Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRL00001867 | ||
Relator: | NORONHA NASCIMENTO | ||
Descritores: | EXECUÇÃO INEPTIDÃO DA PETIÇÃO INICIAL TÍTULO DE CRÉDITO TÍTULO EXECUTIVO IMPOSTO DE SELO | ||
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Nº do Documento: | RL199201230052872 | ||
Data do Acordão: | 01/23/1992 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO. | ||
Decisão: | REVOGADA A DECISÃO. | ||
Área Temática: | DIR COM - TIT CRÉDITO. DIR TRIB - DIR FISC. DIR PROC CIV - PROC ESP. | ||
Legislação Nacional: | CPC67 ART193 ART272 ART273 ART813. LULL ART48 N3. TGIS32 ART120 A. | ||
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Sumário: | A ineptidão da petição inicial não é conceito que se possa transpor literalmente para a acção executiva, já que nada do previsto no art. 193 do Código de Processo Civil é susceptível de acontecer nesta acção. O que na acção executiva corresponde à ineptidão da petição inicial é a inexequibilidade do título, que acontece quando o pedido se não contém no conteúdo do título. O requerimento para a execução estabelece o que o exequente peticiona não sendo lícito que o exequente, na contestação de embargos de executado, amplie o pedido. Assim, se no requerimento da execução o exequente pede dado capital e respectivos juros não lhe é admitido que na contestação de embargos peça o que dispendeu em imposto de selo. O imposto do selo a que se refere o art. 120 - A da Tabela Geral do Imposto do Selo só é devido por quem beneficia da operação bancária o que não é o caso do avalista o qual por aquele imposto não é responsável. O avalista responde da mesma forma que o avalisado no âmbito cautelar do direito cambiário, mas não no âmbito do direito fiscal. | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa: Banco Fonsecas e Burnay propôs execução para pagamento de quantia certa com processo ordinário contra "Franco Farmacêutica Lda" agora denominada "Biofranco - Indústria de Química Fina Lda" e contra (C) e (D). Citados, os executados embargaram a execução, arguindo que os juros de mora vencidos ascendem a 6008218 escudos e não a 6587035 escudos como vem peticionado. Na contestação, o exequente - embargado explicita que a quantia peticionada (e que o embargante afirma estar a mais) se reporta ao imposto de selo e não a juros de mora vencidos. A final, os embargos foram julgados improcedentes. Inconformados, os embargantes apelaram, concluindo as suas alegações de recurso da seguinte forma: a) no requerimento para a execução, o embargado limitou-se a pedir o pagamento da quantia exequenda e juros vencidos; b) não pediu, assim, o imposto de selo; c) ao pretender receber quantias não requeridas, há ineptidão do requerimento inicial para a execução, o que acarreta nulidade do processo, nulidade esta de conhecimento oficioso; d) ao não conhecer desta nulidade, a sentença é, também ela, nula; e) o Mmo. Juiz violou também o disposto no artigo 664 do Código de Processo Civil, por se servir de factos não articulados no requerimento inicial; f) o despacho recorrido violou os artigos 193, 201, 202, 660, 664 e 668, todos do Código de Processo Civil. Pede, desta forma, o provimento do agravo com a declaração de nulidade do processo. O embargado, por sua vez, pronuncia-se pela confirmação do julgado. Os factos que importa reter são os seguintes: 1) o exequente, Banco Fonsecas & Burnay propôs execução para pagamento de quantia certa com processo ordinário contra os embargantes - executados; 2) no seu requerimento para a execução o exequente pede a citação dos executados para em 10 dias pagar a quantia de 85000000 escudos e ainda 6587035 escudos de juros de mora vencidos, num total de 91587035 escudos; 3) este pedido baseia-se no título executivo junto, consubstanciado numa livrança de 85000000 escudos subscrita pela executada "Biofranco" e avalisada pelos executados (C) e (D); 4) deduzidos embargos, veio a exequente contestá-los; nos embargos, os executados afirmam que os juros de mora vencidos montam a 6008218 escudos e não a 6587035 escudos; na contestação, a exequente esclarece que a quantia pedida a mais se reporta a imposto de selo e não a juros de mora; 5) no saneador-sentença, o Mmo. Juiz considerou que o imposto de selo é devido pelos executados e, nessa medida, julgou improcedentes os embargos. 1) Dentre as várias questões que se levantam, em sede de recurso, há que começar pela ineptidão do requerimento para a execução. Dir-se-à, desde logo, que a ineptidão da petição inicial não é um conceito que se possa transpôr literalmente para o processo executivo. A ineptidão baseia-se ou na falta ou inteligibilidade do pedido ou causa de pedir, ou na contradição entre o pedido e a causa que o sustenta ou na incompatibilidade substantiva entre pedidos principais (art. 193 do CPC). Ora, nada disto acontece na acção executiva. Nesta, o direito está já definido no título que serve de fundamento à execução; ou por outras palavras, o título fornece-nos os limites, os contornos e as características do direito nele incorporado. Enquanto a acção declarativa tem por objectivo definir o direito, a acção executiva - com o direito já definido - tem por escopo permitir a realização concreta daquele direito. Daí que a ineptidão da petição inicial só exista na acção declarativa pois só nesta é preciso delimitar uma causa de pedir que seja inteligível e um pedido que seja o corolário lógico daquela. Na execução, o que pode acontecer é o pedido não se conter no conteúdo do título; ou seja, pode o título executivo ter limites apertados que estejam muito aquém do que se pede. Quando isto sucede estamos perante um caso de inexequibilidade do título (inexequibilidade que pode ser total ou parcial). Significa isto, portanto, que a inexequibilidade do título é, na acção executiva, o correspondente à ineptidão da petição inicial na acção declarativa; por isso mesmo, aquela inexequibilidade é fundamento de embargos (art. 813 do CPC), mas a ineptidão da petição inicial ou do requerimento para a execução não aparece no elenco constante daquele mesmo art. 813 para basear esses embargos. Concluir-se-à, portanto, que no caso vertente não há qualquer ineptidão como vem arguido. 