Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | RUI MIGUEL TEIXEIRA | ||
Descritores: | MANIPULAÇÃO DE MERCADO DEVER DE FUNDAMENTAÇÃO PRESSUPOSTOS | ||
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Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 04/09/2025 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Texto Parcial: | N | ||
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Meio Processual: | RECURSO PENAL | ||
Decisão: | NÃO PROVIDO | ||
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Sumário: | O cumprimento do dever de fundamentação da matéria de facto não exige a motivação facto a facto, especialmente quando um determinado meio de prova é susceptível de demonstrar mais do que um facto. Para que se tenha por verificado a comissão de um crime de manipulação de mercado é necessário que a prática levada a cabo assuma um volume que cause nos demais operadores a percepção de que existe uma grande volatilidade nos títulos e uma transacção inusitada dos mesmos de molde a ser criada uma falsa percepção sobre o devir dos mesmos. | ||
Decisão Texto Parcial: | ![]() | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam os juízes que compõem a 3ª secção do Tribunal da Relação de Lisboa I. Relatório Apresenta-se a recorrer perante este Tribunal o Ministério Público porque inconformado com a decisão proferida pelo Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, Juízo Local Criminal de Lisboa - Juiz 2 – mediante o qual foram absolvidos os arguidos AA e XXX S.L., da prática de um crime de manipulação de mercado, p. e p. pelo art.º 379º, nºs 1, 2, do Código dos Valores Mobiliários, pela qual vinham pronunciados. Assim, formulou, após motivação, as seguintes conclusões recursais: “1ª Nos presentes autos, o AA e, através deste, a XXX S.L., foram submetidos a julgamento e absolvidos da acusação contra eles formulada pela prática de um crime de manipulação de mercado, p. e p. pelo art.º 379º, nºs 1, 2, do Código dos Valores Mobiliários, pelo qual vinham pronunciados. 2ª Assim sendo, as razões da discordância relativamente à sentença recorrida prendem-se com o erro notório na apreciação da prova e contradição insanável entre a matéria de facto e a decisão (art.º 410.º, n.º 2, al. b), bem como discordância ao enquadramento jurídico dos factos. 3ª Da análise que fizemos à sentença recorrida, em especial à motivação da matéria de facto e aos elementos probatórios em que se suporta, não podemos deixar de dizer que não acolhemos a tese da mesma, dá como provados todos os factos constantes da acusação/pronúncia, (excepto os 8 e 10), acabando por concluir que os factos dados como provados não preenchem o elemento objectivo do tipo legal de crime de manipulação de mercado. 4ª A desvalorização do relatório da CMVM, bem como dos documentos que o suportam e o testemunho do técnico do Dr. BB, de grande relevância para a prova dos factos, não pode ser ignorada como o foi pelo Tribunal a quo. Acresce referir que a documentação relevante da acusação foi analisada em audiência, não tendo por isso o tribunal actuado em conformidade com as melhores práticas e regras de apreciação e valoração da prova. 5ª No presente caso o Tribunal a quo não procurou outro suporte probatório que não fosse a versão apresentada pela defesa, tendo omitido, por um lado, uma análise critica da globalidade do vasto acervo probatório que tinha à sua disposição, nomeadamente, relatório de indícios elaborado pela CMVM, de fls. 4, documentos de fls. 23, 35,46 e 235, informação complementar de fls. 47, exposição de fls. 232, 263 a 268, documentos de fls. 236 a 253, 271 e 272, relativamente aos quais não fez qualquer alusão, e, por outro lado, uma valoração critica da totalidade da prova circunstancial, indirecta ou indiciária. 6ª Consequentemente, não é correcto que o Tribunal a quo afirme, como o faz, que os factos dados como provados não preencham o elemento objectivo do tipo de crime de manipulação de mercado, pois com base na prova testemunhal da defesa e das declarações do arguido, “não se verificou um nexo de causalidade do arguido e a idoneidade para alterar ficticiamente o mercado, não tendo sido feita qualquer prova da aptidão da conduta para lesar o bem jurídico protegido, a saber a segurança do investimento e a confiança do mercado”. 7ª Toda a matéria de facto provada aponta que o arguido delineou e conseguiu o objectivo de manipular o preço das acções do Banco ZZZ, de modo ilícito e que o código de valores mobiliários não permite, ainda que o tivesse feito numa fronteira limite, muito próxima da licitude, mas que claramente ultrapassou aquilo que era legalmente admissível, redundando a sua conduta numa infracção ao disposto no art.º 379º do Cód. Valores mobiliários (doravante CVM). 8ª Neste sentido, resulta evidente que o tribunal a quo deu como não provado algo que não podia deixar de ter acontecido, fazendo-o de uma forma ilógica, arbitrária e notoriamente violadora das regras da experiência. 9ª Pelo exposto, parece-nos que a sentença em crise não efectuou o devido exame critico da prova e, consequentemente padece da nulidade a que alude o art.º 379, nº 1, alínea a), por referência ao art.º 374º, nº 2, ambos do Código de Processo Penal. 10ª O crime de manipulação de mercado é um crime de perigo abstracto-concreto, porquanto deixa em aberto um elenco de condutas passiveis de violarem o bem jurídico protegido (regularidade e eficiência do mercado de valores mobiliários), na medida em que estas se reportam a categoria de actos potencialmente lesivos, não se exigindo que as referidas condutas tenham gerado um perigo efectivo para o mercado, (in Crime de Manipulação de Mercado, Revista Julgar nº 17). 11ª A criminalização das situações legalmente caracterizadas como manipulação de mercado assenta, segundo os considerandos da Directiva /2003/06/CE, na necessidade de garantir a integridade dos mercados financeiros e promover a confiança dos investidores, proibindo-se as práticas que coloquem em causa essa integridade. 12ª O tipo descrito no art.º 379º, nº 1, do CMVP pode ser preenchido em termos objectivos, designadamente, através da realização de operações de natureza fictícia, quando os seus intervenientes não pretendem que o contrato a que esta se reporta venha a ser cumprido ou porque não ocorre uma real translação patrimonial. 13ª É este o caso dos autos, tendo-se demonstrado que ocorreram centenas de operações em que a sociedade controlada pelo arguido realiza negócios consigo própria sobre o título Banco ZZZ, num curto espaço de tempo. 14ª Nestes termos, não cabe ao Tribunal apurar se ocorreu, em consequência da conduta desenvolvida pelo arguido uma variação no preço do titulo ou da sua liquidez, ao Tribunal basta apenas apurar como apurou, que o arguido, neste caso de forma consistente ao longo de meses, desenvolveu uma prática que é em si idónea, a ter impacto sobre a liquidez para a percepção que o mercado, os investidores globalmente considerados, têm de determinado titulo. 15ª A conduta do arguido, que resultou da matéria de facto provada, pelo seu volume e consistência no tempo, sendo em si uma prática susceptível de colocar em risco a transparência do mercado, como referido no art.º 311º, nº 2 do CVM, deve ter-se como integrada no ilícito descrito no art.º 379º do CVM. 16ª Quanto ao tipo subjectivo de ilícito, por um lado, consiste na intenção fraudulenta de manipular o mercado, devendo existir um propósito fraudulento praticado sobre os investidores, através do controle ou actuação artificial incidente no preço dos títulos, isto é, a realização de um acto fora da sua causa função – acção típica para alterar o regular funcionamento do mercado – que causa um desvio que é artificial com consciência que o acto cria o perigo abstracto, ou seja, tendo o agente conhecimento de que o facto está a desviar a função que o mercado deve desempenhar. 17ª O arguido prestou declarações tendo reconhecido a realização das transacções identificadas na acusação/pronúncia, excepto as assinaladas no ponto 8 e 10 da acusação/pronúncia. 18ª Já a expressão de tais transacções na totalidade das transacções das acções do Banco ZZZ e respectivo impacto na liquidez do título resultou das declarações do Dr. BB e dos documentos juntos aos autos. 19ª A principal questão que se colocava nos presentes autos era a intenção do arguido praticar os factos. 20ª O arguido esclareceu que a sua intenção não era manipular o mercado ou de praticar qualquer acto fictício, mas antes realizar operações com reais efeitos para as esferas jurídicas intervenientes. 21ª Esclareceu ainda que os negócios identificados na acusação/pronúncia se deveram a erros na introdução de dados ou na informação fornecida pela plataforma quanto ao preço, sendo que não teve qualquer vantagem económica com os mesmos, apenas prejuízo. 22ª Mas referiu que se apercebeu sempre da existência dos negócios indicados na acusação/pronúncia no final de cada dia, porquanto ficava com acções que não devia ter. 23ª Em 30.12.2011 a GAESCO deu-lhe conhecimento do email recebido da CMVM, nesse momento cancelou todas as ordens e só retomou a actividade no dia 02.01.2012. 24ª Não obstante aperceber-se da existência dos referidos negócios ao final do dia em que os mesmos ocorriam, apenas a partir do momento em que foi informado que estes negócios podiam ser interpretados como manipulação de mercado, tirou a máquina de operações da internet – a qual não tinha capacidade para o volume de operações que efectuava, o que era do conhecimento do arguido – e colocou uma linha ponto a ponto segura. Posteriormente, obteve outra máquina para operar. 