Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
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| Relator: | CARLA CRISTINA FIGUEIRA MATOS | ||
| Descritores: | CONTRATO ARRENDAMENTO NORMA SUPLETIVA PRAZO CERTO OPOSIÇÃO À RENOVAÇÃO | ||
| Nº do Documento: | RL | ||
| Data do Acordão: | 05/16/2024 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Texto Parcial: | N | ||
| Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
| Decisão: | IMPROCEDENTE | ||
| Sumário: | I. Partindo dos termos da redação da norma (o art.º 1096 nº 1 do CC), entendemos que os mesmos apontam no sentido de que a norma é integralmente supletiva, pois logo no seu início consta a expressão “Salvo disposição em contrário”, da qual resulta que a estipulação correspondente ao corpo da norma é (toda ela) supletiva; por outro lado, a única ressalva prevista no preceito encontra-se na sua parte final, reportando-se ao que consta no número seguinte (que contém previsão diversa para determinado tipo de contratos), e não a qualquer segmento do corpo da norma. II. Entender que parte da norma é supletiva e parte é imperativa não tem suporte adequado na redação da norma, e não pode haver interpretação que não tenha um mínimo de correspondência verbal com o texto. III. Por outro lado, não faria sentido que a lei permitisse o mais (estipulação de que não há renovação automática do contrato) e não permitisse o menos (estipulação de renovação automática por período inferior a três anos). IV. Interpretação diversa contenderia com o reforço da segurança e estabilidade do arrendamento urbano que a Lei 13/2009 pretendeu fomentar, pois contribuiria para o aumento de contratos nos quais fosse expressamente afastada a possibilidade de renovação automática, único modo de obstar à renovação pelo período de três anos, o que nos parece que manifestamente não corresponderá ao pensamento legislativo. V. O que resulta da redação do art.º 1096 nº 1 do CC é que inexistindo no contrato qualquer cláusula em sentido contrário, o mesmo renovar-se-á por período igual ao estipulado para a sua duração inicial, e se este for inferior a três anos, a renovação será por três anos. VI. E é aqui que se atinge o objetivo da Lei 13/2019, pois nos casos em que o contrato não contenha qualquer clausula relativa à sua renovação, a nova redação do art.º 1096 nº 1 do CC assegura a renovação por período igual ao da duração inicial desde que igual ou superior a três anos, ou por três anos quanto a duração estipulada para o contrato for inferior. VII. A solução legal de renovação, por pelo menos três anos, dos contratos de arrendamento que vem prevista no art.º 1096 nº 1 do CC pressupõe a inexistência de cláusula contratual que disponha diversamente. | ||
| Decisão Texto Parcial: | |||
| Decisão Texto Integral: | Acordam neste Tribunal da Relação de Lisboa: I - RELATÓRIO: A, melhor identificado nos autos, intentou a presente ação de despejo, que segue a forma de ação declarativa comum, contra B e C, melhor identificados nos autos, peticionando que: “Seja decretada a cessação do contrato de arrendamento por oposição à renovação e o despejo da fracção arrendada, condenando-se os Réus à sua entrega livre e devoluta de pessoas e bens; ao pagamento de €2.985,05 e ainda no pagamento de uma indemnização mensal, no valor do dobro da renda, desde a data da citação e até à entrega do locado, livre e devoluto de pessoas e bens”. Como fundamento do peticionado, alega, em suma, ser proprietário da fracção autónoma correspondente ao … do prédio urbano sito na Rua ..., n.º ..., na ..., imóvel este que, por contrato outorgado em 01 de Abril de 2015, foi dado de arrendamento aos Réus. Sucede que, em Novembro de 2021, comunicou a estes que se opunha à renovação do contrato, pelo que o mesmo teria o seu término em 31 de Março de 2022. Sucede que os Réus, apesar de terem sido regularmente notificados de tal oposição, se recusam a proceder à entrega do imóvel. Devida e regularmente citados, os Réus apresentaram contestação. Nessa sede, confirmam o alegado pelo Autor na petição inicial, considerando, todavia, que a comunicação efetuada não é válida em virtude de o período contratual da renovação não findar em 31 de Março de 2022. Neste sentido, consideram ser de aplicar a Lei n.º 13/2019 que fixou, com efeitos retroativos, um limite mínimo de três anos para as renovações dos contratos de arrendamento com prazo certo. Como tal, consideram que o contrato de arrendamento teve a sua última renovação em 31 de Março de 2021. Uma vez que, nessa data, não foi manifestada qualquer oposição, o contrato renovou-se até ao próximo dia 31 de Março de 2024, razão pela qual consideram que devem ser absolvidos do pedido. Após determinação do Tribunal, o Autor veio apresentar resposta na qual, em suma, pugna pela improcedência dos argumentos dos Réus, considerando que o disposto no artigo 1096.º, n.º 1 do C.C tem natureza supletiva, pelo que podem as partes, no contrato de arrendamento, fixar períodos de renovação inferiores a três anos. Assim sendo, deve-se entender que o contrato de arrendamento se renovou por períodos sucessivos de um ano até à oposição à renovação ocorrida e que produziu efeitos a 31 de Março de 2022. Ainda que assim não se entenda, considera ainda que a norma prevista no artigo 1096.º, n.