Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
12514/13.8T2SNT.L1-4
Relator: DURO MATEUS CARDOSO
Descritores: ACORDO DE ALTERAÇÃO
TRABALHO A TEMPO PARCIAL
TRABALHO TEMPO COMPLETO
REQUISITOS
FALTA DE INDICAÇÃO DO PERÍODO NORMAL DE TRABALHO DIÁRIO E SEMANAL
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 01/13/2016
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: N
Texto Parcial: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: ALTERADA A SENTENÇA
Sumário: I- Nos termos do art. 153º-1-b) do CT/2009, nos acordos de alteração de trabalho a tempo completo para trabalho a tempo parcial tem de haver indicação do período normal de trabalho diário e semanal, com referência comparativa a trabalho a tempo completo.
II- Este requisito visa obstar a inaceitáveis abusos por parte da entidade empregadora, colocando no seu livre arbítrio a atribuição, ou não, de um número mínimo de horas de trabalho diário ou semanal, procurando também impedir situações de não atribuição de qualquer trabalho por largos períodos de tempo ou a atribuição de meras “migalhas” retributivas.
III- Querer trabalhar em “Part-time” não é equivalente a “no-time” ou a “às vezes-time”.
IV- Não preenche este requisito legal a mera indicação de trabalho com “duração máxima de 132 horas mensais”.
V- A consequência da falta de indicação do período normal de trabalho é o estabelecimento de presunção, ilidível, de que o contrato é celebrado a tempo completo.
VI- Estando previsto no acordo de alteração um tempo máximo de trabalho mensal de 132 horas, não é de considerar o período de trabalho semanal de 40 horas previsto no art. 203º do CT/2009 mas, por força art. 153º-2 do CT/2009, antes que a trabalhadora passou a estar sujeita a cumprir um horário de trabalho de duração de 132 horas mensais.
(Sumário elaborado pelo Relator)
Decisão Texto Parcial: Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Lisboa.



I-RELATÓRIO:



I- AA, intentou no Juízo de Trabalho de Sintra da Comarca de Lisboa Oeste, a presente acção declarativa de condenação, com processo comum, CONTRA,

        BB, LDA.

II- PEDIU que:

-Seja reconhecida e declarada a ilicitude e consequente nulidade da Adenda ao Contrato de Trabalho celebrada entre a A e a Ré com as legais consequências e por via disso seja a Ré condenada a:
- A autora seja reintegrada no seu posto e local de trabalho, com a antiguidade e a categoria profissional e tempo laboral, que lhe pertencia à data da assinatura da Adenda ao Contrato de trabalho.
-A ré seja condenada no pagamento das remunerações mensais, remunerações de férias, subsídios de férias e de Natal vencidas desde a data do respetivo despedimento, no montante de €: 8987,00, bem como as vincendas até ao trânsito em julgado da decisão do tribunal ou efetiva reintegração profissional da A;
-A ré seja condenada no pagamento à A, a título de trabalho suplementar e descanso compensatório, não gozado nem pago e remanescentes devidos nos créditos vencidos pela não inclusão da média do trabalho suplementar, na remuneração de férias, subsídio de férias e de natal, nos anos de 2006 a 2007 no montante de € 1753,51, conforme requerido nos arts. 168º a 191º da p.i.;
-A ré seja condenada no pagamento à A, de diferenças salariais na sua remuneração, remuneração de férias, subsídio de férias e de Natal, vencidos e não pagos nos anos de 2009 a junho de 2012, no valor de €: 23.260,00;
-A ré seja condenada na concessão à A, das férias não gozadas, nem pagas, desde 2009 até ao presente, por exclusiva culpa da Ré;
-A ré seja condenada no pagamento à A, de uma indemnização pela violação do dever de ocupação efetiva, de pelo menos €22.500,00;
-A ré seja condenada n pagamento à A dos subsídios de refeições no valor diário de €: 5,69, por cada dia a que ficou obrigada à inatividade, bem como das folgas não gozadas e formação não facultada pela Ré, na vigência do contrato e em montante a calcular em execução de sentença;
-A ré seja condenada no pagamento à A, de uma indemnização a título de danos não patrimoniais sofridos em consequência da violação pela Ré dos seus direitos e regalias, sujeitando-a à assinatura da Adenda e a inatividade e a manter o vínculo de efetiva, mas sem trabalho, nem salário, e bem assim pela impossibilidade de aceder ao subsídio de desemprego após o seu abusivo despedimento, em virtude do crime de abuso de confiança à segurança social, praticada pela Ré, e referente à não entrega dos descontos efetuados sobre a remuneração da trabalhadora, desde janeiro de 2010 até à data do despedimento, no valor de pelo menos €:20.000,00;
-A ré seja condenada no pagamento da sanção pecuniária compulsória nos termos do disposto no artº.829º.-A do CC, em pelo menos €: 500,00 por cada dia de atraso no cumprimento da obrigação de reintegrar a A, em conformidade com a sentença que vier a ser proferida nos presentes autos;
-A ré seja condenada no pagamento de juros vincendos à taxa legal, até efetivo e integral pagamento;
-A ré seja condenada na regularização das contribuições pagas à segurança social, relativamente à A. desde novembro de 2009 até ao presente, com base na remuneração real que deveria ter sido paga com inclusão dos remanescentes supra discriminados e reclamados.

III- ALEGOU, em síntese, que:

-Foi admitida ao serviço da ré em 1.3.2006, através de contrato de trabalho sem termo, para exercer, por conta e sob a autoridade e direção desta, as funções de vigilante;
-Ultimamente, a autora auferia a retribuição base mensal de € 629,60, acrescida da quantia diária de € 5,28 de subsídio de almoço;
-A autora trabalhava 40 h semanais, em turnos rotativos;
-A ré aproveitou-se da incapacidade temporária da autora e da sua debilidade e limitações e pressionou-a a assinar uma adenda ao contrato de trabalho que diminuiu o seu horário de trabalho;
-Tal adenda, porque foi obtida mediante coação, é nula.

