Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | MANUEL GONÇALVES | ||
Descritores: | PROVA DOCUMENTAL DOCUMENTO PARTICULAR REGULAÇÃO DO PODER PATERNAL GUARDA DE MENOR AMPLIAÇÃO RESIDÊNCIA ESTRANGEIRO | ||
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Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 03/11/2010 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
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Meio Processual: | AGRAVO | ||
Decisão: | CONFIRMADA A DECISÃO | ||
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Sumário: | I- Não pode o tribunal dar como provados factos constantes de documentos particulares, quando impugnados pela parte contrária e não corroborados por outros meios de prova, nomeadamente testemunhal; II- A guarda do menor deve ser confiada ao progenitor que mais garantias dê de promover o seu desenvolvimento físico, intelectual e moral, bem como as suas necessidades afectivas; III- Residindo os progenitores em países diferentes, não faz sentido confiar-se a guarda do menor a um deles e fixar-se a residência (do menor) no país do não guardião, sob pena de se esvaziar de conteúdo o poder-dever atribuído; IV- A Convenção de Haia sobre os Aspectos Civis do Rapto Internacional de Crianças, teve como principal objectivo a protecção do interesse do menor contra a separação ilícita de um dos seus pais, bem como contra a desinserção do ambiente e da cultura em que estava inserido. (Sumário do Relator) | ||
Decisão Texto Parcial: | ![]() | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa: B..., requereu regulação do exercício do poder paternal e entrega do menor C..., contra D.... Para o efeito, alega em síntese o seguinte: Requerente e requerido casaram civilmente em Bagdad em 23.02.1999 e desse casamento nasceu C..., em 20.03.2000. O menor sempre viveu com os pais na Jordânia. Em 30.04.2007, o requerido desapareceu de casa com o menor, sem autorização da requerente. Só uma semana depois é que a requerente soube que o requerido conseguira trazer o menor para Portugal. O comportamento do requerido tem vindo a afectar gravemente os interesses do menor, que se viu obrigado a interromper os estudos na Jordânia e a abandonar a rotina diária a que estava habituado. Apresentou resposta o requerido (fol. 68). Foi designada uma conferência de pais, que acabou por ser adiada (fol. 367), para 4/9/2007. A fol. 464, pediu o requerido a audição do menor, antes da tomada de qualquer decisão. Na conferência de pais (fol. 473), que teve lugar em 04.09.2007, indeferiu-se a audição do menor, neste momento processual e em face da ausência de acordo dos progenitores, ordenou-se a notificação das partes, para alegarem, nos termos do art. 178 nº 1 e 2 OTM. Em 06.09.2007, proferida decisão provisória (fol. 504), nos seguintes termos: «1º O menor C..., fica confiado aos cuidados e guarda da mãe, com a qual residirá, em Portugal, e á qual é atribuído o exercício do poder paternal. 2º Mantém-se a proibição de saída de Portugal. 3º O menor continuará a frequentar o k... School. 4º O pai poderá estar com o menor dois fins de semana seguidos a que se seguirá um fim de semana que o menor passará com a mãe. Nos fins de semana que couberem ao pai, esta irá buscar o menor ao colégio na sexta feita, após o fim das actividades escolares, onde o entregará na segunda-feira, antes do início das actividades escolares. 5º O menor passará a véspera de Natal com o pai e o dia de Natal com a mãe, sendo entregue à mãe no dia 25 até às 11H00 horas. O menor passará com a mãe a véspera de Ano Novo e com o pai o Ano Novo, devendo o pai ir buscá-lo no dia 1 de Janeiro às 11H00 horas. 6º Sem prejuízo do disposto no número anterior, o menor passará a primeira metade das férias de Natal com o pai e a segunda com a mãe. 7º O menor passará o dia do pai e o dia de aniversário natalício deste com o pai. 8º O pai pagará. A título de pensão de alimentos, todas as despesas escolares do menor, nestas se incluindo as despesas com a mensalidade do colégio, com as actividades extracurriculares, com os livros e material escolar. 9º O progenitor entregará o menor à progenitora no prazo de três dias. 10º No prazo de 3 dias: - a progenitora entregará nos autos a cédula pessoal do menor, - o progenitor entregará nos autos o passaporte do menor». Inconformado com a decisão proferida em 04,09.2007, na parte em que se indeferiu a audição do menor antes de qualquer decisão sobre a tutela provisória, recorreu o requerido (fol. 550). O recurso foi admitido como agravo (fol. 553), com subida diferida e feito devolutivo, em 18.09.2007. Da admissão do recurso foi expedida notificação às partes em 21.09.2007 (fol. 832 e segs). Apresentou o agravante alegações (fol. 1211 e segs), em que formula as seguintes conclusões: 1- Vem o presente recurso interposto da decisão do tribunal a quo, datada de 04.09.2007, que julgou improcedente o pedido do ora recorrente de que o menor fosse ouvido directamente pelo Tribunal antes de ser tomada uma decisão quanto à tutela provisória. 2- Embora o tribunal tenha decidido a realização de perícia pelo Instituto de Medicina Legal, com vista a apurar a vinculação do menor a cada um dos progenitores, considera-se que tal exame não substitui a observação e contacto directo do Tribunal com o menor. 3- Se o menor tivesse sido ouvido, não temos dúvidas de que teria afirmado preferir ficar com o recorrente. 4- Embora o C... tenha apenas sete anos há precedentes sobre crianças da mesma idade que foram ouvidas sobre a sua tutela, especialmente quando estava em causa o seu regresso a um país estrangeiro. 5- O recorrente era pai e mãe do C..., uma vez que devido ao tipo de trabalho desenvolvido pela recorrida houve nesta família uma inversão dos papeis familiares tradicionais. 6- Portanto, aquela relação mais próxima que normalmente as crianças desenvolvem com a mãe, neste caso foi desenvolvida com o pai. 7- Se a guarda definitiva do menor for entregue à recorrida este sofrerá um forte trauma que afectará o seu equilíbrio emocional e psicológico e poderá causar-lhe danos graves. 8- Se a recorrida conseguir levar o menor para a Jordânia, como pretende, por que ali tem instalada toda a sua estrutura familiar, social e económica, o recorrente (por lapso diz-se recorrido) nunca mais o verá. 9- Ao limiar o direito de audição da criança, o Tribunal violou gravemente o seu direito a pronunciar-se nos autos e a determinar o seu futuro, sendo ainda indetermináveis, neste momento, os danos que a entrega à recorrida lhe poderá já ter causado e vir ainda a causar. 10- O recorrente entende que o seu filho deveria ter sido ouvido antes de ser tomada qualquer decisão quanto à sua tutela provisória e que não o tendo feito, o Tribunal a quo fez errada interpretação do art. 175 OTM. Contra alegou a recorrida (fol. 1250). Alegaram as partes, nos termos do art. 178 OTM (fol.555 e 581/839 e segs.). Em 25.09.2007 (fol. 1178) reiterou o requerido o pedido de audição do menor, antes de ser tomada decisão sobre a tutela definitiva. Ouvidos o M. P., e a requerente, foi em 25.10.2009, (fol. 1256) proferido despacho, em que, entre outras coisas: - se indeferiu a peritagem requerida a fol. 894; - depoimento de parte da requerente; - se indeferiu a audição do menor. Inconformado recorreu o requerido (fol. 1313), recurso que foi admitido como agravo (fol. 1312), em 09.11.2007, com subida diferida e efeito devolutivo. Apresentou o agravante as suas alegações, (fol. 1468) em que formula as seguintes conclusões: 1- Vem o presente recurso interposto da decisão do Tribunal a quo, datada de 25.10.2007, na parte que resultou o indeferimento da peritagem requerida a fol. 894 dos autos, (letra e assinatura da recorrida, em vários documentos) e do depoimento de parte desta, excepto quanto aos factos dos artigos 222, 304, 307 das alegações do ora recorrente, decisão com a qual não se concorda pelas seguintes razões: 2- O Doc nº 11 da p. i., não deixou de ser relevante por ser de 2000 e atesta as boas qualidades de pai do ora recorrente. 3- Também importante é o exame da letra, assinatura e rubrica exaradas pela recorrida nos doc nº 1, 71, 72, 76 e 77 das alegações da recorrente, para verificação da sua autenticidade, porque: - O doc nº 1 faz prova quanto ao art. 9º das alegações do recorrente e permite demonstrar a ligação da recorrida ao governo de S...; - O doc nº 71 e 72 são essenciais para fazer prova quanto aos artigos 224, 227, 228 e 229 das alegações do recorrente e são relevantes para fazer prova quanto ao facto de a recorrida ter tido amantes, ter feito diversos abortos e ter entregue um dos fetos abortado, por vingança, a um desses antigos amantes, sendo esses factos importantes para saber se a recorrida poderá ser ou não boa mãe; - Os doc nº 76 e 77 são relevantes para fazer contra-prova quanto à acusação da recorrida ao recorrente, de que este teria falsificado a sua assinatura em documentos (cfr. art. 389 e 390 das alegações do recorrente), visto que esse seria certamente o comportamento desejável para um bom pai de família; 4- Estes exames são também importantes para saber se a recorrida mentiu quando impugnou estes documentos, porque se o fez, não será capaz de ensinar ao filho os valores da verdade, justiça, correcção, lealdade e decência; 5- Foi indeferido o depoimento de parte da recorrida, nos termos do art. 552 e ss do CPC quanto à matéria dos artigos 16, 17, 30, 31, 32, 53 a 69, 223 a 225, 227 a 229, 238, 239, 346 a 354, 360, 377, 378, 380 e 381, posição com que não concorda. 6- O facto de a progenitora ter traido o progenitor não é indiferente para saber se é boa mãe de família e dedicada ao filho e não ao amante E.... 7- A situação de a progenitora ter-se tornado mais próxima da religião muçulmana e do estilo de vida e de pensamento muçulmano mais radical e pretender educar o filho como árabe é relevante porque o C... é uma criança ocidentalizada e católica e a tentativa da sua transformação numa criança árabe e alteração dos seus princípios religiosos e sociais ocidentais seria gravíssima para a sua estabilidade emocional e psicológica. 8- O facto de a progenitora ter enriquecido à custa do trabalho do progenitor e depois o ter tentado correr de casa, deixando-o em má situação não é irrelevante porque é um procedimento pouco correcto, pouco humano, que diz muito da sua personalidade egoísta, injusta e impiedosa e que deve ser tido em conta na atribuição da tutela do C.... 9- A tentativa da progenitora de utilizar o casamento para obter o passaporte português e a separação por vingança do marido é um tipo de comportamento interesseiro e vingativo não abona em favor da sua capacidade para ser boa mãe. 10- O facto de a progenitora ter tido amantes, ter feito vários abortos, tendo abortado propositadamente, por quatro vezes, durante a sua relação amorosa com F... e ter tido o sangue frio de colocar um feto morto numa garrafa e de entregá-lo a este amante demonstra uma natureza pouco própria de uma boa mãe de família, a sua ligação próxima ao regime brutal de S..., o seu desprezo pela vida humana e pelos mais elementares princípios éticos e direitos humanos e a sua incapacidade para ter o carinho, compreensão e o amor verdadeiro que uma boa mãe deve ter. 11- O circunstancialismo de ter feito ameaças ao recorrente, inclusive, ameaças de morte, demonstra uma personalidade irascível, violenta e vingativa que não é apropriada numa pessoa que irá educar um menor de sete anos de idade. 