Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | ORLANDO NASCIMENTO | ||
Descritores: | RESPONSABILIDADES PARENTAIS GUARDA ALTERNADA GUARDA CONJUNTA ALIMENTOS | ||
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Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 07/04/2024 | ||
Votação: | MAIORIA COM * VOT VENC | ||
Texto Integral: | S | ||
Texto Parcial: | N | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | IMPROCEDENTE | ||
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Sumário: | (do relator): 1. Na ação de regulação do exercício das responsabilidades parentais, residindo o progenitor em Portugal e a progenitora na China, a distância entre os dois locais inviabiliza a fixação de residência alternada do menor, nascido em 27 de setembro de 2018, com cada um dos progenitores pela instabilidade, insegurança e ausência de centro de referência de vida do menor, contrários, pois, ao seu superior interesse. 2. Pretendendo o progenitor que a residência do menor seja fixada junto de si, em Portugal, deverá demonstrar que esse regime de exercido de responsabilidades parentais melhor corresponde ao interesse do menor, v. g., por constituir a reposição do ambiente sócio familiar em que o menor viveu nos seus primeiros anos de vida e o regresso ao estabelecimento de ensino que frequentou, com toda a inserção social que tal pode significar, não lhe bastando invocar o abuso de direito, previsto no art.º 334.º, do C. Civil, fundamentando o seu pedido na reação à ação da progenitora ao afastar-se com o menor para a China. 3. Nessas circunstâncias, sendo inquestionável o direito de qualquer dos progenitores a fixarem o seu centro de vida de acordo com a sua vontade ou condições objectivas para o efeito, mostra-se impossível recriar a situação ideal de regulação das responsabilidades parentais proposta pelo progenitor de “…ser reposta a normalidade do menor residir em Portugal … com o pai e com a mãe se esta assim o quiser, com a presença de ambos os progenitores…” . | ||
Decisão Texto Parcial: | ![]() | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam os Juízes que constituem o Tribunal da Relação de Lisboa. 1. RELATÓRIO. Nesta ação de regulação do exercício das responsabilidades parentais relativas ao menor LD, proposta pelo progenitor, BGLFD, contra a progenitora, YL, foi proferida sentença, regulando o exercício das responsabilidades parentais nos seguintes termos: “1. A criança ficará aos cuidados e a residir com a mãe, competindo a esta o exercício das responsabilidades parentais relativas aos actos da vida corrente do LD. 2. As responsabilidades parentais relativas às questões de particular importância para a vida da criança serão exercidas em comum por ambos os progenitores. 3. A criança estará com o progenitor sempre que este tiver disponibilidade, sem prejuízo dos períodos de descanso e das actividades lectivas da criança, acordando com a progenitora com 48 de antecedência. 4. A progenitora garantirá o contacto diário do LD com o progenitor, através dos meios disponíveis, designadamente, Skype, Messenger ou WhatsApp, ocorrendo tal contacto entre as 19H00 e as 20H00. 5. Nos períodos de férias escolares do Natal/Passagem de Ano e da Páscoa, o LD passará metade do respectivo período com cada um dos progenitores, mediante calendarização a acordar entre ambos. Em caso de falta de acordo entre os progenitores no que concerne à escolha dos períodos de férias, caberá à mãe a escolha nos anos ímpares e ao pai nos anos pares. 6. Nas férias escolares de Verão, a criança passará períodos de férias iguais, não inferiores a 15 dias, com cada um dos progenitores, a acordar entre ambos até 31 de Março de cada ano. Em caso de falta de acordo entre os progenitores no que concerne à escolha dos períodos de férias, caberá à mãe a escolha nos anos ímpares e ao pai nos anos pares. 7. Sempre que possível, pela presença do pai ou do LD no mesmo país em tal data, no dia do aniversário da criança, esta tomará uma das principais refeições com cada um dos progenitores, sem prejuízo das suas actividades lectivas e períodos de descanso. 8. As deslocações da criança para o estrangeiro dependem da autorização de ambos os progenitores. 9. O progenitor contribuirá com € 300,00 (trezentos euros) a título de alimentos, quantia que pagará entre até ao dia 8 de cada mês, mediante depósito ou transferência para conta bancária da progenitora. 10. Tal quantia será actualizada anualmente, com início em Janeiro de 2024, de acordo e na proporção do índice de inflação, incluindo a habitação, publicado pelo Instituto Nacional de Estatística”. Inconformado com essa decisão, o progenitor dela interpôs recurso, recebido como apelação, pedindo a sua revogação, formulando as seguintes conclusões: I. Salvo o devido respeito, entende-se que a apreciação feita no que respeita ao direito aplicável aos factos dados como provados na sentença ora recorrida não é a mais acertada no óptica da defesa do melhor interesse do menor, como de seguida evidenciaremos. II. Como acima se disse o presente recurso visa apenas matéria de direito, nomeadamente quanto à questão de com quem ficará a residir a criança (escolha da pessoa que melhore se posicione na defesa dos interesses desta e que justifique a sua guarda/fixação de residência), competindo a esse progenitor gerir os actos da vida corrente do filho e, consequentemente, fica colocado em causa a grande maioria do restante regime de responsabilidades parentais decidido pelo tribunal de primeira instância. III. Sobre a factualidade dada como provada importa referir antes de mais que o Recorrente nunca negou a importância da mãe (ora Recorrida) na vida do seu filho menor LD ... nem nunca teve comportamentos com o intuito de afastar o menor da mãe, contrariamente ao que esta fez relativamente ao ora Recorrente enquanto pai ao dificultar-lhe o mais que lhe era possível os convívios entre o menor e o pai circunstância que obrigou o Recorrente a iniciar o presente processo de Regulação de Responsabilidades Parentais. IV. Aliás, esse afastamento promovido pela Recorrida entre o menor e o Recorrente pai é reconhecido pelo Tribunal a quo quando refere: Dos autos e dos factos apurados resulta que tal conduta da progenitora revela uma indisponibilidade para promover relações habituais do LD com o progenitor, critério que a lei impõe ao julgador que seja ponderado na decisão sobre a residência da criança e nos direitos de visita a serem estabelecidos (cfr. artigo 1906.