-Mais tarde, a autora quis revogar essa adenda e passar novamente a trabalhar a tempo inteiro;
-No entanto, a ré não lhe deu qualquer resposta;
-Além disso, a ré, sabendo que a autora não podia laborar ao domingo por ter filhos menores e não ter onde os deixar, atribuiu-lhe um horário nesse dia;
-A ré deu ordens verbais para que a autora ficasse em casa, violando assim o direito de ocupação efetiva da autora;
-A autora ficou sem rendimentos e sofreu com esta situação pelo que entende que, por esses danos, tem direito a receber uma indemnização de € 22 500.
-Entretanto, a ré enviou-lhe uma carta a comunicar que considerava o contrato de trabalho denunciado, por abandono de trabalho, visto a autora ter deixado de comparecer por mais de 10 dias;
-Todavia, tal não sucedeu pois a autora não trabalhava apenas porque a ré não lhe dava trabalho;
-Nunca foi intenção da autora pôr termo ao contrato de trabalho pelo que falta o elemento subjetivo da cessação do contrato por abandono do trabalho;
-A ré não fez contribuições para a segurança social quanto à autora a partir de 31.1.2010 o que impossibilitou esta de obter o subsídio de desemprego;
-Por tal facto e por todas as violações contratuais levadas a cabo pela ré, que sujeitou a autora à assinatura da adenda e a uma situação de inatividade, sem trabalho nem salário, entende a autora que tem direito a receber uma indemnização por danos morais;
-A atitude da ré ao invocar um abandono de trabalho inexistente configura uma situação de despedimento ilícito;
-Perante tal, entende a autora que tem direito a ser reintegrada e que lhe devem ser pagos os salários intercalares;
-Na vigência do contrato, a autora prestou trabalho suplementar que não lhe foi pago;
-Também não gozou o respetivo descanso compensatório;
-Além disso, o valor do trabalho suplementar prestado e não pago deve ser considerado no cômputo dos valores a pagar a título de subsídios de férias e de natal;
-Após a assinatura da adenda que levou a que a autora passasse a trabalhar em regime de tempo parcial, a autora viu o seu rendimento reduzido relativamente ao valor que recebia quando trabalhava a tempo inteiro, pelo que a ré deve pagar-lhe a diferença.

IV- A ré foi citada, realizou-se Audiência de Partes em que teve lugar infrutífera tentativa de conciliação, e aquela veio a CONTESTAR, dizendo, no essencial, que:

-Ocorreu a prescrição porque tendo o contrato terminado por abandono do trabalho, os efeitos da cessação produzem-se no dia 21.3.2012, data em que se completaram os 10 dias após a ocorrência do abandono;
-Por isso, o prazo de prescrição de 1 ano completou-se em 22.3.2013;
-Quando a ação foi proposta (em 19.5.2013), já o prazo de prescrição tinha decorrido;
-A adenda ao contrato de trabalho que levou à passagem da autora a regime de trabalho a tempo parcial resultou de uma pretensão manifestada pela autora que comunicou ao supervisor que tinha dificuldades em comparecer ao trabalho e preferia trabalhar menos horas e de preferência ao fim de semana, pois tal era-lhe mais conveniente do ponto de vista pessoal;
-A autora nunca disse à ré que essa pretensão era meramente temporária;
-A retribuição da autora passou a ser inferior porque a mesma passou a trabalhar menos tempo;
-A adenda foi livremente assinada pela autora não se verificando nenhum vício da vontade e não existindo qualquer invalidade da adenda;
-A ré pagou sempre à autora em função do trabalho que a mesma prestou pelo que entende não lhe dever qualquer diferença salarial;
-Não houve, por parte da ré, qualquer violação do dever de ocupação efetiva;
-A ré comunicou à autora em 28.1.2011, a escala e horário de trabalho no cliente Edifício (…);
-Este local de trabalho manteve-se inalterado até 7.3.2012, data em que a autora deixou de comparecer sem ter apresentado qualquer justificação;
-Assim, o abandono do trabalho verificou-se e esta forma de cessação do contrato é plenamente válida;
-Considera que nada deve à autora de trabalho suplementar e descanso compensatório;
-A ré não comunicou à segurança social em 31.10.2010 o fim do contrato de trabalho da autora, só o tendo feito em setembro de 2012.

A autora RESPONDEU, pugnando pela não verificação da prescrição porque o prazo de 1 ano se conta data da receção da carta a comunicar o abandono do trabalho, ou seja, de 19.6.2012, pelo que  o prazo ainda não tinha decorrido à data da instauração da ação.

V- Foi dispensada a realização de audiência preliminar e proferido despacho saneador em que se conheceu da incompetência em razão da matéria, absolvendo-se a ré da instância relativamente ao pedido referente à regularização das contribuições para a segurança social.

Relegou-se para final o conhecimento da excepção de prescrição.

Dispensou-se  a fixação de base instrutória.

O processo seguiu os seus termos e, a final, veio a ser proferida sentença que julgou pela forma seguinte:

DECISÃO:

Pelo exposto, julgo a ação parcialmente procedente por provada e, em consequência:

a) julgo improcedente a exceção de prescrição dos créditos da autora;
b) declaro ilícito o despedimento da autora;
c) condeno a ré a pagar à autora as retribuições mensais e subsídios de férias e de Natal devidos desde a data do despedimento, ocorrido em 19.6.2012, no valor mensal de € 238,71 até à data do trânsito em julgado da presente decisão, nos termos do art. 390º, do CT, deduzindo os valores a que alude o nºs 2 do referido artigo, a quantificar em sede de incidente de liquidação;
d) condeno a ré a reintegrar a autora, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade;
e) condeno a ré no pagamento da quantia diária de € 50, a título de sanção pecuniária compulsória, por cada dia de atraso no cumprimento da obrigação de reintegração da autora;
f) condeno a ré a pagar à autora juros de mora sobre as quantias atrás referidas contados à taxa anual de 4% desde o vencimento e até integral pagamento;
g) no mais, julgo a ação improcedente e absolvo a ré do restante contra si peticionado.