25ª O funcionamento melhorou muito, mas continuaram a existir alguns negócios cruzados, não tendo sido possível evitar os mesmos. 26ª Ora, resulta na nossa opinião, que das próprias declarações do arguido, que pelo menos desde 30.12.2011 teve conhecimento que a sua actuação poderia ser considerada manipulação de mercado, o arguido continuou a representar a realização de negócios consigo mesmo como consequência necessária da sua conduta, e, ainda assim, manteve a actuação nos referidos moldes, afastando um sistema que permitiria eliminar os negócios cruzados para conseguir manter o volume dos negócios e os lucros pretendidos. 27ª Ainda assim, sempre se dirá que tendo o arguido iniciado a sua actividade aos 17 anos, tendo vasta experiência profissional na bolsa, não se concebe que o mesmo, antes da comunicação da CMVM não estivesse já ciente das consequências dos negócios fictícios que efectuou no mercado. 28ª Acresce que estamos a falar de 790 negócios realizados entre Outubro e Dezembro de 2011 envolvendo um total de 626.251.539 acções do Banco ZZZ e de 42 negócios entre 03.07.2012 e 30.01.2013 num total de 46.139.414 acções do Banco ZZZ, pelo que decorre das regras da experiencia comum que os mesmos não poderiam resultar todos de erro conforme alegado pela defesa. 29ª O preço de execução coincidiu com o limite das ofertas de compra em 790 negócios e com o limite das ofertas de venda em 788 negócios, ou seja, em tais negócios o arguido colocou um preço mínimo para a venda igual ao preço máximo para compra, o que não é o procedimento normal de alguém que pretende negociar com terceiros. 30ª A quase totalidade dos negócios foram introduzidos no próprio dia da execução. 31ª Pelo exposto, atendendo a todos os elementos supra expostos, não restam dúvidas de que a conduta do arguido AA e, através deste, a XXX S.L. integram os elementos objectivos e subjetivos do crime de manipulação de mercado por que foram pronunciados, pelo que, a Mmª Juiz deveria tê-los condenado em conformidade. Nestes termos, Vossas Excelências, melhor decidindo, farão a costumada Justiça.” Ao assim recorrido respondeu o arguido AA sustentando que: 1. O Ministério Público assaca vícios à Sentença recorrida que são inexistentes – há apenas uma discordância quanto ao julgamento feito pelo Tribunal a quo. Porém, o Ministério Público não impugna a matéria de facto. 2. E, de todo o modo, ainda que o fizesse, a conclusão seria idêntica. A prova foi valorada, e bem valorada, pelo Tribunal a quo. 3. Ainda que da matéria de facto se não possa retirar o que dela se quer retirar, porque a mesma não é suficiente para que seja imputado o crime ao Arguido. 4. Bem andou, pois, a Sentença recorrida, ao julgar que: - Em primeiro lugar, a conduta não é idónea a provocar o resultado típico – os negócios de autocontratação em causa representam uma gota num oceano. - AA, um investidor muito experimentado, nunca poderia ter desejado alcançar o resultado (típico) através da prática de atos manifestamente inidóneos para alcançá-lo. - Tão pouco existe dolo eventual. O Arguido soube pela primeira vez a 30.12.2011 que, na perspectiva da CMVM, poderia estar a incorrer no risco de influir artificialmente no mercado das acções do Banco ZZZ em virtude de algumas autocontratações involuntárias que haviam ocorrido na sua carteira na Euronext Lisbon. Demonstrou-se que, imediatamente e em conjunto com a GVC Gaesco, o Arguido agiu e alterou o sistema em que operava, para limitar o número de autocontratações, o que logrou, uma vez que a totalidade de autocontratações ocorridas de então em diante diminuiu marcadamente (10 no total de um ano, à ratio de 1 por mês, num universo de cerca de 40.000 operações…). 5. Só por absurdo poderá sustentar-se que o Arguido, ainda assim, representou que continuando a exercer a sua profissão (a qual, pela sua natureza e a dos sistemas operativos com que operava, incluía um risco mínimo de erro, nomeadamente na geração de autocontratações, mas em escala tão irrisória que nunca impactariam a percepção dos investidores) preenchia um tipo de crime, tendo-se conformado com esse risco. 6. Antes pelo contrário. O Arguido demonstrou de forma lógica e coerente que não nunca equacionou que poderia estar a impactar artificialmente a perceção que os investidores no mercado de ações do Banco ZZZ teriam do mesmo (pois a percentagem ínfima de autocontratações que, involuntariamente, gerou, não seriam idóneas para o fazer e porque a sua operação, de scalper ou day trader, é facilmente identificável pêlos investidores). 7. O elemento subjetivo, que o próprio Recurso reconhece como elemento central, é inexistente. 8. E são também inexistentes os elementos objetivos do tipo – e inexistentes também os factos necessários para os afirmar. Sublinhe-se: – wash trades são operações fictícias, e as que estão em causa nos autos são reais, tanto que originaram negócios de compra e venda com terceiros; não basta haver cruzamento entre ordens de compra e de venda, como o Ministério Público afirma, para que as operações sejam fictícias, porque isso é simplesmente o sistema, o mercado, a funcionar… – as operações imputadas ao Arguido não são idóneas para impactar a liquidez do mercado da Euronext Lisbon – menos ainda o impactaram, em concreto. Nestes termos e nos melhores de Direito cujo douto suprimento de V. Exas., Venerandos Juízes Desembargadores, se invoca, Deve o Recurso interposto pelo Ministério Público ser julgado totalmente improcedente, mantendo-se na íntegra a Sentença recorrida que absolveu o Arguido da prática do crime por que vinha acusado.” Subidos os autos a esta Relação o Ministério Público junto da mesma pronunciou-se, pelas mesmas razões constantes do recurso, pela procedência do mesmo. Os autos foram a vistos e à conferência. * II – Do âmbito do recurso e da decisão recorrida O âmbito do recurso é delimitado em função do teor das conclusões extraídas pelo recorrente da motivação apresentada, só sendo lícito ao Tribunal ad quem apreciar as questões desse modo sintetizadas, sem prejuízo das que importe conhecer oficiosamente, como são os vícios da sentença previstos no artigo 410º, nº2, do CPP, mesmo que o recurso se encontre limitado à matéria de direito (cfr. Ac. do Plenário das Secções Criminais do STJ de 19/10/1995, DR I-A Série, de 28/12/1995 e artigos 403º, nº1 e 412º, nºs 1 e 2, ambos do Código do Processo Penal). No caso concreto, analisadas as conclusões recursais as questões a decidir são: a. A existência de o erro notório na apreciação da prova e contradição insanável entre a matéria de facto e a decisão (art.º 410.º, n.º 2, al. b) do C.P.P.) b. Errado enquadramento jurídico dos factos. Para efeitos de conhecimento da questão recordaremos aqui, por transcrição, os factos provados, os não provados e a respectiva fundamentação: Assim: “A XXX S.L. é uma sociedade limitada e unipessoal, com o capital social de € 27.000,00, constituída em 21 de Outubro de 1998, que desenvolve o objecto social de prestação de serviços de assessoria em investimentos, compra e venda de bens imóveis, respectiva manutenção e exploração nomeadamente mediante arrendamento e aquisição de valores mobiliários, salvo sociedades de valores. Nos anos de 2011, 2012 e 2013, o AA exerceu as funções de administrador único da XXX S.L., pelo que era este quem tomava as decisões sobre a forma como essa sociedade desenvolvia a sua actividade, nomeadamente, quais as acções que decidia comprar e vender, em que mercados, por que intervalos de preços e em que quantidades. O Banco ZZZ é uma sociedade comercial anónima, aberta, com o NIPC ..., constituída em 17 de Julho de 1985, que desenvolveu o objecto social de actividade bancária, que, em 2011, 2012 e 2013, detinha o capital social de €6.064.999.986,00, representando por 7.207.167.060 acções nominativas, escriturais e sem valor nominal, encontrando-se integralmente realizado, com sede na ... no Porto. Nos anos de 2011, 2012 e 2013, a Banco ZZZ encontrava-se admitida à negociação no Eurolist by Euronext, mercado regulamentado gerido pela Euronext Lisbon - Sociedade Gestora de Mercados Regulamentados, SA, integrando as respectivas acções o cabaz constitutivo do Índice PSI 20. A GVC Gaesco Valores, S.V., S.A. é uma sociedade comercial de direito espanhol, registada na Comisión Nacional del Mercado de Valores (CNMV), com o número 182, e membro das bolsas de valores de Barcelona, Madrid e Valência, e, ainda, membro remoto de Euronext Lisbon (com o código n.º 4752). Nos anos de 2011, 2012 e 2013, a arguida XXX S.L. foi titular da conta de registo de valores mobiliários n.º 117.GV.063653, sedeada na GVC Gaesco Valores, S.V., S.A.. Em data anterior a 13 de Outubro de 2011, o arguido AA decidiu fazer introduzir, através da conta n.º 117.GV.063653, da GVC Gaesco Valores, S.V., S.A., no Euronext Lisbon, ordens de compra e de venda de acções da Banco ZZZ que sabia que iriam dar origem, pelo menos parcialmente, a transacções em que a arguida XXX S.L. assumiria, simultaneamente, a qualidade de vendedora e compradora. Assim, Nas sessões do Euronext Lisbon realizadas entre 13 de Outubro de 2011 e 30 de Dezembro de 2011, o AA aí fez inserir, através da conta n.º 117.GV.063653, da GVC Gaesco Valores, S.V., S.A., 1.079 ordens – operações de execução - de compra de acções do Banco ZZZ, pela XXX S.L., em que fixou limite ao preço de aquisição. Tais ordens foram parcialmente executadas, dando origem à aquisição, pela XXX S.L., de um total de 1.555.254.685 acções da Banco ZZZ, ou seja, 29,45% da quantidade total transaccionada. Simultaneamente, nas mesmas sessões do Euronext Lisbon, o AA aí fez inserir, através da conta n.