º, n.º 5 do Código Civil)” - (cfr. página 9 da sentença ora recorrida). V. Porém, o Tribunal quo na decisão ora em crise não retirou qualquer consequência desta postura da Recorrida, nem ponderou adequadamente o imperativo legal previsto no artigo 1906.º, n.º 5, do Código Civil (CC) no caso dos presentes autos ao decidir que o VI. A este propósito importa relevar que a Recorrida sempre manifestou um sentimento de possessividade e domínio quanto ao menor, arrogando-se de uma supremacia moral apenas reconhecida pela própria de que ela é sabe o que é melhor para o filho e que esse melhor para o filho passou desde a separação do casal por afastar o mais que pudesse o menor do pai, relembrando-se novamente aqui que todos os constrangimentos criados pela Recorrida desde 2020 a 2022 que obrigaram o Recorrente a propor a regulação das responsabilidades parentais que originaram os presentes autos. VII. O propósito da Recorrida afastar o menor do Recorrido foi e é um propósito duradouro, consolidado no tempo e reiterado em factos objectivos que não podem ser ignorados nem desvalorizados pelo julgador quanto ao progenitor que melhor promove os convívios entre ambos os progenitores e, consequentemente, salvaguarda a plenitude emocional e física para o melhor desenvolvimento e bem estar do menor, sendo que no caso dos autos e para culminar o comportamento da Recorrida em fugir ilegalmente para a China para o menor, privando este de estar com o seu pai e este sequer de saber do paradeiro do seu filho, a resposta à ponderação a fazer à luz do n.º 5 do artigo 1906.º do CC é óbvia e não pode deixar significar que o Recorrido é quem tem inequivocamente todas as condições para respeitar o referido normativo legal e, portanto, à luz desta norma a guarda deve ser atribuída ao Recorrente e não à Recorrida. VIII. Para o Tribunal a quo não ficou demonstrado que o Recorrido não tivesse interesse na vida do menor ou não quisesse participar na vida deste, demonstrou-se exactamente o contrário, conforme decorre da fundamentação vertida nas páginas 11 e 12 da sentença ora recorrida. IX. Por conseguinte, ficou demonstrado também para o Tribunal de primeira instância que o Recorrido tem todo o interesse e quer ter uma presença efectiva na vida do filho muito mais significativa do que meros contactos à distância com filho no outro lado do ou conveniência da Recorrida, situação ilegalmente criada e imposta pela Recorrida à relação entre pai e filho. X. Por outro lado e contrariamente ao que o tribunal a quo quer fazer transparecer, embora se admita que o menor tenha passado mais tempo com Recorrida e que tenha uma ligação afectiva mais estreita com a mãe do que com o pai e que aquela seja a figura parental de referência, não se pode olvidar nesta sede como a forma desleal e em absoluto desprezo pelo bem estar do menor que estas circunstâncias de facto foram fabricadas pela Recorrida, designadamente: i) os obstáculos que a Recorrida sempre colocou para que o Recorrente pudesse estar com o seu filho de tal monta que se viu a intentar o presente processo; ii) os obstáculos que a Recorrida sempre colocou ao Recorrente durante a vigência deste processo enquanto o menor esteve em Portugal, seja porque alegadamente o menor estava doente, seja porque o Recorrido não com o menor exactamente as mesmas actividades que a Recorrente unilateralmente queria impor, seja porque o Recorrido não concordava com as opções educativas que a Recorrente queria unilateralmente impor; iii) a fuga ilegal da Recorrida com o menor para a China em Setembro de 2022 que colocou o Recorrente na impossibilidade física de estar com o menor e participar nos assuntos correntes e nos assuntos de particular importância da vida menor, limitando unilateralmente a relação entre pai e filho com 4/5 anos de idade a meios electrónicos quando é conveniente ou apetece à Recorrida. XI. Assim sendo, conclui-se que foi a própria a Recorrida que ao arrepio do interesse do menor e das normas vigentes legais em Portugal e no contexto internacional no que à defesa dos direitos das crianças diz respeito que de forma batoteira e desleal fabricou a narrativa que serviu agora de suporte para que o Tribunal a quo fundamente a sua decisão nos moldes que passam a citar: Na situação vertente apurou-se que o LD desde o seu nascimento, ocorrido a 27.09.2018, viveu com ambos os progenitores até pelo menos Janeiro de 2020, e, após tal data, passou a residir com a progenitora até residir em semanas alternadas com o progenitor e com a progenitora, tendo existindo semanas, durante tal período, mas em datas não apuradas, que, por motivos de saúde do LD ou motivos profissionais do progenitor, sendo a semana que caberia estar com o pai, ficou a residir com a mãe (factos provados aos pontos 1, 2, 7 e 8). Resulta assim, dos factos apurados que, durante todo o período em que a criança esteve em Portugal e após a separação dos pais, foi a mãe quem, na maioria do tempo, prestou todos os cuidados à criança - isto sem prejuízo de, quando o LD esteve em situação e semanas alternadas e esteve a residir com o pai, o mesmo cumpriu igualmente na prestação desses cuidados. Mais se apurou que em Setembro de 2022, sem o conhecimento e/ou o consentimento do progenitor, a progenitora levou o LD consigo para a China (onde a mesma tem toda a sua família) e onde permanece com a criança, sendo que, desde tal data, que o progenitor não vê o LD, senão por meios electrónicos à distância. É, por conseguinte, manifesto que, enquanto viveu em Portugal, sempre que o pai não tinha disponibilidade por motivos profissionais e/ou de saúde da criança, era a mãe quem lhe prestava todos os cuidados necessários e era com que esta que a criança residia. No entanto, tal não legitima a conduta da progenitora de levar consigo para a China o LD – realce-se que, no decurso destes autos -, encontrando-se em vigor um regime provisório de regulação do exercício das responsabilidades parentais, de guarda semanal alternada entre ambos os progenitores e, após a realização de ATE, onde os progenitores teriam chegado a consenso. É um comportamento censurável