º 1 do C.C não poderia ser aplicável ao prazo de renovação em curso, mas apenas a uma renovação seguinte. De acordo com este entendimento, após o término da primeira renovação do contrato de arrendamento em 31 de Março de 2019, o mesmo renovar-se-ia por três anos, tendo, assim, o seu término em 31 de Março de 2022, pelo que nada obsta à oposição efectuada. O Tribunal notificou as partes para, querendo, se pronunciarem quanto à possibilidade de o Tribunal decidir através de despacho saneador-sentença. Notificadas, as partes indicaram nada ter a opor a tal decisão. Foi proferido despacho saneador sentença cujo dispositivo é o seguinte: “VI - DISPOSITIVO: Nestes termos, e com os fundamentos supra indicados, julga-se a presente acção declarativa comum, proposta por A contra B e C parcialmente procedente e, em consequência: a) Declara-se que o contrato de arrendamento cessou vigência no dia 31 de Março de 2022; b) Condenam-se os Réus a despejar de imediato a fracção autónoma designada pela letra “…”, correspondente ao … do prédio urbano sito na Rua ..., n.º ..., na ..., descrito na ...ª Conservatória do Registo Predial de ..., freguesia da ..., sob o n.º ..., e inscrito na matriz predial de ..., sob o n.º ..., e a entregá-la ao Autor livre e devoluta de pessoas e bens; c) Condenam-se os Réus ao pagar ao Autor, a quantia de €2.985,05 (dois mil, novecentos e oitenta e cinco euros e cinco cêntimos); d) Condenam-se os Réus a pagar ao Autor a quantia mensal de €1.194,10 (mil, cento e noventa e quatro euros e dez cêntimos), contada desde a data de citação e até à entrega do imóvel indicado em b) livre e devoluto de pessoas e bens – descontada dos eventuais pagamentos que os Réus tenham vindo a efectuar ao Autor. * Condenam-se os Réus nas custas do processo (cf. Artigos 527.º, n.ºs 1 e 2 do C.P.C). * Registe e notifique. “ * Inconformados, vieram os RR deduzir recurso de apelação de tal decisão, apresentando alegações com as seguintes conclusões: “IV – CONCLUSÕES 1. Recorrem os RR porque, com o maior respeito pelo M.mo. Juiz de Direito do Tribunal a quo, no essencial, discordam do sentido da interpretação e aplicação da norma constante do art.º 1096º, nº 1, do C.C., porque, em seu entendimento, quer atendendo à letra da lei – com a qual se impõe existir um mínimo de correspondência verbal na reconstituição do pensamento legislativo, ainda que imperfeitamente expresso –, quer ao presumível pensamento legislativo, face às circunstâncias em que a mesma foi elaborada e à finalidade com que foi produzida, deverá esta norma ser interpretada no sentido em que tanto o período inicial de duração do contrato como as renovações devem ter o limite mínimo de três anos, exceto se as partes estipularem que o contrato não é renovável. 2. Consideram que a liberdade conferida às partes por esta norma, tem de ser entendida de acordo com as regras impostas sobre interpretação da lei. 3. Discordam, ainda, da interpretação preconizada na douta sentença recorrida das norma do nº 2, do art.º 9º e 1080º, do C.C., também aplicáveis ao caso sub judice, conjugados com a norma do nº 1, do art.º 1096º, do C.C., em seu entendimento, violadas na douta sentença devido a erro de interpretação, devendo ser interpretadas e aplicadas no sentido de que a norma do nº 1, do art.º 1096º, do C.C. tem natureza imperativa no que respeita à duração dos períodos de duração das renovações, por força do disposto na primeira parte do art.º 1080º do C.C., e só tem natureza supletiva relativamente à opção entre contrato renovável e não renovável, em que as partes são livres para estipularem que o contrato não é renovável, conforme infra explicitado. 4. Consequentemente, as comunicações de oposição à renovação do contrato enviadas aos Réus (em 3 de novembro de 2021), quando já decorria a (segunda) renovação do contrato, declarando como termo da renovação um prazo muito inferior ao fixado pela lei entretanto em vigor, não são válidas nem eficazes, devendo o período de renovação do contra que se encontrava a decorrer – que se iniciou a 01.04.2021 – ser dilatado, de acordo com o limite de duração mínima estabelecido pela nova lei, cujo término ocorrerá a 31.03.2024. 5. A grande divergência no presente caso, prende-se com saber se a comunicação de oposição à renovação efetuada pelo Autor aos RR, ora Recorrentes, é ou não válida, cuja solução parte e depende da interpretação das normas em vigor aplicáveis. 6. Divergindo do entendimento dos RR, o tribunal a quo considera que a norma mais diretamente aplicável ao caso, que é a do nº 1, do art.º 1096.º do C.C., tem natureza supletiva, face à expressão inicial do seu texto, com o teor “Salvo estipulação em contrário”, e que, por isso, as partes podem determinar que as renovações contratuais tenham duração inferior a três anos – conforme foi estipulado no contrato em apreço –, motivo pelo qual, a comunicação de oposição à renovação efetuada pelo Autor aos RR é válida e, consequentemente, o contrato cessou em 31 de março de 2022. 7. A interpretação que o tribunal a quo faz das normas aplicáveis ao caso, e a consequente sentença, com a qual os RR não se conformam, é, pois, a razão de ser do presente recurso. 8. A Lei n.º 13/2019, de 12/02, deu uma nova redação à norma do nº 1, do art.º 1096º, do C.C. e o que se constata é que esta alteração acrescentou, unicamente, a expressão “…ou de três anos se esta for inferior…”. 9. Foi, portanto, este limite mínimo de duração das renovações que foi alterado, que o legislador pretendeu ampliar, acrescentando à norma, que tem por epígrafe “Renovação automática”, esta expressão. 10. E a intenção do legislador, subjacente produção da norma (a reconstituir em sede de interpretação), foi no sentido de corrigir situações de desequilíbrio e de conferir segurança e estabilidade aos arrendamentos, fixando períodos mínimos de duração, da inicial e das renovações, conforme refere no seu art.º 1º a Lei n.º 13/2019, de 12/02. 11. Foi com esse desiderato que o legislador fixou um limite mínimo de três anos à duração inicial dos contratos de arrendamento e às suas renovações, dando uma nova redação do nº 1, do art.