12- O facto de escravizar a empregada G... e de reter no seu cofre o passaporte desta demonstra um comportamento ético-social incorrecto da recorrida, a sua incapacidade de dar uma boa formação moral ao seu filho e de lhe transmitir os mais elementares princípios de justiça, solidariedade social e humanidade. 13- A situação de ter acusado falsamente a empregada H... de lhe ter roubado jóias e outros valores, demonstra que alguém que mente e que usa falsas declarações para perseguir e prejudicar outra pessoa, não será certamente uma boa mãe. 14- O facto de ter obtido declarações com base em coacção da empregada G... a seu favor e de a ter espancado e ameaçado de que seria acusada de roubar se não fizesse falsas declarações em Tribunal contra o progenitor constitui um conjunto de crimes graves relevantes para avaliar da capacidade da mãe para educar o C.... 15- O facto de se ter apossado de todos os bens do progenitor que ficaram na sua casa demonstra maldade. 16- O referência ao nº 1 do art. 1409 CPC, resulta certamente de lapso, visto que o Tribunal a quo pretendia com certeza referir-se ao nº 2. 17- O Tribunal a quo ao não admitir os meios de prova referidos fez uma má interpretação desta norma, já que estes são necessários para avaliar qual é o progenitor que apresenta melhores condições para ficar com a tutela definitiva do menor. 18- Deve ser concedido provimento ao presente recurso, revogando-se a decisão recorrida e substituindo-a por outra que aceite os meios de prova supra referidos. Contra alegou a recorrida (fol. 1565) A fol. 1545 foi junto Relatório de Exame Pedopsiquiátrico Forense de C.... A requerente (fol. 1602), pediu a realização de novo Exame, pelo Departamento de Pedopsiquiatria do Hospital Dona Estefânia. Tal pretensão foi indeferida por despacho de 22.01.2008 (fol. 1675). A fol. 1872 e 2829, foram juntos relatórios da Segurança Social, relativos ao requerido D.... A fol. 2708 e 2820 foram juntos Relatórios da Segurança Social, relativos à progenitora B.... A fol. 2736 e 2757, foram juntos os Relatórios Periciais Psicológicos, relativo aos progenitores. Ambos os progenitores pediram a realização de 2º exame, o que foi indeferido (fol. 2905). Procedeu-se a julgamento (fol. 3214, 3227, 3254, 3361, 3487, 3496, 3540, 3636, 3751, 3984, 3987, 4071), após o que foi proferida decisão da matéria de facto (fol. 4273). Foi proferida sentença (fol. 4321), em que se conclui da seguinte forma: «Pelo exposto, decido regular o exercício do poder paternal a que dizem respeito estes autos da seguinte forma: a) O menor fica entregue à guarda e cuidados da mãe, que exercerá o poder paternal; b) O menor voltará a frequentar a International ... School Amman Jordan; c) O pai contactará o menor, através de Web cam, de 2ª a 6ª feira, às 19H00 horas (hora de Amã); d) O menor passará com o pai as férias escolares do Natal e da Páscoa; e) O menor passará com o pai o mês de Agosto; f) O pai custeará as viagens do menor a Portugal; g) O menor viajará para Portugal aos cuidados de hospedeira; h) A título de alimentos para o menor, o pai suportará metade do custo do colégio». Inconformado recorreu o pai (fol. 4372) recurso que foi admitido como apelação, a que foi atribuído o efeito devolutivo. A fol. 4400 foi proferido despacho, nos seguintes termos: «Foi atribuída natureza urgente aos presentes autos. Proferida sentença, não se justifica a manutenção de tal natureza, com reflexos, nomeadamente, nos prazos aplicáveis. Assim, nos termos do art. 160 OTM, retiro a natureza urgente que tinha sido atribuída aos autos». Inconformado com o teor do referido despacho, apresentou-se o requerido, pai do menor, a recorrer, ( fol. 4405), recurso que foi admitido, (fol. 4423) como agravo, com subida imediata e efeito devolutivo. Notificado da admissão do presente recurso, não alegou o agravante (as alegações de fol. 4429 e segs, apenas se reportam ao recurso de apelação), pelo que se haverá como deserto tal recurso. Nas alegações (fol. 4429 e segs) que apresentou, quanto ao recurso de apelação, formula o apelante as seguintes conclusões: 1- Existem na Matéria de Facto Provada inúmeros factos que correspondem, pura e simplesmente, a grosseiras falsidades e deturpações da realidade. 2- Existem nos autos documentos e elementos de prova que, só por si, são suficientes para evidenciar tais falsidades e distorções da realidade. 3- Também existem nos autos documentos e elementos de prova que são suficientes para dar como provados alguns factos que tem a maior relevância em termos da boa decisão da presente lide. 4- Assim, a sentença recorrida deveria ter dado como provada, e não deu, o bom aproveitamento e empenhamento do menor na disciplina de português – documento nº l do requerimento de 11 de Março de 2009. 5- A sentença recorrida deveria ter dado como provado, e não deu, o comportamento satisfatório, a boa adaptação e o facto do facto do menor ser um atleta/aluno interessado e feliz nas suas actividades desportivas extracurriculares – documento nº 2 do requerimento de 18 de Março de 2009. 6- Deve ser admitida a junção aos autos de um documento comprovativo de que o recorrente é titular de uma licença internacional de conduções contrariando, assim, o que é dito na sentença a este propósito – artigo 712° nº 1 alínea c) do CPC. 7- Deveria ter sido dado como provado na Matéria de Facto que já foi proferida uma sentença no Reino da Jordânia nos termos da qual é atribuída à Mãe a custódia do filho e que é mesmo só a Requerida a única que tem direito a essa custódia e depois desta a Ordem das Mulheres, como foi esclarecido na sunita do Imã I... documento junto no requerimento de 1 de Dezembro de 2007. 8- A sentença recorrida também deveria ter dado como provado as excelentes aptidões e desempenho profissionais do Recorrente, bem como do seu rendimento anual documentos juntos em 6 de Março de 2009. 9- A sentença também deveria ter reconhecido aquilo que foi expressamente consagrado no único relatório escolar sobre o menor em 2007 e 2008 e onde se concluiu que o menor era: “O C... é um elemento agradável e educado da classe. O C... teve um começo bem difícil no ano lectivo. Levou-lhe um tempo para começar a sentir-se seguro e a integrar-se na vida da escola. Ao longo do ano a confiança do C... em si mesmo melhorou e agora ele tem um largo círculo de amigos entre os rapazes. Na sala de aula o C... é quieto mas tomou-se muito interessado em participar nas discussões da classe. Ele gosta de falar e de contar e a sua fala tornou-se mais clara e fluente. O C... é um elemento da classe muito acertado e estimado. Foi um prazer ensiná-lo e desejar-lhe latiu o bem possível no 4º ano» - documento nº l do requerimento de 25 de Junho de 2008. 10 A Sentença recorrida deveria ter reconhecido a autoria dos escritos em língua portuguesa da responsabilidade exclusiva do menor – documentos 1, 2 e 3 do requerimento de 25 de Março de 2009. 11- A sentença recorrida também deveria ter dado como provado que o menor chegou a ser considerado como a “estrela da semana” pela professora responsável pelo actual presente ano lectivo - documento nº 4 do requerimento apresentado em 25 de Março de 2009. 12- A sentença recorrida deveria ter reconhecido que pelas leis do Reino da Jordânia qualquer suspeito ausente não tem sequer direito a assistência e representação por um advogado – documento nº 35 a fls. 393 junto na Conferência de Pais. 13- A sentença recorrida deveria ter reconhecido e dado como provado que a Requerida consciente, deliberada e intencionalmente impediu o menor de gozar de actividades extra-curriculares que tanta felicidade lhe davam e podiam dar, mesmo quando tudo era, e sempre foi, custeado exclusivamente pelo Recorrente – documento nº 1 do requerimento de 1 de Janeiro de 2009. 14- A sentença recorrida deveria ter reconhecido que o menor era, em Portugal uma criança feliz integrada, com muitos e bons amigos, e por todos apreciado no seu meio académico e social, sendo intimo amigo de muitos alunos da escola que frequentava em Portugal – nº 2 a 22 do requerimento entregue em 8 de Janeiro de 2008, os documentos juntos sob os nº 1 a 22 do requerimento entregue em 26 de Maio de 2008, os documentos juntos sob o nº 1 a 14 do requerimento entregue em 12 de Junho de 2008 e os documentos juntos sob o nº 1 a 13 do requerimento entregue em 2 de Maio de 2008. 15- A Sentença recorrida deveria ter reconhecido a validade de algumas das conclusões constantes nos únicos relatórios periciais psicológicos feitos ao Recorrente e à Requerida e que se encontram transcritos na notificação de 1/10/2008. Por respeito à necessidade de sintetização, dão-se por reproduzidas as passagens constantes do Capítulo XVII destas Alegações. Entre estas, não pode deixar de realçar afirmações do menor em que este reconhece que “relativamente ao tempo passado no Iraque afirma não ter memórias. Sobre aquilo que deseja para o seu futuro mostra-se confiante e que gostava de ficar a viver com o pai, não sabendo, no entanto, justificar porquê. Acrescente que a mãe não sabe deste seu desejo e que se ela perguntar, eu dava uma desculpa, dizia que queria ir à casa de banho como forma de fugir à questão“ 16- A Sentença recorrida deveria ter dado como provado o único relatório pedopsiquiátrico feito ao menor e notificado a 19/12/2007 e em que algumas partes se dão por reproduzidas nas transcrições constantes do Capítulo XVIII destas Alegações. Também não se pode deixar de realçar uma passagem como a de que “afirma que quer continuar a viver com o pai em Portugal e não deseja regressar a Amã e que é uma criança com boas competências cognitivas e uma maturidade emocional um pouco acima do esperado para a sua idade e sexo ‘. 17- Nos termos do artigo 712° nº 1 alínea C do CPC, deve ser admitida a junção aos autos da queixa crime apresentada pelo Recorrente contra as Técnicas do ISS que subscreveram um Relatório vergonhoso, eivado de mentiras, calúnias, factos difamatórios e ofensas inadmissíveis ao bom nome do Recorrente. 18- A sentença recorrida deveria ter reproduzido tudo quanto consta da acta em que se reproduz a conversa do menor e o seu desejo reiterado de ficar em Portugal; isto, mesmo sob a pressão psicológica da Mãe que acompanhou o menor, embora não tenha estado presente na audiência. 19- Ao abrigo do disposto no art. 712 nº 1 alínea c) CPC requer-se que seja admitida a junção aos autos de uma petição subscrita por 34 pais encarregados de educação da escola frequentada pelo menor e onde estes «considerar que o C... está bem integrado na comunidade escolar, que é um aluno contente e feliz, tem a estima dos amigos para um rapaz de 9 anos e apresenta todas as manifestações de beneficiar e apreciar a excelente educação e saudável atmosfera da escola St. Julians». Com a petição cuja junção se requer, devem ser dados como provados os factos constantes da mesma. 