Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
567/08.5TTVFX.L1-4
Relator: NATALINO BOLAS
Descritores: TRANSMISSÃO DE ESTABELECIMENTO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 02/23/2011
Votação: UNANIMIDADE
Texto Parcial: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA A DECISÃO
Sumário: Dependendo a procedência dos pedidos efectuados contra a recorrente, da prova da transmissão do estabelecimento, esses pedidos têm de soçobrar se os autores não provaram (nem sequer alegaram) que a recorrente assumiu os efectivos da entidade empregadora, ou que lhe tenha sido transmitida qualquer estrutura organizativa, clientela, bens corpóreos ou incorpóreos, ou, ainda, que a recorrente tenha assumido a actividade anteriormente desenvolvida pela entidade empregadora – elementos essenciais para se concluir pela existência de transmissão de estabelecimento nos termos do art.º 318.º do CT.
(Elaborado pelo Relator)
Decisão Texto Parcial:Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa

I – Relatório

A,
B, e
C,
intentaram apresente acção em processo comum, emergente de contrato individual de trabalho, contra
D – Comércio de Materiais de Construção, Lda.,
E – Construções e Venda de Materiais de Construção, Lda., e
F, Unipessoal, Lda.,
pedindo a condenação das RR, solidariamente entre si, no pagamento da quantia de €15.300,00, sendo €5000 ao 1ª A, €5.550 ao 2ª A e €4.750 ao 3ª A; acrescida das importâncias apuradas nos termos do art. 437º, do Código do Trabalho, bem como a reintegrá-los ao serviço das 2ª e 3ª RR, ou, em caso de opção tomada nesse sentido até à data da sentença, a pagarem-lhes as indemnizações por antiguidade calculadas de acordo com o art. 438º, do mesmo diploma.
Alegaram para o efeito, e em síntese, a existência de um contrato de trabalho com a 1ª R e a transmissão desta para as outras RR do seu estabelecimento e locais afectos ao exercício da sua actividade onde desenvolviam as suas funções.
Mais invocam a impossibilidade de prestação de trabalho por falta de instalações e que foram vítimas de despedimento ilícito por falta de processo disciplinar.
Referem, por último, a falta de pagamento de retribuições respeitantes a Março e Abril de 2008, bem como das férias e subsídio de férias vencidos em 01.01.2008, e, ainda, dos proporcionais de férias, subsídio de férias e de Natal referentes ao trabalho prestado em 2008.
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As RR E e F apresentaram contestação, conforme consta de fls. 138 e seguintes, onde excepcionaram a respectiva ilegitimidade para os termos da acção e invocaram também a ineptidão da petição inicial.
Sem prescindir, impugnaram parte dos factos alegados pelos AA, referindo, em síntese, que os contratos de trabalho dos AA sempre se mantiveram inalterados com a 1ª R, mesmo após a transmissão desta, pelo que não são devedoras das importâncias peticionadas.