º 1096.º, do Cód. Civil com a introdução da expressão “…ou de três anos se esta for inferior…”. 12. Caso pretendesse continuar a deixar à liberdade das partes a estipulação relativa à duração do período das renovações, não teria procedido à alteração acrescentando unicamente esta expressão “…ou de três anos se esta for inferior…”. 13. Pretendendo os contratantes uma curta duração do arrendamento existe a possibilidade de celebração de contratos não renováveis com o limite mínimo de duração de um ano (art.º 1095º, nº 2, do C.C.), estipulando que o contrato não é renovável. 14. Os contratantes são livres na opção entre um contrato renovável – cujos períodos de duração têm, imperativamente, no mínimo três anos, tanto o inicial como os das renovações subsequentes – e um contrato não renovável – cujo período de vigência terá, imperativamente, a duração mínima de um ano. 15. No que concerne a esta opção, entre contrato renovável ou não renovável, a aludida norma não é imperativa, é supletiva, dominando a autonomia privada, sendo, porém, imperativa nos contratos renováveis (quando as partes optaram por essa modalidade). 16. Para interpretar esta norma obedecendo às regras impostas sobre interpretação da Lei, designadamente o limite que a norma do nº 2 do art.º 9º C.C. consagra, convirá decompor o período que a integra para uma análise semântica do seu texto. 17. Neste período que constitui a norma do nº 1, do art.º 1096º, do C.C. a palavra “…renova-se…” está ligada, de forma incindível, com sequência de palavras seguinte que completam a oração “…por períodos sucessivos de igual duração ou de três anos se esta for inferior...”, formando toda a sequência com o sentido único de que, dito de outra forma, o contrato renovável se renova por períodos sucessivos com a duração mínima de três anos, ainda que as partes tenham estipulado períodos com inferior duração. 18. Este segmento da oração “…por períodos sucessivos de igual duração ou de três anos se esta for inferior ...” já parte – já pressupõe – da opção previa por um contrato renovável (com prazo certo para habitação permanente), no exercício da liberdade contratual permitida pela expressão inicial “Salvo estipulação em contrário” – é exclusivamente quanto a essa opção que vigora o princípio da autonomia privada. 18. Por conseguinte, divergindo do entendimento preconizado na douta sentença recorrida, entendem os RR que a norma do nº 1, do art.º 1096º, do C.C. tem natureza imperativa no que respeita à duração dos períodos de duração das renovações, por força do disposto na primeira parte do art.º 1080º do C.C., e só tem natureza supletiva relativamente à opção entre contrato renovável e não renovável, em que as partes são livres para estipularem que o contrato não é renovável. 19. No entendimento dos RR, nem na hipótese de admissibilidade de um elevadíssimo grau de imperfeição de expressão do pensamento do legislador permitiria uma interpretação da norma do nº 1, do art.º 1096º, do C.C. com o sentido da douta sentença recorrida, na qual com o devido respeito pelo M.mo. Juiz do tribunal a quo e salvo melhor opinião, é violada a norma do nº 1, do art.º 1096º e, consequentemente, as normas do nº 2, do art.º 9º e 1080º, do C.C., por erro de interpretação. 20. O termo “renova-se” é incindível da sequência de palavras seguintes “por períodos sucessivos de igual duração ou de três anos se esta for inferior…” 21. O pronome demonstrativo “esta”, que antecede as palavras “for inferior”, face à estrutura da oração, refere-se necessariamente à “duração” – à duração das renovações estipulada pelos outorgantes no contrato, como sucedeu no caso vertente. 22. Ao mencionar “…por períodos sucessivos de igual duração ou de três anos se esta for inferior…” já a opção entre contrato renovável e não renovável foi tomada (e somente quanto a esta escolha a norma é supletiva) e, portanto, este segmento da norma já se reporta exclusivamente aos contratos renováveis – com períodos de duração mínima das renovações de três anos –, como decorre da sequência lógica do texto, de acordo com uma análise semântica (mas atendendo também ao elemento teleológico), ou seja, depois da prévia opção (essa livre) por um contrato renovável. 23. Com o devido respeito e salvo melhor opinião, a interpretação que o tribunal a quo, faz desta norma configura uma deturpação do seu sentido e uma injustificável incoerência a duplicidade de critérios de tal interpretação, considerando que do texto resulta que é imposta aos contratantes a duração inicial mínima do contrato de três anos, mas já não as renovações. 24. Perante o entendimento preconizado na douta sentença recorrida na interpretação desta norma, do nº 1, do art.º 1096º, do C.C., colocam-se as seguintes questões: - Qual é, então, o período mínimo de duração das renovações que a lei permite aos contratantes estipularem? - Além desta norma (nº 1, do art.º 1096º, do C.C.), qual a norma que estabelece o limite de duração do período das renovações? 25. Excetuando as normas dos artigos 1096º, 1097º e 1098º, do C.C., de cujas epígrafes consta o termo “renovações”, os recorrentes desconhecem quaisquer outras cujo teor se refira às renovações dos contratos de arrendamento, ou em que o termo conste das suas epígrafes. 26. No entendimento dos RR, a expressão “Salvo estipulação em contrário” que consta do nº 1, do art.º 1096º, do C.C. só pode referir-se à permissão/liberdade dada pela norma às partes contratantes de optarem entre um contrato renovável e não renovável, sendo, portanto, imperativa relativamente aos contratos renováveis e supletiva quanto a opção de o contrato ser ou não renovável. 