Inconformada com a sentença proferida, a autora interpôs recurso de Apelação (fols. 567 v. a 623), apresentando as seguintes desnecessariamente extensas, prolixas e repetitivas conclusões:
(…)

165-Nestes termos, a Recorrente apela a este Venerando Tribunal, no sentido de concluir dever ser a douta sentença recorrida revogada e alterada quanto à matéria objecto do recurso, na medida em que, o Tribunal a quo apreciou de forma manifestamente incorrecta a prova produzida nos autos e aplicou incorrectamente o Direito aos factos.
166- Igualmente e uma vez revogada a douta sentença, no que ao objecto do recurso se refere, deve ser declarando procedentes os pedidos respectivamente formulados nas alíneas d), e),f),g),h),i), k) da Petição Inicial, e bem assim deve ser alterada a decisão constante da alínea c) da douta sentença, no sentido da condenação da Ré a pagar à autora as retribuições mensais e subsídios de férias e de natal devidos desde a data do despedimento até à data do trânsito em julgado da decisão no valor mensal de €629,60.

A ré contra-alegou (fols. 625 a 677), pugnando pela improcedência do recurso.

Correram os Vistos legais tendo o Digno Procurador-Geral Adjunto do Ministério Público emitido Parecer (fols. 678 a 679), no sentido de ser negado provimento ao recurso.

VI-A matéria de facto considerada provada em 1ª instância, é a seguinte:

1-A autora foi admitida como trabalhadora da Ré, em 1 de março de 2006, mediante um contrato sem termo, conforme documento junto a fls. 63 e que aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais, para desempenhar funções correspondentes à categoria profissional de vigilante, sob autoridade, fiscalização e direção efetiva da Ré.
2-Ficou acordado que a autora auferiria a retribuição mensal de €595,13 acrescida do subsídio de refeições no valor de €5,28.
3-Remuneração mensal que foi sendo atualizada, designadamente, em janeiro de 2008 para € 612,45 e em janeiro de 2009 para € 629,60.
4-Na vigência do contrato de trabalho, a autora, de acordo com as necessidades da ré e em cumprimento das suas ordens, prestou-lhe trabalho suplementar.
5-A ré remunerou a autora pelo trabalho suplementar prestado nos dias feriados pagando-lhe o valor das horas trabalhadas nesse dia, ou seja, multiplicando o valor hora pelo número de horas trabalhadas.
6-A autora esteve de licença de maternidade e com incapacidade para o trabalho por doença nos períodos referidos na declaração junta a fls. 142, que aqui se dá por integralmente reproduzida para todos os efeitos legais, tendo auferido da segurança social os correspondentes subsídios.
7-A autora e a ré assinaram a adenda ao contrato de trabalho junta a fls. 65 e datada de 1.11.2009, nos termos da qual acordaram alterar a cláusula 6ª do contrato de trabalho à qual atribuíram a seguinte redação: “o segundo outorgante deverá cumprir um horário que poderá ser por turnos rotativos e de duração máxima de 132 horas mensais, assim como o primeiro outorgante pagará a retribuição horária de 3,63 €”.
8-No período de novembro de 2009 a março de 2012, a autora auferiu os valores constantes dos recibos juntos a fls. 117 a 141 que aqui se dão por integralmente reproduzidos, para todos os efeitos legais.
9-Após abril de 2012, a ré deixou de pagar o vencimento à autora.
10-A autora remeteu à ré a carta datada de 3.2.2012, que se encontra junta a fls. 147 e que aqui se dá por integralmente reproduzida para todos os efeitos legais, na qual, entre outras coisas, comunicou à ré a denúncia da adenda, com efeito retroativo à data da assinatura da mesma, comunicando ainda a sua disponibilidade imediata para retomar a plenitude do exercício de funções. Enviou ainda documento contendo o horário de funcionamento da instituição frequentada pelas suas filhas menores para efeitos de elaboração do tempo da sua prestação laboral de forma compatível com a necessidade de prestar assistência às filhas. Esta carta foi recepcionada na ré em 6.2.2012.
11-A autora remeteu à ré a carta datada de 7.3.2012, que se encontra junta a fls. 147 e que aqui se dá por integralmente reproduzida para todos os efeitos legais, na qual, entre outras coisas, comunicou à ré a ausência de resposta desta à carta por si enviada em 3.2.2012, referiu a sua manutenção em situação de inatividade e requereu que a ré a informasse no prazo de 10 dias se iria ou não atribuir-lhe tempo laboral completo. Comunicou ainda à ré que a partir da próxima semana deixaria de ter disponibilidade para prestar serviços aos sábados e domingos. Esta carta foi recepcionada na ré em 12.3.2012.
12-A autora enviou à ré os emails juntos a fls. 159 a 167, que aqui se dão por integralmente reproduzidos, para todos os efeitos legais, comunicando-lhe a sua disponibilidade para trabalhar.
13-A ré não deu resposta às cartas da autora de 3.2.2012 e 7.3.2012.
14-A autora, pelo menos a partir de 28 de janeiro de 2011, prestava trabalho aos domingos, das 8 h às 16 h, no Edifício (…).
Além disso, quando o supervisor tinha possibilidade de lhe arranjar outros trabalhos, em função das disponibilidades manifestadas pela autora, por um lado, e das necessidades dos clientes da ré, por outro lado, o supervisor entrava em contacto com ela para ver se podia ou não fazer esses trabalhos.
15-A autora entregou à ré a exposição datada de 27.2.2008 junta a fls. 179 e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzida, para todos os efeitos legais.
16-Com data de 18 de junho de 2012, a ré remeteu à autora a carta junta a fls. 180 e que aqui se dá por integralmente reproduzida, para todos os efeitos legais, na qual lhe comunicou que a autora desde o dia 11.3.2012 não comparecia ao trabalho, sem nada ter comunicado nem ter apresentado qualquer justificação para o efeito, pelo que, por corresponder a um período superior a 10 dia úteis seguidos, a ré presumia e considerava rescindido o contrato de trabalho da autora por abandono de trabalho, extinção essa que lhe comunicou por meio da referida carta.
17-A autora respondeu a esta carta através da carta datada de 28.6.2012 e junta a fls. 181, a qual se dá aqui por integralmente reproduzida para todos os efeitos legais, na qual referiu que a presunção com base na qual a ré extinguiu o contrato é abusiva e falsa e informou pretender impugnar o despedimento.
18-No mês de abril de 2006, a autora realizou 8,99 horas de trabalho em dia feriado que lhe foi pago à razão unitária de € 3,43.
19-No mês de junho de 2006, a autora realizou 15,99 horas de trabalho em dia feriado que lhe foi pago à razão unitária de € 3,43.
20-A ré, quando efetua o pagamento dos subsídios de férias e de natal, inclui no cálculo do valor a pagar, a média do valor pago a título de trabalho noturno mas não inclui a média do valor pago a título de trabalho suplementar.
21-No mês de dezembro de 2006, a autora realizou 16,99 horas de trabalho em dia feriado que lhe foi pago à razão unitária de € 3,43.
22-A autora não tinha outro rendimento que não fosse o proveniente do seu trabalho.
23-Por ter auferido os rendimentos que constam dos recibos no período de novembro de 2009 em diante, a autora passou a depender dos rendimentos do seu marido para fazer face às despesas mensais do agregado familiar, composto por ambos e três menores, e chegaram a ter que pedir dinheiro emprestado a amigos e familiares.
24-A ré procedeu mensalmente à retenção na fonte das contribuições devidas pela trabalhadora à segurança social.
25-A ré sabia que sobre si impende a obrigação de entregar à segurança social as quantias monetárias resultantes dos descontos efetuados na remuneração da autora.
26-Em 14.9.2012, a ré comunicou à segurança social a cessação do contrato de trabalho da autora.
27-A R dedica-se à atividade de segurança privada, designadamente à prestação de serviços de vigilância por conta e à ordem de terceiros.
28-Tal atividade é prosseguida no terreno com recursos a vigilantes com a categoria de Vigilantes profissional como é o caso da A, e que exercem as respetivas funções nos vários locais/clientes que em cada momento a R. tem, e na medida em que é preciso. Em resumo, a medida espacial e geográfica da afetação e ocupação dos trabalhadores Vigilantes depende, visceralmente, da existência de clientela e das respetivas necessidades.
29-Quer a atividade de prestação de serviços em causa, quer as funções de vigilância a desempenhar, caracterizam-se por alguma ambulatoriedade no espaço e no tempo, na medida em que variam em função dos clientes e respetivos locais/estabelecimentos, sendo que estes, por sua vez, variam em função de contratos comerciais de prestação de serviços precários (com prazo).
30-A alteração ao contrato de trabalho acordada em novembro de 2009 resultou de pretensão manifestada pela A ao respetivo Supervisor da R, e de acordo com a qual a mesma tinha dificuldades em comparecer ao trabalho (e estar sempre a justificar), e preferia trabalhar menos horas.
31-Na sequência desta pretensão, a autora elaborou e subscreveu a petição escrita de fls. 255 na qual solicita a sua passagem de full-time a part-time por motivos familiares a partir do dia 1 de novembro de 2009.
32-Petição esta que passou depois pelo Supervisor CC, prosseguiu para o Coordenador de Meios Humanos (DD) - e que integram a cadeia hierárquica da R, para efeito de visto e aprovação -, e chegou à Secção de Pessoal da R em 17.11.09, onde, confirmada aceitação e aprovação de tal alteração, foi a mesma convolada em Adenda ao contrato.
33-A ré comunicou à autora a respetiva escala e horário de trabalho no cliente Edifício (…), por carta datada de 28.1.2011 e rececionada em 31.1.2011.
34-Local de trabalho este que se manteve inalterado até março de 2012 inclusive.
35-A partir de 7-3-2012, a A deixou de comparecer ao trabalho. Com exceção das cartas referidas em 10 e 11 supra, a autora não comunicou qualquer justificação para ter deixado de comparecer ao trabalho, tal como não apresentou qualquer posterior justificação impossibilitante de assim ter procedido anteriormente.
36-As folgas da autora, no trabalho por turnos, não correspondiam obrigatoriamente com o Sábado ou o Domingo sendo que só correspondiam a um Domingo duas vezes em cada oito semanas.

37-Todas as remunerações por trabalho prestado eram liquidadas e processadas no respetivo recibo de vencimento, sob a designação de:
- “horas extra” (a 50% ou a 75%),
- “horas extra a 100%” (correspondente à retribuição do trabalho extra noturno);
- “horas feriado” (acréscimo relativo ao trabalho prestado em dias de feriado);
- e a remuneração por “trabalho noturno” (correspondente ao acréscimo de 25% respetivo), sendo pagas no mês seguinte e através de transferência bancária para a conta da A, surgindo no final do recibo de vencimento a identificação da conta bancária.

38-Relativamente aos dias feriados trabalhados, a ré não descontava esse valor na retribuição base e pagava as horas trabalhadas nesse dia de acordo com o respetivo valor unitário.