º 117.GV.063653, da GVC Gaesco Valores, S.V., S.A., 1127 ordens de venda de acções da Banco ZZZ, pela XXX S.L., em que fixou limite ao preço de alienação. Tais ordens foram parcialmente executadas, dando origem à venda, pela XXX S.L., de um total de 1.555.254.685 acções da Banco ZZZ Parte das ordens de compra e venda por AA inseridas no Euronext Lisbon deram origem a 790 negócios em que a arguida XXX S.L. assumiu, simultaneamente, a qualidade de vendedora e compradora, e onde foram transaccionadas 626.251.539 acções da Banco ZZZ, nos seguintes termos: Por assumir, simultaneamente, a posição de compradora e vendedora nas transacções acima descritas, a arguida XXX S.L. não obteve quaisquer mais-valias com os mesmos, tendo, ainda, suportado as correspondentes taxas de intermediação. As ordens de venda que deram origem a tais negócios eram, todas, limitadas em termos de preço, tendo o preço de execução coincidido integralmente com o respectivo limite em 788, destes 790 negócios. Os 46 negócios celebrados, em Outubro de 2011, pela arguida XXX S.L. consigo própria, corresponderam a 3,04 % do total de negócios de compra e a 2,03 % do total de negócios de venda de acções da Banco ZZZ realizados pela referida arguida. Através dos negócios acima elencados foram, em Outubro de 2011, transacionadas um total de 19.946.014 acções da Banco ZZZ, correspondentes a 20,91% do total de acções dessa empresa transacionadas pela arguida XXX S.L. nesse mês, e a 2,20% do total das mesmas negociado no Euronext Lisbon, nesse período. Estas 19.946.014 acções foram negociadas pelo valor total de € 3.248.334,42, correspondente a 20,84% do valor da totalidade das compras e a 20,82% das vendas de acções da Banco ZZZ realizadas pela arguida XXX S.L., e a 2,11% do valor da totalidade de acções dessa empresa negociadas em Outubro de 2011, no Euronext Lisbon. As ordens de compra que deram origem a 41 desses 46 negócios foram introduzidas no dia da respectiva execução, e continham instruções para a aquisição de um total de 35.738.958 acções da Banco ZZZ, apenas tendo sido executadas quanto a 19.511.042. As ordens de venda que deram origem a 45 desses 46 negócios foram introduzidas no dia da respectiva execução, e continham instruções para a venda de um total de 44.147.477acções da Banco ZZZ, apenas tendo sido executadas quanto a 19.803.123. Em Outubro de 2011, a quantidade média de acções transacionada em cada negócio em que a arguida XXX S.L. assumiu, simultaneamente, a qualidade de vendedora e de compradora, foi de 433.609, mais de oito vezes superior à quantidade média da totalidade dos restantes negócios de acções da Banco ZZZ realizados, nesse período, no Euronext Lisbon, que foi de 50.357. Tais negócios tiveram um valor médio de € 70.615,97, mais de oito vezes superior ao valor médio da totalidade dos restantes negócios de acções da Banco ZZZ realizados, nesse período, no Euronext Lisbon, que foi de 8.554,85. Os 433 negócios celebrados, em Novembro de 2011, pela arguida XXX S.L. consigo própria, corresponderam a 3,97 % do total de negócios de compra e a 3,31 % do total de negócios de venda de acções da Banco ZZZ realizados pela referida arguida. Através dos negócios acima descritos foram, em Novembro de 2011, transacionadas um total de 366.634.801 acções da Banco ZZZ, correspondentes a 40,10% do total de acções dessa empresa transacionadas pela arguida XXX S.L. nesse mês, e a 12,22% do total das mesmas negociado no Euronext Lisbon, nesse período. Estas 366.634.801 acções foram negociadas pelo valor total de € 45.640.758,50, correspondente a 40,58% do valor da totalidade das compras e a 40,54% das vendas de acções da Banco ZZZ realizadas pela arguida XXX S.L., e a 12,31% do valor da totalidade de acções dessa empresa negociadas em Novembro de 2011, no Euronext Lisbon. As ordens de compra que deram origem a 423 desses 433 negócios foram introduzidas no dia da respectiva execução, e continham instruções para a aquisição de um total de 636.142.255 acções da Banco ZZZ, apenas tendo sido executadas quanto a 363.166.705. As ordens de venda que deram origem a 420 desses 433 negócios foram introduzidas no dia da respectiva execução, e continham instruções para a venda de um total de 656.857.757acções da Banco ZZZ, apenas tendo sido executadas quanto a 362.943.045. Em Novembro de 2011, a quantidade média de acções transacionada em cada negócio em que a arguida XXX S.L. assumiu, simultaneamente, a qualidade de vendedora e de compradora, foi de 846.732, mais de vinte e uma vezes superior à quantidade média da totalidade dos restantes negócios de acções da Banco ZZZ realizados, nesse período, no Euronext Lisbon, que foi de 38.555.Tais negócios tiveram um valor médio de € 105.405,91, mais de vinte e duas vezes superior ao valor médio da totalidade dos restantes negócios de acções da Banco ZZZ realizados, nesse período, no Euronext Lisbon, que foi de 4.758,21. Os 311 negócios celebrados, em Dezembro de 2011, pela arguida XXX S.L. consigo própria, corresponderam a 6,59 % do total de negócios de compra e a 4,32 % do total de negócios de venda de acções da Banco ZZZ realizados pela referida arguida. Através dos negócios acima descritos foram, em Dezembro de 2011, transacionadas umtotal de 239.670.724 acções da Banco ZZZ, correspondentes a43,93% do total de acções dessa empresa transacionadas pela arguida XXX S.L. nesse mês, e a 17,45% do total das mesmas negociado no Euronext Lisbon, nesse período. Estas 239.670.724 acções foram negociadas pelo valor total de € 28.905.820,79, correspondente a 43,67% do valor da totalidade das compras e a 43,60% das vendas de acçõesda Banco ZZZ realizadas pela arguida XXX S.L., e a 17,15% do valor da totalidade de acções dessa empresa negociadas em Dezembro de 2011, no Euronext Lisbon. As ordens de compra que deram origem a 286 desses 311 negócios foram introduzidas no dia da respectiva execução, e continham instruções para a aquisição de um total de561.137.072 acções da Banco ZZZ, apenas tendo sido executadas quanto a 225.020.716. As ordens de venda que deram origem a 281 desses 311 negócios foram introduzidas no dia da respectiva execução, e continham instruções para a venda de um total de 544.266.225acções da Banco ZZZ, apenas tendo sido executadas quanto a 220.122.465. Em Dezembro de 2011, a quantidade média de acções transaccionada em cada negócio em que a arguida XXX S.L. assumiu, simultaneamente, a qualidade de vendedora e de compradora, foi de 770.645, mais de dezoito vezes superior à quantidade média da totalidade dos restantes negócios de acções da Banco ZZZ realizados, nesse período, no Euronext Lisbon, que foi de 42.503. Tais negócios tiveram um valor médio de € 92.944,76, mais de dezassete vezes superiorao valor médio da totalidade dos restantes negócios de acções da Banco ZZZ realizados, nesse período, no Euronext Lisbon, que foi de 5.235,68. As ordens de compra inseridas, pelo arguido AA, no Euronext Lisbon, em Outubro, Novembro e Dezembro de 2011, deram origem, no prazo de 60 minutos sobre a sua emissão, a 641 negócios, referentes a 548.236.330 acções da Banco ZZZ As ordens de venda inseridas, pelo arguido AA, no Euronext Lisbon, em Outubro, Novembro e Dezembro de 2011, deram origem, no prazo de 60 minutos sobre a sua emissão, a 661 negócios, referentes a 556.999.762 acções da Banco ZZZ Das 65 sessões do Euronext Lisbon realizadas em Outubro, Novembro e Dezembro de2011, a GVC Gaesco Valores, S.V., S.A. intermediou transacções para clientes seus em 58 delas. E, dessas 58 sessões, a arguida XXX S.L. emitiu ordens de compra e venda em56 delas, tendo, inclusivamente, emitido ordens de venda em todas as sessões do Euronext Lisbon realizadas no mês de Novembro de 2011 e em 21 das 22 sessões desse mercado, realizadas em Dezembro de 2011. Em 54 dessas 56 sessões, a arguida XXX S.L. emitiu ordens de compra e venda de acções da Banco ZZZ, que vieram a dar origem a transacções em que aquela sociedade foi, simultaneamente, compradora e vendedora. Das 126.389 transacções de acções da Banco ZZZ nos meses de Outubro, Novembro e Dezembro de 2011, um total de 17.137 foram intermediadas pela GVC Gaesco Valores, S.V., S.A.. Das 17.137 aquisições de acções da Banco ZZZ, intermediadas, nesse período, pela GVC Gaesco Valores, S.V., S.A., 17.129, ou seja, 13,55% do total de negócios realizados no Euronext quanto a esse título, corresponderam a compras ordenadas pela arguida XXX S.L.. Das 22.555 alienações de acções da Banco ZZZ, intermediadas, nesse período, pela GVC Gaesco Valores, S.V., S.A., 22.546, ou seja, 17,84% do total de negócios realizados no Euronext quanto a esse título, corresponderam a vendas ordenadas pela arguida XXX S.L.. Das 905.415.686 acções da Banco ZZZ negociadas em Outubro de 2011, 95.376.377, ou seja, 10,53% do total, foram transaccionadas pela arguida XXX S.L.. Das 3.001.247.063 acções da Banco ZZZ negociadas em Novembro de 2011, no Euronext, 914.279.494, ou seja, 30,46% do total, foram transaccionadas pela arguida XXX S.L.. Das 1.373.441.986 acções da Banco ZZZ negociadas em Dezembro de 2011, no Euronext, 545.598.814, ou seja, 39,72% do total, foram transaccionadas pela arguida XXX S.L.. Nas sessões do Euronext Lisbon em que a arguida XXX S.L. efectuou transacções, em Outubro, Novembro e Dezembro de 2011, esta sociedade sempre comprou evendeu o mesmo número de acções. Em data anterior a Julho de 2012, o arguido AA decidiu fazer introduzir, através da conta n.