27. Consequentemente, convencionando-se que o contrato com prazo certo é renovável, tanto a duração do período inicial como as subsequentes renovações têm, obrigatoriamente, a duração mínima de três anos; optando-se (estipulando) por um contrato com prazo certo não renovável o período mínimo de duração pode ser de um ano, conforme dispõe o nº 2, do art.º 1095º do C.C. 28. Em face do exposto, reiterando o alegado na exceção deduzida em sede de contestação, entendem os RR. que, em virtude de ter entrado em vigor a norma do nº 1, do art.º 1096º, do C.C. com a nova redação a dada pela Lei nº 13/2019, de 12/02, enquanto decorria o período da (primeira) renovação do contrato, fixando – imperativamente e com efeitos retroativos – um limite mínimo de três anos à duração dos contratos de arrendamento para habitação permanente com prazo certo e às suas renovações, as comunicações de oposição à renovação do contrato enviadas aos Réus (em 3 de novembro de 2021), quando já decorria a (segunda) renovação do contrato, declarando como termo da renovação um prazo muito inferior ao fixado pela lei entretanto em vigor, não são válidas nem eficazes, devendo o período de renovação do contrato, que se encontrava a decorrer – que se iniciou a 01.04.2021 –, ser dilatado para três anos, cujo término ocorrerá a 31.03.2024, requerendo, assim, a V. Exas. que assim seja declarado e julgado por este venerando Tribunal no acórdão a proferir. 29. Com exceção da interpretação destas normas, nº 1 do art.º 1096º, nº 2 do art.º 9º e 1080º do C.C., decisivas para o sentido da sentença, relativamente às quais os RR divergem do tribunal a quo, quanto à interpretação das restantes normas aplicáveis, ao invés, estes partilham da mesma opinião. 30. Com o devido respeito, entendem, assim, os Recorrentes que, julgando como julgou, a douta sentença recorrida violou as normas constantes do nº 1 do art.º 1096º, nº 2 do art.º 9º e 1080º do C.C., devido a erro de interpretação, porque deveriam ter sido interpretadas no sentido supra exposto, devendo por isso ser revogada, nos termos ora requeridos e apelados. Nestes termos e nos melhores de Direito que V. Exas. doutamente suprirão, deve ser dado provimento ao presente recurso e, consequentemente, julgada improcedente a sentença recorrida, sendo revogada e substituída por douto acórdão que julgue as comunicações de oposição à renovação do contrato enviadas aos Réus, ora Recorrentes, inválidas e ineficazes, devendo o período de renovação do contra que se encontrava a decorrer – que se iniciou a 01.04.2021 – ser dilatado, de acordo com o limite de duração mínima estabelecido pela nova lei, cujo término ocorrerá a 31.03.2024. Assim se fazendo Justiça” O A apresentou contra-alegações de recurso, nas quais concluiu nos seguintes termos: “EM CONCLUSÃO: UM: O recurso é inadmissível, por violação do disposto no artigo 639º, nº 1, do CPC, pelo que, nos termos do art.º 641º, nº 2, b), do Código de Processo Civil, deverá ser rejeitado. DOIS: Em qualquer caso, o recurso não merece provimento, uma vez que foi válida e eficaz a oposição à renovação, atenta a admissibilidade de estipulação em contrário ao prazo de renovação, admitida pelo art.º 1096º, nº1, do Código Civil. TRÊS: Ainda que a disposição do art.º 1096º, nº 1, do Código Civil fosse imperativa, continuaria a oposição à renovação a ser válida e eficaz, uma vez que apenas a 1 de Abril de 2019 se verificou nova renovação do arrendamento à sombra da lei nova, pelo que essa renovação terminaria sempre a 31 de Março de 2022. QUATRO: Ao julgar a acção de despejo procedente e provada, a douta decisão recorrida fez integral e correcta aplicação da lei, pelo que deve ser totalmente confirmada. NESTES TERMOS, CONFIRMANDO A DOUTA DECISÃO RECORRIDA, VOSSAS EXCELÊNCIAS FARÃO JUSTIÇA!” * O recurso foi admitido como apelação, com subida nos próprios autos e efeito suspensivo. * Em 26.03.2023, já neste Tribunal da Relação, foi proferido o seguinte despacho: “I. Nas suas alegações de recurso o recorrido pugna pela inadmissibilidade do recurso por violação do disposto no artigo 639º, nº 1, do CPC, concluindo que, nos termos do art.º 641º, nº 2, b), do Código de Processo Civil, o recurso deverá ser rejeitado. Dispõe o art.º 639 nº 1 do CPC que “O recorrente deve apresentar a sua alegação, na qual conclui, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão”. Por sua vez o art.º 641 nº 2 al b) do CPC prescreve que o recurso é indeferido quando não contenha ou junte a alegação do recorrente ou esta não tenha conclusões. Ora, as alegações dos recorrentes contêm conclusões, conforme nelas expressamente consta, razão pela qual não há fundamento para a rejeição do recurso. Se as conclusões são devidamente sintéticas é questão diversa, sendo que nos casos em que as conclusões sejam efetiva e excessivamente complexas, deve o Relator, nos termos previstos no art.º 639 nº 3 do CPC, convidar o recorrente a sintetizá-las. In casu, as conclusões do recurso não se afiguram excessivas nem complexas ou prolixas, estando redigidas de modo compreensível para o tribunal e para a parte contrária compreenderem os fundamentos de impugnação aduzidos pelos apelantes, tanto mais que o recorrido apresentou contra-alegações de recurso. Nessa sequência não há, pois, circunstância que obste ao conhecimento do recurso nos termos e para os efeitos do disposto no art.º 652 nº 1 al b) do CPC, indeferindo-se o pedido de rejeição do recurso. Notifique. * II. Aos vistos. Inscreva em Tabela. “ * O recorrido, notificado desse despacho, veio requerer a intervenção da conferência. Os recorrentes responderam, pugnando pela manutenção do decidido. * Colhidos os vistos legais, cumpre decidir. * II – OBJETO DO RECURSO: Considerando que a reclamação para a conferencia é decidida no Acórdão que julga o recurso (cf art.