Concluem pela improcedência da acção.
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Citado o Ministério Público em representação da Ré D, ausente, não foi deduzida qualquer contestação.
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Os AA apresentaram resposta à contestação a fls. 176 e seguintes, onde defenderam a improcedência das excepções invocadas.
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Foi proferido despacho saneador que declarou improcedentes a excepção de ineptidão da petição inicial e, bem assim, a excepção ilegitimidade passiva das R E e F, e afirmou a validade da instância.
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Procedeu-se à realização da audiência e discussão de julgamento e foi dada decisão sobre a matéria de facto, conforme consta de fls. 223-229, sem reclamações.
Foi proferida sentença cuja parte dispositiva se transcreve, após ter sido rectificada:
“Pelo exposto, julgo a presente acção parcialmente procedente e, em consequência:
1. Declaro ilícito o despedimento dos AA;
2. Condeno a R. E – Comércio de Materiais de Construção, Lda., a pagar a cada um dos AA a quantia de € 11.742,50 (onze mil, setecentos e quarenta e dois cêntimos e cinquenta cêntimos), correspondente às retribuições, incluindo férias, subsídio de férias e de Natal, vencidas desde 22.06.2008 e até à presente data, acrescida dos valores daquelas que se vencerem até ao trânsito em julgado da presente decisão, deduzidas dos montantes que, desde aquela data, os AA. hajam obtido por trabalho prestado a outra entidade, tudo a liquidar em execução de sentença;
3. Condeno a R. E, Lda., a pagar aos AA A, B e C, respectivamente, € 3.529,17 (três mil quinhentos e vinte e nove euros e dezassete cêntimos), € 4.262,50 (quatro mil duzentos e sessenta e dois euros e cinquenta cêntimos) e € 4.079,17 (quatro mil setenta e nove euros e dezassete cêntimos), a título de indemnização de antiguidade computada até esta data, bem como no montante que vier a liquidar-se em execução de sentença em função da antiguidade dos AA;
4. Condeno a R D – Comércio de Materiais de Construção, Lda. e a R E – Comércio de Materiais de Construção, Lda., a pagarem, solidariamente entre si a quantia de €1.650,00 (mil, seiscentos e cinquenta euros) a cada um dos AA, referente a retribuições, férias, subsídio de férias e proporcionais de férias, de subsídio de férias e de Natal;
5. Absolvo, no mais peticionado, a R D – Comércio de Materiais de Construção, Lda. e a R E – Comércio de Materiais de Construção, Lda.;
6. Absolvo a R. F Unipessoal, Lda., de todos os pedidos formulados pelos AA.”.
Custas pelos AA e pelas RR D e F, na proporção do decaimento, e sem prejuízo do apoio judiciário de que os AA beneficiam (art. 446º do Código do Processo Civil, aplicável ex vi art. 1º nº 2 al. a) do Código de Processo do Trabalho).