e violador quer de uma decisão judicial, quer dos direitos do LD a crescer e a ser cuidado com e por ambos os progenitores – cfr. página 8 da sentença ora recorrida (…) Por outro lado, a decisão unilateral da progenitora, em violação de uma decisão judicial em vigor e em prejuízo do melhor interesse do LD, que o Tribunal entende não ser válida (nem poder ser validad), não pode deixar que o Tribunal não reflicta sobre a situação em que o LD foi colocado – encontrando-se há um ano e três meses na China, onde vive com a mãe e com a família materna, em situação concreta que ao Tribunal não foi possível conhecer, desde logo, pelas declarações vagas e imprecisas neste âmbito prestadas pela progenitora -, mas inserido numa civilização e numa sociedade com costumes, tradições, modos de pensar, estrutura organizativa e inserção social e inserção dos cidadãos no Estado, totalmente díspar da vivida em Portugal (e na Europa). Acresce que, o LD viajou para a China quando estava quase a perfazer 4 anos de idade, encontrando-se neste momento com 5 anos e três meses e, por isso, ali viveu um período da sua tenra vida, em que o último ano foi um ano de maior aquisição de conhecimentos e competências pessoais – pelo crescimento e aprendizagem decorrentes da idade – mais representativo na sua vida, do que os primeiros três anos, em que a descoberta do Mundo e das vivências ainda é muito precária e foi vivida em fase em que o Mundo e Portugal, enfrentaram uma situação de pandemia, com restrição de contactos e convívios e algum isolamento da sociedade – cfr. página 9 de sentença ora recorrida. XII. Ora, face ao que ficou explanado não pode colher a fundamentação do tribunal a quo agora citada, porquanto a mesma não valoriza e pondera devidamente as circunstâncias de facto desleais e batoteiras com que a Recorrente subverteu e eliminou o Recorrente da vida do filho ao criar uma gigante barreira física entre o pai (em Portugal) e o filho (na China). XIII. Neste âmbito cumpre assinalar que o Recorrente pai sempre foi uma pessoa presente na vida do menor (cfr. a título de exemplo os factos 4, 7, 8 e 9 dados como provados na sentença ora recorrida) e que o projecto de vida para o menor LD ... preconizados por ambos passou sempre por o menor viver e formar-se pelos padrões de vida europeus (cfr. facto dado como provado em 3 na sentença ora recorrida). XIV. Por conseguinte, não fora as circunstâncias de facto fabricadas maliciosamente pela Recorrida com o único objectivo de afastar o Recorrente da vida do filho em Portugal e depois com a estocada final da sua fuga ilegal e criminosa para a China com o menor e o pai tinha (e continua a ter) todas as condições emocionais, afectivas e materiais para proporcionar um crescimento e desenvolvimento saudável do menor em Portugal em condições de proximidade do pai e da mãe, fosse num regime de residência alternada, num regime de guarda fixada ao pai ou até num regime de guarda fixada ao mãe. XV. A Recorrida unilateralmente e ignorando o bem estar e o interesse maior da menor em ter uma mãe e um pai presente na sua vida decidiu unilateralmente nas condições já acima afloradas que o menor eliminou o pai da vida do menor e decidiu que o melhor para o menor é ter apenas mãe, contrariando ao mesmo tempo uma decisão judicial mas principalmente revelando profundo desprezo do que é melhor para o bem estar do seu filho em prol do seu interesse egoístico manifestado desde o nascimento do menor em ser a figura parental dominante e prevalente na vida do menor seja a que custo for. XVI. Com efeito, dúvidas não restam que se alguém cumpre as regras vigentes e coloca em primeiro lugar o interesse do menor LD ... ao invés de colocar em primeiro lugar o seu interesse pessoal e egoístico e concomitantemente sempre foi uma pessoa presente e interessada na vida do menor é o Recorrido pai e por isso mesmo é ele que é merecedor em função da superior defesa dos interesses do menor que a residência do menor seja fixada com o Recorrente pai em Portugal. XVII. A fixação da residência do menor junto do pai em Portugal não implica que o menor seja afastado da mãe, dado que o Recorrente não irá impedir qualquer contacto entre filho e mãe e está disponível para seja adoptado o regime de residência alternada semanal entre os progenitores em Portugal, sendo certo que a Recorrida sempre teve rendimentos em Portugal passíveis de poder residir em Portugal (cfr. a título de exemplo o facto 18 dado como provado na sentença ora recorrida. XVIII. Por outro lado, o tribunal a quo estriba-se também no tempo que já decorreu desde a saída ilícita do menor para a China da responsabilidade exclusiva da Recorrida mãe para de legitimar a fixação da residência com a Recorrida, nomeadamente quando refere e passamos novamente a citar: Acresce que, o LD viajou para a China quando estava quase a perfazer 4 anos de idade, encontrando-se neste momento com 5 anos e três meses e, por isso, ali viveu um período da sua tenra vida, em que o último ano foi um ano de maior aquisição de conhecimentos e competências pessoais – pelo crescimento e aprendizagem decorrentes da idade – mais representativo na sua vida, do que os primeiros três anos, em que a descoberta do Mundo e das vivências ainda é muito precária e foi vivida em fase em que o Mundo e Portugal, enfrentaram uma situação de pandemia, com restrição de contactos e convívios e algum isolamento da sociedade (cfr. página 9 da sentença ora recorrida – sublinhado e negrito nossos. (…) Ora, considerando toda a factualidade provada, afigura-se ao Tribunal que o progenitor que se apresenta como mais consistente no exercício da sua função parental, na situação actual em que se encontra o LD (a viver na China há 1 ano e 3 meses e com 5 anos e 3 meses de idade e sempre tendo vivido com a progenitora), é a progenitora (cfr. página 10 da sentença ora recorrida) – sublinhado e negrito nossos. XIX. Ora, no que respeita ao tempo decorrido que o menor se encontra na China, importa, em primeiro lugar, relembrar vivamente que a saída de Portugal para a China em Setembro de 2022 foi feita à revelia e sem consentimento necessário e prévio do ora Recorrente e por única e exclusiva iniciativa e responsabilidade da Recorrida, sendo certo que para contornar a necessária autorização do Recorrido para