, pela parte que a arrolou. Trata-se de jurisprudência constante, já de há muito (cfr., entre outros, o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 02-05-2013, Pº 16295/11.7YIPRT-A.P1, rel. JOSÉ MANUEL ARAÚJO BARROS; o Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 12-11-2020, Pº 3678/17.2T8VCT-B.G1, rel. MARGARIDA SOUSA). De todo o modo, caberia à requerente – se assim o entendesse – impugnar, pelos meios processuais adequados, as decisões processuais tomadas pela julgadora, do que não dão conta os autos. Podemos entender que a requerente do presente incidente (ré no processo em questão) se não reveja no conteúdo de posições e decisões tomadas pelo julgador, na decorrência do indeferimento de pretensões por si deduzidas, mas tal não revisão, descontentamento ou mesmo discordância, não implica parcialidade do julgador, não se encontrando a mesma patenteada por qualquer forma. Os recursos são os mecanismos legais para se poder reagir em tais situações e para se aquilatar da correta ou incorreta aplicação da lei. A Justiça é feita caso a caso, tendo em consideração a real e objetiva situação a dirimir. O Juiz não é parte nos processos, devendo exercer as suas funções com a maior objetividade e imparcialidade, sabendo-se que nem sempre se consegue passar esta imagem, mas, o que releva é que esta conceção esteja materializada no julgador e que o utente da justiça a final a compreenda. Com efeito, os juízes têm por função ser imparciais e objetivos, fundando as suas decisões na lei e na sua consciência. Como dispõe o artigo 4.º, n.º 1 do Estatuto dos Magistrados Judiciais, os juízes julgam apenas segundo a Constituição e a lei e não estão sujeitos a ordens ou instruções, salvo o dever de acatamento pelos tribunais inferiores das decisões proferidas, em via de recurso, pelos tribunais superiores. De acordo com o n.º 2 do artigo 4.º do Estatuto dos Magistrados Judiciais, a independência dos magistrados judiciais manifesta-se na função de julgar, na direção da marcha do processo e na gestão dos processos que lhes forem aleatoriamente atribuídos. Perante os elementos disponíveis e o contexto em que teve lugar a intervenção da Sra. Juíza – que não tem alguma relação com as partes e demais intervenientes no processo, senão, em virtude deste - , não se conclui que, objetiva e subjetivamente, se mostre posta em causa a imparcialidade do julgador, sendo que, não se evidencia que tenha havido tratamento desigualitário ou discriminatório de uma parte face a outra, apenas sucedendo que, no desenrolar da tramitação do processo, conforme explicita a Sra. Juíza, a mesma entendeu exercer os respetivos poderes – instrutórios, decisórios e inquisitórios – nos termos que concretizou, culminando na prolação de decisões sobre as pretensões respetivas das partes e sobre a gestão dos atos de inquirição a que presidiu (em 09-10-2023 e 27-11-2023), que resultaram no respetivo conteúdo fundamentador e no dispositivo decisório que exteriorizou. Nenhuma falta de urbanidade do julgador se infere relativamente à testemunha mencionada pela requerente – sendo certo que esta, mesmo a verificar-se, não legitimaria, por si só, a procedência do incidente de suspeição respeitando a quebra de imparcialidade com uma ou ambas as partes. Assim sendo, entendemos não se encontrarem reunidos os pressupostos que materializam o incidente, o que conduz à sua improcedência. Não se nos afigura a existência de litigância de má-fé do requerente, não se patenteando alguma das circunstâncias a que se reporta o n.º 2 do artigo 542.º do CPC. * VI. Face ao exposto, indefiro a suspeição deduzida relativamente à Sra. Juíza “B”. Não se vislumbra má fé na litigância da requerente. Custas a cargo da requerente. Notifique. Lisboa, 10-05-2024, Carlos Castelo Branco. (Vice-Presidente, com poderes delegados – cfr. Despacho 2577/2024, de 16-02-2024, pub. D.R., 2.ª Série, n.º 51/2024, de 12 de março). |