º 117.GV.063653, da GVC Gaesco Valores, S.V., S.A., no Euronext Lisbon, ordens de compra e de venda de acções da Banco ZZZ que sabia que iriam dar origem, pelo menos parcialmente, a transacções em que a arguida XXX S.L. assumiria, simultaneamente, a qualidade de vendedora e compradora. Assim, Nas sessões do Euronext Lisbon realizadas em 03/07/2012, 18/07/2012, 02/08/2012, 10/08/2012, 20/08/2012, 11/09/2012, 24/09/2012, 26/09/2012, 28/09/2012, 03/10/2012, 16/10/2012, 22/10/2012, 25/10/2012, 12/11/2012, 15/11/2012, 22/11/2012, 13/12/2012, 19/12/2012, 24/12/2012, 03/01/2013, 10/01/2013, 11/01/2013, 14/01/2013, 16/01/2013, 18/01/2013, 22/01/2013, 23/01/2013, 24/01/2013, 25/01/2013 e 30/01/2013, o arguido AA fez inserir, através da conta n.º 117.GV.063653, da GVC Gaesco Valores, S.V., S.A., no Euronext Lisbon, diversas ordens de compra e de venda de acções da Banco ZZZ, pela XXX S.L.. Tais ordens deram origem à aquisição, pela XXX S.L., de um total de 1.087.094.966 acções da Banco ZZZ, pelo valor total de €102.672.475,24.Tais ordens deram origem à alienação, pela XXX S.L., de um total de 281.084.512.110 acções da Banco ZZZ, pelo valor total de €102.757.506,33. Parte das ordens de compra e venda por si inseridas no Euronext Lisbon deram origem a 42 negócios em que a arguida XXX S.L. assumiu, simultaneamente, a qualidade de vendedora e compradora, e onde foram transaccionadas 46.139.414 acções da Banco ZZZ, pelo valor de € 4.414.534,83, nos seguintes termos: Na sessão do dia 18 de Julho de 2012, a arguida XXX S.L. celebrou consigo própria um negócio através do qual foram transacionadas 1.047.890 acções do Banco ZZZ, volume correspondente a 9,66% da totalidade das acções dessa instituição bancária negociadas nesse dia, no Euronext Lisbon. Na sessão do dia 2 de Agosto de 2012, a arguida XXX S.L. celebrou consigo própria um negócio através do qual foram transacionadas 839.218 acções do Banco ZZZ, volume correspondente a 5,24% da totalidade das acções dessa instituição bancária negociadas nesse dia, no Euronext Lisbon. Na sessão do dia 20 de Agosto de 2012, a arguida XXX S.L. celebrou consigo própria três negócios através dos quais foram transacionadas 673.000, 5.025 e 300.000 acções do Banco ZZZ, volume correspondentes a 3,18% da totalidade das acções dessa instituição bancária negociadas nesse dia, no Euronext Lisbon. Na sessão do dia 28 de Setembro de 2012, a arguida XXX S.L. celebrou consigo própria um negócio através do qual foram transacionadas 1.896.300 acções do Banco ZZZ, volume correspondente a 2,94% da totalidade das acções dessa instituição bancária negociadas nesse dia, no Euronext Lisbon. Na sessão do dia 3 de Outubro de 2012, a arguida XXX S.L. celebrou consigo própria um negócio através do qual foram transacionadas 1.081.643 acções do Banco ZZZ, volume correspondente a 1,38% da totalidade das acções dessa instituição bancária negociadas nesse dia, no Euronext Lisbon. Na sessão do dia 16 de Outubro de 2012, a arguida XXX S.L. celebrou consigo própria dois negócios através dos quais foram transacionadas 448.889 e 600.000 acções do Banco ZZZ, volume correspondentes a 1,67% da totalidade das acções dessa instituição bancária negociadas nesse dia, no Euronext Lisbon. Na sessão do dia 22 de Outubro de 2012, a arguida XXX S.L. celebrou consigo própria um negócio através do qual foram transacionadas 691.315 acções do Banco ZZZ, volume correspondente a 1,07% da totalidade das acções dessa instituição bancária negociadas nesse dia, no Euronext Lisbon. Na sessão do dia 13 de Dezembro de 2012, a arguida XXX S.L. celebrou consigo própria um negócio através do qual foram transacionadas 726.652 acções do Banco ZZZ, volume correspondente a 4,22% da totalidade das acções dessa instituição bancária negociadas nesse dia, no Euronext Lisbon. Na sessão do dia 3 de Janeiro de 2013, a arguida XXX S.L. celebrou consigo própria um negócio através do qual foram transacionadas 3.296.815 acções do Banco ZZZ, volume correspondente a 5,38% da totalidade das acções dessa instituição bancária negociadas nesse dia, no Euronext Lisbon. Na sessão do dia 14 de Janeiro de 2013, a arguida XXX S.L. celebrou consigo própria um negócio através do qual foram transacionadas 4.036.223 acções do Banco ZZZ, volume correspondente a 1,52% totalidade das acções dessa instituição bancária negociadas nesse dia, no Euronext Lisbon. Na sessão do dia 16 de Janeiro de 2013, a arguida XXX S.L. celebrou consigo própria um negócio através do qual foram transacionadas 1.573.428 acções do Banco ZZZ, volume correspondente a 1,37% da totalidade das acções dessa instituição bancária negociadas nesse dia, no Euronext Lisbon. Na sessão do dia 18 de Janeiro de 2013, a arguida XXX S.L. celebrou consigo própria um negócio através do qual foram transacionadas 3.000.000 acções do Banco ZZZ, volume correspondente a 1,50% da totalidade das acções dessa instituição bancária negociadas nesse dia, no Euronext Lisbon. Na sessão do dia 24 de Janeiro de 2013, a arguida XXX S.L. celebrou consigo própria três negócios através dos quais foram transacionadas 801.846, 4.705.765 e 2.392.263 acções do Banco ZZZ, volume correspondentes a 1,59% da totalidade das acções dessa instituição bancária negociadas nesse dia, no Euronext Lisbon. Na sessão do dia 25 de Janeiro de 2013, a arguida XXX S.L. celebrou consigo própria quatro negócios através dos quais foram transacionadas 3.954.886, 896.141, 240.673 e 814.591 acções do Banco ZZZ, volume correspondentesa 2,85% da totalidade das acções dessa instituição bancária negociadas nesse dia, no Euronext Lisbon. O arguido AA desenvolve a sua actividade profissional como Investidor em bolsa desde meados dos anos 1990, principalmente nos mercados bolsistas de Espanha, mas também no resto das bolsas europeias e dos EUA. Nunca ao longo de todos estes anos o Arguido ou a XXX S.L. (nunca) tiveram quaisquer percalços com a Justiça - quer a nível judicial, quer regulatório - pautando antes a sua conduta pelo maior respeito pelas leis e regras do mercado, e sendo considerado por aqueles que com ele convive e trabalha uma pessoa honesta, séria e um ótimo profissional. O Arguido exerce a profissão de Empresário, auferindo cerca de 6.000€ por mês; vive em casa arrendada pela Sociedade arguida; tem dois filhos de 2 anos de idade. O Arguido e a Sociedade Arguida não têm antecedentes criminais. 2.2. – Matéria de facto não provada Com interesse para a decisão, não resultou provado: Da Acusação/Pronuncia - que o Arguido tivesse o propósito de, em qualquer das situações descritas, criar a aparência de que aqueles títulos estavam a ser transacionados em volume muito superior ao real; - que nas sessões do Euronext Lisbon realizadas entre 13 de Outubro de 2011 e 30 de Dezembro de 2011, o AA aí tenha feito inserir, através da conta n.º 117.GV.063653, da GVC Gaesco Valores, S.V., S.A., 17.129 ordens de compra de acções da Banco ZZZ, pela XXX S.L., em que fixou limite ao preço de aquisição; - que, simultaneamente, nas mesmas sessões do Euronext Lisbon, o AA aí fez inserir, através da conta n.º 117.GV.063653, da GVC Gaesco Valores, S.V., S.A., 22.546 ordens de venda de acções da Banco ZZZ, pela XXX S.L., em que fixou limite ao preço de alienação; - ou seja, que o Arguido tenha introduzido no mercado as ordens de compra e de venda constantes dos art.s 8 e 10 da Acusação; - que o Arguido tenha querido realizar as operações de auto contratação mencionadas, ciente de que não correspondiam a transações reais, sendo que não geram mais-valias, mas acarretam custos (como se reconhece no art.º 13); - que o Arguido tenha feito, e tido o propósito de fazer, com que o mercado Euronext Lisbon registasse níveis de liquidez das acções da Banco ZZZ superiores aos reais e, assim, levar os indivíduos que nele realizam transacções a tomarem as respectivas decisões de investimento com base em informações que sabiam não corresponder à realidade, nomeadamente quanto ao número de outros investidores que estavam a decidir vender e comprar tais títulos, e por que quantidades e preços o decidam fazer; - que o AA tenha actuado de forma livre, deliberada e consciente, com o intuito concretizado, de fazer introduzir no Euronext Lisbon ordens de compra e de venda de acções da Banco ZZZ configuradas a, pelo menos em parte, darem origem a negócios em que a arguida XXX S.L. assumiria, simultaneamente, a posição de vendedora e de compradora, e que, portanto, não correspondiam a transacções reais; - que, ao realizar os negócios acima descritos, em que a XXX S.L. assumiu, simultaneamente, a posição de vendedora e de compradora de 2,20% do total de acções da Banco ZZZ, em Outubro de 2011, de 12,22%, em Novembro de 2011, de 17,45%, em Dezembro de 2011, de percentagens entre os 0,00% e os 9,66% nas sessões de Julho de 2012 a Janeiro de 2013 acima identificadas, esta e o AA lograram fazer com que o mercado Euronext Lisbon registasse níveis de liquidez das acções da Banco ZZZ superiores aos reais, levando os indivíduos que nele realizam transacções a tomarem as respectivas decisões de investimento com base em informações que sabiam não corresponder à realidade, nomeadamente, quanto ao número de outros investidores que estavam a decidir vender e comprar tais títulos, e por que quantidades e preços o decidiam fazer; - que o Arguido tenha adoptado tal conduta com o propósito, e que o tenha logrado concretizar, de fazer com que o mercado Euronext Lisbon registasse níveis de liquidez das acções da Banco ZZZ superiores aos reais, e, assim, levar os participantes desse mercado a basearem as suas decisões de investimento em informações que sabia não corresponderem à realidade; - que o AA tenha actuado em nome próprio e em representação da Sociedade Arguida, de forma livre e consciente, bem sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei, o que não o impediu de assim proceder. 