2) Numa coisa têm os embargantes inteira razão: o exequente não pediu o pagamento do imposto de selo. E não basta ele ser devido para que os devedores o paguem; é preciso que seja pedido. O requerimento para a execução estabelece aquilo que o exequente peticiona; e o título executivo permite o controle da exequibilidade do pedido. No caso dos autos, o exequente foi bem claro no seu requerimento: pediu o capital da livrança e os juros de mora. Nada mais pediu; e não é na contestação - que se destina a impugnar os fundamentos dos embargos - que o exequente pode alterar o pedido, requerendo que a execução prossiga para pagamento de mais coisas que ele, em tempo oportuno, não pediu. O que o exequente fez - ao alargar o pedido, na contestação, ao imposto de selo - foi alterar o pedido em desrespeito total aos arts. 272 e 273 do CPC. Conforme acima se salientou, a contestação dos embargos tem por função impugnar os fundamentos articulados pelo embargante; daí que seja inadmissível aproveitar-se a contestação para alteração do pedido sem o que se deixará o próprio embargante - executado indefeso já que a lei não prevê novo articulado deste em resposta à contestação. Ao condenar os executados no que não lhes fora pedido, a sentença recorrida incorreu na nulidade prevista nos arts. 661 e 668 n. 1 alínea e) do CPC (condenação além do pedido). Repare-se que os apelantes invocam esta nulidade, embora sem a qualificar. Na verdade, as duas primeiras conclusões das alegações são bem explícitas no seu teor: argui-se, aí, que o exequente se limitou a pedir o capital da livrança e os juros, não peticionando o imposto de selo e - mau grado isso - a sentença impôs a "condenação" no pagamento deste imposto. O que estas conclusões contêm, manifestamente, é a arguição desta nulidade, embora não qualificada juridicamente. Arguição que sai, aliás, reforçada quando os embargantes trazem também à colação a violação do art. 664 do CPC por se ter tomado em linha de conta factos que, afinal, o exequente não havia articulado em tempo útil. Procede, só por aqui, a apelação. 3) Algo mais se dirá, contudo, quanto ao imposto de selo. Saber se os executados devem pagar o montante correspondente ao imposto de selo corresponde a determinar o alcance exacto da expressão "outras despesas" inserta no art. 48 n. 3 da Lei Uniforme das Letras e Livranças. O portador de uma livrança pode reclamar contra os ora executados o montante incorporado no título, os juros de mora, as despesas de protesto (se o houver), dos avisos, e "outras despesas". "Outras despesas" são aquelas que se mostram estritamente necessárias à efectivação do direito do portador do título (cfr. Abel Delgado, "Lei Uniforme", 6. edição, pag. 309). O imposto de selo é devido pela realização de operações bancárias e a lei fixa-o em função do benefício extraído pelo cliente da operação (art. 120 - A do Regulamento e Tabela do Imposto de Selo, com a redacção dada pelo DL n. 119-B/83 de 28/2). O imposto de selo é, pois, algo que se impõe ao cliente bancário "ope legis" como consequência directa do benefício que ele extrai da operação em que se envolveu. O imposto é pedido pelo Banco; mas isso deve-se tão só ao comando vinculativo do n. 3 do art. 120- - A. Vale isto por dizer que qualquer entidade bancária que pretenda exercer os direitos cambiários que um título cartular lhe confira, tem que exigir à cabeça, o imposto de selo por força daquele n. 3 do art. 120 - A; o que corresponde a inferir que tal exigência se inscreve no conceito de "outras despesas" a que alude o art. 48 da Lei Uniforme. Simplesmente, o art. 120 - A. do Regulamento e tabela do Imposto de Selo limita o alcance do imposto a pagar: este só é devido por quem beneficiou da operação bancária. No caso concreto, a execução foi instaurada contra a subscritora da livrança e os avalistas. Sendo o aval uma garantia dada à obrigação cartular do obrigado principal (arts. 28, 30 e segs. 77 e 78 da Lei Uniforme), há que inferir que o garante não beneficiou da operação bancária; logo, não tem que pagar um imposto referente a uma operação de que não beneficiou e que foi realizada em benefício do garantido. É certo que o art. 32 da Lei Uniforme consigna que o avalista responde da mesma forma que o avalisado. Mas esta norma é obviamente de direito civil e comercial (de natureza substantiva) e jamais de direito fiscal. Daí que o avalista responda da mesma forma que o avalisado, no âmbito cartular do direito cambiário; mas não responde da mesma forma no âmbito do direito fiscal, até porque ninguém é obrigado a pagar impostos que incubem a outros. Dir-se-à, por conseguinte, que, na melhor das hipóteses, o exequente podia peticionar o imposto de selo da executada "Biofranco", mas não dos executados (C) e (D). 4) Do que se deixa exposto, resulta, por consequência, que os embargos procedem. A execução prosseguirá quanto ao capital e aos juros de mora vencidos, mas não quanto à quantia relativa ao imposto de selo e incorporada indiscriminadamente no montante dos juros. Não há que pôr aqui, a questão da admissibilidade ou não do indeferimento parcial. Estamos, tão só, no âmbito da exequibilidade do título e da redução da quantia exequenda aos limites estritos daquela exequibilidade. Termos em que se julga procedente a apelação, revogando-se a sentença recorrida e, nessa medida, se reduz o pedido do exequente - embargado à quantia de 91008218 escudos. Lisboa, 23/1/92 Luis António Noronha Nascimento. |