Inconformada com a sentença, veio a Ré E interpor recurso de apelação para este Tribunal da Relação, apresentando doutas alegações, com as seguintes conclusões:
(…)
Os Autores contra-alegaram pugnando pela manutenção da decisão recorrida e interpuseram recurso subordinado pretendendo a condenação solidária da ré F.
A ré F contra-alegou pugnando pela manutenção da decisão recorrida.
Não foi admitido o recurso subordinado interposto pelos autores, tendo sido admitido o recurso de apelação interposto pela ré E, Lda.
Subiram os autos a este Tribunal da Relação, onde o Exmo. Magistrado do Ministério Público emitiu douto parecer no sentido da improcedência do recurso.
Nada obstando ao conhecimento da causa, cumpre decidir.

O âmbito do recurso é limitado pelas questões suscitadas pelos recorrentes nas conclusões das alegações (art.ºs 690º e 684º, n.º 3 do Cód. Proc. Civil) , salvo as questões de conhecimento oficioso (n.º 2 in fine do art.º 660º do Cód. Proc. Civil).
Assim, as questões a que cumpre dar resposta no presente recurso são as seguintes:
- Se não ocorreu a transmissão do estabelecimento e, por isso,
- se a ré E, Lda. deve ser absolvida de todas as condenações;

II - FUNDAMENTOS DE FACTO
Os factos considerados provados são os seguintes:
1. O A A foi admitido pela R D, em Julho 2003, para exercer funções de empregado de serviços externos, sob autoridade e direcção da R, nas suas instalações em Alverca, com horário de trabalho não determinado em concreto, mas, pelo menos, durante 40 horas semanais, mediante retribuição não concretamente determinada, mas, no mínimo, de € 550,00 mensais;
2. O A B foi admitido pela R D, em 01.03.2002, para exercer funções de motorista de pesados, sob autoridade e direcção da R, nas suas instalações em Alverca, com horário de trabalho não determinado em concreto, mas, pelo menos, durante 40 horas semanais, mediante retribuição não concretamente determinada, mas, no mínimo, de € 550,00 mensais;
3. O A C foi admitido pela R D, em 05.07.2002, para exercer funções de mecânico de auto, sob autoridade e direcção da R, nas suas instalações em Alverca, com horário de trabalho não determinado em concreto, mas, pelo menos, durante 40 horas semanais, mediante retribuição não concretamente determinada, mas, no mínimo, de € 550,00 mensais;
4. Os AA são associados do Sindicato dos Trabalhadores do Comércio, Escritórios e Serviços de Portugal;
5. Em Abril de 2008, a R D comunicou aos AA que iria encerrar para férias até ao fim do mês e que, a partir dessa data, haveria alterações na estrutura da sociedade;
6. O sócio gerente da R D, em Abril de 2008, constituiu as outras duas sociedades RR, sendo que o património da R D foi transferido para a R F;
7. Em 29.04.2008, a R D, comunicou aos AA que o sócio gerente AS cedera as quotas e renunciara à gerência e que o novo sócio gerente da sociedade transferira a actividade da mesma para Nisa (…), na qual os trabalhadores se deviam apresentar para trabalhar;
8. As instalações referidas em 7 estavam encerradas e a R D nunca aí desenvolveu a sua actividade;
9. Em Maio de 2008, os AA apresentaram-se para trabalhar nas instalações que a R D tinha em Alverca e onde sempre exerceram a sua actividade e, aí, o anterior gerente, AS, não permitiu que os AA exercessem as suas funções, comunicando-lhes que nesse local agora só laboravam as RR E e F;
10. Os AA deslocaram-se à morada de Nisa referida em 7 e aí não se encontrava qualquer sociedade a desenvolver a sua actividade e ninguém os recebeu para eles exercerem as suas funções;
11. A R E foi constituída mediante contrato datado de 1.04.2008 e ficou a exercer a sua actividade nas instalações da R D, em Alverca, sendo que esta sociedade tem como objecto social a construção de edifícios residenciais e não residenciais, ampliação, reparação e restauro de edifícios, montagem de edifícios pré-fabricados e ainda o comércio por grosso de materiais de construção e pré-fabricados, conforme fls. 15-18, cujo teor aqui se dá por reproduzido;
12. A R F foi constituída mediante contrato datado de 14.02.2008 e tem como objecto social a promoção de projectos e empreendimentos imobiliários e urbanizações, compra, venda, arrendamento e revenda de imóveis, conforme fls. 18-20, cujo teor aqui se dá por reproduzido;
13. A R D tem como objecto social o transporte e comércio de materiais de construção e pré-fabricados e encontra-se inscrita na CRC de Vila Franca de Xira, sendo que se encontra inscrita, com data de 02.05.2008, a alteração do sócio gerente, conforme consta fls. 101-106, cujo teor aqui se dá por reproduzido;
14. Pelo menos, até ao início do mês de Maio de 2008, que todas as RR exerceram a sua actividade, nas mesmas instalações, e no mesmo estabelecimento, em Alverca, tendo todas, até 29.04.2008, o mesmo sócio gerente.