2.3. – Motivação O Tribunal formou a sua convicção com base nas declarações do AA sobre os factos, tendo o mesmo negado peremptoriamente qualquer intenção de manipular o mercado. Recordou o Arguido que, assim que receberam um mail da CMVM (30 de Dezembro de 2011), cancelou todas as ordens, e fez intervir o departamento de risco. No dia 2 de Janeiro seguinte, recebeu “sinal verde” para continuar a investir. Para reduzir ao mínimo o fenómeno (involuntário e, para si, oneroso) das operações de auto contratação, introduziram um equipamento dotado de uma linha que opera ponto a ponto, acompanhado por uma outra pessoa para exercer o controlo das ordens. Afirmou o Arguido: "Não víamos manipulação nestes negócios, porque nem eu nem os outros brokers estávamos conscientes disso. (...) Quando as acções de uma empresa valem muito existem poucas movimentações, então as máquinas tratam disso muitíssimo bem. Quando se trata de acções mais baratas, há grandíssimos volumes e as máquinas têm mais dificuldade em processar a informação. (...) No dia 30 [de Dezembro de 2011] recebemos a comunicação da CMVM, que era uma sexta-feira, e houve o período de festas, logo em seguida houve uma reunião na GVC para analisar estes riscos, a diferença entre a operação em Portugal e em Espanha, e como endereçar estes problemas. Foi tomada então a decisão de instalar a linha ponto a ponto. No primeiro dia de trabalho do ano seguinte já se estava a trabalhar para solucionar isto." O Arguido foi tentando controlar os negócios cruzados, e foi conseguindo, tendo reduzido os mesmos a um mínimo, e logrado chegar quase a zero. "Nunca tive intenção de cruzar ordens comigo mesmo." O Arguido esclareceu que as operações de auto contratação não se traduziam em qualquer benefício para a Sociedade Arguida; mas, bem ao invés, em perdas. Disse o Arguido: "Sempre que se introduz uma ordem de compra, para ganhar dinheiro é preciso de negociar com terceiros (...) não apenas porque isso tem custos, mas porque os rendimentos vêm é de conseguir negociar com terceiros.” Mais esclareceu o Arguido: "Quando introduzo uma ordem, não posso saber quantas execuções terá gerado. Tanto que as acções podem ser compradas por valores muito díspares; só quando a ordem for executada na íntegra é que ele fica a saber. Uma pessoa quando quer manipular um valor introduz ordens constantemente, para dar a sensação de que há "ganas de comprar ou de vender". O que eu faço é o oposto: eu coloco uma única ordem e não mexo mais nela." E, ainda: "Quando uma pessoa introduz a todo o momento, isso, para mim, é manipular o valor. No meu caso é apenas uma ordem com muitas execuções. Ponho uma ordem de compra ou de venda e espero que se execute completamente. Mas é só uma ordem e toda a gente a vê o seu código e percepciona que é uma ordem apenas. Ou está do lado das compras ou das vendas (...) O modo como introduzo as ordens não cria essa sensação (de que há "ganas de comprar ou de vender"). É uma ordem que entra no mercado e fica estática. Não dão uma aparência de um aumento do volume. Estão lá para ser negociadas, ninguém fica a pensar que deverá comprar ou vender por causa das minhas ordens. ". O AA, com a maior clareza, esclareceu que as operações em causa nos autos nunca poderiam ter sido por si forjadas; o mesmo não teria possibilidade de manipular as ordens dadas uma vez, encontrando-se as mesmas colocadas, e em plena interacção, com todos os demais investidores. Das detalhadas declarações do Arguido, formou o Tribunal a convicção de que o mesmo, com a sua conduta, não só não "provocou", como também não "contribuiu" para uma "alteração artificial do regular funcionamento do mercado" (nem da mesma foi feita qualquer prova concreta); bem como de que a mesma conduta não era sequer idónea a esse fim. Pelo seu detalhe, clareza, e pela forma serena com que o Arguido esclareceu os factos, mereceu o mesmo crédito ao Tribunal. Mais atendeu o Tribunal às suas declarações relativas às respectivas condições pessoais, familiares e profissionais. Atendeu o Tribunal ao depoimento de BB, Economista, a desempenhar funções na CMVM. O depoente esclareceu que elaborou o relatório de fls. 4 e ss., confirmando todas as informações do mesmo, e respectivos valores. Entendeu o depoente que o Arguido, enquanto scalper, tinha que ter um controlo de risco muito apertado. O depoente aludiu a uma introdução artificial de liquidez susceptível de influenciar o comportamento dos investidores, mas não logrou provar que, no caso concreto, tal tenha ocorrido. O depoente não se recorda de terem contactado com a GAESCO, e nunca contactou com o Arguido. Porém, reconheceu o depoente que "a XXX S.L. teve de pagar taxas de bolsa pela compra e pela venda, não é? Mesmo nestes negócios em que no fundo não há mais-valia nem menos valia nenhuma, mas teve de pagar uma taxa à bolsa para fazer estes negócios. Portanto, até nesse aspecto não há racionalidade económica absolutamente nenhuma associada a eles." Sendo que o depoente não conseguiu assinalar uma intenção manipulatória ao Arguido, salientando, apenas, a existência de operações atípicas na operativa da Sociedade Arguida; mas, não logrando reconduzi-las a uma vontade do Arguido direcionada ao objectivo de interferir artificialmente no mercado; bem como não conseguindo afastar a possibilidade de aquelas auto contratações resultarem de um erro informático, e ignorando qualquer esforço do Arguido para vencer esse problema (pois nunca falou com o mesmo). Afirmou o depoente "(...) o que é facto é que estas transacções fictícias foram feitas. Agora, essa parte de sistemas ao certo; como é que se passou, o que é que se passou, eu isso não sei...". Confrontado pela Ilustre Mandatária do Arguido com a possibilidade de ter apurado números, e não mais, reconheceu o depoente: “CC (DR) - Mas a minha pergunta é: o Senhor Dr. alguma vez ponderou o cenário de que a XXX S.L. considerasse - ou não considerasse... -, que estes negócios consigo própria fossem ilícitos e, portanto, assumisse isso como um custo da operação? BB (CC) – Não. DR - Nunca? CC - Não, porque em função da quantidade e da... DR - Acha que isso era um cenário que não era possível? CC - Até podia ser outra coisa; podia ser alguém a querer fazer liquidez que não existia. DR - Sim, isso deixou claro; deixou claro. CC - Não, mas ser alguém que até encomendasse; alguém que estivesse por trás da XXX S.L. a dizer: "vocês põem..."; aliás, não foi até isso que aconteceu com o Banco ZZZ quando houve aquele processo grande - mega processo - em Tribunal? DR - Não sei. CC - Não sabe? Das 17 offshores... DR - Então, mas o sr. Dr. está... Oh senhor Dr., diga-me lá... CC - Estava a negociar com a carteira do próprio banco... DR - Certo, e como é que funcionava nesse caso? Era uma sociedade com um intermediário...? CC - Eram 17 sociedades. DR - Então Dr., como é que está a comparar essas realidades? CC - (imperceptível) DR - Mas como é que está a comparar... é que não pode dar um exemplo de 17 offshores para me dizer que é a mesma situação de uma sociedade - uma - com um intermediário. Ou diz-me que é o mesmo? Para si é tudo o mesmo? CC - Não. Pode ser ou pode não ser. Naquele caso a ideia era dar uma noção de liquidez aparente que o Banco ZZZ fazia (imperceptível) internacionais. DR - Certo. CC - E porque o sector bancário tinha uma quebra no mundo e as acções do Banco ZZZ foram de alguma forma sustentadas através dessa estratégia; e neste caso eu não sei o que é que se passou. DR - Pois, claro... CC - O que sei é que este negócio... DR - Mas não sabe o que se passou, mas pondera que eventualmente até podia ser uma situação destas... CC - Podia ser! DR - Claro. CC - Eu quando estou a investigar tenho de pôr as várias hipóteses. DR - Mas não pôs esta; este cenário que eu lhe pus. CC - (imperceptível) DR - Não - ser um erro assumido pelo cliente. CC - Um erro assumido pelo cliente? DR - Sim - dizer: é uma ineficiência do sistema e eu assumo esta menos-valia no cômputo das minhas mais-valias. Esse cenário: que o cliente sempre quis realizar transacções com outras pessoas e que por insuficiência do sistema não o fez - esse cenário nunca o colocou. CC - Não. Não por uma simples razão: eu coloquei-o inicialmente, mas depois pensei: 790 operações em três meses? DR - E as de 2012? Uma por sessão; duas por sessão? CC – Pois. DR - É proibido... CC - Pois, mas não é proibido também? DR - Pois, voltamos sempre ao mesmo: é proibido. (...) CC - É, no fundo é isso... Eu também não sei se o Senhor AA alguma vez tentou contactar a CMVM, não sei... Ou a ... espanhola... DR - Ou se alguma vez fez alguma coisa... essa parte não sabe nada... CC - Não sei." A circunstância de o depoente se ter bastado com o apuramento de números, sem procurar mais informação e, nomeadamente, sem procurar ouvir o Arguido, para esclarecer a razão de ser das auto contratações detectadas, e sem procurar saber o que o Arguido tinha em mente, e/ou se tinha já diligenciado por corrigir a situação, o que seria, desde logo, bastante pedagógico (caso o próprio Arguido não o tivesse, já, feito; e fê-lo, imediatamente, assim que foi alertado pela CMVM), são fragilidades na