o menor viajar para China apenas se vislumbra que a Recorrente tenha eventualmente praticado crime de falsificação de documentos. XX. Assim, em primeiro lugar, é inequívoco que o menor LDe ... saiu de Portugal para a China de forma ilícita, porquanto não foi observada a necessária autorização do Recorrente e ao mesmo tempo em clara violação de uma decisão judicial de um tribunal português quanto ao regime provisório de responsabilidades parentais em vigor estabelecido pelo Tribunal a quo no dia 22/04/2021, aliás o que também é frisado e censurado pelo Tribunal recorrido quando refere: É, por conseguinte, manifesto que, enquanto viveu em Portugal, sempre que o pai não tinha disponibilidade por motivos profissionais e/ou de saúde da criança, era a mãe quem lhe prestava todos os cuidados necessários e era com que esta que a criança residia. No entanto, tal não legitima a conduta da progenitora de levar consigo para a China o LD – realce-se que, no decurso destes autos -, encontrando-se em vigor um regime provisório de regulação do exercício das responsabilidades parentais, de guarda semanal alternada entre ambos os progenitores e, após a realização de ATE, onde os progenitores teriam chegado a consenso. É um comportamento censurável e violador quer de uma decisão judicial, quer dos direitos do LD a crescer e a ser cuidado com e por ambos os progenitores – cfr. página 8 da sentença ora recorrida. XXI. Em segundo lugar e não menos importante, quanto ao ano e três meses que o menor está na China ilegalmente com a mãe, importa reter que esse tempo decorrido foi consumido enquanto o ora Recorrente confiou no Tribunal a quo para protagonizar a reposição da legalidade e fazer respeitar a sua própria decisão que a Recorrida flagrante e intencionalmente desrespeitou a partir de Setembro de 2022. XXII. A cronologia sintética do que aconteceu nos presentes autos e respectivo apenso A entre Setembro de 2022 e Janeiro de 2024, o tal período de um ano e três meses é a seguinte: i) em 20/10/2022 teve lugar uma conferência de pais nos presentes autos em que a Recorrida já não esteve presente e em que o seu mandatário referiu: Segundo foi informado, a mãe está fora do país, encontrando-se momentaneamente na China. Continua a pretender que o menor resida consigo e em breve quer regressar a Portugal –cfr. página 2 da referida acta. ii) através de despacho de 24/01/2023 e após a apresentação de alegações por ambas as partes, é agendada o início do julgamento para 18/04/2023; iii) Em 09/04/2023, perante a incumprimento claro do regime provisório de responsabilidades em vigor e a incumprida promessa da Recorrente regressar a Portugal e se ter constatado que o “momentaneamente na China” significava na realidade o permanentemente na China, o Recorrente intentou um incidente de incumprimento por violação cláusula 4 a 7 da regulação provisória estabelecida em 22/04/2021, o qual até hoje continua por decidir pelo tribunal a quo; iv) as sessões de julgamento dos presentes autos em primeira instância decorreu entre 18/04/2023 e 18/10/2023; v) a sentença ora recorrida foi notificada às partes em 03/01/2024. XXIII. Resulta da cronologia do processo judicial acima elencada que do período de um ano e três meses que decorreu desde a fuga ilegal e criminosa da Recorrida com o menor de Portugal para a China, foram consumidos 6 meses entre a conferência de pais de 20/10/2022 e a primeira sessão de julgamento em 18/04/2023; foram consumidos 6 meses entre o início e o fim das sessões de julgamento (18/04/2023 a 18/10/2023) e foram consumidos 2 meses e meio entre a data da última sessão de julgamento (18/10/2023) e a notificação da sentença ora recorrida (03/01/2024). XXIV. Destarte, o argumento do tempo do menor na China com a mãe foi precisamente o tempo que a morosidade da justiça portuguesa necessitou para proferir uma sentença de primeira instância após a fuga ilegal e criminosa da Recorrida com o menor para a China. XXV. Com efeito, nos presentes autos aconteceu o extraordinário feito da morosidade da exclusiva responsabilidade do Tribunal a quo servir de argumento para que o menor fique a residir com a Recorrida na China atento o tempo decorrido que o próprio tribunal a quo demorou a tramitar e a decidir o processo, circunstância que é bizarra, incompreensível e completamente inaceitável sob qualquer ponto de vista, nomeadamente de um cidadão de boa fé que respeitas as normas legais e processuais vigentes, que confia e acredita que o ordenamento jurídico português vai realizar justiça e repor a legalidade. XXVI. Significa isto que o Recorrido confiou na justiça portuguesa, a justiça portuguesa demora cerca de um ano e três meses para produzir uma decisão de primeira instância e o Tribunal a quo usa a sua própria morosidade para fundamentar que atento esse ano e três meses que demorou a decidir o superior interesse da criança é ficar com a Recorrida que violou aum decisão judicial portuguesa e fugiu ilegalmente para a China, primeiro era momentamente depois passou a permanentemente, não pode ser!!! XXVII. Ponderadas todas as circunstâncias concretas do presente caso qualquer que seja a solução que não seja a de ordenar a fixação de residência junto do pai em Portugal constitui um flagrante abuso de direito reconhecido à Recorrida porquanto o seu comportamento excedeu largamente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito, nos termos previstos no artigo 334.