VII-Nos termos dos arts. 635º-4, 637º-2, 639º-1-2, 608º-2 e 663º-2, todos do CPC/2013, o âmbito do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação; os tribunais de recurso só podem apreciar as questões suscitadas pelas partes, salvo se importar conhecê-las oficiosamente.

Tratando-se de recurso a interpor para a Relação, como este pode ter por fundamento só razões de facto ou só razões de direito, ou simultaneamente razões de facto e de direito, assim as conclusões incidirão apenas sobre a matéria de facto ou de direito ou sobre ambas (v. Fernando Amâncio Ferreira, "Manual dos Recursos em Processo Civil", 3ª ed., pag. 148).

Atento o teor das conclusões das alegações apresentadas pelos apelantes, as questões que fundamentalmente se colocam nos presentes recursos são as seguintes:

A 1ª, se a matéria de facto dada como provada pode ser alterada nos termos pretendidos pela autora.
A 2ª, se o valor das retribuições intercalares a pagar à autora deve ser no montante mensal de € 629,60.
A 3ª, se a autora tem direito a uma indemnização por danos não patrimoniais.
A 4ª, se a autora tem direito a uma indemnização por a ré ter obstado à prestação efectiva de trabalho.
A 5ª, se a autora tem direito às quantias peticionadas a título de descanso compensatório remunerado, não pago nem gozado, devido a trabalho suplementar prestado em 2006 e 2007.
A 6ª, se a autora tem direito a que se inclua na remuneração de férias, subsídio de férias e subsídios de Natal dos anos de 2006 e 2007 os acréscimos resultantes da prestação regular e periódica referente a trabalho suplementar.

    VIII- Decidindo.

Quanto à 1ª questão:

Quanto à natureza temporária da adenda ao contrato de trabalho.
(…)

Consequentemente, nos termos do art. 662º-1 do CPC/2013, adita-se ao conjunto dos factos provados um novo facto com o nº 39 e o seguinte conteúdo:”A autora auferiu os valores constantes dos recibos cujas cópias estão juntas a fols. 67 a 89 e 95 a 116”.

Quanto à 2ª questão:

Insurge-se a apelante contra a condenação na sentença recorrida das retribuições intercalares apenas no montante mensal de € 238,71. Entende que o valor correcto mensal deveria ser € 629,60.
Isto porque considera que deveria ser tomado em linha de conta a remuneração mensal auferida a partir de Janeiro de 2009 e antes da celebração da Adenda ao contrato de trabalho.

Sustenta, para tal, que:

-A Adenda celebrada era meramente temporária e antes do despedimento a autora já denunciara a mesma;
-A ré aceitou tacitamente a retoma do trabalho a tempo inteiro antes do despedimento;
-Com o despedimento efectuado pela ré operou-se “a caducidade da denúncia e por via disso a repristinação do contrato de trabalho inicial no seu todo”;
-Uma vez que a Adenda não respeita o disposto no art. 153º do CT, a denúncia da autora faz perder a validade e eficácia daquela;
-Pelo menos deveria ter-se em consideração as 132 horas, à razão de € 3,63 por hora, estabelecidas como máximo na adenda celebrada.

Vejamos.

Na vigência do contrato de trabalho entre autora e ré foi celebrado um acordo apelidado de Adenda em que se alterou a Clª 6ª do contrato inicial (40 horas semanais e remuneração mensal de € 595,13) para um regime de “...horário que poderá ser por turnos rotativos e de duração máxima de 132 horas mensais...” e com “...retribuição horária de 3,63 €.”

Foi assim acordado, entre ambas as partes, a passagem da autora a um regime de trabalho a tempo parcial, o que é permitido pelo art. 155º-1 do CT.

Porém, contrariamente ao sustentado pela autora, não resulta do próprio acordo escrito de adenda que a alteração para tempo parcial fosse por período determinado, o que deveria constar do próprio acordo, face à exigência de forma escrita (art. 155º-1 do CT).

Foi deste modo, uma alteração a título definitivo.

Também a denúncia da adenda invocada pela autora não produz quaisquer efeitos pois não respeitou o prazo de 7 dias previsto no art. 155º-2 do CT, como resulta dos factos provados nºs 7 e 10. Em vez de 7 dias, a autora quis denunciar passados 2 anos e 3 meses...
Não colhe igualmente a perspectiva da apelante de que a ré aceitou tacitamente a retoma do trabalho a tempo inteiro pois a ausência de respostas às comunicações da autora não significam, nem expressa nem tacitamente, qualquer aceitação de regresso ao trabalho a tempo completo (v. factos provados nºs 10, 11, 12 e 13).
De facto, do silêncio da ré não se retira qualquer manifestação desta em aceitar a pretensão da autora - art. 217º-1 do CC.
E o silêncio da ré só valeria como declaração negocial se a lei, convenção ou uso lhe atribuíssem esse valor (art. 218º do CC), o que, manifestamente, não é o caso.

Por outro lado não se vê como é o despedimento da autora leva à caducidade da denúncia da Adenda e esta, por sua vez, leva à repristinação do contrato de trabalho inicial no seu todo.

Desconhecem-se totalmente tão singulares efeitos jurídicos, mas a apelante também não esclarece em que funda tais conclusões.

Como se sabe, não é efeito do despedimento ilícito, ou mesmo lícito, a caducidade de denúncia efectuada relativamente a uma alteração do contrato de trabalho.

E, se “caducou” a denúncia da Adenda, esta manter-se-ia necessariamente em vigor.

Se antes se queria referir à caducidade da Adenda (e não da denúncia), também o despedimento não causa tal efeito jurídico.

Atentemos agora relativamente à validade e eficácia da Adenda por desrespeito ao disposto no art. 153º do CT, se tal ocorreu por força da denúncia efectuada pela autora.