º 652 nº 4 do CPC), são as seguintes as questões a apreciar no âmbito do recurso: - Apreciar, em sede de conferência, o pedido de rejeição do recurso. - Aferir a validade e eficácia da comunicação de oposição à renovação do arrendamento enviada pelo ora recorrido aos ora recorrentes. * III – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO: a) Factos provados: Com relevância para a decisão da causa, o Tribunal de 1ª instância considerou provados os seguintes factos: 1 – O direito de propriedade sobre a fracção autónoma designada pela letra “…”, correspondente ao … do prédio urbano sito na Rua ..., n.º ..., na ..., descrito na ….ª Conservatória do Registo Predial de ..., freguesia da ..., sob o n.º ..., e inscrito na matriz predial de ..., sob o n.º ..., encontra-se registado desde o dia 05 de Março de 2020 em nome do Autor, por via de partilha hereditária. 2 – No dia 01 de Maio de 2015, D, na qualidade de “Senhorio” e os Réus, na qualidade de “Inquilino”, assinaram um documento escrito designado “Contrato de Arrendamento para habitação com prazo certo”, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido, e do qual constavam, entre o mais, as seguintes cláusulas: “(…) é ajustado o arrendamento do: … (Fracção …), do prédio sito na Rua ..., ... (…) 1.ª O contrato de arrendamento é COM PRAZO CERTO nos termos do artigo 1095.º e seguintes do Código Civil (…) pelo prazo efectivo de TRÊS ano(s), com início em 1 de Abril de 2015 e término em 31 de MARÇO de 2018. 2.ª No fim do prazo convencionado o contrato de arrendamento renova-se por períodos sucessivos de um ano enquanto não for denunciado pelo(a) Senhorio(a) ou pelo(a) Inquilino(a). 3.ª O(A) Senhorio(a) pode impedir a renovação automática do contrato de arrendamento mediante comunicação ao Inquilino, feita com 120 (cento e vinte) dias de antecedência sobre o fim do prazo ou da renovação em curso, através de carta registada (…) 6.ª A renda mensal é de €500,00 QUINHENTOS EUROS) (…) 7.ª Nos termos do n.º 1 do artigo 1077.º do Código Civil, a renda é automaticamente actualizada por aplicação da taxa de 3% no início de cada novo ano de vigência deste contrato, sem necessidade de quaisquer comunicações entre as partes contratantes (…) 13.ª – a) Quando o(a) Senhorio(a) se opuser à renovação do presente contrato nos termos do artigo 1097.º do Código Civil e o Inquilino não restituir o locado no prazo legal, este fica obrigado, a título de indemnização, a pagar por cada mês ou fracção que decorrer até à restituição, o dobro da renda estipulada (…)”. 3 – A partir de Abril de 2021, a “renda” cifrou-se em €597,05. 4 – Em 03 de Novembro de 2021, o Autor, através da Associação Lisbonense de Proprietários, sua representante, remeteu a cada um dos Réus uma carta registada com Aviso de Recepção, com o assunto “Oposição à Renovação de Contrato de Arrendamento”, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido, e da qual constava, entre o mais, o seguinte texto: “(…) O Contrato de Arrendamento foi celebrado, por prazo certo de três anos sendo que de acordo com o artigo terceiro os seus Senhorios pretendem opor-se à renovação. Assim, na qualidade de procuradora dos proprietários do prédio (…) vimos apresentar oposição à renovação do Contrato de Arrendamento celebrado com início em 1 de abril de 2015. A presente oposição à renovação produz efeitos no termo do prazo da sua renovação, ou seja, em 31 de março de 2022. Vª. Exa deverá proceder à restituição do andar completamente livre e devoluto, até à data mencionada, nomeadamente o dia 31 de março de 2022 (…)”. 5 – O Réu recebeu a missiva em 08 de Novembro de 2021 e a Ré em 02 de Dezembro de 2021. 6 – Os Réus não procederam à entrega do imóvel ao Autor mantendo-se a residir no mesmo. 7 – Desde 01 de Abril de 2022 e até à entrada da acção em juízo, os Réus entregaram mensalmente ao Autor a quantia de €597,05. *** FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO: Apreciação, em sede de conferência, do pedido de rejeição do recurso: Nas suas alegações de recurso o recorrido pugna pela inadmissibilidade do recurso por violação do disposto no artigo 639º, nº 1, do CPC, concluindo que, nos termos do art.º 641º, nº 2, b), do Código de Processo Civil, o recurso deverá ser rejeitado. Alega para tal que os Réus não procederam, no seu recurso, à elaboração de quaisquer conclusões, limitando-se nas mesmas a reproduzir integralmente as suas alegações, num verdadeiro trabalho de copy paste, pois as conclusões 1 a 18 correspondem quase integralmente aos primeiros dezoito parágrafos do ponto III das alegações, as conclusões 19 a 20 são também uma reprodução integral dos parágrafos 23 e 24 do ponto III das alegações, as conclusões 21 a 28 reproduzem os parágrafos 26 a 34 do ponto III das alegações., e ss conclusões 29 e 30 correspondem aos parágrafos 36 a 37 do ponto III das alegações. Dispõe o art.º 639 nº 1 do CPC que “O recorrente deve apresentar a sua alegação, na qual conclui, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão”. Por sua vez o art.º 641 nº 2 al b) do CPC prescreve que o recurso é indeferido quando não contenha ou junte a alegação do recorrente ou esta não tenha conclusões. Ora, as alegações dos recorrentes contêm conclusões, conforme nelas expressamente consta, razão pela qual não há fundamento para a rejeição do recurso. E ainda que as conclusões fossem integral reprodução das alegações (o que não sucede in casu, pois os parágrafos da alegação são em muito maior número do que o das conclusões, tendo sido expurgadas das conclusões muitas das considerações de direito feitas nas alegações), tal não equivaleria à falta de conclusões, como defende o recorrido. Veja-se a este propósito o que referem António Santos Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa em Código de Processo Civil Anotado, vol. I, Almedina, 3ª ed., na anotação nº 9 ao art.