º do CC. XXVIII. Enfim, o Recorrido não pode ser prejudicado nem pela morosidade dos presentes autos nem tal morosidade pode servir de argumento para consolidar uma situação ilegal provocada intencionalmente e exclusivamente por responsabilidade da Recorrida em flagrante violação de uma decisão judicial, defraudando completamente o Recorrido da confiança depositou na justiça portuguesa perante a violação judicial de uma decisão sua e beneficiar a infractora Recorrida; ou seja, nos presentes autos o moral da história é que o crime compensa e quem respeita as decisões judiciais e confiou nos tribunais para repor a justiça saiu completamente defraudado na sua boa fé e na protecção da sua confiança jurídica que é como é consabido é um dos valores baluarte de qualquer estado de direito que se preze e minimamente saudável. XXIX. Pelos motivos já expostos e por brevidade de exposição o Recorrente não repetir, mas do qual se destacam: i) a presença na vida do menor e o interesse que o Recorrente desde sempre manifestou em estar e fazer parte efectiva na decisão e responsabilidade sobre os actos correntes e as decisões de particular importância da vida menor LD ...; ii) a atitude da Recorrida desde sempre pretendeu obstaculizar e dificultar todos e quaisquer contactos entre este e o menor e que culminou com a fuga ilegal e criminosa daquela para a China com o menor em Setembro de 2022 em absoluto desprezo pelo superior interesse do menor designadamente de ter um pai presente na sua vida; iii) o desprezo da Recorrente pela decisão judicial em vigor quanto ao regime provisório responsabilidades parentais em vigor desde 22/04/2021; iv) a deslealdade da Recorrida para com o Recorrente e justiça portuguesa, fabricando artificialmente situações de facto que conduziram a que a mãe fosse a figura de referência do menor em detrimento do pai; v) o Recorrido não pretender retirar os contactos ou dificultar os deteriorar qualquer laço afectivo entre o menor e a Recorida, podendo esta regressa a Portugal e manter os convívios regulares em fins de semana alternado ou em semanas alternadas. XXX. Destarte, dúvidas não restam que no caso dos presentes autos, o menor regressar a Portugal para voltar a ter uma mãe e um pai é a situação que melhor representa defesa cabal dos interesses do menor LD ... por forma a proporcionar-lhe um crescimento adequado e saudável, com vivência e formação na Europa, de acordo com o que foi projectado para a sua vida por ambos os progenitores e, por outro lado, que permite assegurar que não volta a acontecer um progenitor eliminar o outro da sua vida como acontece nos presentes autos. XXXI. Caso contrário, em virtude das circunstância ilegais, e até se dirá imorais, com que a Recorrida criou as circunstância de facto que afastam permanentemente o menor do pai e com a validação e beneplácito dos tribunais portugueses que validam e premeiam o desrespeito pelas suas decisões e ignoram o melhor para as crianças (ter pai e mãe), o Recorrido provavelmente nunca mais verá o menor ou só quando este tiver 18 anos e vontade própria de estar com o pai, depois de o menor já ter vivido uma infância e adolescência sem a referência do pai e o necessário vínculo afectivo entre eles para uma futura relação saudável entre pai e filho; ora este último cenário, certamente não é o que melhor salvaguarda os interesses da criança, pelo que deve a residência do menor ser fixada com o Recorrido em Portugal, sem prejuízo deste admitir que tal residência seja alternada com a Recorrente. XXXII. Aqui chegados, importa afirmar que toda a jurisprudência assinalada na sentença ora recorrida sobre as EXCEPÇÕES que justificam e legitimam o não regresso ao país do qual o menor foi ilicitamente subtraído, nomeadamente as excepções previstas no artigo 13.º Convenção sobre os Aspectos Civis do Rapto Internacional de Crianças (Convenção de Haia)2, não são aplicáveis nem comparáveis com o caso dos presentes autos, pelo que deve ser reposta a normalidade do menor residir em Portugal (lugar onde nasceu e viveu até Setembro de 2022) com o pai e com a mãe se esta assim o quiser, com a presença de ambos os progenitores, porquanto essa é a realidade que melhor defende o interesse e bem estar do menor LD ... e, paralelamente, não passa a imagem para a sociedade em geral que o crime e os desrespeito pelas decisões judiciais em Portugal compensa validando e suportando um autêntico abuso de direito nos termos previstos no artigo 334.º do CC XXXIII. Por conseguinte, nos presentes autos a residência deve ser fixada junto do Recorrido em Portugal, sendo certo que este não se opõe que seja fixada residência alternada semanal entre Recorrido e Recorrente. XXXIV. No mais, os regimes de convívios entre mãe e filho e a pensão de alimentos deve ser a fixada pelo Tribunal a quo mas em sentido em invertido, ou seja, tal regime é aplicável à Recorrente e não ao Recorrido; ou caso assim não se entenda e seja fixado o regime de residência alternada, o menor deve passar igual período de tempo com o Recorrente e a Recorrida, inclusive nas datas festivas e nas férias lectivas, bem como não haverá lugar ao pagamento da pensão de alimentos. XXXV. Para o caso de se manter a injusta situação actual, face aos factos dados como provados na sentença ora recorrida quanto aos rendimentos do Recorrente (cfr. factos 16 e 17), nomeadamente quanto aos rendimentos auferidos em 2021, deve a pensão de alimentos ser reduzida à quantia mensal 100 €. XXXVI. Consequentemente, deve ser revogada a sentença ora recorrida nos termos acima elencados porquanto a mesma viola os artigos 1906.º, n.º 1, 5, 6, 8 e 334.º, todos do CC, e ser substituída por outra decisão que fixe a residência do menor LD ... junto do Recorrente, que fixe o regime de convívios semanal e o regime de convívio em datas festivas e férias lectivas invertido entre o Recorrente e a Recorrida ao que foi definido pelo tribunal a quo, bem como fixe o pagamento da pensão de alimentos ao Recorrente; sendo que o Recorrente não se opõe a uma residência alternada em que o menor passe metade do tempo com cada um dos progenitores e assim seja removida o pagamento da pensão de alimentos a qualquer um dos progenitores; e por último; caso assim não se entenda, mantendo-se o regime fixado na sentença ora recorrida que o valor da pensão de alimentos a pagar pelo Recorrente seja reduzido para a quantia de 100 €. Termos em que e nos demais de direito deve ser dado provimento ao presente recurso e, por via dele, ser revogada a sentença ora recorrida porquanto viola flagantemente os artigos 1906.º, n.º 1, 5, 6 e 8, e 334.º do cc e, em consequência: i) ser substituída por acórdão que julge fixe a residência do menor LD ... junto do recorrente, que fixe o regime de convívios semanal e o regime de convivio em datas e festivas e férias lectivas invertido entre o recorrente e a recorrida ao que foi definido pelo tribunal a quo, bem como fixe o pagamento da pensão de alimentos ao recorrente nos mesmo termos; ii) sendo que o recorrente não se opõe a uma residência alternada em que o menor passe metade do tempo com cada um dos progenitores e assim seja removido o pagamento da pensão de alimentos a qualquer um dos progenitores; iii) caso assim não se entenda, mantendo-se o regime fixado na sentença ora recorrida deve o valor da pensão de alimentos a pagar pelo recorrente reduzido para a quantia de 100 €, fazendo-se, assim, a tão almejada e necessária justiça!!! * A progenitora apelada contra-alegou, pugnando pela confirmação da sentença recorrida e requerendo a ampliação (subordinada) do recurso nos termos do n.