Como já se viu, a denúncia efectuada pela autora foi extemporânea e, por isso, ineficaz. Não tendo a denúncia produzido efeitos nunca a validade e eficácia da Adenda poderia ser afectada por uma denúncia ineficaz.

Resta verificar se a Adenda acordada respeitou as exigências legais e, quanto a isso, está bem patente que não.

O art. 153º do CT identifica os vários requisitos necessários para que o contrato de trabalho possa ser exercido a tempo parcial, sendo tais requisitos necessariamente aplicáveis em situações, como as dos autos, em que se pretende que o trabalhador que está a tempo completo passe a trabalhar a tempo parcial.

Um desses requisitos (art. 153º-1-b) do CT) é a indicação do período normal de trabalho diário e semanal, com referência comparativa a trabalho a tempo completo.

Este requisito visa obstar a inaceitáveis abusos por parte da entidade empregadora, colocando no seu livre arbítrio a atribuição, ou não, de um número mínimo de horas de trabalho diário ou semanal.

Procura também impedir situações, como se verificaram neste caso dos autos (factos provados nºs 7, 8, 13 e 14), de não atribuição de qualquer trabalho por largos períodos de tempo ou a atribuição de meras “migalhas” retributivas.

Constata-se sem dificuldade que o acordo de Adenda celebrado (facto provado nº 7) não fixou o período normal de trabalho diário e semanal, mas tão só um período máximo mensal de 132 horas de trabalho.

Porém, a consequência daquela falta não é, como pretende a apelante, a perda de validade e eficácia da Adenda por efeito da denúncia da autora (que, aliás, como já se viu, não foi operante), mas antes a constante do art. 153º-2 do CT/2009, ou seja, “presume-se que o contrato é celebrado a tempo completo”.

Esclarece-se no Código do Trabalho Anotado, 2ª ed., Almedina, de Pedro Romano Martinez e Outros, a pag. 314, em anotação ao art. 184º do CT/2003, preceito semelhante ao actual art. 153º do CT/2009, que “A ausência de indicação do período normal de trabalho semanal desencadeia a presunção, também ilidível, de que o trabalho a tempo parcial contratado tem a duração máxima permitida por lei...ou pelo instrumento de regulamentação colectiva aplicável se este contiver disposição sobre a matéria.”

Será então que se tem de considerar o período de trabalho semanal de 40 horas, previsto no art. 203º do CT/2009 e no contrato de trabalho inicialmente celebrado (facto provado nº 1) ?
Atentando na matéria de facto provada não se encontra factualidade que ilida tal presunção excepto a que resulta do teor da própria Adenda ao estabelecer o tempo máximo de trabalho mensal de 132 horas.

Assim, por força art. 153º-2 do CT/2009, tem de se entender que a autora passou a estar sujeita a cumprir um horário de trabalho de duração de 132 horas mensais, com uma retribuição horária de € 3,63, no equivalente a € 479,16 mensais.

E é este valor mensal de € 479,16 que se tem de considerar na condenação das retribuições intercalares desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da decisão.

Quanto à 3ª questão:

Peticionou a autora uma indemnização por danos não patrimoniais no montante de € 20.000,00.
São pressupostos exigidos pelo art. 483º do CC, para que exista obrigação de indemnizar, a violação de um direito ou interesse alheio, a ilicitude, o vínculo de imputação do facto ao agente, dano e nexo de causalidade entre o facto e o dano- v. Prof. A. Varela, Obrigações, I Vol., pag. 445.
Com interesse, ficou provado (facto nº 23) que “Por ter auferido os rendimentos que constam dos recibos no período de novembro de 2009 em diante, a autora passou a depender dos rendimentos do seu marido para fazer face às despesas mensais do agregado familiar, composto por ambos e três menores, e chegaram a ter que pedir dinheiro emprestado a amigos e familiares”.
Nos termos do art. 496º-1 do CC deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito, como é o caso.
Como é sabido, os danos não patrimoniais, não consubstanciam uma verdadeira indemnização nem podem ser avaliados em medida certa. Há antes uma atribuição de certa soma pecuniária que se julga adequada a compensar e a apoucar dores e sofrimentos através do proporcionar de um certo números de alegrias e satisfação que os minorem ou façam esquecer. Ao contrário da indemnização propriamente dita, cujo fim é preencher um espaço verificado no património do lesado, a compensação dos danos não patrimoniais tem por fim acrescer um património intacto para que o lesado, com tal acréscimo, alcance lenitivo para as suas amarguras.
O nº 3 do art. 496º do CC, no respeitante ao montante da indemnização manda atender sempre a um critério de equidade, devendo fazer-se nas circunstâncias expressas no art. 494º do CC, ou seja, o grau de culpabilidade do agente, a situação económica do responsável e a do lesado e as circunstâncias concretas do caso.
Como ensina o Prof. A. Varela, Das Obrigações em Geral, 2ª ed., I Vol., pag. 486 e nota 3, e ainda pag. 438, o seu montante deve ser proporcionado à gravidade do dano, devendo ter-se em conta, na sua fixação ponderada, todas as regras da boa prudência, do bom senso prático, da justa medida das coisas, da criteriosa ponderação das realidades.
Tal reparação reveste uma natureza acentuadamente mista: por um lado, visa compensar de algum modo, mais do que indemnizar, os danos sofridos pelo lesado; por outro lado, não lhe é estranha a ideia de reprovar ou castigar, no plano civilístico, com os meios adequados do direito privado, a conduta do agente.
Importa realçar que a ré ao promover a celebração da Adenda sem a necessária estipulação de período normal de trabalho diário e semanal permitiu-se a que, de forma arbitrária e sem respeito pelo direito da autora a saber qual o horário mínimo diário e semanal de trabalho a que estava sujeita e com que podia contar, utilizasse a sua força de trabalho de forma aleatória.
Pretender trabalhar menos horas do que as 40 semanais inicialmente fixadas (facto provado nº 30) não significa querer trabalhar apenas quando apetece ao empregador que ela trabalhe ou as horas que, em cada momento, o empregador decide que ela vai trabalhar naquele dia, naquela semana ou naquele mês.
Part-time” não é equivalente a “no-time” ou a “às vezes-time”.
Assim, durante quase 3 anos, a ré ou não atribuiu qualquer trabalho à autora em alguns meses ou diminui noutros considerável e irregularmente, a quantidade de trabalho que, anteriormente, era executado por ela, muito abaixo do máximo de 132 horas fixado na adenda, levando a que a mesma, com três filhos menores, ficasse em situação de relevante penúria económica levada ao humilhante ponto de ter de pedir dinheiro emprestado a amigos e familiares.
Ora o montante indemnizatório a arbitrar tem de reflectir toda esta realidade envolvente, tendo em conta o sofrimento expectável por uma pessoa comum, colocada em semelhante situação, não se premiando particulares ou exageradas sensibilidades.
Face ao exposto e tendo em conta toda a matéria provada e o condicionalismo exposto, razoável e ajustado se nos afigura que seja a autora compensado com indemnização relativa aos danos não patrimoniais no montante de € 15.000,00.