investigação feita pelo depoente que, no entender do Tribunal, fragilizam, nomeadamente, o seu depoimento. No que à Defesa diz respeito: Atendeu o Tribunal ao depoimento de DD, Compliance na GVC Gaesco, o qual não conhece pessoalmente o Arguido. Esclareceu que a Sociedade Arguida é cliente da GVC. Recordou o depoente que, no final de 2011, houve contactos da CMVM, e pedidos de informação quanto à Sociedade Arguida; pedidos de informação que não incluíam a indicação de que se tratasse de apurar infracções. No entanto, no final de 2011, a Sociedade Arguida encerrou posições, para evitar equívocos com o Regulador português. Posteriormente, a Sociedade Arguida continuou a operar, e não só com o mercado português. A Sociedade Arguida usava um rooter de ordens que enviava à GVC. Ainda recordou o depoente que, no início de 2012, a Sociedade Arguida introduziu novos mecanismos (equipamentos com filtros nos rooters) para evitar operações que pudessem gerar indícios de manipulação, e de auto contratação. Sendo que a GVC punha à disposição dos clientes vários fornecedores de equipamentos. Na GVC, não tiveram indícios de irregularidade, por parte da Sociedade Arguida e do Arguido. Estes, quando abriram as contas, optaram por equipamentos GL. Na GVC detêm essa informação, porque quando o Arguido e a Sociedade Arguida inseriam ordens, havia a indicação do rooter GL. Recordou o depoente que fizeram um estudo intenso da actividade do cliente: analisaram operação a operação. O depoente teve conhecimento de algumas operações de auto contratação, mas de muito pequeno volume, em relação à operação em geral, não havendo indícios de tentativa de criar tendências. Mais esclareceu que era impossível que o cliente pudesse evitar a auto contratação; o cliente não vê quem são os que vão executar a ordem; é impossível o cliente limitar a si mesmo a execução das ordens. Não podemos, aqui, falar de uma operação de wash trade, pois, como explicou o depoente, uma wash trade “É o uso de um valor fictício por relação a um determinado valor, feito para transmitir uma ideia, uma aparência ao mercado, tentando criar uma aparência em relação a determinado título.” Mais esclareceu, por referência à auto contratação, que, só após a liquidação, cinco dias depois, há sinal da mesma. Na operativa intra diária, o cliente abre e fecha as posições no mesmo dia. Na GVC, têm ferramentas de controle para detectar manipulação, nomeadamente, controles programados. Esclareceu, por fim, que desde 2012, a GL introduziu melhorias nos rooters, para impedir a auto contratação. E o depoente não tem conhecimento de outros casos posteriores. O depoente crê ter visto um mail que o Arguido, neste contexto, enviou ao gerente da GL; e tem a ideia de outras operações terem sido bloqueadas. Dentro daquela que é a sua área profissional, do que foi do seu conhecimento e logrou esclarecer, uma vez que a Sociedade Arguida é sua cliente, a testemunha afigurou-se objectiva e isenta, tendo prestado um depoimento esclarecedor. Pelo que mereceu inteiro crédito ao Tribunal. Atendeu o Tribunal ao depoimento de EE, Economista, com 20 anos de experiência no sector Financeiro, o qual conhece o Arguido por estar no mercado. O depoente esclareceu que foi o autor do parecer técnico pericial de 20 de Julho (cfr. doc. 1, junto com a contestação), e mantém o que escreveu. A actividade de scalper (sendo que o scalping consiste em efectuar operações de forma muito rápida) pode conduzir àqueles “encontros” – auto contratação. Porém, o volume de transacções, para ser significativo, tinha que vir acompanhado de dinheiro avultado. Mais ou menos volume não determina nenhum tipo de decisão. E 2% não alterariam a percepção do investidor. Quando se coloca uma ordem no mercado, não se sabe quantas execuções vai a mesma gerar; é impossível conhecer de antemão o resultado. Recordou o depoente que analisou a actividade do Arguido, enquanto profissional, num período determinado; sendo que este lhe passou a informação a respeito do problema que se colocara. Definiu o Arguido como uma pessoa com boas intenções, só tem boas referências do mesmo, e a sua conduta nunca lhe suscitou nenhum tipo de desconfiança. Pelo que concluiu que o mesmo não teve qualquer intervenção naquelas operações. O depoente, perante a questão que lhe foi colocada pelo Arguido, analisou as transacções que foram realizadas, a lista das operações, o comportamento de outros bancos, e algum tipo de irregularidade. Por fim, descartou a possibilidade de manipulação, por parte do Arguido. Dentro daquela que é a sua área profissional, do que foi do seu conhecimento e logrou esclarecer, uma vez que conhece o Arguido do mercado, a testemunha afigurou-se objectiva e isenta, tendo prestado um depoimento esclarecedor. Pelo que mereceu inteiro crédito ao Tribunal. Atendeu o Tribunal ao depoimento de FF, Economista e mulher do Arguido. A depoente esclareceu que trabalhou para o Arguido desde 2001: fazia contabilidade, ordens de mercado, e de tudo um pouco. Afirmou que, sem querer, ocorrem auto contratações, por vezes não funciona a máquina (e houve problemas com as máquinas); o que, mesmo agora, por vezes acontece. Mas, em 2011/2012, ocorria com frequência. Entende que não era expectável que 790 operações (sendo que todas elas se cruzaram com terceiros) fossem alterar o mercado, nem que 2,20% afectasse qualquer investidor. Também recordou que, em final de Dezembro, receberam um aviso (da CMVM). A XXX S.L. (que pode ser classificada como scalper) não ganha nada com as auto contratações; pelo contrário, perde. No início e no final do dia, afirmou a depoente que nunca deram nenhuma ordem falsa, de compra ou de venda. A depoente explicou, por referência aos documentos juntos com a Contestação, e pela própria elaborados, o seguinte: Doc. 2 - análise das 790 operações do lado da ordem de compra Doc. 3 - análise das 790 operações do lado da ordem de venda doc. 4 - relação temporal entre OC e OV – Doc. 2 e 3 e Doc. 5 - (operações de auto contratação): "CC - Quantas operações temos em que a diferença vai de uma hora a um dia? FF (EL) - 112. Na coluna 8 lê-se 155 menos 43, que estão na coluna 2. DR - Estes números que aqui estão neste doc 4 (...) significa que entre as várias operações aí referidas houve mais de 10 segundos de intervalo [entre as ordens]? E depois 5 minutos, e depois 30 minutos, e depois entre 30 minutos e uma hora; entre 15 a 30 minutos; entre 5 minutos e 15 minutos; entre 1 a 5 minutos; menos que um minuto; EL – Sim. DR - Essas 20 ordens quretêm diferença de 10 segundos ou menos entre a ordem de compra e a de vende, pode dizer-se que foram colocadas em simultâneo? EL - 10 segundos para um investidor é muitíssimo tempo. Simultâneo é 0,0000, porque na bolsa falamos de nano- segundos. Um segundo para nós é o mundo inteiro. DR - Doc. 5 (...) o que é que vemos nesse quadro? EL - Podemos ver a data de execução, a hora da ordem e na terceira coluna são todas as auto-execuções e na quarta coluna são o n.° de títulos de auto-execuções e na última coluna a diferença da hora entre a ordem de compra e a ordem introduzida do lado da venda. DR - O que conseguimos concluir daqui? (...) Todos estes números são a diferença horária entre a ordem de compra e a de venda? EL - Sim. DR - Há alguns quadrados que não têm nada. O que significa? EL - São dias diferentes. Os que não têm nada referem-se a sessões diferentes. DR - Voltando ao tempo do quadro 4, qual é a média entre a ordem de compra e a ordem de venda? EL - 34 minutos e 31 segundos. DR - Durante esse período de tempo o que acontece à ordem? EL - Está no mercado, introduzida do lado da compra ou da venda, e nesse tempo médio de 34 minutos e 31 segundos, a ordem pode ser negociada (vendida ou comprada por terceiros) DR - Tem alguma ideia destas 790 operações, quantas se cruzaram com terceiros? EL - Cruzaram-se todas com terceiros. 100%" E mais que isso, "91,5% dos títulos foram negociados por terceiros", o que resulta da "coluna 17 - acima em vermelho tem 91,75%". A depoente esclareceu, ainda, que no Documento nº5 se vê que, mesmos entre as auto contratações, o tempo médio é de 27 minutos. Ou seja, entre as execuções das ordens, o tempo médio é de largos minutos. Donde, é impossível alguém querer assegurar uma manipulação de mercado quando há tanto tempo de permeio entre ordens, e entre ordens e execuções. E entre as próprias execuções. A testemunha prestou um depoimento claro, alicerçado nos factos que bem conhece, pois elaborou, nomeadamente, os referidos documentos, por referência à matéria em apreço, no âmbito do seu trabalho com o Arguido. Afigurou-se objectiva e isenta, não obstante ser a sua mulher, e mereceu inteiro crédito ao Tribunal. Atendeu o Tribunal aos documentos juntos aos autos, mormente: - Relatório de Indícios, elaborado pela CMVM, de fls. 4 e ss.; - Documentos de fls. 23, 27 a 33, 36 a 38; - Conteúdo dos CD-R’s de fls. 25, 35, 46 e 235; - Informação complementar de fls. 47; - Exposição de fls. 232 (traduzida de fls. 263 a 268); - Documentos de fls. 236 a 253, 271 e 272; -Acusação do processo de contra-ordenação n.