º 2, do art.º 635.º, do C. P. Civil, requerendo o aditamento da matéria de fato fixada pelo tribunal a quo e arguindo a nulidade da sentença, prevista na al. d), do n.º 1, o art.º 615.º, do C. P. Civil, por não ter conhecido de questões que devia conhecer, relativas às causas que justificam a deslocação do menor para fora de Portugal, concernente aos atos praticados pelo progenitor apelante contra a pessoa e bens da apelada e do filho de ambos. O Ministério Público apresentou contra-alegações, pronunciando-se pela manutenção da sentença recorrida. 2. FUNDAMENTAÇÃO. A) OS FACTOS. O Tribunal a quo julgou: A.1. Provados os seguintes factos: 1. Requerente e Requerido mantiveram uma relação amorosa e viveram juntos, como marido e mulher, pelo menos entre 2016 e Janeiro de 2020. 2. Dessa relação, nasceu, em Lisboa, a 27 de Setembro de 2018, LD .... 3. O projecto dos Requerente e Requerida, para o futuro do LD, era que este permanecesse a viver na Europa, e aqui efectuasse todo o seu percurso escolar. 4. Durante o período em que viveram juntos, após o nascimento de LD, a progenitora deslocou-se várias vezes à China, onde reside toda a sua família, por questões familiares, de saúde e de trabalho, ficando o LD em tais períodos, em Portugal com o progenitor por duas vezes, e numa terceira ocasião, tendo LD acompanhado a progenitora em viagem à China, o que foi acordado entre ambos. 5. Em sede de conferência de pais, ocorrida nestes autos na data de 22.04.2021, por falta de acordo entre os progenitores, foi fixado regime provisório de regulação do exercício das responsabilidades parentais, nos seguintes termos: “Considerando as declarações que os pais hoje aqui prestaram, a idade do LD, a capacidade que ambos os pais evidenciam ter para acompanhar e cuidar do filho, a ligação que o LD tem com ambos os pais e que, relativamente ao pai, cumpre reforçar, e por entender que é nesse sentido que aponta o superior interesse desta criança, ao abrigo do artº 28, nº 1 do R.P.G.T.C., decido fixar o seguinte regime provisório de regulação das responsabilidades parentais do menor LD ...: 1º- As responsabilidades parentais serão exercidas em comum por ambos os pais. 2º- Até final de junho de 2021, o LD fica a residir com a mãe e passa fins de semana alternados com o pai, compreendidos desde sexta-feira no final das atividades escolares, até segunda-feira ao início das atividades escolares, indo o pai buscá-lo à escola e ali o entregando; mais estará com o pai depois de cada fim de semana na quinta-feira seguinte, ficando o pai com o filho até sexta-feira de manhã. 3º- A partir de junho de 2021, o LD residirá em semanas alternadas com cada um dos pais, de sexta-feira a sexta-feira, pernoitando com o progenitor com quem não está nessa semana de 2ª feira para 4ª feira ou de 3ª feira para 4ª feira. 4º- Nos meses de maio e junho, o pai assegurará o pagamento da escola do filho e metade das despesas de saúde deste. 5º- A partir de julho, as despesas de saúde e escolares do LD serão suportadas em partes iguais por ambos os pais. 6º- Durante o mês de agosto, tudo estando a correr de forma favorável, os pais poderão acordar entre si um período de férias, que cada um dos pais passará com o filho.” 6. Na data de 29.09.2021 foi proferido despacho a remeter os pais para Audição Técnica Especializada. 7. Após a separação dos Requerente e Requerida, a criança LD viveu com a progenitora até Julho de 2021, estando com o progenitor, pelo menos, aos sábados. 8. Desde Julho de 2021 e até cerca de Maio de 2022 a criança LD passou a residir com o progenitor e com a progenitora, em semanas alternadas, tendo existido semanas, em datas e por períodos não apurados, em que, por doença da criança e/ou impedimento profissional do progenitor, na semana que caberia ao progenitor ficar com o LD, este se manteve a residir com a progenitora. 9. No relatório de informação sobre a Audição Técnica Especializada, datado de 20.04.2022, foi feito constar que os progenitores chegaram a acordo: “Responsabilidade Parental e Residência No seguimento das diligências supra referenciadas, foi possível apurar que os progenitores consensualizam quanto à partilha das Responsabilidades Parentais, bem como relativamente à fixação da residência do LD ... junto da progenitora. Convívios Relativamente aos convívios paterno-filiais, os progenitores consensualizaram que o LD ... realizará convívios com o pai e fins-de-semana alternados. Não obstante ser pretensão do progenitor cumprir com a calendarização de tais convívios, pelo mesmo foi solicitada alguma flexibilidade por parte da progenitora, na eventualidade de existir a necessidade de alterar algumas datas, devido a eventuais compromissos profissionais do mesmo. Pensão de Alimentos No que concerne à dimensão da pensão de alimentos, a progenitora referiu não pretender pedir ao pai do seu filho qualquer valor, requerendo apenas o pagamento de 50% das despesas de educação e saúde alusivas ao LD .... Relativamente a esta dimensão, o progenitor referiu que pretende efetivamente contribuir para o sustento do filho, contudo mencionou que iria conferenciar com o seu advogado sobre a referida questão, especificamente o montante em causa.” 10. Na decorrência do resultado da ATE foi agendada data para conferência de pais, que se realizou a 20.10.2022, e na qual esteve ausente a progenitora, por se encontrar na China com a criança, tendo o progenitor declarado pretender residência alternada relativamente à criança LD, porquanto a progenitora se ausentara para a China com o filho. 11. Em data não apurado do mês de Setembro de 2022, a progenitora levou o LD para a China, onde permanece com o mesmo, desde tal data, mantendo-se o progenitor a viver em Portugal. 12. Desde tal data que o progenitor não vê o LD, senão por meios electrónicos à distância. 