Quanto à 4ª questão:

Já no âmbito da LCT se entendia, pese embora a lacuna legal, existir um direito à ocupação efectiva (v. Ac. do STJ de 13/7/2011, P. nº 105/08.TTSNT. L1. S1, disponível em www.dgsi.pt/jstj).
Mais explícito, o art. 122º-b) do CT/2003 estabelecia que ser proibido ao empregador “obstar, injustificadamente, à prestação efectiva do trabalho”.
Com o mesmo teor, o actual art. 129º-1-b) do CT/2009.
Efectivamente, enquanto o direito ao trabalho tem em vista, fundamentalmente, o direito à ocupação de um posto de trabalho, o direito à ocupação efectiva reporta-se a um momento posterior, na medida em que o que está em causa é a própria realização pessoal do trabalhador através do trabalho.
Ora sendo o trabalho um meio de realização pessoal e tendo em conta que deve ser respeitada a dignidade da pessoa do trabalhador, para a entidade empregadora surge um verdadeiro dever de ocupação efectiva que se traduz num dever de diligência de o conservar condignamente ocupado (v. Furtado Martins, Direito e Justiça, Revista da Faculdade de Direito da Universidade Católica Portuguesa, suplemento, pp. 182 e 183).
Por isso, o quando o empregador não recebe o trabalho que lhe é regularmente oferecido, sem para tal ter qualquer justificação, poder-se-á dizer que atenta contra o prosseguimento dos fins envolvidos na situação jurídica do trabalho, violando um dever acessório de conduta derivado do princípio geral da boa fé (Furtado Martins, Despedimento Ilícito, Reintegração na Empresa e Dever de Ocupação Efetiva, 1992, p. 191).
Como se escreveu naquele citado Ac do STJ de 13/7/2011, “não se trata dum direito absoluto do trabalhador, pois pode existir uma desocupação do trabalhador que seja justificada, cabendo naturalmente ao empregador o ónus da prova do circunstancialismo em que se fundamenta.
Cotejando os factos provados desde logo se retira que somente a partir de Fevereiro de 2012 (factos provados nºs 10 e 11) a autora reclamou junto da ré a retoma de trabalho a tempo completo.
Por outro lado, embora a autora prestasse trabalho aos Domingos desde 28/1/2011 (facto nº 14), manifestou-se indisponível para tal a partir do meio de Março de 2012 (facto nº 11), tendo a ré invocado abandono de trabalho por carta do dia 18/6/2012 (facto nº 16).        
Portanto, pelo menos até Fevereiro de 2012 não existe nenhuma situação em que a autora manifeste vontade de trabalhar a tempo completo, ou tal o exija da ré, o que inviabiliza qualquer entendimento de obstaculização à prestação de trabalho por parte da autora até essa data.
Por outro lado, a partir de Março de 2012 é a própria autora que obsta à prestação de trabalho aos Domingos. Mas é também neste quadro de recusa da autora em prestar trabalho aos Domingos que a ré continua sem dar trabalho a tempo completo (40 horas semanais) à autora o que, convenhamos, não estava obrigada, mas somente 132 horas mensais ou 33 semanais, como acima se viu.
Como já atrás se disse na questão anterior, o art. 496º-1 do CC manda atender aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito.
Ora face às recusas recíprocas durante apenas cerca de 3 meses e à inexistência de obstaculização por parte da ré entre Novembro de 2009 e Fevereiro de 2012, a gravidade da conduta da ré mostra-se reduzida pelo que se entende não se encontrarem reunidos os pressupostos necessários para a atribuição de compensação indemnizatória por obstaculização da ré à prestação de trabalho por parte da autora.
Improcede este pedido indemnizatório.