º 639º do CPC: “Apesar de constituir uma técnica manifestamente errada e violadora das exigências de sintetização impostas pelo preceito, a circunstância de, em sede de conclusões, o recorrente reproduzir a motivação vertida na alegação propriamente dita não configura um caso de falta de conclusões. Nessa eventualidade, o recurso não pode ser rejeitado de imediato, devendo ser proferido despacho de convite ao aperfeiçoamento, com fundamento na apresentação de conclusões complexas ou prolixas (…).” Veja- se ainda o Ac. do STJ de 07.11.2019 proferido no Proc. 3113/17.6T8VCT.G1.S1, cujo sumário se passa a reproduzir: “I. Compulsado o recurso de apelação da autora constata-se: (i) que o teor das respectivas conclusões se encontra dividido em 96 pontos enquanto o corpo das alegações se encontra organizado em 121 artigos; (ii) que o teor das conclusões ainda que muito próximo do teor do corpo das alegações, não coincide inteiramente com ele. II. Bastariam tais dados para se reconhecer que a apelação da autora não é omissa em conclusões e que, quando muito, ajuizando tais conclusões como sendo complexas ou prolixas, devia o tribunal ter formulado convite ao seu aperfeiçoamento. III. A resposta teria de ser a mesma ainda que se entendesse que o texto das conclusões recursórias constitui a repetição (quase) integral do texto da alegação propriamente dita; com efeito, a orientação da jurisprudência consolidada do STJ é no sentido de que a circunstância de, em sede de conclusões, o recorrente reproduzir a motivação constante da alegação propriamente dita não configura um caso de falta de conclusões, não podendo, por isso, o recurso ser rejeitado de imediato, antes devendo ser proferido despacho convidando ao aperfeiçoamento, com fundamento na apresentação de conclusões complexas ou prolixas.” Ou o Ac. do STJ de 16.12.2020 proferido no Proc. 2817/18.0T8PNF.P1.S1, cujo sumário também ora se transcreve: “I. O ónus de formulação de conclusões recursórias tem em vista uma clara delimitação do objeto do recurso mediante enunciação concisa das questões suscitadas e dos seus fundamentos, expurgadas da respetiva argumentação discursiva que deve constar do corpo das alegações, em ordem a melhor pautar o exercício do contraditório, por banda da parte recorrida, e a permitir ao tribunal de recurso uma adequada e enxuta enunciação das questões a resolver. II. “A falta de conclusões” a que se refere a alínea b), parte final, do n.º 2 do artigo 641.º do CPC, como fundamento de rejeição do recurso, deve ser interpretada num sentido essencialmente formal e objetivo, independentemente do conteúdo das conclusões formuladas, sob pena de se abrir caminho a interpretações de pendor subjetivo. III. Assim, a reprodução do corpo das alegações nas conclusões não se traduz na falta destas, impondo-se, quando muito, o convite ao aperfeiçoamento das mesmas, ao abrigo do disposto no n.º 3 do artigo 639.º do CPC. IV. De todo o modo, a orientação no sentido de fazer equivaler a reprodução integral do corpo das alegações nas conclusões - que aqui não se acolhe - não deverá prescindir de uma aferição casuística em ordem a ponderar, à luz do principio da proporcionalidade, a repercussão que essa reprodução, mais ou menos integral, possa acarretar, em termos de inteligibilidade das questões suscitadas, em sede do exercício do contraditório e da delimitação do objeto do recurso por parte do tribunal. “ É, pois, evidente que a falta de conclusões geradora de rejeição do recurso é apenas a completa omissão de apresentação de conclusões, e não a reprodução nas conclusões do corpo das alegações. Reprodução que no caso dos autos não é sequer absoluta, pois, conforme já se disse, os parágrafos da alegação são em muito maior número do que o das conclusões, tendo sido expurgadas das conclusões muitas das considerações de direito feitas nas alegações. Não há, pois, fundamento para a pretendida rejeição do recurso. Se as conclusões são devidamente sintéticas é questão diversa, sendo que nos casos em que as conclusões sejam efetiva e excessivamente complexas, deve o Relator, nos termos previstos no art.º 639 nº 3 do CPC, convidar o recorrente a sintetizá-las. In casu, apesar de conterem algumas repetições de parágrafos do corpo da motivação do recurso, as conclusões do recurso não se afiguram excessivas nem complexas ou prolixas, estando redigidas de modo compreensível para o tribunal e para a parte contrária compreenderem os fundamentos de impugnação aduzidos pelos apelantes, tanto mais que o recorrido apresentou contra-alegações de recurso que evidenciam que apreendeu facilmente as conclusões do recurso apresentado. Nessa sequência não há, pois, circunstância que obste ao conhecimento do recurso nos termos e para os efeitos do disposto no art.º 652 nº 1 al b) do CPC, improcedendo o pedido de rejeição do recurso. E, consequentemente, improcede a reclamação, para a conferência, do despacho de 26.03.2023, cuja decisão se deverá manter. As custas da reclamação são a cargo do apelado/reclamante, por ter ficado vencido (art.