13. A progenitora não informou o progenitor da sua intenção de viajar com a criança LD para a China, nem de aí ficar a residir com a criança, nem tratou de saber se o progenitor autorizava a criança LD a deslocar-se para a China em tal data. 14. Após ter perfeito os 3 anos de idade, e enquanto viveu em Portugal, a criança LD frequentou a escola PI. 15. Requerente e Requerida mantêm um conflito por desacordo sobre questões patrimoniais, relacionadas com empresas e bens móveis, imóveis e valores monetários, que adquiriram na constância da vivência em conjunto e que se encontram a dividir. 16. O Requerente aufere mensalmente cerca de € 3.000,00, onde se inclui o uso de carro e de casa. 17. O Requerente declarou em sede de IRS, como rendimentos do trabalho, no ano de 2020 a quantia de € 13.390,00; no ano de 2021 a quantia de € 24.500,00 e no ano de 2022 a quantia de € 14.050,00. 18. A Requerida declarou em sede de IRS, como rendimentos do trabalho, no ano de 2020 a quantia de € 9.825,20 e em tal ano como outros rendimentos a quantia de € 3.668,79; e no ano de 2021 a quantia de € 20.720,00, a título de rendimentos do trabalho. B) O DIREITO APLICÁVEL. O conhecimento deste Tribunal de 2.ª instância, quanto à matéria dos autos e quanto ao objecto do recurso, é delimitado pelas conclusões das alegações do recorrente como, aliás, dispõem os art.ºs 635.º, n.º 2 e 639.º 1 e 2 do C. P. Civil, sem prejuízo do disposto no art.º 608.º, n.º 2 do C. P. Civil (questões cujo conhecimento fique prejudicado pela solução dada a outras e questões de conhecimento oficioso). Atentas as conclusões da apelação, acima descritas, as questões submetidas ao conhecimento deste Tribunal pelo apelante consistem em saber se a) a fixação da residência do menor junto do pai em Portugal é a situação que melhor representa a defesa dos interesses do menor, devendo os regimes de convívios entre mãe e filho e a pensão de alimentos ser fixados em sentido invertido ao estabelecido pelo tribunal a quo ou, caso assim não se entenda, ser fixado um regime de residência alternada, devendo o menor passar igual período de tempo com o Recorrente e a Recorrida, inclusive nas datas festivas e nas férias lectivas e não havendo lugar ao pagamento de pensão de alimentos (conclusões I a XXXIV), b) a pensão de alimentos deve ser reduzida à quantia mensal 100 € (conclusão XXXV). Conhecendo. 1) Quanto à primeira questão, a saber, se a fixação da residência do menor junto do pai em Portugal é a situação que melhor representa a defesa dos interesses do menor, devendo os regimes de convívios entre mãe e filho e a pensão de alimentos ser fixados em sentido invertido ao estabelecido pelo tribunal a quo ou, caso assim não se entenda, ser fixado um regime de residência alternada, devendo o menor passar igual período de tempo com o Recorrente e a Recorrida, inclusive nas datas festivas e nas férias lectivas e não havendo lugar ao pagamento de pensão de alimentos. Como decorre da matéria de facto provada da sentença sob recurso, o menor tem residido prevalentemente com a progenitora apelada, primeiro em conjunto com o progenitor apelante, atenta a harmonia existente entre os progenitores (n.ºs 1, 2 e 4 da matéria de facto provada da sentença), seguidamente com a progenitora (n.º 7 da matéria de facto), após, em regime alternado entre os progenitores (n.ºs 5 e 8 da matéria de facto) e por último com a progenitora nas condições exaradas sob os n.ºs 10 a 13 da matéria de facto provada da sentença. Como também decorre das alegações e contra-alegações dos progenitores nenhum deles questiona as capacidades do outro para ter a guarda do menor e cuidar dos seus interesses. Assim sendo, a pretensão do apelante no sentido de que a residência do menor junto de si em Portugal melhor corresponde à defesa dos interesses do menor estrutura-se, essencialmente, na situação harmónica descrita sob os n.ºs 1 a 4 e 14 da matéria de facto provada da sentença, onde pontifica o local de nascimento do menor e de residência de ambos os progenitores e o projeto de vida por estes acordado para o menor. Ora esta situação, idealizada e posta em prática pelo apelante e pela apelada, deixou de existir, continuando o progenitor a residir em Portugal e tendo a progenitora passado a residir na China. A distância entre estes dois locais de residência dos progenitores inviabilizaria a residência alternada a que se reporta o n.º 10 da matéria de facto provada da sentença, pela instabilidade, insegurança e ausência de centro de referência de vida do menor, nascido em 27 de setembro de 2018, contrários, pois, a todos os títulos, ao seu superior interesse. Pretende agora o apelante que a residência do menor seja fixada junto de si, em Portugal, com a fixação de um regime de convívios com a progenitora. Não obstante, em vez de demonstrar que esse regime de exercido de responsabilidades parentais melhor corresponde ao interesse do menor, v. g., por constituir a reposição do ambiente sócio familiar em que o menor viveu nos seus primeiros anos de vida e o regresso ao estabelecimento de ensino que frequentou, com toda a inserção social que tal pode significar, o apelante situa o cerne do seu pedido na reação à ação da progenitora ao afastar-se com o menor para a China, que qualifica como possível abuso de direito, nos termos previstos no art.º 334.º, do C. Civil. Atento o enfoque/centralidade imprimido à sua pretensão pelo próprio apelante importa, antes de mais, referir que não está agora em causa a qualificação da ação da progenitora a que se reportam os n.ºs 10 a 14 da matéria de facto provada da sentença, com o seu eventual prémio ou sancionamento, mas a fixação de um regime de regulação das responsabilidades parentais em termos que, nas circunstâncias atuais, melhor corresponda ao interesse do menor. Sendo este, e não aquele, o cerne da questão que ora nos ocupa, para a decisão a proferir é irrelevante saber se a deslocação da progenitora para a China, levado consigo o menor, constitui violação do regime provisório fixado, como pretende o apelante e que poderia/deveria ter sido objecto do correspondente incidente, ou se essa deslocação constituiu uma defesa da progenitora em relação a atos do progenitor, como pretende a apelada com a interposição do recurso subordinado. Nestas circunstâncias, ficando afastada, in limine, a apreciação do abuso de direito invocado pelo apelante, prejudicada fica também a apreciação do recurso subordinado, por irrelevante, para a decisão a proferir sobre a questão em apreciação. Sendo inquestionável o direito de qualquer dos progenitores a fixarem o seu centro de vida de acordo com a sua vontade ou condições objectivas para o efeito, o certo é que o progenitor continua a viver em Portugal e a progenitora vive agora na China, com ela permanecendo o menor desde 2022 (n.