20- Requer-se ainda, a junção aos autos do Exame feito por um Mestre em Psicoterapia e Psicólogo Clínico onde se reconhecem realidades tão evidentes como aquelas que se encontram transcritas no Capítulo XXII destas Alegações e que nesta sede se dão por reproduzidas. Não se deixam de salientar passagens tão impressionantes como «revelou que é difícil estabelecer uma relação com a mãe, dialogar com ela, dizendo que muitas vezes é castigado sem razão nenhuma, tendo confessado novamente a sua vontade de ficar em Portugal com o pai, que em relação à bandeira de Portugal + João fez questão de vincar que era este o seu país de referência». 21- O princípio essencial que deve nortear a regulação do exercício do poder paternal é o do interesse do menor - vide por exemplo o art. 1905 nº 2 CC e o art. 180 nº 1 OTM 22- Deve porém, ser outrossim ponderado na regulação do poder paternal o direito da criança a manter contactos pessoais e directos com ambos os progenitores. 23- Previsto em instrumentos internacionais e comunitários, o direito da criança manter regularmente contactos pessoais e directos com os progenitores deve ser qualificado como um direito fundamental (art. 16 nº 1 da Constituição) de natureza análoga (art. 17 da Constituição). 24- Contrariamente a Portugal, a Jordânia não ratificou a Convenção de Haia sobre os Aspectos Civis do Rapto Internacional de Crianças, instrumento internacional fundamental na tutela do direito de visita dos progenitores. 25- Na Jordânia, correm mandados de captura e processos criminais contra o recorrente, quer uns, quer outros, tendo como fonte sempre, única e exclusivamente, denúncias da recorrida, tendo alguns desembocado em condenações à revelia, sem que porém o recorrente tenha tido sequer a oportunidade de se defender. 26- A sentença proferida pelo Tribunal a quo não terá eficácia na Jordânia, na medida em que os tribunais deste país já regularam o exercício do poder paternal sobre o menor C..., tendo-o não só atribuído, em exclusivo à recorrida, como não prevendo qualquer regime de contactos e visitas a favor do recorrente. 27- O recorrente não tem meios de assegurar o cumprimento do regime de contactos e visitas fixado na sentença proferida pelo Tribunal a quo, nem para vigiar a forma como a recorrida exercerá o poder paternal. 28- Por um lado, uma vez que a Jordânia não ratificou a Convenção de Haia sobre os Aspectos Civis do Rapto Internacional de Crianças, o recorrente não pode recorrer aos instrumentos de cooperação judiciária previstos nessa Convenção. 29- Por outro lado, o recorrente não poderá fazer valer os seus direitos de progenitor não guardião junto dos tribunais jordanos, na medida em que, caso se desloque à Jordânia, o recorrente será imediatamente detido e, além disso, esbarrará na regulação do poder paternal fixado pela jurisdição jordana. 30- A sentença recorrida, ao impor que a residência do menor seja fixada na Jordânia, não garante o regime de contactos e visitas aí fixado para o recorrente. 31- O recorrente, não se opondo a que o poder paternal seja atribuído à recorrida, entende que a residência habitual do menor deve ser fixada em Portugal, uma vez que apenas neste Estado, do qual o menor é exclusivamente nacional, pode ser garantido o direito fundamental do menor de manter contactos pessoais e regulares com ambos os progenitores. 32- Ao determinar que a residência habitual do menor seja fixada na Jordânia e que este possa ausentar-se de Portugal na companhia de mãe ou mediante autorização escrita, a sentença recorrida regulou o exercício do poder paternal de modo contrário aos interesses do menor, tendo, por conseguinte, violado o art. 1905 nº 2 CC e 180 OTM. Deve ser revogada a sentença recorrida e reconhecido o direito do menor ficar à guarda da mãe, embora seja fixada residência habitual em Portugal e consagrada a proibição de não se ausentar para o estrangeiro sem autorização de ambos os pais, mantendo-se no mais aquilo que for aplicável na sentença recorrida. Contra alegou a recorrida (fol. 4594), sustentando a manutenção da sentença recorrida. Corridos os vistos legais, há que apreciar e decidir. FUNDAMENTAÇÃO. É a seguinte a matéria de facto considerada assente, na sentença sob recurso: 1- B..., doravante designada por Requerente, nasceu em 01.02.1961, no Iraque e é filha de J... e de L..... Tem nacionalidade Iraquiana. É a mais velha de uma fratria de 6: Duas das irmãs são casadas com cidadãos americanos e vivem com os maridos nos EUA. Uma irmã é casada com um inglês, funcionário de uma ONG, presentemente, vive em Inglaterra. O irmão vive no Brasil e é casado com uma cidadã brasileira. A irmã mais nova, de nome M..., é casada com um cidadão jordano e, temporariamente, vive no Canadá. Presentemente, o pai da requerente vive no Brasil com o filho. A mãe da requerente tem casa em Amã, perto da casa da requerente. Costuma passar temporadas com cada uma das filhas, nos países onde estão a viver. Desde Julho de 2008 que está em Portugal, em casa da requerente. A requerente e sua família professam a religião mandeísta, pré-cristã. A requerente casou aos 21 anos de idade tendo-se divorciado. 2- D..., doravante designado por requerido, nasceu em 17.05.1963 em Portugal e é filho de N... e de O.... Tem nacionalidade portuguesa. O pai do requerido é diplomata de carreira. O requerido é o mais velho de uma fratria de dois, tendo um irmão solteiro. O requerido, os pais do mesmo e o irmão do mesmo vivem todos no mesmo condomínio. Sito em Oeiras. O requerido e seus pais são católicos. O requerido casou catolicamente com P... em 22.02.1986, estando grávida. Teve um filho deste casamento, Q..., nascido em 30.07.1986. O requerido e P...e o Q... viviam no mesmo prédio em que já viviam e vivem os pais do requerido. Separou-se de P... cerca de 3 anos depois do casamento, quando esta engravidou de outro homem. P... e Q... foram viver para o Estoril. Desde então, o requerido não mais conviveu com o filho Q.... O casamento de P... e D... foi dissolvido por divórcio decretado em 04.10.1990. D... nunca pagou pensão de alimentos ao Q.... Em Setembro de 2008, o menor C... não tinha conhecimento da existência de David. O requerido casou em 18.11.1994, em França, com R.... Deste casamento teve dois filhos: V..., nascida em 20.11.1995 e T..., nascido em 22.10.1998. O casamento com R... foi dissolvido em 29.04.2003, por divórcio nessa data decretado. O requerido nunca pagou pensão de alimentos aos filhos T... e V.... R... faleceu, tendo os dois filhos ficado a residir com uma tia materna em Coimbra. 3- Em 1998 no Iraque, requerente e requerido iniciaram uma relação amorosa, tendo o requerido ficado a viver no Iraque desde então. Requerente e requerido casaram, civilmente, em Bagdad, Iraque, no dia 23 de Fevereiro de 1999. Os pais do requerido não foram ao casamento. O casamento da requerente e requerido, celebrado na vigência do casamento deste com R..., nunca foi transcrito para o registo civil português. 4- Do casamento da requerente e do requerido, nasceu no dia 20.03.2000, em Amã, Jordânia, o menor C.... O nascimento do menor foi registado, pelo pai, na Secção Consular da Embaixada de Portugal no Egipto, no dia 12 de Abril de 2000, como sendo filho de mãe solteira. O menor tem nacionalidade portuguesa, por ser filho de pai português. 5- Até Janeiro de 2003, o casal e o menor viveram, alternadamente em Bagdad e Amã. O casal e o menor viveram algum tempo em casa da mãe da requerente, no Iraque. Quando os pais viajavam, o menor ficava aos cuidados da avó da materna. Em Fevereiro de 2003, o casal e o menor mudaram para Amã. Desde Fevereiro de 2003, o menor viveu com os pais, na Jordânia, na casa de morada de família sita em ..., Jordânia. A avó materna e duas das tias maternas (uma das quais de nome M...) que entretanto em 2003, também tinham ido viver para Amã, viviam próximo da casa de morada de família da requerente e requerido e o menor mantinha contacto diário com as mesmas, ou seja, estas frequentavam a casa do casal e o casal frequentava a casa da mãe da requerente e as casas das irmãs desta. O irmão do requerido visitou o casal em Amã. Os pais do requerido nunca visitaram o casal no Iraque nem em Amã, sendo que, nesse período, o pai do requerido teve graves problemas de saúde. Até ao ano de 2004, requerente e requerido mantiveram um casamento harmonioso. 6- Em Amã, o menor frequentava, com aproveitamento, o colégio «International ...... Jordan», onde fez as suas amizades e se sentia feliz. Este colégio proporciona aos alunos um ambiente escolar internacional, aberto a diferentes culturas e os prepara para, no futuro acederem à universidade. Este colégio foi escolhido por ambos os pais. Por ser frequentada também por ocidentais, a escola era protegida por guardas armados com metralhadoras. Existia um sistema de cascata, ou seja, um sistema de contactos telefónicos que era activado para comunicar situações de encerramento da escola ou alertas de emergência. C... era um aluno mediano. Nos anos lectivos de 2004/2005 e 2005/2006, o menor aprendeu árabe no colégio, por insistência da mãe. No ano lectivo de 2007/2008, o custo anual do colégio era de 10.000,00 USA dólares. O colégio é frequentado por alunos jordanos e estrangeiros. Duas das melhores amigas do C... continuam a frequentar essa escola. Era o requerido quem mais acompanhava a vida escolar do menor e quem ia às reuniões de pais. Era o requerido que tratava de toda a correspondência com a escola. O requerido envolvia-se nas actividades da escola, obtendo patrocínios para a mesma e tendo ajudado a obter um empréstimo bancário de 10.000.000 euros. O requerido fazia fotos e DVD de todos os encontros de pais e distribuía-os pelos outros pais, por via informática. Fez calendários para a escola e ajudava sempre que era solicitado. Em Amã, tinha uma vida familiar estável, convivendo regularmente com os seus amigos. Em Amã, o menor tem amigos, tem um quarto para si, tem brinquedos e livros. Requerente e requerido cozinhavam e organizavam festas para o menor e os seus amigos. Todos os amigos do menor participavam na sua festa de aniversário. Ambos os pais tratavam o menor com carinho. Embora viajasse em trabalho, a requerida conciliava o seu trabalho com a vida familiar, dedicando o seu tempo livre à educação do filho. Quando a mãe viajava, o menor ficava aos cuidados do pai. O melhor amigo do menor era U..., que é muçulmano e é filho de uma amigo do requerido de nome Z.... O menor também convivia com as filhas do padrinho. Em Amã, C... era um menor feliz. 7- Desde 2002, o menor e os pais vinham a Portugal uma ou duas vezes por ano, chegando a permanecer cá durante um mês. O menor gostava de passar férias em Portugal e gostava muito do mar. Nessas férias, o requerido nunca efectuou qualquer visita aos filhos V... e T.... 8- Antes de conhecer a requerente, em 1998, o requerido já trabalhava no Iraque. Dedicava à intermediação comercial e financeira. O requerido tinha experiência de contratos internacionais, dominava a língua inglesa e as ferramentas informáticas mais recentes na área do comércio internacional. A partir do momento em que iniciou o seu casamento com a requerente, o requerido, trabalhou em moldes não concretamente apurados, em empresas da requerente, quase tendo deixado de exercer actividades comerciais próprias. O requerido efectuava contactos das empresas da requerente por e-mail com clientes e fornecedores. O requerido dinamizou alguns contratos firmados pelas empresas da requerente. O requerido nunca foi sócio de qualquer empresa na Jordânia nem no Iraque. O requerido trabalhava principalmente a partir de casa e através de meios informáticos. O requerido tinha uma procuração da requerente, passada em 5/7/2000 com todos os poderes para praticar actos de gestão das suas empresas, que foi revogada em 29/1/2007. 