º 527 nºs 1 e 2 do Código de Processo Civil). Da validade e eficácia da comunicação de oposição à renovação do arrendamento enviada pelo ora recorrido aos ora recorrentes: No presente recurso está em causa aferir a validade da comunicação de oposição à renovação do arrendamento enviada pelo ora recorrido aos ora recorrentes em 03 de novembro de 2021 e recebida pelo recorrente Réu em 08 de novembro de 2021 e pela recorrente Ré em 02 de dezembro de 2021, oposição que visava produzir efeitos no termo do prazo da renovação do contrato - 31 de março de 2022. O contrato de arrendamento foi celebrado em 01.05.2015, com a duração de três anos (com início em 1 de Abril de 2015 e término em 31 de MARÇO de 2018), sendo que se clausulou que no fim do prazo convencionado o contrato de arrendamento se renovaria por períodos sucessivos de um ano enquanto não fosse denunciado pelo(a) Senhorio(a) ou pelo(a) Inquilino(a). A questão que se suscita prende-se com a validade e eficácia de tal oposição à renovação do contrato, entendendo os recorrentes que o período contratual da renovação não findava em 31 de Março de 2022, data dos alegados efeitos da oposição à renovação do contrato. Sustentam tal posição no facto de a Lei n.º 13/2019 de 12/02 ter dado uma nova redação à norma do nº 1 do art.º 1096º do C.C, defendendo que esta norma passou a impor um prazo mínimo de três anos para o período de renovação do contrato. Por sua vez, o recorrido defende que a norma em causa (1096 nº1 do CC) é supletiva, e portanto o prazo de cada renovação do contrato continuou a ser de um ano; ainda que assim não fosse, ou seja, ainda que se considere ter sido legalmente imposto como prazo de renovação do contrato o período de três anos, como apenas a 1 de Abril de 2019 se verificou a renovação do arrendamento à sombra da lei nova, essa renovação sempre terminaria sempre a 31 de Março de 2022. Impõe-se assim interpretar o disposto no art.º 1096 nº 1 do CC na redação introduzida pela Lei n.º 13/2019, de 12/02. Para o efeito (interpretação da norma) importa recorrer ao disposto no artigo 9.º do CC, o qual no seu nº1 prescreve que “A interpretação não deve cingir-se à letra da lei, mas reconstituir a partir dos textos o pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada”; acrescenta o nº 2 que “Não pode, porém, ser considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso” e o nº 3 que “ na fixação do sentido e alcance da lei, o intérprete presumirá que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados”. Importa, pois, para além do elemento literal/gramatical, atender aos elementos sistemático, histórico e teleológico necessários à boa interpretação da norma. Dispõe o art.º 1096 nº 1 do CC que “Salvo estipulação em contrário, o contrato celebrado com prazo certo renova-se automaticamente no seu termo e por períodos sucessivos de igual duração ou de três anos se esta for inferior, sem prejuízo do disposto no número seguinte.” A redação constitui o elemento literal necessário à interpretação da norma. Não podemos todavia olvidar que esta redação foi introduzida pela Lei n.º 13/2019, de 12/02, a qual, como se refere no seu art.º 1º, estabelece medidas destinadas a corrigir situações de desequilíbrio entre arrendatários e senhorios, a reforçar a segurança e a estabilidade do arrendamento urbano e a proteger arrendatários em situação de especial fragilidade, o que, enquanto elemento teleológico, é também de considerar para a interpretação do referido art.º 1096º. A mesma Lei alterou também a redação do nº 3 do art.º 1097º do CC para a seguinte: “A oposição à primeira renovação do contrato, por parte do senhorio, apenas produz efeitos decorridos três anos da celebração do mesmo, mantendo-se o contrato em vigor até essa data, sem prejuízo do disposto no número seguinte”, o que, enquanto elemento sistemático, se deve também considerar para a interpretação do aludido art.º 1096º. Ora, partindo dos termos da redação da norma (o art.º 1096 nº 1 do CC), entendemos que os mesmos apontam no sentido de que a norma é integralmente supletiva, pois logo no seu início consta a expressão “Salvo disposição em contrário”, da qual resulta que a estipulação correspondente ao corpo da norma é (toda ela) supletiva; por outro lado, a única ressalva prevista no preceito encontra-se no final do mesmo, reportando-se ao que consta no número seguinte (que contém previsão diversa para determinado tipo de contratos), e não a qualquer segmento do corpo da norma. Entender que parte da norma é supletiva e parte é imperativa não tem, para nós, suporte adequado na redação da norma, e não pode haver interpretação que não tenha um mínimo de correspondência verbal com o texto. Por outro lado, entrando já na análise dos restantes elementos relevantes para a interpretação da norma, importa realçar que não faria sentido que a lei permitisse o mais (estipulação de que não há renovação automática do contrato) e não permitisse o menos (estipulação de renovação automática por período inferior a três anos). Interpretação diversa contenderia, em nosso entendimento, com o reforço da segurança e estabilidade do arrendamento urbano que a Lei 13/2009 pretendeu fomentar, pois contribuiria para o aumento de contratos nos quais fosse expressamente afastada a possibilidade de renovação automática, único modo de obstar à renovação pelo período de três anos, o que nos parece que manifestamente não corresponderá ao pensamento legislativo. O que resulta da redação do art.º 1096 nº 1 do CC é que inexistindo no contrato qualquer cláusula em sentido contrário, o mesmo renovar-se-á por período igual ao estipulado para a sua duração inicial, e se este for inferior a três anos, a renovação será por três anos. E é aqui que se atinge o objetivo da Lei 13/2019, pois nos casos em que o contrato não contenha qualquer clausula relativa à sua renovação, a nova redação do art.º 1096 nº 1 do CC assegura a renovação por período igual ao da duração inicial desde que igual ou superior a três anos, ou por três anos quanto a duração estipulada para o contrato for inferior. Ou seja, a solução legal de renovação, por pelo menos três anos, dos contratos de arrendamento que vem prevista no art.