º 11/2013, de fls. 296. Bem como aos documentos juntos pela Defesa, com destaque para aqueles que foram elaborados pela testemunha FF, e melhor esclarecidos pela mesma em audiência de julgamento, bem como o parecer técnico da autoria de EE, e reiterado pelo mesmo em audiência. Antecedentes criminais: C.R.C. junto aos autos. O elenco dos factos não provados encontra o seu fundamento na fragilidade da prova da Acusação, nomeadamente da prova testemunhal, nos termos que assinalámos ao lacunar depoimento de BB, radicado numa limitada investigação; por contraste com a consistente prova da Defesa, quer produzida pelas testemunhas por si arroladas, quer pelas declarações do próprio Arguido; sendo que Arguido e testemunhas de Defesa se mostraram credíveis, consistentes e conhecedores da matéria em causa.” * * III – Da análise dos fundamentos do recurso Como é sabido, e resulta do disposto nos art.º 368º e 369º ex-vi art.º 424º nº 2, todos do Código do Processo Penal, o Tribunal da Relação deve conhecer das questões que constituem objecto do recurso pela seguinte ordem: Em primeiro lugar das que obstem ao conhecimento do mérito da decisão. Seguidamente das que a este respeitem, começando pelas atinentes à matéria de facto, e, dentro destas, pela impugnação alargada, se tiver sido suscitada e depois dos vícios previstos no art.º 410º nº 2 do Código do Processo Penal. Por fim, das questões relativas à matéria de Direito. Será, pois, de acordo com estas regras de precedência lógica que serão apreciadas as questões suscitadas pelo recorrente. Começaremos, no entanto, por fazer uma referência à conclusão 9ª em que o recorrente refere existir a ausência de exame crítico da prova É, desde logo, patente que a razão não assiste ao recorrente. Só se verifica a nulidade por falta de fundamentação quando esta falte de todo. Apenas a absoluta falta de fundamentação integra a previsão da al. a) do n.º 1 do art.º 379.º e n.º 2 do 374.º do CPP, e não a sua menor perfeição – constituindo a erroneidade dessa motivação fundamento para impugnação nos termos do art.º 412.º do CPP ou eventualmente nulidade, prevista no art.º 410.º/2 do mesmo código. O acórdão recorrido mostra-se motivado de forma suficiente, contendo uma análise coerente e lógica dos meios de prova produzidos e da valoração de que foram objecto. Contudo, sempre se dirá que a lei não exige que o tribunal fundamente facto a facto. E no caso concreto, diga-se, o Tribunal não o fez porque não carecia de o fazer, pois eles estavam relacionados ou eram a conclusão de outros já motivados. Vejamos: o dever de fundamentação das decisões em matéria processual penal encontra-se consagrado nos art.ºs 97.º, n.º 5 e 374º nº 2, ambos do CPP, sendo que que este último, relativo à fundamentação da sentença, determina que a mesma contenha exposição, tanto quanto possível completa, ainda que concisa, dos motivos, de facto e de direito, que fundamentam a decisão, com a indicação e exame crítico das provas que serviram para formar a convicção do tribunal. Como é sabido a indicação e exame crítico das provas não se satisfaz com a mera indicação do meio de prova determinante da formação da convicção do tribunal; nem tão pouco com o resumo ou súmula do depoimento da testemunha que determinou tal convicção. O que se exige é que o tribunal explique o porque da decisão. Porque razão tais factos foram julgados provados ou não provados com base naquele meio de prova e não provados ou provados com base noutro meio de prova produzido nos autos; porque razão o tribunal valorou aquele meio de prova e não outro. O que significa que este dever de fundamentação implica necessariamente o exame crítico da prova, consagrado aliás no referido normativo legal. Aliás, este exame crítico encontra-se relacionado e é exigido pelo princípio da livre apreciação da prova, consagrado no art.º 127º do CPP. Na verdade, inexistindo regras legais que fixem o valor de cada prova ou qualquer hierarquia entre elas (com excepção da prova tarifada: confissão integral e sem reservas do arguido; da prova pericial e dos documentos autênticos), e sendo admissíveis todos os meios de prova, e bem assim as presunções judiciais, desde que não proibidos por lei (art.º 126º do CPP e 32.º, n.º 8 da CRP), o juiz tem que justificar e demonstrar que a análise e valoração da prova que realiza e que determina a sua convicção é imparcial, independente, legal não arbitrária, alicerçada num processo lógico-racional conforme às regras da experiência e da lógica (art.º 127.º do CPP). Esta análise crítica das provas permite ao juiz demonstrar que a sua decisão não se mostra motivada por convicções sem base probatória, provas inadmissíveis, bias, preconceitos, crenças ou pré-julgamentos, em conformidade com os princípios da independência, interna e externa, e imparcialidade inerentes à função de julgar, constituindo de igual modo um factor de protecção do próprio julgador, que expõe e justifica o seu processo valorativo. A este propósito vejam-se os sumários de alguns arrestos do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos (TEDH): 9. De acuerdo con su jurisprudencia constante, que refleja un principio vinculado a la administración de justicia, las decisiones judiciales deben estar suficientemente motivadas (Papon c. Francia (dec.)). 110. La motivación tiene por finalidad demostrar a las partes que han sido escuchadas y, así, contribuir a que estén más dispuestas a aceptar la decisión. Además, obliga al juez a basar su razonamiento en argumentos objetivos y preserva los derechos de defensa. No obstante, el alcance del deber de motivación puede variar en función de la naturaleza de la decisión y debe ser analizado a la luz de las circunstancias del caso (Ruiz Torija c. España, párrafo 29). 111. Aunque un tribunal no esté obligado a dar una respuesta detallada a cada argumento presentado (Van de Hurk c. Países Bajos, párrafo 61), debe quedar claro en la decisión que se han abordado las cuestiones fundamentales del caso (véase Boldea c. Rumanía, párrafo 30) [Guía del artículo 6 del Convenio Europeo de Derechos Humanos, Derecho a un proceso equitativo (parte penal) disponível in https://www.echr.coe.int/Documents/Guide_Art_6_criminal_SPA.pdf. ] Por tudo isto, e dada a essencialidade deste requisito da sentença/acórdão, a sua omissão fere de nulidade a decisão, como expressamente comina o art.º 379º nº 1 al. a) do CPP. No caso, verifica-se que a motivação é clara, com indicação precisa das provas em que o Tribunal a quo se alicerçou, sendo estas analisadas de forma crítica, sempre com apelo às regras da experiência. O Tribunal não teve, nem tem de analisar todos os factos individualmente. Referiu expressamente porque aceitava uma das versões que lhe foi presente. Ou seja, em harmonia com o exigido pelo art.º 374.º, n.º 2 do CPP. Como exemplarmente se decidiu no Ac. STJ, de 09-02-2012, Proc. 1/09.3FAHRT.L1.S1, in www.dgsi.pt “A sentença, segundo o modelo paradigmático do art.º 374.º, n.º 2, do CPP, leva a cabo a narrativa, condensada na fundamentação, de facto e de direito, especificando os factos provados e não provados, com o propósito de assegurar que todos os factos resultantes da acusação e da defesa e emergentes da decisão da causa foram objecto de apreciação, bem como de uma exposição, tanto possível completa, ainda que concisa, das razões de facto e de direito que fundamentam a decisão, seguindo um exame crítico das provas que serviram para fundamentar a convicção. Essa motivação é o resultado da livre apreciação da prova, que sem limitar o juiz o corresponsabiliza, levando a um “salutar autocontrole“ (cfr. Sérgio Poças, Da Sentença Penal, Fundamentação de Facto, Rev. Julgar, Setembro –Dezembro de 2007, T3, pág. 35), da legalidade e justiça das provas, explicitando às partes e ao Tribunal de recurso as suas razões decisórias, concorrendo para a celeridade processual, bem como à comunidade as razões da decisão. O exame crítico das provas é, em resultado de um juízo apriorístico sobre o seu valor, o pressuposto de formulação de uma relação de igualdade entre elas ou hierárquica, a fundamentar o porquê de umas merecerem o mesmo valor ou valor superior a outras, conducente ao seu detrimento, na formação da convicção probatória, levando, ainda ao conhecimento das provas que foram apreciadas, para, a final, se conhecer o processo lógico-racional, em globo, seguido pelo juiz”. Em suma, e para o que releva neste caso, o cumprimento do dever de fundamentação da matéria de facto não exige a motivação facto a facto, especialmente quando um determinado meio de prova é susceptível de demonstrar mais do que um facto. Assim, improcede o recurso nesta parte. O recorrente aponta à decisão recorrida os vícios do art.º 410º nº 2 al. b) do C.P.P. O art.º 410.º n.º 2 do Código de Processo Penal, estabelece a possibilidade de o recurso se fundamentar na insuficiência da matéria de facto provada para a decisão; na contradição insanável da fundamentação ou entre esta e a decisão, ou no erro notório na apreciação da prova, «mesmo nos casos em que a lei restrinja a cognição do tribunal de recurso a matéria de direito». A apreciação destes vícios não implica qualquer sindicância à prova produzida, no Tribunal de primeira instância, porque envolve apenas a análise do texto da decisão recorrida, na sua globalidade, sem recurso a quaisquer elementos que lhe sejam externos, ainda que constem do processo. Apenas as regras de experiência comum podem servir de critério de aferição da sua existência. Repete-se: os vícios em questão têm de resultar do texto da decisão e não de quaisquer elementos externos à mesma. Assim, o constante da conclusão 5ª (desvalorização do relatório de indícios elaborado pela CMVM, de fls. 4, documentos de fls. 23, 35,46 e 235, informação complementar de fls. 47, exposição de fls. 232, 263 a 268, documentos de fls. 236 a 253, 271 e 272), 17ª (declarações do arguido e sua valoração), 18ª (declarações da testemunha BB e “documentos” – quaisquer que sejam – juntos aos autos”) e 26ª (declarações do arguido) não constituem fundamento deste tipo de impugnação da matéria de facto. Poderia, eventualmente, fundamentar uma impugnação nos termos do art.