Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | CATARINA ARÊLO MANSO | ||
Descritores: | CARTÃO DE CRÉDITO CLÁUSULA CONTRATUAL GERAL DEVER DE COMUNICAÇÃO ABUSO DE DIREITO | ||
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Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 05/26/2011 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | IMPROCEDENTE | ||
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Sumário: | I - O legislador, possibilitou ao aderente o conhecimento antecipado da existência das cláusulas contratuais gerais, que irão integrar o contrato singular, bem como o conhecimento do seu conteúdo, exigindo-lhe, para esse efeito, também a ele, um comportamento diligente. II - Não consta, nem alegou que pediu informações sobre qualquer elemento do contrato e lhe tivesse sido recusada durante estes 28 anos de utilização. (Sumário da Relatora) | ||
Decisão Texto Parcial: | ![]() | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa I- A…SA. intentou a presente acção declarativa de condenação, sob a forma de processo sumário, contra B… pedindo que o R. seja condenado a pagar à autora a importância de € 24.242,91, acrescida dos juros moratórios que se vencerem desde 26.11.2009 e até efectivo e integral pagamento, à taxa convencional de 22,76%. Invocou a falta de pagamento de despesas efectuadas com um cartão de crédito que facultou ao réu. O R. foi citado e contestou a acção, alegando ineptidão da petição inicial, prescrição e falta de recebimento dos extractos mensais. A A. apresentou articulado de resposta. Foi proferido despacho saneador que julgou improcedente a arguida ineptidão da petição inicial. Dispensou-se a selecção da matéria de facto assente e a elaboração da base instrutória. Procedeu-se a julgamento e a acção foi julgada procedente e condenou o réu a pagar a quantia de €24.42,91, acrescida dos juros moratórios vencidos e vincendos desde 26.11.2002 e até integral pagamento, à taxa convencional de 22,76% contados sobre o capital de €16.450,05. Não se conformando com a decisão interpôs recurso o réu e nas suas alegações concluiu: - a emissão de um cartão pressupõe um contrato entre mutuante e mutuário; - não foi feita prova, ao encontro do que estatui o nº 3 o artº5 do DL nº 446/85, de que foi comunicado previamente ao recorrente, de modo adequado efectivo, segundo o critério de idoneidade e as circunstâncias do caso concreto, o conteúdo das clausulas contratuais gerais, não podendo a prova da recepção ser tácita, como que a retirar do silencioso uma manifestação tacita de aceitação; - a falta de resposta à matéria exceptiva alegada pelo recorrente implica dar como provada a mesma, realidade que não considerou bem como a nulidade inerente à não recepção das comunicações. Houve contra alegações defendendo a decisão impugnada Corridos os vistos legais nada obsta ao conhecimento Factos 1) A A. é uma sociedade financeira que se dedica à emissão e comercialização de cartões de crédito, nos sistemas Visa, MasterCard e outros. 2) Em 24.10.1984 e no exercício da sua actividade, pelo documento escrito constante de fls. 10, a A. convencionou com o R., a solicitação e interesse deste, os termos e condições de atribuição de utilização de cartão de crédito, tendo este sido posteriormente reemitido, até que foi substituído pelo cartão com o n.º …. 3) Nos termos do referido contrato, foram acordadas, entre outras, as seguintes regras: - A A. obrigou-se a efectuar aos comerciantes a quem o R., por meio do uso dos cartões que aquela emitiu e lhe entregou, tenha feito aquisições de bens e/ou serviços, seja em Portugal ou no estrangeiro, o pagamento integral do respectivo preço, até ao limite máximo de utilização convencionado, e bem assim, a reembolsar as instituições de crédito junto das quais o R. tenha, se aplicável, efectuado levantamentos em numerário e a crédito, designadamente em Caixas Automáticas de Multibanco e Visa; - Mensalmente, a A. emitia e enviava ao R., para a morada por este indicada, o Extracto da Conta-Cartão, conjuntamente referente a ambos os citados cartões, contendo (i) a descrição e os valores das transacções efectuadas, pagas pela A…SA em nome do R., (ii) os valores que por este fossem devidos à A…SA pela prestação de serviços, (iii) os valores respeitantes a correcções ou movimentos de estorno quando devidos, (iv) os valores respeitantes a anuidades, juros, impostos e encargos devidos a serviços solicitados pelo R. à A…SA e (v) os pagamentos que tenham sido efectuados no mês e por referência ao Extracto anterior pelo R. à A…SA. - O R. comprometeu-se a, pela titularidade do Cartão, pagar uma anuidade do montante em cada ano em vigor e, bem assim, a pagar à A. vinte dias após a data da emissão de cada Extracto de Conta mensal, a quantia total neste indicada como estando em dívida ou, em alternativa, a efectuar o pagamento em prestações mensais nunca inferiores a 10% do valor total em dívida, caso em que seriam debitados juros sobre o valor que ficasse em dívida, calculados por aplicação da taxa que, a cada momento, fosse a convencionada. - O R. obrigou-se a não utilizar os respectivos Cartões para além do limite máximo de utilização convencionado para a respectiva Conta-Cartão. 4) Convencionaram ainda A. e R. que, no caso de não ser efectuado o pagamento integral do saldo indicado em cada extracto, sobre o valor do capital remanescente em dívida seria aplicada uma taxa de juro mensal, que poderia ser revista pela A., sendo tais alterações posteriormente comunicadas ao R., através do extracto de conta, cifrando-se tal taxa actualmente em 22,76% ao ano. 5) Ao longo do período de vigência do contrato celebrado, ocorreram alterações legislativas que obrigaram a A. a reformular as condições gerais de utilização dos cartões de que o R. era titular, as quais foram ainda alteradas para assegurar acrescidas das condições de segurança, sendo que a última versão das Condições Gerais de Utilização juntas a fls. 12, tendo as mesmas sido enviadas ao R. logo após a sua elaboração. 6) E tendo tomado conhecimento dessas novas Condições Gerais de Utilização, Direitos e Deveres das Partes, o R. não usou da faculdade de, caso delas discordasse, rescindir o Contrato ao abrigo do qual lhes foram atribuídos os cartões de crédito, faculdade de que dispunham nos termos das mesmas condições. 7) Mediante a utilização dos cartões referidos em 2), o R. adquiriu, em diversos estabelecimentos comerciais por si escolhidos, bens e/ou serviços, e levantamento em Caixas Automáticas Multibanco no valor de € 16.450,05, nos termos constantes de fls. 13, bem como outros produtos financeiros associados à sua conta-cartão. 8) A A. procedeu sempre e em cada momento ao pagamento integral do preço de todos os bens e/ou serviços adquiridos pelo R. nos estabelecimentos comerciais por ele escolhidos, bem como levantamentos em caixas Multibanco. 9) A A. remeteu ao R. para a morada por este indicada, conforme acordado, os extractos discriminativos do saldo devedor do cartão utilizado, expresso nos mesmos, sob a rubrica "Saldo Anterior", sendo que o último pagamento efectuado ocorreu em 18/01/2008. 10) Deveria o R. ter pago à A., até ao dia 07/06/2008 a quantia de € 16.450,05, a que acresciam, então, o montante de € 2.383,18 a título de juros remuneratórios à taxa convencionada de 22,76% ao ano, acrescida de imposto de selo no valor de € 16,88 e despesas judiciais no valor de € 181,50. 11) Face ao não pagamento dos valores mínimos mensais, a A. procedeu ao cancelamento do Cartão Unibanco titulado pelo R. 12) As quantias referidas em 10) encontram-se por pagar. 13) Na quantia indicada em 10) está incluída a utilização "Cash Advanced" em conta, ou seja, um Crédito pessoal transferido para a conta bancária indicada pelo R. com o valor contratado no pedido de financiamento, conforme documentos de fls. 88 a 93 dos autos. 14) Resulta das condições gerais dos pedidos de utilização de "Cash Advance", ficou acordado que o reembolso das quantias de "Cash Advance" em Conta utilizadas e o pagamento dos respectivos encargos seriam efectuados em pagamentos mensais e sucessivos, de igual montante, e no prazo convencionado. 15) Os pagamentos mensais devidos pela atribuição do Crédito pessoal seriam lançados a débito na Conta-Cartão de que é titular o R.. 16) A rescisão ou cessação de vigência, bem como o cancelamento do cartão importam o vencimento imediato e a exigibilidade da totalidade dos pagamentos mensais devidos pela utilização do referido crédito e que não tenham ainda sido lançados a débito na conta-cartão, os quais transitam integralmente para o saldo da referida conta-cartão. 17) Foram assumidos diversos compromissos contratuais no sentido de proceder ao pagamento da quantia disponibilizada pela A…SA em 24 prestações mensais, cada um. 18) Por falta de pagamento dos extractos na sequência de utilização do cartão de Crédito …, os créditos pessoais atribuídos venceram-se e, consequentemente no extracto de conta datado de 18/05/2008, foi exigida a totalidade dos pagamentos mensais devidos pela atribuição do referido Crédito. 19) A presente acção deu entrada em juízo no dia 02.12.2009 e o R. foi citado em 10.12.2009. Houve contra alegações defendendo a manutenção da decisão Corridos os vistos legais, nada obsta ao conhecimento II – Apreciando O recurso é balizado pelas conclusões das alegações, estando vedado ao tribunal apreciar e conhecer de matérias que naquelas não se encontrem incluídas, a não ser que se imponha o seu conhecimento oficioso (art. 684º, nº 3 e 690º, nºs 1 e 3 do CPC), acrescendo que os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, sendo o seu âmbito delimitado pelo conteúdo do acto recorrido. Vem provado que o apelante há mais de 28 anos que vem utilizando o cartão da apelada que é sucessivamente renovado. Ou seja, o primeiro cartão foi emitido em 24.10.1984, sendo ele funcionário bancário do Banco …, doc. fls. 10. A defesa do apelante cinge-se à falta de prova, do que estatui o nº 3 o artº5 do DL nº 446/85, de que foi comunicado previamente ao recorrente, de modo adequado e efectivo, segundo o critério de idoneidade e as circunstâncias do caso concreto, o conteúdo das clausulas contratuais gerais, não podendo a prova da recepção ser tácita, como que a retirar do silêncio uma manifestação tácita de aceitação. E que a falta de resposta à matéria exceptiva alegada pelo recorrente implica dar como provada a mesma, realidade que não se considerou bem como a nulidade inerente à não recepção das comunicações. Mas, salvo o devido respeito, não é verdade, basta ver os art.4 a 9 dos factos provados, para se concluir que lhe foram remetidos e sempre teve conhecimento das condições para a utilização do referido cartão. E não se diga, como sustenta o recorrente, que, não foi feita prova da comunicação das cláusulas. Aliás, essa prova foi feita com a remessa do contrato para casa do apelante, cabendo - lhe a prova de que não recebeu. Na substituição do cartão, que tem um período de validade, foram também remetidas as cláusulas alteradas. E, o apelante continuou sempre a usar o cartão. Se sempre recebeu os cartões, pois não houve interrupção na utilização, também recebia as clausulas que o acompanhavam. E, se não lho tivessem retirado, continuaria a usar ainda hoje. Por outro lado, uma resposta negativa a uma questão não conduz à prova do contrário, mas antes a considerar como se não tivessem sido articulados os factos contidos nesse quesito. Vem provado que o autor ora apelado sempre remeteu o contrato para o réu e este nada disse e continuou a usar o cartão. Aliás, este é um cartão que lhe permite fazer compras e não as pagar na altura, diferindo o pagamento das mesmas para mais tarde. E o apelante aceitou essas condições como consta da sua contestação que aceitou a matéria dos art. 1, 2 e 3,da p.i. Como é do conhecimento geral esta é uma modalidade do dinheiro de plástico que permite ao seu titular realizar as despesas que quiser, até ao montante máximo autorizado pela empresa que o promove e se compromete perante terceiros a efectuar os pagamentos, substituindo-se ao devedor originário titular do cartão. E, o invocado desconhecimento do valor da dívida porque não recebeu quer os extractos quer o contrato, não colhe de forma alguma. Provou-se que só quem recebesse os extractos podia ter conhecimento do valor mínimo a pagar indicado pela apelante com a informação e modo de pagamento, basta consultar os extractos juntos, sendo certo que o montante era variável, bem como o montante mínimo aceite para o pagamento. Além disso, vem provado que houve contactos e foi celebrado um acordo de pagamento para regularização da dívida. Mas, para além de usar o cartão recorreu ao “Cash Advance”, crédito pessoal transferido para a conta bancária por si indicada com o valor do financiamento, cf. doc. de fl. 88 a 93. Resulta das condições gerais dos pedidos de utilização de “Cash Advance” que ficou acordado o reembolso das quantias em conta e o pagamento dos respectivos encargos seriam efectuados em pagamentos mensais e sucessivos, de igual montante e, no prazo acordado. O último pagamento foi efectuado em 18.1.2008. Visando combater os abusos do poder económico e de defesa do consumidor, bem como a autonomia privada do uso destes meios electrónicos, atendendo aos apelos da Comunidade Europeia, no sentido de serem tomadas medidas de combate e condenação das cláusulas abusivas, surgiu o DL 446/85 de 25/10. Com o regime jurídico das cláusulas contratuais gerais o legislador, confrontado com um fenómeno de tráfego negocial de massas, procurou salvaguardar o contraente mais fraco, protegendo-o de cláusulas abusivas e susceptíveis de ocasionar um desequilíbrio entre os contraentes, posto que a contratação baseada em condições negociais gerais tem implícita uma certa posição de poder do utilizador das cláusulas decorrente do próprio modo de formação do contrato. Com tal desiderato foram traçadas, no essencial, formas de assegurar a tutela dos interesses dos contraentes mais desprotegidos contra cláusulas contratuais absolutamente proibidas ou relativamente proibidas pela via da fiscalização do controlo incidental (declaração de nulidade no quadro de apreciação de um contrato singular) e da fiscalização ex ante do controlo abstracto (acção inibitória), cf. Almeno de Sá, Cláusulas Contratuais e Directivas Sobre Cláusulas Abusivas, 2ª ed., Almedina, pág. 208 e 270. Como se refere no Ac. do STJ, de 23.04.2002, www.dgsi.jstj.pt, citando Almeno de Sá, “…a fiscalização das condições gerais processa-se, em primeiro lugar na forma de controlo incidental, isto é, no âmbito de um litígio referente a cláusulas de um contrato concluído entre determinado utilizador e o seu parceiro negocial. Estão em jogo uma ou várias estipulações referentes a um concreto contrato celebrado entre dois sujeitos, que se opõem num diferendo onde se questiona a vigência ou validade de tais estipulações”. “Ao lado deste tipo de fiscalização, funciona um processo abstracto de controlo, destinado a erradicar do tráfico jurídico condições gerais iníquas, independentemente da sua inclusão efectiva em contratos singulares. Consagrou-se, com esta finalidade preventiva, o sistema da acção inibitória: visa-se que os utilizadores de condições gerais desrazoáveis ou injustas sejam condenados a abster-se do seu uso ou que as organizações de interesses que recomendem tais condições aos seus membros ou associados sejam condenadas a abandonar essa recomendação.” Menezes Cordeiro, Tratado de Direito Civil, Parte Geral Tomo I, 1999, Almedina, págs. 353 a 355, que define as cláusulas contratuais gerais como “proposições pré-elaboradas que proponentes ou destinatários indeterminados se limitam a propor ou aceitar”, ensina que a noção de cláusulas contratuais gerais pode ser decomposta em vários elementos dos quais convém aqui destacar a generalidade e a rigidez. Acresce que, segundo o disposto no citado art. 5.º, n.º 3, “o ónus da prova da comunicação adequada e efectiva cabe ao contratante que submeta a outrem as cláusulas contratuais gerais” – na redacção que lhe foi dada pelo Dec. Lei n.º 220/95, de 31/1, que teve como declarado objectivo adaptar a lei nacional aos princípios consagrados na Directiva n.º 93/13/CEE, do Conselho, de 5 de Abril de 1993. Como resulta expressamente do preâmbulo de tal diploma …. "as sociedades técnicas e industrializadas da actualidade introduziram, contudo, alterações de vulto nos parâmetros tradicionais da liberdade contratual. A negociação privada, assente no postulado da igualdade formal das partes, não corresponde muitas vezes, ou mesmo via de regra, ao concreto da vida. Para além do seu nível atomístico, a contratação reveste-se de vectores colectivos que o direito deve tomar em conta. O comércio jurídico massificou-se: continuamente, as pessoas celebram contratos não precedidos de qualquer fase negociatória. A prática jurídico-económica racionalizou-se e especializou-se: as grandes empresas uniformizam os seus contratos, de modo a acelerar as operações necessárias à colocação dos produtos e a planificar, nos diferentes aspectos, as vantagens e as adscrições que lhes advêm do tráfico jurídico.”. O cartão de crédito pode definir-se como o documento pessoal e intransmissível, emitido por uma entidade bancária, por uma instituição financeira ou outro estabelecimento comercial a favor de um determinado titular, cuja posse confere a este a possibilidade de adquirir bens e serviços junto de estabelecimentos comerciais. Ao nível da formação do acordo impõe o art. 5º o dever de comunicação prévia, e na íntegra, ao aderente, das cláusulas contratuais gerais que se pretenda fazer inserir em contratos singulares (nº 1). Essa comunicação deve ser feita de modo adequado e com a devida antecedência para que, tendo em conta a importância do contrato e a extensão e complexidade das cláusulas, se torne possível o seu conhecimento completo e efectivo por quem use de comum diligência (n.º 2). Procura o legislador, deste modo, possibilitar ao aderente o conhecimento antecipado da existência das cláusulas contratuais gerais, que irão integrar o contrato singular, bem como o conhecimento do seu conteúdo, exigindo-lhe, para esse efeito, também a ele, um comportamento diligente. Devem ser prestados todos os esclarecimentos razoáveis que tenham sido solicitados. Devem ser consideradas as anteriores relações comerciais. Trata-se de uma obrigação de meios, certo que a lei não exige ao predisponente das cláusulas gerais que implemente o resultado do conhecimento efectivo das cláusulas gerais, bastando que realize, para o efeito, a actividade que, em concreto, se mostre razoavelmente idónea (Mário Júlio de Almeida Costa e António Menezes Cordeiro, -Cláusulas Contratuais Gerais, pág. 25). Este dever de comunicação prévia mostra-se cumprido. Aliás, como vem provado a parte tinha 30 dias para as aceitar ou não. No caso vertente o apelante recebeu-as e continuou sempre a usufruir das vantagens do mesmo. Não consta que tivesse pedido informações sobre qualquer elemento do contrato e lhe tivesse sido recusada. Aliás, o apelante com a sua actividade profissional de bancário sabia por dever de ofício as implicações do uso do cartão de crédito da apelada. Por outro lado, não se pode falar em desconhecimento dos factos, tanto mais que o cartão foi sendo sucessivamente substituído e remetido com as condições actualizadas e o apelante sempre o usou e não o revogou. Por outro lado, não se aceita o desconhecimento dos extractos uma vez que sempre foi pagando por multibanco e só quem recebe os extractos tem acesso à indicação das referências que aí constavam. Só em 18.1.2008 deixou de efectuar os pagamentos. Sendo certo que, vem provado que houve contactos do apelante para calendarizar o pagamento dos montantes em dívida constantes dos extractos. Mas, se por hipótese, se aceitasse que assistia razão ao recorrente relativamente à questão que submeteu à apreciação e, agora, em apreço, sempre teria agido com abuso de direito. O abuso de direito – art. 334º do Código Civil – traduz-se no exercício ilegítimo de um direito, resultando essa ilegitimidade do facto de o seu titular exceder manifestamente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito. Não basta, porém, que o titular do direito exceda os limites referidos, sendo necessário que esse excesso seja manifesto e gravemente atentatório daqueles valores. Como não se exige que o titular do direito tenha consciência de que o seu procedimento é abusivo, isto é, não é necessário que tenha a consciência Uma das variantes do abuso de direito é a proibição de venir contra factum proprium. Com esta fórmula pretende-se significar ser ilegítimo o exercício de um direito quando o seu titular excede os limites impostos pela boa fé, o que ocorre quando há contradição real entre a conduta de um dos outorgantes que se vincula a dada situação futura, criando confiança na contraparte e a conduta posterior a frustrar a confiança criada. Menezes Cordeiro, in Da Boa Fé no Direito Civil, vol. II, pag. 795, escreve que “o exercício de um direito que implique alegação de nulidade formal pode ser abusiva por contrariar a boa fé.” Por outro lado, como lembra o Ac. do STJ de 12.11.98, CJ Ac.STJ, ano VI, tomo 3, pag. 111, “o impedimento do direito de arguir o vício resultaria na atribuição de eficácia plena a um negócio que a lei declara imperativamente ferido de uma congénita inabilidade para a produzir”. E acrescenta: “... há situações limite, casos de gritante compromisso dos princípios da boa fé, que poderão justificar o impedimento, com fundamento em abuso de direito, da arguição da nulidade formal.” Neste sentido, veja-se Baptista Machado, in RLJ ano 118, pags. 10 e 11, e o Ac. do STJ de 17.01.2002, CJ Ac.STJ, ano X, tomo 1, pag. 48. À luz dos princípios expostos, não vemos que pudesse concluir-se como pretende o apelante que a apelada não lhe comunicou as clausulas de utilização do cartão nem lhe remeteu as informações deste cartão ou dos extractos. Concluindo 1.O legislador, possibilitou ao aderente o conhecimento antecipado da existência das cláusulas contratuais gerais, que irão integrar o contrato singular, bem como o conhecimento do seu conteúdo, exigindo-lhe, para esse efeito, também a ele, um comportamento diligente. 2. Não consta, nem alegou que pediu informações sobre qualquer elemento do contrato e lhe tivesse sido recusada durante estes 28 anos de utilização. III – Decisão: em face do exposto, julga-se improcedente a apelação, mantendo-se a decisão impugnada. Custas pelo apelante Lisboa, 26 de Maio de 2011 Catarina Arelo Manso Maria Alexandrina Branquinho António Valente |