º 1096 nº 1 do CC pressupõe a inexistência de cláusula contratual que disponha diversamente. A norma não afasta, pois, a aplicabilidade de cláusula contratual que preveja a renovação do contrato por período inferior a três anos. Importa ainda atentar no disposto no art.º 1097 nº 3 do CC, o qual prescreve que “A oposição à primeira renovação do contrato, por parte do senhorio, apenas produz efeitos decorridos três anos da celebração do mesmo, mantendo-se o contrato em vigor até essa data, sem prejuízo do disposto no número seguinte.”. Tal preceito introduz uma limitação no que diz respeito à eficácia da oposição à 1ª renovação do contrato. Tal oposição só produz efeitos decorridos três anos da celebração do contrato, o que significa que ainda que o contrato tenha duração inferior a três anos e o senhorio queira impedir a sua renovação através da oposição à renovação, a lei difere os efeitos de tal oposição para o momento em que decorram três anos desde a data da celebração do contrato; ou seja, a oposição é válida e impede a 1ª renovação do contrato, mas a lei impõe uma “moratória” para a produção dos seus efeitos, do que resulta, na prática, uma extensão da vigência do contrato até estarem decorridos três anos sobre a sua celebração. Tal não significa, contudo, que quando existam efetivamente renovações do contrato estas tenham que ter imperativamente duração de três anos. São questões diferentes. O art.º 1096 nº 1 do CC regula, supletivamente, a possibilidade de renovação do contrato e a respetiva duração; o art.º 1097 nº3 do CPC regula a produção de efeitos da oposição à 1º renovação do contrato, ou seja, uma situação em que não chega a haver sequer qualquer renovação do contrato. Daí que não se possa recorrer à previsão contida no art.º 1097 nº 3 do CC para fundamentar a alegada imperatividade do prazo de renovação contratual de três anos previsto no art.º 1096º nº 1 do CC. Em suma, concluímos pela supletividade do prazo de três anos previsto no art.º 1096 nº1 do CC., aderindo ao entendimento plasmado no Ac. de 17.03.2022 proferido por este Tribunal da Relação de Lisboa no Proc. 8851/21.6T8LRS.L1-6 e no Ac. de 10.01.2023 também deste TRL no Proc. 1278/22.4YLPRT.L1-7, bem como no Ac. do TRP de 12.07.2023 proferido no Proc. 9506/21.1T8PRT-A.P1. A tal não obsta o disposto no art.º 1080.ºdo CC, o qual dispõe que as normas sobre a resolução, a caducidade e a denúncia do arrendamento urbano têm natureza imperativa, salvo disposição legal em contrário, pois para além de não estar em causa qualquer norma relativa à resolução, caducidade ou denúncia do contrato (mas antes uma norma relativa à sua renovação), o próprio art.º 1080º ressalva expressamente a existência de disposições legais supletivas. A nova redação do art.º 1096 nº1 do CC não buliu, pois, com a plena aplicabilidade da clausula contratual que, no caso dos autos, instituiu que no fim do prazo convencionado para o contrato de arrendamento (recorde-se, de 1 de Abril de 2015 e término em 31 de MARÇO de 2018) este se renovaria por períodos sucessivos de um ano enquanto não for denunciado pelo(a) Senhorio(a) ou pelo(a) Inquilino(a). E não estando em causa a primeira renovação do contrato (a qual já havia ocorrido em 2018, ainda antes da entrada em vigor da lei 13/2009, e como tal escapou à disciplina instituída por esta Lei – cf Ac do STJ de 17.01.2023 proferido no Proc. 7135/20.1T8LSB.L1.S1) não se aplica o disposto no art.º 1097 nº 3 do CC. Portanto, é perfeitamente válida e eficaz a comunicação da oposição à renovação do arrendamento enviada pelo ora recorrido aos ora recorrentes em 03 de novembro de 2021 (recebida pelo recorrente Réu em 08 de novembro de 2021 e pela recorrente Ré em 02 de dezembro de 2021), oposição que produziu efeitos no termo do prazo (anual) da sua renovação - 31 de março de 2022. Nessa sequência, impõe-se a improcedência do recurso. Ainda que concluísse pela imperatividade da parte do art.º 1096 nº1 do CC que prevê a renovação dos contratos de arrendamento por igual período ao da duração inicial, ou por três anos se este for inferior, a oposição à renovação do contrato enviada pelo recorrido aos recorrentes sempre produziria efeitos em 31.03.2022. É que quando entrou em vigor a lei 13/2009, o que ocorreu em 13.02.2019, o contrato de arrendamento, com duração inicial prevista até 31.03.2018, já se tinha renovado por um ano, nos termos contratualizados, escapando, pois, tal renovação ocorrida em 2018 ao regime previsto na referida Lei, conforme acima referido (sendo aliás o que resulta do disposto no art.º 12º nº 1 do CC, o qual ressalva os efeitos jurídicos já produzidos dos factos que a nova lei visa regular, in casu a renovação do contrato por um ano). Apenas os efeitos da renovação seguinte (a de 2019) seriam já afetados pela alegada imperatividade do prazo de renovação do contrato - in casu três anos -, o qual terminaria precisamente em 31.03.2022, podendo, pois, o senhorio opor-se à renovação do contrato para produzir efeitos nessa data. Razão pela qual a apelação sempre improcederia. As custas do recurso são a cargo dos apelantes, por terem ficado vencidos (art.º 527 nºs 1 e 2 do Código de Processo Civil). *** VI. DECISÃO: Pelo exposto acordam os Juízes desta 8ª seção do Tribunal da Relação de Lisboa em: a) - Julgar improcedente a reclamação para a conferência do despacho proferido pela Relatora a 26.03.2024, mantendo-se, em consequência, o decidido no despacho reclamado; b) - Julgar improcedente a apelação, mantendo-se, em consequência, a decisão recorrida. Custas do recurso pelos apelantes. Custas da reclamação para a conferencia pelo apelado/reclamante. Notifique. * Lisboa, 16-05-2024 Carla Matos Amélia Puna Loupo Carla Figueiredo |