º 412º do C.P.P. mas para tal os requisitos e pressupostos são diferentes e não foram minimamente invocados. Ora, dito isto e quanto à suposta contradição. A contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão, corresponde, genericamente, à afirmação simultânea de uma coisa e do seu contrário, vale por dizer, quando se considera provado e não provado o mesmo facto, ou quando se dão como provados factos antagónicos ou quando esse antagonismo intrínseco e inultrapassável se estabelece na fundamentação probatória da matéria de facto, ou entre a fundamentação e a decisão, a ponto de se tornar evidente, a partir da simples leitura do texto que dessa fundamentação deveria resultar decisão oposta àquela que foi tomada. «Para os fins do preceito (al. b) do nº 2) constitui contradição apenas e tão só aquela que, como expressamente se postula, se apresente como insanável, irredutível, que não possa ser ultrapassada com recurso à decisão recorrida no seu todo, por si só ou com o auxílio das regras da experiência. As contradições insanáveis que a lei considera para efeitos de ser decretada a renovação da prova são somente as contradições internas, rectius intrínsecas da própria decisão considerada como peça autónoma» (Simas Santos e Leal Henriques Código de Processo Penal Anotado, pág. 739). Verificar-se-á sempre que «(…) no texto da decisão constem posições antagónicas ou inconciliáveis, que se excluam mutuamente ou não possam ser compreendidas simultaneamente dentro da perspetiva de lógica interna da decisão, tanto na coordenação possível dos factos e respetivas consequências, como nos pressupostos de uma solução de direito» (Ac. do STJ de 12.03.2015, processo n.º 418/11.3GAACB.C1.S1. No mesmo sentido, Acs. do STJ de 20.9.2017, proc. 596/12.4JABRG.G2.S1; de 5.09.2018, proc. 2175/11.4TDLSB.L1.S1, de 03.04.2019, processo 38/17.9JAFAR.E1.S1, de 25.09.2019, proc. 60/2017.5 JAFAR.E1.S1, in http://www.dgsi.pt). Pode, pois, existir contradição insanável, não só, entre os factos dados como provados, mas também entre os dados como provados e os não provados, como entre a fundamentação probatória da matéria de facto e a decisão (Germano Marques da Silva, in “Curso de Processo Penal”, Editorial Verbo, 1994, vol. III, pág. 325). «A contradição da fundamentação ou entre esta e a decisão só importa a verificação do vício quando não seja suprível pelo tribunal ad quem. Isto é, quando seja insanável. (…) A contradição tanto pode emergir entre factos contraditoriamente provados entre si, como entre estes e os não provados («provado que disparou», «não provado que disparou»), como finalmente entre a fundamentação (em sentido amplo, abrangendo a fundamentação de facto e também a de direito) e a decisão. É exemplo deste último tipo de contradição, a circunstância de a sentença se espraiar em considerações tendentes à irresponsabilidade penal do arguido e a decisão final concluir, sem mais explicações, por uma condenação penal, ou vice-versa. Por vezes a contradição surpreende-se até no modo como se apresenta a fundamentação da matéria de facto, quando essa fundamentação resulta contraditória com a solução de facto encontrada.» (Pereira Madeira, Código de Processo Penal Comentado, cit., 2.ª ed., 2016, a págs. 1274-1275, em anotação ao artigo 410.º). Ora, lida a decisão não se pode dizer que exista a afirmação de “uma coisa e o seu contrário”, nem que o que foi afirmado ou negado é contraditado pela fundamentação do mesmo facto. Aliás, não só tal contradição não se surpreende do texto da decisão como o próprio recorrente nem sequer aponta a contradição, isto é, não refere onde é que, na sua opinião a contradição existe. O que o recorrente refere é que os factos, tal como afirmados são suficientes para a condenação porque o tipo apenas existe a criação do perigo (vide conclusão 14ª). Contudo, tal não se traduz em qualquer contradição ou vício do art.º 410º do C.P.P. mas sim numa errada subsunção/ qualificação jurídica, matéria a abordar infra. Improcede, assim, o recurso nesta parte. O recorrente sustenta também a verificação de erro notório na apreciação da prova. O erro notório na apreciação da prova supõe que do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugado com o senso comum, deflua de forma fácil, evidente e ostensiva que factualidade ali exarada é arbitrária, contrária à lógica, a regras científicas ou de experiência comum, ou assenta na inobservância de regras sobre o valor da prova vinculada, ou das leges artis (Acs. do STJ de 12.03.2015, processo 40/11.4JAAVR.C2; de 06.12.2018, processo 22/98.0GBVRS.E2.S1 e de 03.04.2019, processo 38/17.9JAFAR.E1.S1 e Simas Santos e Leal Henriques, in “Recursos em Processo Penal, 7ª ed., 2008, Editora Rei dos Livros, pág. 77). «Verifica-se erro notório na apreciação da prova quando se retira de um facto dado como provado uma conclusão logicamente inaceitável, quando se dá como provado algo que está notoriamente errado, que não podia ter acontecido, ou quando, usando de um processo racional e lógico, se retira de um facto dado como provado uma conclusão ilógica, arbitrária e contraditória, ou notoriamente violadora das regras da experiência comum (…)» (Leal-Henriques e Simas Santos no Código de Processo Penal Anotado, vol. II, 2ª edição, pág. 740, em anotação ao artigo 410º). «É o erro ostensivo, de tal modo evidente que não passa despercebido ao comum dos observadores, ou seja, quando o homem de formação média facilmente dele se dá conta» (Germano Marques da Silva – Curso de Processo Penal, Vol. III, pág. 341). «O “erro notório na apreciação da prova” constitui uma insuficiência que só pode ser verificada no texto e no contexto da decisão recorrida, quando existam e se revelem distorções de ordem lógica entre os factos provados e não provados, ou traduza uma apreciação manifestamente ilógica, arbitrária, de todo insustentável, e por isso incorrecta, e que, em si mesma, não passe despercebida imediatamente à observação e verificação comum do homem médio» (Ac. do STJ de 06.10.2010 Proc. n.º 936/08.0JAPRT.P1.S1. No mesmo sentido, Acs. do STJ de 20.11.2014, processo 87/14.9YFLSB e de 13.03.2019, processo 2400/11.1TASTB.E1.S1, in http://www.dgsi.pt ). Ora, a própria definição do vício desde logo permite afirmar que o mesmo não se verifica pois que, do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugado com o senso comum, não deflui de forma fácil, evidente e ostensiva que factualidade ali exarada é arbitrária, contrária à lógica, a regras científicas ou de experiência comum, ou assenta na inobservância de regras sobre o valor da prova vinculada, ou das leges artis e nem sequer o recorrente refere onde é que tal se verifica. E agora, 51 páginas depois, chegamos ao verdadeiro “busílis” que mais não é o saber se os factos apurados são subsumíveis ao tipo. Dispõe o art.º 379º nº 1 do Código dos Valores Mobiliários que “Quem divulgue informações falsas, incompletas, exageradas, tendenciosas ou enganosas, realize operações de natureza fictícia ou execute outras práticas fraudulentas que sejam idóneas para alterar artificialmente o regular funcionamento do mercado de valores mobiliários ou de outros instrumentos financeiros, é punido com pena de prisão até 5 anos ou com pena de multa.” No caso que nos ocupa não restam dúvidas que as operações em causa eram fictícias já que estamos a falar da compra e venda de acções por parte da mesma entidade (embora através de intermediário). Perguntar-se-á: se se comprava e vendia à mesma pessoa e a operação era efectuada por essa mesma pessoa, qual o objectivo. Com certeza não era pagar comissões. Esta suspeita é válida, sustenta a existência do inquérito e até, quiçá a acusação e a pronúncia. Contudo, em julgamento é necessário provar algo mais. Ter-se-á de provar que as operações levadas a cabo eram idóneas para alterar artificialmente o regular funcionamento do mercado de valores mobiliários ou de outros instrumentos financeiros. Ora, é esta prova que não foi feita. Na verdade, o Ministério Público tem razão, quando refere na conclusão 14ª, que basta a prova de que o arguido desenvolveu uma prática que é em si idónea, a ter impacto sobre a liquidez para a percepção que o mercado, os investidores globalmente considerados, têm de determinado título. Acontece que a prática aqui em causa tem de assumir um volume que cause nos demais operadores a percepção de que existe uma grande volatilidade nos títulos e uma transacção inusitada dos mesmos de molde a ser criada uma falsa percepção sobre o devir dos mesmos. Ora, embora se prove a operação, embora se aceite que a prática é incorrecta, a mesma nunca assumiu uma proporção tal que permita dizer que, mesmo em termos abstractos ela foi idónea a ter impacto sobre a liquidez e percepção de que os investidores têm sobre o título. E tanto basta para que o recurso improceda. * V - Dispositivo Por todo o exposto, acorda-se neste Tribunal da Relação em julgar improcedente o recurso interposto e, consequentemente, manter a decisão recorrida. Sem custas por delas estar isento o Ministério Público. Notifique. Acórdão elaborado pelo 1º signatário em processador de texto que o reviu integralmente sendo assinado pelo próprio e pelos Venerandos Juízes Adjuntos. Lisboa e Tribunal da Relação, 9 de Abril de 2025 Rui Miguel de Castro Ferreira Teixeira Ana Rita Loja Alfredo Costa |