9- Em data não concretamente apurada mas que se situa no ano de 2004, começaram a surgir desentendimentos entre requerido e os familiares da requerente. Em data não apurada, em casa do casal, a mãe da requerente foi buscar uma maçã ao frigorífico e deu parte da mesma ao menor. O requerido repreendeu a sogra, dizendo que o menor não jantaria. A sogra ficou melindrada e, durante algum tempo, não frequentava a casa do casal. Também surgiram desentendimentos entre requerido e uma irmã da requerente, de nome M... e com a qual o requerido mantinha, até então, uma relação mais chegada. Na sequência desse desentendimento, durante algum tempo, M... não frequentou a casa do casal, mas o marido desta, W..., continuou a frequentar a casa do casal. 10- Também no ano de 2004, entre o casal começaram a surgir desentendimentos. Uma das fontes de desentendimento era que o requerido pretendia educar o filho como ocidental e a requerente pretendia transmitir-lhe também valores da cultura árabe. Em casa, requerente e requerido falavam entre si em inglês. O requerido queria que o menor consolidasse bem o conhecimento do inglês antes de aprender mais línguas, designadamente o português e o árabe. O pai nunca ensinou português ao C.... O requerido proibiu o menor de falar árabe com a mãe. Quando o menor falava com a mãe em árabe e vice-versa, o requerido zangava-se. O requerido proibiu o menor de comer comida árabe. A requerente nunca quis educar o seu filho como muçulmano, sendo que, na Jordânia, o menor foi baptizado, tendo sido seu padrinho Y..., amigo do casal. A requerente pretendia obter a nacionalidade portuguesa que lhe conferiria a posse de um passaporte português que lhe permitiria viajar com mais facilidade, o que era importante para os seus negócios. Em 22.05.2006, o requerido enviou e-mails à requerente, dizendo que o pai estava a tratar de tudo para lhe disponibilizar um passaporte português. A requerida não obteve o passaporte português. O requerido não queria que a requerente mexesse nas coisas do seu escritório, o que gerou discussões no casal. Estas divergências foram-se agravando. 11- O requerido simpatizava com os interesses americanos na região e tinha uma atitude de apoio à invasão do Iraque pelos EUA. O livro «O Profeta da Desgraça» de Craig Winn é propriedade do requerido e está assinado pelo mesmo. Em Abril de 2007, gastou cerca de 500 dólares americanos em livros no site «Amazon.com200». Em Amã, os bancos, centros comerciais, supermercados e hotéis têm sistemas de segurança rigorosos. Os bares e restaurantes frequentados por estrangeiros têm que ter o mesmo tipo de segurança. Como estrangeiros, o menor e o requerido tinham um visto de curta duração (anual). Como estrangeira, a requerente tinha um título de residência – cartão castanho. 12- Em 09.02.2007 e em 25.02.2007, o requerido enviou e-mail à requerente, dizendo que a amava e que nunca fugiria com o menor. Em meados de Abril de 2007, a requerente pediu ao padrinho do menor, Y..., à mulher deste e ao cunhado W..., para irem à casa do casal, o que estes fizeram. Então a requerente disse-lhes que o requerido, falsificando documentos, se apoderara de 146.000 dólares pertencentes à empresa da requerente e, por isso, queria pôr fim à vida em comum e queria que o requerido saísse de casa. O requerido sugeriu que viessem todos para Portugal. A requerente disse que queria a guarda do menor e permanecer com o mesmo na Jordânia. Após esta conversa, o requerido permaneceu na casa de morada de família. No dia 30 de Abril de 2007, o requerido foi buscar o menor à escola, levou-o para o aeroporto e trouxe-o para Portugal. Fê-lo sem autorização ou sequer conhecimento da requerente. O requerido trouxe consigo 146.000 dólares. O requerido trouxe consigo os documentos do menor bem como alguns documentos da requerente e de familiares desta. O requerido veio para Portugal deixando na casa de morada de família livros e outros bens pessoais e de família, nomeadamente objectos de seus pais em prata e marfim. O requerido tentou trazer alguns bens que se encontravam na casa de morada de família, contratando pessoas para os empacotar enquanto a requerente estava a trabalhar. Alertada para o facto de que estavam pessoas a empacotar bens em sua casa, a requerente chamou a polícia, que impediu que tais bens saíssem da casa de morada de família. Constatou então a requerente que o menor não estava em casa nem no colégio, apercebendo-se de que o pai se tinha ausentado com o menor. O menor não tinha concluído o ano lectivo. 13- A requerente recorreu a tribunal de Primeira Instância de Amã. Este Tribunal proibiu o menor de viajar, no dia 3 de Maio de 2007. As autoridades policiais da Jordânia emitiram um mandado de captura contra o requerido, no dia 1 de Maio de 2007. 14- Quando chegou a Portugal com o menor, o requerido não telefonou à requerente nem contactou com a mesma por qualquer forma, avisando-a do local onde estava o menor. Só decorridos alguns dias, após a vinda com o menor para Portugal, é que a requerente ficou a saber que o menor se encontrava em Portugal com o requerido. A requerente contactou o requerido por várias vezes para falar com o menor mas nem sempre conseguiu falar com o filho. 15- Quando chegaram a Portugal, o requerido e o menor ficaram a viver em casa dos pais do requerido. Em Junho de 2007, o requerido arrendou um apartamento que tem uma sala, 3 quartos, duas casas de banho, cozinha, despensa e varanda, está integrado num condomínio com piscina e jardim e tem acesso directo à praia. O menor gosta muito de praia. No mesmo condomínio, vivem os pais e o irmão do requerido. Nesse apartamento, o menor tem quarto próprio. Quando está com o pai, o menor convive diariamente com os avós paternos. Os avós paternos são pessoas educadas e respeitadas no meio em que vivem. O requerido inscreveu o menor no St. ... School, tendo o menor frequentado as aulas ainda no 3º período. Este colégio proporciona aos alunos um ambiente escolar internacional, aberto a diferentes culturas e os prepara para, no futuro, acederem à universidade. Aquando da inscrição, o progenitor apresentou depoimentos escritos de várias pessoas, com vista a atestar o seu carácter. O menor, acompanhado do pai, teve uma entrevista com o Director do Colégio em 24.05.2007. Mostrou-se retraído e triste. Do relatório escolar do menor do 3º trimestre de 2007, datado de 18.06.2007, consta que: - se adaptou rapidamente às rotinas da classe. - fez amigos e é aceite pela aula. - é polido. - é um pouco retraído e não muito falador. O menor transitou para o 3º ano. 16- A requerente só obteve passaporte necessário para entrar em Portugal (G) no dia 26 de Junho de 2007, emitido em 17 de Junho de 2007. Entrou em Portugal no dia 28 de Junho de 2007. O irmão da requerente veio a Portugal para lhe prestar apoio, dado que fala português, tendo regressado ao Brasil no dia 18.07.2007. 17- Aquando das primeiras visitas, o requerido não disse à requerente onde estava a viver em Portugal nem em que escola tinha inscrito o menor. Após a sua chegada a requerente viu o menor pela primeira vez no dia 2 de Julho de 2007, na Marina de Oeiras, com a presença imposta do requerente, do pai, deste e do seu irmão. Quando o encontro acabou, o menor ficou triste. No mês de Julho e até 22 de Agosto, o menor viu a mãe apenas quando o pai o permitiu sempre na presença deste e do avô paterno e, por vezes, também da avó paterna. Nestes encontros ocorreram discussões entre os progenitores, que foram presenciadas pelo menor. Nestes encontros, a requerente e os sogros, nunca se cumprimentaram. O requerido marcou vários encontros que depois desmarcou. O requerido foi passar uns dias ao Algarve e levou o menor. No mês de Julho de 2007, a requerente chegou a estar vários dias sem conseguir ver o filho. Em Julho de 2007, a requerente dirigiu-se à casa dos pais do requerido para ver o filho e levar comida de que este gostava. A avó paterna não abriu a porta e, através do intercomunicador, disse que o menor não estava e não recebeu a caixa com comida. De 30.04.2007 a 22.08.2007, a requerente não pode falar livremente com o filho. A partir de 22.08.2007, o menor pode estar com a mãe em casa desta. 18- A requerente abandonou a sua vida na Jordânia e veio para Portugal para estar junto do filho. A requerente intentou a presente acção em 13.07.2007. A requerente permanece, desde então em Portugal à espera da resolução da mesma. A requerente arrendou um apartamento de 3 assoalhadas na ..., em Oeiras, com todas as condições para receber o menor. Teve a preocupação de ficar perto da casa do requerido e do colégio St. ... para facilitar as deslocações do menor. Pretende regressar à Jordânia, onde tem a sua casa, os seus amigos e familiares e onde tem a vida organizada. 19- Em 04.09.2007, realizou-se conferência de pais. Por despacho de 06.09.2007, foi nos termos do preceituado art. 157 da OTM, fixo o seguinte regime provisório: 1º O menor C... fica confiado aos cuidados e guarda da mão, com a qual residirá em Portugal, e à qual é atribuído o exercício do poder paternal. 2º Mantém-se a proibição de saída do menor de Portugal. 3º O menor continuará a frequentar o Saint .... School. 4º O pai poderá estar com o menor dois fins de semana seguidos a que se seguirá um fim de semana que o menor passará com a mãe. Nos fins de semana que couberem ao pai, esta irá buscar o menor ao colégio na sexta feira, após o fim das actividades escolares, onde o entregará na segunda feira, antes do início das actividades escolares. 5º O menor passará a véspera de Natal com o pai e o dia de Natal coma mãe, sendo entregue à mãe no dia 25 até às 11H00 horas. O menor passará com a mãe a véspera de Ano Novo e com o pai o Ano Novo, devendo o pai ir buscá-lo no dia 1 de Janeiro às 11H00 horas. 6º Sem prejuízo do disposto no número anterior, o menos passará a primeira metade das férias do Natal com o pai e a segunda com a mãe. 7º O menor passará o dia do pai e o dia do aniversário natalício deste com o pai. 8º O pai pagará, a título de pensão de alimentos, todas as despesas escolares do menor, nestas se incluindo as despesas com a mensalidade do colégio, com as actividades extracurriculares, com livros e material escolar. 9º O progenitor entregará o menor à progenitora no prazo de 3 dias. 10º No prazo de 3 dias: - a progenitora entregará nos autos a cédula pessoal do menor. - o progenitor entregará nos autos o passaporte do menor O regime tem sido cumprido. 20 – No dia da conferência de pais, 04.09.2007, o menor acendeu velas em casa da avó, por estar preocupado, e rezou com a avó paterna. No dia 8 de Setembro de 2007, durante uma visita do menor à requerente, esta comunicou ao requerido que a criança estava muito doente, com dores de estômago fortes e cheio de febre e que o pretendia levar para o Centro de Saúde de Oeiras. O requerido aconselhou a levar a criança à Clínica Europa, para onde esta se dirigiu. Esta Clínica não tem serviços de Urgência, o que o requerido desconhecia. Quando o requerido chegou à Clínica, acompanhado do avô paterno, levou o menor para o Hospital, tendo a requerente apanhado um taxi. O menor foi observado no Hospital, nenhum problema tendo sido diagnosticado. O menor foi entregue à mãe, em consequência do regime provisório fixado, no dia 11.09.2007. Aquando da entrega o menor chorou. 21- O pai disse ao menor que a mãe iria tentar raptá-lo e que se fosse para a Jordânia nunca mais veria o pai. Em 04.12.2007, o menor disse à perita médica do IML que em Amã há «bad guys and terrorits». No decurso da visita domiciliária realizada na casa do requerido, o avô paterno disse á referida técnica que se o menor fosse para Amã dois dias depois estava morto. O menor estava presente no quarto onde ocorreu a conversa. 22- Ano lectivo 2007/2008. No início deste ano lectivo, o menor estava convencido de que o pai trabalhava no colégio e o pai não lhe explicou prontamente que tal não era verdade. Em Setembro de 2007, de manhã, o menor chorava, com frequência, agarrando-se ao progenitor que nessa manhã o tinha ido levar e dizendo que não queria ficar na escola. A reacção de cada um dos pais, nessa situação era diferente. A mãe, de forma carinhosa mas firme, explicava ao filho que tinha que ficar na escola e afastava-o de si. O pai ficava agarrado ao filho sem conseguir afastá-lo de si sem a interferência de terceiros. O menor mostrava-se triste. O menor tinha dificuldade em olhar as pessoas nos olhos. O menor tinha má dicção. O menor era pouco autónomo. A professora alertou os pais para a situação e para a necessidade de estimular a auto-confiança e autonomia do menor. Ao longo do ano lectivo, o menor começou a ultrapassar as dificuldades acabadas de referir. Quer a mãe quer o pai se mostravam interessados no desempenho do filho. Em 10.02.2008, o requerido enviou para o e-mail da requerente um e-mail dirigido ao menor com um trabalho de casa que o menor tinha que fazer para entregar na escola e que consistia na elaboração de uma árvore de costados. Tal trabalho tinha 3 folhas. Na 1ª folha, no local referente à fotografia do filho consta uma fotografia do filho com o pai, no local da fotografia do pai consta fotografia do pai e do filho e no local da fotografia da mãe consta uma fotografia desta em pijama e com uma máscara de beleza aplicada no rosto. Nessa primeira folha consta o nome dos avós paternos e está por preencher o nome dos avós maternos. Nas 2ª e 3ª fls, constam os nomes de todos os avós. Ano lectivo de 2008/2009. No início do presente ano lectivo, o João: - mostrava-se triste. - mostrava-se reservado, não mostrando quaisquer emoções. - não respondia nem quando era directamente interpelado pela professora. - tinha poucos amigos. - nos trabalhos de grupo não conseguia escolher o seu par, mesmo quando a professora lhe dizia para escolher. Progressivamente, o menor foi melhorando a sua participação e integração nas actividades da turma. No fim do primeiro período, o menor e o amigo X..., da mesma aula, foram perseguidos e gozados por outros 3 alunos do colégio. Os menores tinham medo dos mesmos. Por isso, de novo, o menor voltou a chorar dizendo que não queria ficar na escola. De forma carinhosa mas firme, a mãe convenceu-o a ficar, tendo informado do problema o Director. O menor tem dificuldade em organizar-se. Diariamente o pai revê a pasta do filho. Em ambos os anos lectivos: O progenitor vai todas as tardes ao colégio do menor, após as actividades escolares, ou seja, às 15H30 horas. Quando o menor não tem actividades extracurriculares, o requerido fica com o mesmo no intervalo que medeia o fim das actividades escolares e o início das actividades extracurriculares. Quando o menor tem futebol, o pai acompanha-o aos balneários e, depois, assiste aos jogos. Num intervalo entre as actividades escolares e as actividades extracurriculares, o pai levou o menor e dois amigos a um café onde lhes comprou comida, sabendo que tal não é permitido no colégio, o que mereceu uma chamada de atenção por parte do Director. O menor foi convidado para uma festa de aniversário de um colega do colégio, e, como não podia ir, a pedido do menor, o requerido foi pessoalmente entregar o presente na festa. 23- O menor mantém forte ligação afectiva com a mãe. A mãe trata o menor com carinho e firmeza e impõe-lhe regras. O menor mantém, forte ligação afectiva com o pai. O pai trata o menor com carinho e brinca com ele. Tem dificuldade em negar os pedidos do menor e em impor-lhe regras. O menor está muito pressionado e dividido pelo conflito entre os pais, o que lhe tem causado ansiedade e sofrimento. Em julgamento, o menor afirmou preferir ficar em Portugal. O menor tem aulas de português no colégio. Percebe português mas não consegue manter uma conversa simples em português. Pelo menos até Março de 2008, o menor bebia leite de biberão. O menor é meigo, sensível e tem dificuldades em reagir quando o molestam. 24- Após ter regressado a Portugal, em Outubro de 2007, o requerido foi ver os filhos V... e T... a Coimbra. No ano de 2008, o requerido tem ido mensalmente a Coimbra ver os filhos. 25- Após ter chegado a Portugal, e pelo menos até 23.02.2009, o requerido transportava o menor em carro por si conduzido na via pública. O requerido não era titular de carta de condução ou de qualquer outro documento que o habilitasse a conduzir veículos automóveis na via pública, em Portugal. 26- A requerente é empresária na Jordânia e no Iraque, sendo presentemente a CEO (C...E....O...) da empresa «A...Y... Group» que se dedica entre outros ramos de negócio, ao comércio internacional. Na Jordânia a requerente participou em diversas conferências internacionais. A A...Y...Company foi Oil Services nos últimos 3 anos teve os seguintes rendimentos líquidos: - 2006 – 782.674,00 (dólares) - 2007 – 318.641,00 (dólares) - 2008 – 83.948,00 (dólares). 27- Estão em curso, na Jordânia, dois processos criminais contra o requerido resultantes de queixas apresentadas pela requerente. O DIREITO. O âmbito do recurso afere-se pelas conclusões das alegações do recorrente, art. 660 nº 2, 684 nº 3 e 690 CPC. Assim, salvo questões de conhecimento oficioso, apenas haverá que conhecer das questões postas nessas conclusões. Atento o disposto no art. 710 CPC, (nº 1) «a apelação e os agravos que com ela tenham subido são julgados pela ordem da sua interposição...; (nº 2) Os agravos só são providos quando a infracção cometida tenha influído no exame e decisão da causa ou quando,, independentemente da decisão do litígio, o provimento tenha interesse para o agravante». No caso presente, três são os recursos pendentes, a saber: a) Agravo interposto a fol. 550; b) Agravo interposto a fol. 1313; c) Apelação interposta a fol. 4372. I – Agravo interposto a fol. 550. O presente recurso foi interposto do despacho de fol. 473, (de 04.09.2007), na parte em que se indeferiu a pretensão do agravante, em que pretendia a audição do menor, antes da tomada de qualquer decisão. O despacho em causa é do seguinte teor: «Indefere-se a audição, neste momento processual, do menor C.... O menor conta apenas 7 anos de idade pelo que a sua audição por este Tribunal constituiria seguramente uma fonte de pressão e stress sobre o mesmo, e atenta a idade, dificilmente teria maturidade para expressar os seus verdadeiros sentimentos». O exercício do poder paternal, compete em primeira linha aos pais, art. 1877, 1878, 1885 e 1901 CC, e só excepcionalmente pode ser cometido a terceiros, art. 1918 CC. É o mesmo (poder paternal) constituído por um misto de poderes-deveres, sempre sujeito ao «interesse do menor», visando a prossecução de interesses pessoais e patrimoniais deste. A regulação do exercício do poder paternal, comporta no essencial três facetas: a confiança ou guarda do menor; o regime de visitas; a prestação alimentar. São questões que têm a ver com o menor. Daí que, da lei resulte um princípio geral mediante o qual, se deva ouvir o menor, tendo-se em atenção o seu desenvolvimento físico e psíquico. Tal princípio decorre nomeadamente do disposto nos art.1878 nº 2 e 1901 nº 2 CC. Também do disposto no art. 147-A OTM, isso resulta, na medida em que determina a aplicação dos princípios orientadores da intervenção previstos na lei de protecção de crianças e jovens em perigo, com as devidas adaptações. No caso presente, não tendo os pais chegado a acordo, não foi, para tomada da decisão provisória, ouvido o menor. O menor em causa nasceu em 20.03.2000, pelo que tinha á data sete anos de idade. Atento o disposto no art. 1901 nº 2 CC, não teria, em princípio, que ser ouvido o menor. Em causa está processo de jurisdição voluntária, art. 150 OTM, pelo que nas providências a tomar, não está o tribunal sujeito a critérios de legalidade estrita, devendo antes adoptar em cada caso a solução que julgue mais conveniente, art. 1410 CPC. Já se viu que a decisão a tomar pelo tribunal, deverá ter em atenção o «interesse do menor», (art. 1905 nº 2 CC e 180 OTM, 1878 nº 1, 1885, 1918 CC, 36 e 69 CRP, art. 3º nº 1 e 6º nº 3 da Convenção Sobre os Direitos das Crianças (aprovada para ratificação pela Resol. Da Assembleia da República nº 20/90 de 12 de Setembro). Assim, só na medida em que a omissão de «audição dos menores» possa interferir na observância do referido desiderato, é que poderá constituir nulidade. Já se viu que o legislador parece apontar para a idade de 14 anos como aquela em que o menor terá já alguma maturidade para se pronunciar, art. 1901 nº 2 CC. Ora no caso presente o menor tinha à altura sete anos de idade, sendo de supor que, não teria ainda a maturidade suficiente para se pronunciar neste domínio e que a sua audição, quanto à confiança a um dos progenitores, constituiria elemento perturbador do mesmo. Acresce que foi já nos presentes autos proferida decisão definitiva e que antes da prolação da mesma, acabou o tribunal por ouvir o menor. Assim, mesmo que atendendo à data do despacho recorrido, fosse de entender que o menor deveria ter sido ouvido (e não é esse o entendimento perfilhado, como se viu), sempre o recurso teria já perdido utilidade. O recurso de agravo não merece ser provido. II – Agravo de fol. 1313. As questões suscitadas no presente recurso consistem em saber se a peritagem requerida pelo agravante a fol. 894 e o depoimento de parte da requerente, tal como requeridos, deverão ser admitidos. O recurso recaiu sobre o despacho proferido a fol. 1256 que quanto ao objecto do presente recurso, é do seguinte teor: «Nos termos do disposto no art. 1409 nº 1 CPC, indefere-se a realização de peritagem requerida a fol. 894. Na realidade, o primeiro documento referido data do ano de 2000, não se revestindo de utilidade e os demais documentos referem-se a questões que extravasam manifestamente o âmbito destes autos. Admito o depoimento de parte da progenitora quanto aos factos vertidos nos art. 222, 304, 305, 307 das alegações do progenitor. Nos termos do disposto nos art. 1409 nº 1 CPC, indefere-se a realização de depoimento de parte da progenitora quanto aos demais factos, por se entender que o apuramento dos mesmos extravasa, manifestamente, o âmbito dos presentes autos». A fol. 894, entre outras coisas requereu o agravante o seguinte: «Requer-se a peritagem da assinatura da requerente exarada nos Doc. nº 11 da petição inicial do ora requerido e da letra, assinatura e rubrica exaradas pela requerente nos Doc. nº 1, 71, 72, 76 e 77, ora juntos para verificação da sua autenticidade, nos termos do art. 584 CPC ...; Requer-se o depoimento de parte da requerente, nos termos dos art. 552 e ss, do CPC quanto à matéria dos artigos 16, 17, 30, 31, 32, 53 a 69, 222 a 225, 227 a 229, 238, 239, 304, 305, 307, 346 a 354, 360, 377, 378, 380 e 381». Os documentos, cuja peritagem à letra e assinatura se pretende, são os seguintes: O doc. nº 1 (fol. 896/897) é constituído por uma fotocópia de um escrito em árabe, supostamente assinado pela progenitora, em que, em termos elogiosos, se faz referência a S...; O doc nº 11 (fol.957 e segs) é constituído por uma cópia de um escrito em árabe, supostamente da autoria da progenitora, contendo uma referência elogiosa ao requerido; Doc nº 71 (fol. 1164 a 1166) – É constituído por uma fotocópia de uma missiva em árabe, supostamente de 1999, supostamente atribuída à progenitora, e em que se fala da realização de um aborto; Doc nº 472 (fol. 1167 a 1168) é constituído por uma fotocópia em árabe, supostamente da autoria da progenitora, sem data nem assinatura, e em que se fala de um aborto; Doc nº 76 (fol. 1172 a 1174) é constituído por uma fotocópia de um escrito em árabe, datado de 05.07.2000 e que constituirá uma procuração; Doc nº 77 (fol. 1175 a 1176) é constituído por uma fotocópia de escrito em árabe, em que supostamente se terá cancelado a procuração. Os factos, do articulado de alegações do requerido, a que não foi admitido o depoimento de parte, da progenitora, são os seguintes artigos: 16º, em que se refere que a requerente, em 2004, teria um amante; 17º em que se refere uma aproximação por parte da progenitora à religião muçulmana; 30º, 31º e 32º - em que se faz referência à prática seguida pelo progenitores, no que respeita à gestão das empresas da progenitora; 53º a 69º - em que se refere o interesse da progenitora em obter a nacionalidade e passaporte portugueses; 223º a 225, 227ºa 229º - em que se refere a existência de um casamento anterior da progenitora, a realização de abortos e uma relação extra-conjugal; 238º e 239º- em que se refere a existência de ameaças entre requerente e requerido; 346º a 354º, 360º - em que se refere um suposto tratamento dado pela progenitora a uma sua empregada; 377º, 378º e 380º e 381º - em que se refere a existência de bens pessoais do agravante que terão ficado em casa da agravada e que ainda não terá recuperado. Em termos gerais, vigora entre nós o princípio da livre admissibilidade dos meios de prova (art. 655 CPC e art. 341 e segs CC). A admissibilidade em concreto de meios probatórios, está condicionada ao objecto da lide, pois que devendo o juiz seleccionar de entre a matéria alegada aquela que se afigure com relevância para a decisão da causa, segundo as soluções plausíveis da questão de direito (art. 511 CPC) e destinando-se a as provas, a demonstrar essa matéria, apenas deverão ser admitidas as provas que a tenham por objecto (art. 512, 513 CPC. A admitir-se meios de prova relativamente a factos sem relevo para a decisão, estar-se-ia a permitir a prática de actos inúteis, não permitidos por lei, art. 137 CPC, devendo o juiz recusar todas as diligências que forem impertinentes ou dilatórias, art. 265 nº 1 CPC. No que respeita a perícias pedidas pelas partes, as mesmas serão admitidas, se não se revelarem impertinentes ou dilatórias – art. 578 nº 1 CPC. Se um documento se apresenta como irrelevante para a decisão da causa, também será de indeferir qualquer perícia sobre o mesmo, na medida em que ser traduziria num acto inútil. Feita a referência aos princípios gerais, há que ver, como os mesmos se articulam na situação presente e se há ainda a ter em conta regras especiais. No caso presente, estamos perante «processo tutelar cível» de regulação do exercício do poder paternal (art. 146 d) OTM. Trata-se de processo de jurisdição voluntária (art. 150 OTM, pelo que nos termos do disposto no art. 1409 CPC, lhe são aplicáveis o disposto nos art. 302 a 304 CPC. Nos termos do disposto no nº 2 do art. 1409 CPC, neste tipo de processos «o tribunal pode, investigar livremente os factos, coligir as provas, ordenar os inquéritos ...; só são admitidas as provas que o juiz considere necessárias». O processo em causa é urgente, art. 160 OTM. De acordo com os princípios gerais supra referidos, os documentos, sobre que pretende seja efectuada perícia, reportam-se a factos sem relevo para a decisão da causa, pelo que não sendo em termos gerais de admitir, também a perícia sobre os mesmos sempre seria de indeferir. Acresce que a perícia solicitada (exame à letra e assinatura a efectuar pelo LPC) sempre acarretaria para os autos demora não consentânea com a sua natureza (urgente). Também o exame requerido, seria inviável, uma vez que em causa estão fotocópias e não originais. Quanto ao depoimento de parte, a lei exige que recaiam sobre factos pessoais, não podendo recair sobre factos criminosos ou torpes de que a parte seja arguida, art. 554 CPC. Além disso, também estamos (já acima se fez sumária referência à matéria em causa) perante factos sem relevo para a decisão, sendo certo que, para o apuramento das qualidades dos progenitores, o Tribunal determinou e foram realizadas diligências, que constam dos relatórios da Segurança Social e relatórios psicológicos (fol. 1872, 2829, 2708, 2820, 2736 e 2757) Será de negar provimento ao recurso. III- Apelação No presente recurso as questões colocadas, são as seguintes: a) Alteração da decisão da matéria de facto; b) Mérito da decisão. I – Alteração da decisão da matéria de facto. Nesta parte, alega o recorrente que «existem na matéria de facto provada inúmeros factos que correspondem, pura e simplesmente, a grosseiras falsidades e deturpações da realidade. Existem nos autos documentos e elementos de prova que são suficientes para evidenciar tais falsidades e distorções da realidade». Elenca depois, uma série de factos, que no seu entender, deveriam e não foram, dados como provados. Dispõe o art. 712 CPC que a decisão do tribunal da 1ª instância sobre a matéria de facto pode ser alterada pela Relação: a) Se do processo constarem todos os elementos de prova que serviram de base à decisão sobre os pontos da matéria de facto em causa, ou se, tendo ocorrido gravação dos depoimentos prestados, tiver sido impugnada, nos termos do art. 690-A, a decisão com base neles proferida; b) Se os elementos fornecidos pelo processo impuserem decisão diversa, insusceptível de ser destruída por quaisquer outras provas; c) Se o recorrente apresentar documento novo superveniente e que, por si só seja suficiente para destruir a prova em que a decisão assentou. Embora a lei faculte em termos gerais, que as partes peticionem a modificação da decisão da matéria de facto, exige no entanto que observem o ónus da discriminação fáctica e probatória – art. 690-A e o ónus conclusivo – art. 684 nº 3 e 690 nº 4 CPC. Dispõe o art. 690-A CPC que quando se impugne a decisão proferida sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição: quais os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados; quais os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que imponham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados, diversa da recorrida. No caso presente, não foram gravados os depoimentos das testemunhas, pelo que tendo toda a matéria de facto dada como assente, radicado não só em documentos juntos aos autos, como em depoimentos testemunhais, dos autos não constam todos os elementos de prova que serviram de base à decisão. Convém observar que, mesmo que dos autos constassem todos os elementos de prova, o que está em causa não é a simples reavaliação da prova produzida e prolação de decisão com base na convicção então formada, como se de primeira «decisão» se tratasse. Em causa está a alteração de uma «decisão anterior», que foi fundada na livre convicção de quem a proferiu, o que aconteceu com a clara vantagem de ter acompanhado e dirigido, a produção da prova, numa relação de imediação que a gravação sonora não consente. Assim, uma eventual alteração só deverá ocorrer se houver elementos que a «imponham muito claramente», não bastando que a apreciação da prova disponível sugira respostas diferentes. Esta ideia ressalta das alíneas b) e c) do nº 1 do art. 712 ao condicionarem a modificação a decisão de facto proferida em 1ª instância à existência de elementos que, por si só, imponham decisão diversa da proferida. Quando o julgamento tiver por base, fundamentalmente prova testemunhal, o critério de exigência no que respeita à ponderação da possibilidade de alteração, deverá ser idêntico, tanto mais que o autor da decisão em apreciação teve uma percepção directa das provas produzidas, ou de parte delas. Com efeito, não deverá sofrer dúvidas a afirmação de que o sistema de gravação sonora dos meios de prova produzidos oralmente, não fixa todos os elementos relevantes para a respectiva valoração em termos probatórios, todos os elementos susceptíveis de condicionar e alicerçar a convicção do julgador. Como refere Abrantes Geraldes (Temas de Reforma do Processo Civil, Vol. II, pag. 271) «comportamentos ou reacções dos depoentes que apenas podem ser percepcionados, apreendidos, interiorizados e valorados por quem os presencia e que jamais podem ficar gravados ou registados para aproveitamento posterior por outro tribunal que vá apreciar o modo como o primeiro se formou a convicção dos julgadores». Não deverá pois ser uma divergência qualquer, em relação à valoração da prova produzida, ou ao critério das respostas dadas à matéria de facto que justifica uma alteração dessas respostas. Essa alteração apenas deverá ter lugar se a reavaliação da prova o impuser. No mesmo sentido pode ver-se o Ac STJ de 10.03.2005 (Relator – Oliveira Barros, consultável na internet), de que se extrai a seguinte citação: «A plenitude do 2º grau de jurisdição na apreciação da matéria de facto sofre naturalmente a limitação que a inexistência de imediação necessariamente acarreta, não sendo, por isso, de esperar do tribunal superior mais que a sindicância de erro manifesto na livre apreciação das provas». No caso presente, não se mostra minimamente observado o ónus da discriminação fáctica e probatória, a que se refere o art. 690-A nº 1 e 2 CPC. Com efeito, é manifestamente insuficiente, alegar-se que «existem na matéria de facto provada inúmeros factos que correspondem, pura e simplesmente, a grosseiras falsidades e deturpações da realidade» e depois elencar-se factos que se considera que deveriam ter sido considerados provados, sem que se individualize e especifique quais os factos (de entre os provados) que estão em crise. Não se mostra pois feita a indicação e especificação em concreto, de qual a matéria de facto que em face da prova produzida deveria obter decisão diversa. Da forma genérica como o apelante questiona a decisão da matéria de facto, parece pretender que na 2ª instância se proceda à reavaliação de toda a prova, e com base nela se decida a mesma, como se de primeira decisão se tratasse, o que como se viu, não é possível. Alega o apelante que «existem nos autos documentos e elementos de prova que, só por si, são suficientes para evidenciar tais falsidades e distorções da realidade» e que «também existem nos autos documentos e elementos de prova que são suficientes para dar como provados alguns factos que têm a maior relevância em termos da boa decisão da presente lide». Com tal alegação, está o recorrente a invocar como fundamento da alteração da decisão da matéria de facto, as alíneas b) e c) do nº 1 do art. 712 CPC. Já se viu, que a lei exigir que se especifiquem os concretos pontos de facto que se considera incorrectamente julgados e quais os concretos meios probatórios, que constam do processo que impõem decisão diversa, o que, como se viu, não ocorre na situação presente. Como refere Lebre de Freitas (C. P. C., Anotado, Vol. 3º, pag. 96), a propósito da situação referida na alínea b) nº 1 art. 712 CPC, (se os elementos fornecidos pelo processo impuserem decisão diversa, insusceptível de ser destruída por quaisquer outras provas), isso ocorrerá «por exemplo se existe documento autêntico, junto aos autos, que faz prova plena de certo facto e que foi indevidamente desconsiderado pelo tribunal de primeira instância». Não é essa a situação presente, pois que além da ausência de documento autêntico, os documentos particulares, constantes do autos, se mostram na sua generalidade impugnados. Também, não é o caso da existência de «documento novo superveniente que por si só, seja suficiente para destruir a prova em que a decisão assentou», alínea c) nº 1, art. 712 CPC, sendo certo que «só são documentos supervenientes aqueles cuja apresentação foi impossível até à apresentação das alegações de apelação» (Lebre de Freitas, obra citada, pag. 84). Elenca o apelante uma série de factos, que em sua opinião, o Tribunal deveria ter dado como provados, sem fazer qualquer referência aos articulados das partes. Com efeito, relativamente a estes, o tribunal fundamentou exaustivamente a sua convicção, aquando da decisão da matéria de facto, para o que teve em atenção, não só a prova testemunhal, com particular relevo para as pessoas que privavam com o menor (professoras), mas também a prova documental, nomeadamente os relatórios periciais e outros documentos, incluindo os juntos no Apenso. Os factos que o apelante menciona nas suas conclusões, já se mostram na sua maioria contemplados na matéria assente, na parte com relevo para a decisão. Assim, a matéria relativa à sua prestação e comportamento escolar, bem como o estado psicológico e adaptação durante a sua estadia em Portugal, (aspectos referidos nas conclusões 4, 5, 9, 10, 11, 14, 16), foram objecto de apreciação pelo tribunal, e na parte com relevo para a decisão, mostram-se referidas na matéria de facto em 7, 15, 20, 21, 22, 23. A matéria referida em 7 das conclusões, não tem relevo para a decisão, na medida em que o que se questionava era se o recorrente, naquelas datas concretas, se encontrava legalmente habilitado a conduzir veículos automóveis em Portugal. Além disso, reconhece-se que esta matéria tem pouco relevo para a decisão, constituindo mero facto instrumental. Quanto ao rendimento do recorrente, não considerou a sentença o documento junto aos autos, por ter sido objecto de impugnação. Apesar disso, em sede de sentença considerou-se que «a nível económico, ambos os progenitores reúnem condições para que lhes possa ser atribuída a guarda do menor ... O progenitor embora não tenha sido possível fazer prova dos concretos rendimentos auferidos pelo mesmo, ... possui condições de conforto» (fols. 4342). A matéria referida pelo recorrente na conclusão 12º, além de não ter relevo para a decisão, em que como se verá apenas releva o «interesse do menor», não pode considerar-se provada em face dos elementos de prova mencionados (meros documentos particulares, não aceites). A matéria referida na conclusão 13º não pode, por ausência de prova, considerar-se assente, pois como já reiteradamente se referiu, para a prova de um facto, não é suficiente a junção de um documento particular, impugnado pela parte contrária e não confirmado por outros meios, nomeadamente testemunhal. Quanto às conclusões 15ª e 16ª, o Tribunal apreciou de forma crítica, os relatórios periciais, não carecendo de os transcrever na íntegra, na fixação da matéria de facto, como pretende o recorrente. Também se teve em atenção o teor das declarações prestadas pelo menor, em juízo (art. 23 da matéria assente), não tendo o tribunal que reproduzir a totalidade dessa conversa, como pretende o recorrente (conclusão 18ª). Por fim a junção, em sede de recurso, por parte do recorrente, de um denominado «exame feito por psicólogo» a seu pedido, não tem a relevância que o apelante pretende extrair do mesmo. É que se mostram já feitos nos autos, «Exames», levados a cabo pelas instituições para tanto competentes e que lhes foram solicitados pelo tribunal (e não por qualquer das partes). Tais exames, quer pela origem de quem os elaborou, quer pelo distanciamento relativamente às partes, terão sempre que merecer maior credibilidade e por isso, a preferência do Tribunal. O recurso não merece nesta parte proceder. Ainda que o apelante tenha questionado a forma como o Tribunal de 1ª instância apreciou e decidiu a matéria de facto, das conclusões resulta que quanto à sentença objecto de recurso, não questiona a mesma na parte relativa aos alimentos, nem na parte em que entregou o menor à guarda e cuidados da mãe. Isso resulta claramente das seguintes conclusões: 22ª - «Deve ser outrossim ponderado na regulação do poder paternal o direito da criança a manter contactos pessoais e directos com ambos os progenitores»; 30ª - «A sentença recorrida, ao impor que a residência do menor seja fixada na Jordânia, não garante o regime de contactos e visitas aí fixadas para o recorrente»; 31ª - «O recorrente, não se opondo a que o poder paternal seja atribuído à recorrida, entende que a residência habitual do menor deve ser fixada em Portugal, uma vez que apenas este Estado, do qual o menor é exclusivamente nacional, pode ser garantido o direito fundamental do menor manter contactos pessoais e regulares com ambos os progenitores»; 32ª - «Deve ser revogada a sentença recorrida e reconhecido o direito do menor ficar à guarda da mãe, embora seja fixada residência habitual em Portugal e consagrada a proibição de não se ausentar para o estrangeiro sem autorização de ambos os pais, mantendo-se no mais aquilo que for aplicável na sentença recorrida». Dispõe o art. 1905 nº 2 CC (na redacção anterior às alterações introduzidas pela Lei 61/2008 de 31 de Janeiro) que «na falta de acordo, o tribunal decidirá de harmonia com o interesse do menor, incluindo o de manter uma relação de grande proximidade com o progenitor a quem não seja confiado, podendo a sua guarda caber a qualquer dos pais, ou ... a terceira pessoa...». Em causa está acção de regulação do exercício do poder paternal. O grande princípio subjacente é o do interesse do menor. A ele se referem todas as disposições legais aplicáveis, art. 180 OTM, art. 1878 nº 1, 1885, 1905 nº 2 e 1918 CC. A nível constitucional temos os artigos 36 e 69 CRP. O mesmo princípio se mostra vertido nos art. 3º nº 1 e 9º nº 3 da Convenção Sobre os Direitos das Crianças, (aprovada para ratificação pela Resolução da Assembleia da República nº 20/90 de 12 de Setembro). Assim, toda a jurisprudência entende que o interesse exclusivo a ter em atenção é o do menor. Não define a lei o que deve entender-se por interesse do menor, pelo que este deve ser determinado casuisticamente, em face das circunstâncias concretas. Para o efeito pode o julgador socorrer-se das ciências auxiliares do direito, tendo em atenção a sociedade em que se julga e a sua evolução. Entende o recorrente que embora o menor tenha sido confiado à guarda da mãe, e aceitando esse facto, deverá ao mesmo ser fixada residência em Portugal, com proibição de se ausentar para o estrangeiro, sem autorização de ambos os progenitores. Sustenta a sua pretensão, em síntese da seguinte forma: - O direito da criança a manter contactos pessoais e directos com ambos os progenitores deve ser qualificado como um direito fundamental (art. 16 nº 1 CRP); - A Jordânia não ratificou a Convenção de Haia sobre os Aspectos Civis do Rapto Internacional de Crianças; - Na Jordânia, correm mandados de captura e processos criminais contra o recorrente, que assim não poderá deslocar-se àquele país; - Pelo tribunal da Jordânia foi já regulado o exercício do poder paternal, tendo o menor sido confiado em exclusivo à mãe; - O recorrente não poderá fazer valer os seus direitos de progenitor não guardião junto dos tribunais jordanos. Como já se referiu, o único critério a ter em atenção é o «interesse da menor». A determinação do interesse do menor, não é tarefa fácil, pois que há que ter em atenção a sociedade em que se julga, a sua evolução. Nesta parte há a considerar que a família, na sua constituição e funções dos seus elementos, tem sofrido alterações acentuadas nos últimos tempos. Assim, o papel tradicional do homem e mulher mostra-se alterado. O tradicional papel da mulher como mãe, tendo como função essencial as tarefas domésticas e educação dos filhos, mostra-se alterada. Por outro lado o homem (pai) foi chamado a desempenhar também tarefas que anteriormente se entendia serem destinadas às mulheres, nelas se incluindo as atinentes aos filhos e sua educação. Nisso teve certa importância a emancipação da mulher, ingresso em carreiras profissionais, em igualdade com os homens, saída de casa, desaparecimento do tradicional ruralismo (com deslocação para grandes centros urbanos). Esses fenómenos repercutiram-se sobre toda a organização familiar, nomeadamente nos filhos, que por via disso deixaram de ficar entregues a um dos progenitores (a mãe), passando, em regra o dia entregues a terceiros (colégios e infantários), com quem se dividem e estabelecem também ligações afectivas. Nestas circunstâncias, a educação é ministrada também por terceiros, e não só pelos progenitores. Entende-se pois a progressiva equiparação dos sexos, que se vem sentindo a nível legal, também neste domínio e que apontam para uma igualdade de tratamento dos pais, quando a criança não pode ser educada por ambos. Isso resulta claramente, por exemplo do art. 7º e 9º da Convenção dos Direitos das Crianças, já referido, que relativamente à cláusula 6ª da Declaração de 1959 da Assembleia Geral da ONU, sofreu acentuada alteração (pois nesta apontava-se a conveniência de a criança, na infância não ser separada da mãe, salvo em circunstâncias excepcionais). Será pois o exclusivo interesse da criança que ditará a quem deverá ser confiado (e normalmente esse interesse aconselha a entrega à mãe). È sabido que a criança tem necessidade de crescer e de se desenvolver numa atmosfera calma e em ambiente de serena integração familiar, com salvaguarda da satisfação da sua necessidade básica de continuidade das relações afectivas, cuja quebra pode criar sentimentos de insegurança e afectar o seu normal desenvolvimento. Assim a criança deve ser entregue ao progenitor que mais garantias dê de valorizar o desenvolvimento da sua personalidade e lhe possa prestar mais assistência e carinho (Ac TRP. 17.05.94, CJ 94, 3, 200; Ac TRC 19.04.88, CJ 88, 2, 67; Ac STJ 09.05.96 CJ STJ 96, 2, 66; Ac TRC 02.11.94, CJ 94, 5, 34). No caso presente, a aplicação dos princípios enunciados, complica-se, uma vez que os pais têm nacionalidades diferentes e pertencem a culturas substancialmente diferentes (o pai é português e a mãe iraquiana). O Tribunal de 1ª instância decidiu pela confiança da guarda, do menor à mãe, e com essa decisão se conforma o apelante, sendo que dos elementos constantes dos autos, se afigura não merecer tal decisão qualquer censura. O que o apelante questiona é viabilidade do exercício dos seus direitos, e ainda do direito do menor a manter uma relação de proximidade com o progenitor não guardião, uma vez que a mãe reside na Jordânia e o progenitor estabeleceu residência em Portugal. Como se salienta na sentença sob recurso, de tal facto resultará necessariamente que o menor ficará privado do convívio assíduo com um dos progenitores. O facto de um dos progenitores, nomeadamente, aquele a quem foi confiada a guarda do menor, alterar a sua residência, nomeadamente deslocando-se para o estrangeiro, tem suscitado, pedidos de alteração da regulação do exercício do poder paternal. Como refere Maria Clara Sottomayor (Regulação do Exercício do Poder Paternal ..., 4ª edc. Pag.59/60), a Lei 84/95 ao por «o acento, não no interesse deste progenitor, mas no interesse do menor em manter relações com ambos os pais, significa que o juiz, em caso de falta de acordo dos pais, quando tem de escolher a qual dos progenitores confia a guarda da criança, deve ter em conta, segundo indicação da lei, a disposição de cada um dos pais para favorecer as relações da criança com o outro progenitor» (...) «O progenitor que permite que a criança mantenha uma relação positiva com o outro, revela mais maturidade humana e capacidade de separar o conflito entre ambos...» No caso presente, temos o seguinte quadro factual: a) A mãe do menor é iraquiana, vive na Jordânia, (em Amã), detendo empresas no Iraque e na Jordânia, onde tem centrada a sua vida (1, 26); b) O pai do menor tem nacionalidade portuguesa. Contraiu casamento em 22.02.1986, que foi dissolvido por divórcio em 04.10.1990. Casou novamente em 18.11.1994, casamento este dissolvido por divórcio em 29.04.2003 (2); c) Em 23.02.1999, os progenitores contraíram entre si casamento civil em Bagadad, passando a viver até Janeiro de 2003, alternadamente em Bagadad e Amâ (3, 5); d) O menor nasceu em 20.03.2000, em Amã, Jordânia, onde viveu com os pais, frequentando o colégio International ... Jordam, onde fez as suas amizades e se sentia feliz (4, 6); e) Em 30.04.2007 o progenitor foi buscar o menor à escola (em Amã), levou-o para o aeroporto e trouxe-o para Portugal, sem autorização nem consentimento da mãe do menor (12); f) Uma vez em Portugal, o recorrente não telefonou à recorrida nem contactou com a mesma, avisando-a do local onde estava a o menor (14); g) Só passados alguns dias é que a mãe do menor teve conhecimento que o menor se encontrava em Portugal (14); h) Só em 26.06.2007 é que a mãe do menor obteve passaporte para entrar em Portugal, para onde se deslocou em 28.06.2007, abandonando a sua vida na Jordânia para estar junto do filho. Após a sua chegada o recorrente não lhe disse onde morava nem em que escola se encontrava o menor, logrando a recorrida ver o menor pela 1ª vez em 02.07.2007 (16, 17, 18); i) Em 04.09.2007 foi fixado um regime provisório em que o menor foi confiado aos cuidados da mãe, com estabelecimento de um regime de visitas por parte do pai, regime que foi cumprido (19. Dos Exames Psicológicos constantes nos autos, retira-se na parte que ora nos ocupa o seguinte: a) Relatório relativo ao D... (fol. 2736 e segs): «Se a guarda do menor lhe for atribuída, permanecerá em Portugal, onde deseja que o filho possa crescer com estabilidade (...) Considera que B.. é, acima de tudo, uma mulher de negócios, que quer lutar pelo filho apenas por uma questão de vaidade e glória ( ...) Mostra-se preocupado com o facto de B... denegrir a sua imagem junto do filho». b) Relatório pericial, relativo a B... (fols. 2757 e segs): «Os cuidados à criança eram, quase sempre assegurados por si. Salienta, no entanto, que D... a ajudava ... nesse aspecto, é um bom pai (...) Pensava várias vezes em separar-se, mas que adiava ao pensar no filho e no desejo de que este crescesse junto do pai, tal como ela própria sempre cresceu junto de ambos os pais. (...) Destaca o facto de tentar sempre que o filho mantenha uma boa imagem do pai. A situação ideal seria que todos fossem viver em Amã, na medida em que reconhece que, para o C..., é importante manter-se próximo do pai. Caso o D... pretenda permanecer em Portugal, considera que, assim, a situação ideal será este poder passar com o filho alguns períodos nas férias. Desta forma, requer a guarda única do menor, reconhecendo o direito de visita do pai». Das declarações prestadas nos autos, pelos progenitores, ressalta desde logo que é a mãe que mais motivada está para garantir a manutenção de uma relação de proximidade do menor com o outro progenitor. Já se referiu que a questão distância geográfica, é suscitada normalmente em situações em que, tendo-se atribuído a guarda a um dos progenitores, este decide deslocar-se para outra cidade ou para outro país. Não é essa a situação presente, em que se atribuiu a guarda a um dos progenitores, sabendo-se que ambos pretendem residir em países diferentes. Esta situação de facto, impossibilita, como se viu, um contacto assíduo do menor com ambos os progenitores. Como saliente Maria Clara Sottomayor (obra citada pag. 67) «a relação do progenitor sem a guarda com o filho pode, de facto ser mantida, através de estadias mais prolongadas da criança junto do progenitor sem a guarda, durante as férias, o que até permite uma relação mais natural do que os tradicionais fins-de-semana alternados. Por outro lado, os modernos meios de comunicação (telefax, telefone, cassetes audio ou vídeo, internet), permitem, com toda a facilidade, um diálogo diário entre o progenitor e o filho. A qualidade da relação da criança com o progenitor sem a guarda é um valor mais importante do que a quantidade ....» E prosseguindo com a citação (fol. 69): «A questão da mudança de residência deve ser analisada à luz das alternativas para a criança no caso de se proibir a deslocação, e detecta-se ... que nenhuma ... que nenhuma das soluções é a ideal. Portanto terá de se optar pela menos má, a qual, constitui ... a permanência da criança junto da sua figura primária de referência. Esta solução é a mais conforme à lei, pois, é o progenitor guarda que detém o poder-dever de fixar a residência do menor (art. 85 nº 1 e 1887 CC e 192 OTM) e é a solução que evita uma intervenção excessiva do Estado na família. (...) Se o Estado reconhece a necessidade que os adultos têm de recorrerem ao divórcio para se auto-realizarem, não pode depois obrigar os ex-cônjuges a viverem na mesma localidade e a abdicar de refazerem a sua vida pessoal ...» A dissolução de casamentos entre pessoas de nacionalidade diferente, tem originado com alguma frequência que um dos pais regresse ao seu país, levando consigo os filhos, sem autorização do outro progenitor, muitas vazes na expectativa de que aí, mais facilmente conseguirá obter a sua guarda. Foi sobretudo para obviar e resolver essas situações (subtracção e rapto internacional de menores), que foi outorgada a Convenção de Haia Sobre os Aspectos Civis do Rapto Internacional de Crianças, (aprovada pelo DL 33/83 de 11 de Maio - que curiosamente agora o apelante invoca em seu favor). Como resulta da mesma convenção, o principal objectivo foi o de proteger o interesse do menor contra a separação ilícita de um dos pais, bem como contra a desinserção do ambiente e da cultura onde o menor vivia. No caso presente, o apelante decidiu contrair matrimónio com uma iraquiana, com residência quer no Iraque, quer na Jordânia. O filho desse casamento (o menor João), nasceu na Jordânia e aí viveu (e por vezes no Iraque) com os pais, frequentando um colégio, por ambos escolhido, onde tinha amigos e era feliz, até à idade de sete anos, altura em que (30.04.2007) o pai, sem conhecimento e sem autorização da mãe o trouxe para Portugal. O facto de o menor se ter adaptado à nova vida e ter feito novos amigos, facto a que não será alheio o de a mãe, com sacrifício da sua vida profissional, ter decidido fixar residência próximo do local para onde o apelante trouxe o menor e o matriculou numa escola, para assim o acompanhar, não pode ser decisivo, para do ponto de vista do interesse do menor, aqui se fixar a sua residência. Também o facto de em confronto estarem Estados com culturas assaz diferentes, não pode relevar, sabendo-se que o menor nasceu e cresceu na Jordânia, onde era feliz. A alteração produzida na vida do menor, foi provocada pelo ora recorrente, com dificuldade se vendo como se pode sustentar, que isso foi feito no interesse do menor e que no seguimento dessa actuação, se fixe ao mesmo residência habitual em Portugal. Acresce que tendo-se confiado a guarda do menor à mãe, que se sabe ter residência na Jordânia, onde tem instalada a sua vida profissional, o estabelecimento de residência do menor em Portugal, e ainda a proibição de se ausentar para o estrangeiro, sem autorização de ambos os progenitores, constituiria na prática o esvaziamento completo do poder-dever em que foi investida a mãe (exercício do poder paternal), ou a imposição de um ónus ilegítimo, como seja o de a mãe ter que estabelecer residência em Portugal. O recurso não merece proceder. Concluindo: - Não pode o tribunal dar como provados factos constantes de documentos particulares, quando impugnados pela parte contrária e não corroborados por outros meios de prova, nomeadamente testemunhal; - A guarda do menor deve ser confiada ao progenitor que mais garantias dê de promover o seu desenvolvimento físico, intelectual e moral, bem como as suas necessidades afectivas; - Residindo os progenitores em países diferentes, não faz sentido confiar-se a guarda do menor a um deles e fixar-se a residência (do menor) no país do não guardião, sob pena de se esvaziar de conteúdo o poder-dever atribuído; - A Convenção de Haia sobre os Aspectos Civis do Rapto Internacional de Crianças, teve como principal objectivo a protecção do interesse do menor contra a separação ilícita de um dos seus pais, bem como contra a desinserção do ambiente e da cultura em que estava inserido. DECISÃO Em face do exposto decide-se: 1- Negar provimento aos recurso de agravo interpostos, confirmando-se as decisões recorridas; 2- Julgar improcedente o recurso de apelação, confirmando-se a sentença recorrida; 3- Condenar o recorrente, nas custas. Lisboa, 11 de Março de 2010. Manuel Gonçalves Ascenção Lopes Gilberto Jorge. |