º 11 da matéria de facto provada da sentença), mostrando-se impossível recriar a situação ideal proposta pelo apelante, de “…ser reposta a normalidade do menor residir em Portugal … com o pai e com a mãe se esta assim o quiser, com a presença de ambos os progenitores…” (conclusão XXXII). Em face desta realidade, a regulação das responsabilidades parentais estabelecida pela sentença melhor corresponde ao interesse do menor e à salvaguarda da relação de proximidade com os progenitores do que a pugnada pelo apelante, fixando-se residência junto de si próprio, com a deslocação do menor para Portugal, mostrando-se assim respeitado o regime legal aplicável, nomeadamente, o disposto nos n.ºs 1, 5, 6 e 8 do art.º 1906.º, do C. Civil, a que se reporta o apelante. Improcede, pois, esta primeira questão da apelação. 2) Quanto à segunda questão, a saber, se a pensão de alimentos deve ser reduzida à quantia mensal de € 100. A prestação de alimentos a cargo do apelante, como dos autos consta, insere-se no âmbito mais vasto da regulação de responsabilidades parentais relativas ao menor cujos progenitores não vivam em condições análogas às dos cônjuges, prevista nos art.ºs 1912.º, n.º 1, 1909.º, 1905.º e 1906.º, do C. Civil e no dever de assistência próprio da relação de paternidade e filiação, estabelecido pelos art.ºs 1874.º e 1878.º, do C. Civil. Esses alimentos compreendem “tudo o que é indispensável ao sustento, habitação e vestuário… a instrução e educação do alimentado”, como determina o art.º 2003.º, do C. Civil, e têm como medida a necessidade do alimentando e as possibilidades do obrigado a prestá-los, como dispõe o art.º 2004.º, do C. Civil. Discordando da prestação de alimentos no valor de € 300,00 mensais fixada pelo sentença, a prestar a favor do menor e a entregar à progenitora, invocando, essencialmente o rendimento mensal do apelante a que se reporta o facto sob o n.º 16 da matéria de fato provada, aduz o apelante que essa quantia deve ser reduzida para € 100,00 mensais sem que, todavia, fundamente essa pretensão, quer nas necessidades do menor, quer na sua possibilidade de prestação de alimentos, quer ainda na repartição entre os progenitores da medida das necessidades alimentares do menor. Ora, analisada a matéria de facto pertinente, nomeadamente os factos sob os n.ºs 16 a 18 da matéria de facto provada da sentença e considerando também o estatuto socioeconómico dos progenitores demonstrado nos autos não podemos deixar de concluir que a quantia arbitrada pelo tribunal a quo se mostra adequada a assegurar a função própria da prestação alimentar, acima referida, e que tal não acontece com a medida dessa prestação proposta pelo apelante. Nestas circunstâncias, de facto e de direito, não pode deixar de improceder esta segunda questão da apelação e com ela a própria apelação. * A progenitora apelada interpôs recurso subordinado, nos termos previstos no n.º 1, do art.º 633.º, do C. P. Civil, arguindo a nulidade da sentença por omissão decisória, como previsto na al. d), do n.º 1, do art.º 615.º, do C. P. Civil e impugnando a decisão em matéria de facto, requerendo o aditamento de novos factos e a prolação da decisão que pretende devia ter sido proferida pelo tribunal a quo, nos termos previstos nos n.ºs 1 e 2, do art.º 636.º, do C. P. Civil. Tendo a apelação soçobrado, como decorre da sua própria natureza jurídico processual, prejudicado fica o conhecimento do recurso subordinado. C) SUMÁRIO 1. Na ação de regulação do exercício das responsabilidades parentais, residindo o progenitor em Portugal e a progenitora na China, a distância entre os dois locais inviabiliza a fixação de residência alternada do menor, nascido em 27 de setembro de 2018, com cada um dos progenitores pela instabilidade, insegurança e ausência de centro de referência de vida do menor, contrários, pois, ao seu superior interesse. 2. Pretendendo o progenitor que a residência do menor seja fixada junto de si, em Portugal, deverá demonstrar que esse regime de exercido de responsabilidades parentais melhor corresponde ao interesse do menor, v. g., por constituir a reposição do ambiente sócio familiar em que o menor viveu nos seus primeiros anos de vida e o regresso ao estabelecimento de ensino que frequentou, com toda a inserção social que tal pode significar, não lhe bastando invocar o abuso de direito, previsto no art.º 334.º, do C. Civil, fundamentando o seu pedido na reação à ação da progenitora ao afastar-se com o menor para a China. 3. Nessas circunstâncias, sendo inquestionável o direito de qualquer dos progenitores a fixarem o seu centro de vida de acordo com a sua vontade ou condições objectivas para o efeito, mostra-se impossível recriar a situação ideal de regulação das responsabilidades parentais proposta pelo progenitor de “…ser reposta a normalidade do menor residir em Portugal … com o pai e com a mãe se esta assim o quiser, com a presença de ambos os progenitores…” . 3. DECISÃO. Pelo exposto, acordam os juízes deste Tribunal da Relação em julgar a apelação improcedente e declarar prejudicado o recurso subordinado, assim confirmando a sentença recorrida. Custas pelo apelante. Lisboa, 04-07-2024 Orlando Santos Nascimento Pedro Martins Arlindo José Colaço Crua * Fico vencido quanto aos alimentos: Visto que um dos progenitores está a viver na China com o filho, em violação do regime provisório fixado, nada se sabendo sobre as necessidades de alimentos por parte do filho na China, entendo que a proposta do outro de pagar apenas um mínimo de alimentos enquanto se mantiver esta situação se justifica, cabendo ao outro progenitor pedir, e provar os factos necessários para o efeito, perante o tribunal competente, agora na China, para o filho, um montante superior de alimentos a prestar pelo progenitor que continuou a residir em Portugal. (Arlindo José Colaço Crua) |