Quanto à 5ª questão:

Pretende a autora o pagamento de quantias a título de descanso compensatório remunerado, não pago nem gozado, devido a trabalho suplementar prestado em 2006 e 2007.
Com interesse para esta questão apenas se provou que na vigência do contrato de trabalho, a autora, de acordo com as necessidades da ré e em cumprimento das suas ordens, prestou-lhe trabalho suplementar e que a ré remunerou a autora pelo trabalho suplementar prestado nos dias feriados pagando-lhe o valor das horas trabalhadas nesse dia, ou seja, multiplicando o valor hora pelo número de horas trabalhadas (factos provados nºs 4 e 5).
Mas do facto provado nº 39 retira-se que a autora prestou trabalho suplementar nos meses de Abril a Agosto de 2006 e em Março, Abril, Novembro e Dezembro de 2007.
Atento o disposto no art. 202º-1-2 do CT/2003, o descanso compensatório remunerado corresponde a 25% das horas de trabalho suplementar realizado e vence-se quando se perfizer um número de horas igual ao período normal de trabalho diário, o que, na altura, para a autora, correspondia a 8 horas diárias.
Ou seja, só após cada 32 horas de trabalho suplementar se vence 1 dia de descanso complementar remunerado.
Assim, resulta do mesmo facto provado nº 39 que em Maio de 2006 venceu-se 1 de descanso compensatório; em Julho de 2006 venceu-se 1 de descanso compensatório; e em Agosto de 2006 venceu-se 1 de descanso compensatório.
E em Dezembro de 2007 venceu-se 1 de descanso compensatório.
Incumbia à autora, nos termos do art. 342º-1 do CC a prova de que prestara trabalho suplementar em quantidade que conferia direito a descanso complementar e essa prova foi feita.
Mas também incumbia à autora, nos mesmos termos do art. 342º-1 do CC, a prova de não gozara os apurados 3 dias de descanso compensatório, o que não logrou fazer.
No entanto, sendo esse descanso compensatório remunerado, o seu pagamento não se presume e constitui matéria de excepção com a alegação e prova a cargo da ré, por força do art. 342º-2 do CC, o que ré não fez.
A remuneração do descanso compensatório é com base na retribuição normal, sem acréscimos, pelo que sendo a retribuição mensal então no montante de € 595,13 (facto provado nº 2) deve a ré à autora, a esse título, a quantia de € 59,51 (595,13 : 30 x 3)

Quanto à 6ª questão:

Sustenta a autora a inclusão na remuneração de férias, subsídio de férias e subsídios de Natal dos anos de 2006 e 2007 os acréscimos resultantes da prestação regular e periódica referente a trabalho suplementar.
Provou-se a propósito que a ré, quando efectua o pagamento dos subsídios de férias e de natal, inclui no cálculo do valor a pagar, a média do valor pago a título de trabalho nocturno mas não inclui a média do valor pago a título de trabalho suplementar.
No sentido da inclusão na retribuição mensal do trabalhador da média das quantias auferidas por trabalho suplementar, podem ver-se, por exemplo, o Ac. do STJ de 24/4/02, P. nº 02S3606 disponível em www.dgsi.pt/jstj e o Ac. do STJ de 18/6/03, P. nº 02S3741, disponível em www.dgsi.pt/jstj.
E o facto de os valores de todas as prestações a considerar puderem variar de mês para mês não retira a "regularidade" do tipo de prestação. Podem trata-se de prestações pagas regularmente embora de montantes variáveis, a necessitarem de averiguação de médias.
Sobre a classificação do carácter regular e periódico das prestações, existe entendimento, como no Acórdão da Relação de Lisboa de 17 de Dezembro de 2007, que uma prestação só poderá considerar-se regular se for prestada com alguma frequência, que terá de ser pelo menos, de seis meses. Ali se escreveu que “Em nosso entender qualquer prestação que não tenha uma periodicidade certa e pré-determinada só poderá considerar-se regular se for prestada com alguma frequência, que terá de ser, pelo menos, de metade do ano. Menos do que isso não lhe permitirá deixar de ser uma prestação esporádica e, portanto, sem carácter retributivo.”

Diferente jurisprudência, também seguida em algumas Relações e ultimamente com unanimidade pelo Supremo Tribunal de Justiça, exige a prestação de, pelo menos, 11 meses por ano.
Acontece que se retira do facto provado nº 39 que a autora só prestou trabalho suplementar durante 5 meses no ano de 2006 (de Abril a Agosto) e durante 4 meses em 2007 (Março, Abril, Novembro e Dezembro).

Falta, pois, a periodicidade mínima exigível para que se pudesse atribuir o carácter retributivo àquelas prestações a título de trabalho suplementar. Ou seja, nem 6 meses quanto mais 11.
Improcede, deste modo, esta questão, mas procede parcialmente a apelação.

IX- Pelo exposto, acordam os Juízes desta Relação em julgar parcialmente procedente a apelação da autora e, em consequência, alterar a sentença recorrida cujo decisório passa a ser nos seguintes termos:

a) Julga-se improcedente a excepção de prescrição dos créditos da autora;
b) Declara-se ilícito o despedimento da autora;
c) Condena-se a ré a pagar à autora as retribuições mensais e subsídios de férias e de Natal devidos desde a data do despedimento, ocorrido em 19.6.2012, no valor mensal de € 479,16 até à data do trânsito em julgado da presente decisão, nos termos do art. 390º, do CT, deduzindo os valores a que alude o nºs 2 do referido artigo, a quantificar em sede de incidente de liquidação;
d) Condena-se a ré a reintegrar a autora, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade;
e) Condena-se a ré no pagamento da quantia diária de € 50, a título de sanção pecuniária compulsória, por cada dia de atraso no cumprimento da obrigação de reintegração da autora;
f) Condena-se a ré a pagar à autora a quantia de € 59,51 a título de remuneração de descanso compensatório.
g) Condena-se a ré a pagar à autora juros de mora sobre as quantias atrás referidas contados à taxa anual de 4% desde o vencimento e até integral pagamento;
h) Condena-se a ré a pagar à autora a quantia de € 15.000,00 a título de indemnização por danos não patrimoniais, acrescida de juros de mora à taxa anual de 4%, desde a data deste acórdão até integral pagamento;
i) Absolve-se a ré do restante peticionado.
Custas em 1ª instância conforme ali estabelecido.
Custas em 2ª instância a cargo da autora e ré na proporção de 1/2 por cada uma.


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Lisboa, 13 de Janeiro de 2016


Duro Mateus Cardoso
Albertina Pereira
Leopoldo Soares

Decisão Texto Integral: