Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
48-B/1998.L1-1
Relator: SOUSA PINTO
Descritores: RECLAMAÇÃO
DESPACHO DE MERO EXPEDIENTE
ADMISSÃO DO RECURSO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 05/27/2009
Votação: DECISÃO INDIVIDUAL
Texto Integral: S
Meio Processual: RECLAMAÇÃO
Decisão: DEFERIDA
Sumário: I – Despachos de mero expediente são “aqueles que se destinam a regular, de harmonia com a lei, os termos do processo, e que assim não são susceptíveis de ofender direitos processuais das partes ou de terceiros.” São os que “dizem respeito apenas à tramitação do processo, sem tocarem nos direitos ou deveres das partes.”
II – Não é assim de mero expediente o despacho em que o juiz refere não apreciar determinado requerimento alegando que o mesmo já havia sido apreciado anteriormente por documento transitado em julgado, uma vez que não se limita a regular o andamento normal do processado, antes faz uma apreciação sobre o trânsito em julgado duma decisão, o que é passível de impugnação pelas partes.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: 1.           

No processo n.º 48-B/98 do 2.º Juízo Cível do Tribunal Judicial da Comarca do Seixal, foi deduzida reclamação por A. Lda., relativamente ao despacho da Meritíssima Juíza que não admitiu o recurso por aquela interposto, com base na seguinte fundamentação:

“Fls. 790: O despacho sob recurso não é recorrível, na medida em que se consubstancia no reiterar do já decidido em despachos anteriores e no afirmar da falta de poder jurisdicional para tornar a apreciar uma questão já decidida na sequência de acórdão de tribunal superior, com trânsito em julgado.

Face ao exposto, nos termos dos artgs. 679.º e 687.º, n.º 3, do Código de Processo Civil, indefiro o recurso interposto pela expropriada.

Notifique.”

A ora reclamante pretendia recorrer do despacho com o seguinte teor:

“Indefiro a requerida designação de data para a realização de reunião entre as partes atendendo a que a questão ora suscitada já se mostra decidida por despacho transitado em julgado, proferido na sequência do Acórdão da Relação de Lisboa.

Assim, e uma vez que se mostra esgotado o poder jurisdicional quanto à matéria em causa, para que possa receber a indemnização a que tem direito, deverá a expropriada, antes de mais, proceder à entrega do imóvel sito na Rua B., à expropriante, para o que se concede o prazo de 10 dias.

Notifique.”

Entende a reclamante que não poderia a Meritíssima Juíza não ter admitido o recurso em causa, até porque, como refere, no seu requerimento de interposição de recurso referiu expressamente que pretendia pôr em causa a decisão no que respeita à alegada existência de caso julgado.

2.           

A questão que se mostra aqui em apreciação é tão só a de saber se o despacho de que a ora reclamante pretende recorrer é passível de recurso ou se assistia à Meritíssima Juíza o direito a não o admitir.

 Afigura-se-me que a resposta terá de ser no sentido de considerar que não terá a 1.ª Instância invocado qualquer razão legalmente válida para não admitir o recurso.

Com efeito, pese embora tenha feito referência ao art.º 679.º do Código de Processo Civil, o que é facto é que é manifesto que o despacho de que a ora reclamante pretendia recorrer não pode ser considerado de mero expediente ou praticado no âmbito dum poder discricionário.

Na definição de Alberto dos Reis (C.P.C. Anotado, vol. V, 240), despachos de mero expediente são “aqueles que se destinam a regular, de harmonia com a lei, os termos do processo, e que assim não são susceptíveis de ofender direitos processuais das partes ou de terceiros”. São os que “dizem respeito apenas à tramitação do processo, sem tocarem nos direitos ou deveres das partes”.

O despacho em causa, como é simples de ver, não se limita a regular o andamento normal do processado, antes faz apreciação sobre o trânsito em julgado de decisão, o que é passível de ser impugnável pelas partes.

Faz ainda a Meritíssima Juíza alusão ao n.º 3 do art.º 687.º do Código de Processo Civil, sendo certo porém que não descortinamos qualquer situação enquadrável em tal normativo que possa conduzir à inadmissibilidade do recurso - o mesmo é tempestivo, a recorrente tem as necessárias condições para recorrer e não vimos que a decisão não possa ser dele susceptível pois que, como referimos já, não se trata de despacho de mero expediente.

Desta forma, face a todo o exposto, entende-se que a reclamação deve proceder.

3.           

Assim, face a todo o exposto, defere-se a reclamação, determinando-se a substituição do despacho reclamado, por outro que admita o recurso.

Custas pela reclamada, com a taxa de justiça mínima.

Notifique.

Lisboa, 27 de Maio de 2009

 José Maria Sousa Pinto

 (vice-presidente do Tribunal da Relação de Lisboa)