III – FUNDAMENTOS DE DIREITO
Cumpre apreciar e decidir se não ocorreu a transmissão de estabelecimento/empresa entre a ré D e a ré E, Lda..
A decisão de 1.ª instância, após discernir – e bem, segundo o entendemos – sobre o conceito de transmissão de estabelecimento plasmado no art.º 318.º do CT na redacção de 2003, veio a entender ter havido transmissão de estabelecimento entre a ré D e a ré E, Lda., ora recorrente, ali se afirmando o seguinte;
…. no que concerne à R E, (…) decorre dos factos provados que esta sociedade, constituída em 14.02.2008 pelo então ainda sócio gerente da R D, passou a exercer a sua actividade comercial nas instalações de Alverca onde aquela mantinha a sua sede social.
Acresce que a actividade desenvolvida pela R E corresponde, para além do mais, à actividade desenvolvida pela R D, conforme se verifica da comparação do objecto social de uma e outra sociedades (note-se que quer a 1ª Ré quer a 2ª Ré se dedicam ao comércio de materiais de construção e pré-fabricados).
Ora, em face de tais elementos, e não olvidando que o sócio gerente da R E renunciou à gerência da R D (facto levado a registo em 02.05.2008), tendo esta alterado a sua sede para uma morada sita em Nisa sem que, no entanto, a mesma tenha desenvolvido neste local, qualquer actividade, parece-nos que a continuação, pela 2ª R, da mesma actividade económica desenvolvida pela 1ª R, nas instalações que esta lhe colocou à disposição, basta para caracterizar a transmissão da entidade económica, quando é certo que, como já referido supra, a 1ª R nunca desenvolveu a sua actividade nas instalações sitas em Nisa, para onde (supostamente) teria transferido a sua sede social.
Ponderando, pois, todos os factores apurados nos autos, somos a concluir pela transferência de estabelecimento da 1ª Ré para a 2ª Ré, concretizada no início do mês de Maio de 2008, data em que a R D deixou de exercer qualquer actividade, e que com essa transmissão se transmitiu para a R E a posição que aquela ocupava no contrato de trabalho dos AA.”

É contra este entendimento que se insurge a recorrente defendendo que os ora apelados não fizeram prova de qualquer facto ou documento para se concluir pela transferência de um único bem, ou, mesmo, clientela, da Ré D, L.da, para a Apelante E, L.da, sendo que ambas as sociedades têm actividade distinta a que correspondem Códigos de Actividade diferente.
E, quanto a nós, a recorrente tem razão, face aos factos dados como assentes, conforme se passa a expor.
A transmissão de estabelecimento está prevista no no art. 318° do Código do Trabalho que estabelece o seguinte:
1 – Em caso de transmissão, por qualquer título, da titularidade da empresa, do estabelecimento ou de parte da empresa ou estabelecimento que constitua uma unidade económica, transmite-se para o adquirente a posição jurídica de empregador nos contratos de trabalho dos respectivos trabalhadores, bem como a responsabilidade pelo pagamento de coima aplicada pela prática de contra-ordenação laboral.
2 – (…)
3 – (…)
4 – Considera-se unidade económica o conjunto de meios organizados com o objectivo de exercer uma actividade económica, principal ou acessória
Através destas normas o legislador do Código do Trabalho transpôs para o ordenamento jurídico português a Directiva n.º 2001/23/CE, do Conselho, de 12 de Março, relativa à aproximação das legislações dos Estados membros respeitantes à manutenção dos direitos dos trabalhadores em caso de transferência de empresas ou de estabelecimentos, ou de partes de empresas ou de estabelecimentos, que codifica e revoga a Directiva n.º 77/187/CEE, do Conselho, de 14 de Fevereiro, com a redacção que lhe foi dada pela Directiva n.º 98/50/CE, do Conselho, de 29 de Junho (al. q) do art.º 2.º da Lei 99/2003 de 27 de Agosto que aprovou o Código do Trabalho), de modo que a jurisprudência do Tribunal de Justiça das Comunidades há-de ter, na interpretação do conceito de transferência de empresas ou de estabelecimentos a que se refere o art.º 318.º do CT, o seu lugar de destaque.
Assim, afirma a jurisprudência comunitária, que os tribunais nacionais, enquanto autoridade dos Estados-membros, devem interpretar e aplicar o direito interno em toda a medida do possível, “à luz da letra e da finalidade do direito comunitário, por forma a atingir o resultado visado no art. 249º, parágrafo 3 do Tratado” ( Ac. Vol Colson e Kamann, in Col 84, p.1891 e ss., citado por Maria João Palma, in “Breves notas sobre a invocação das normas das directivas comunitárias perante os tribunais nacionais”, edição da AAFDL, 2000, pp. 17 e ss.).
Por outro lado, os tribunais nacionais devem também ter em conta a natureza normativa da própria jurisprudência comunitária, natureza esta que se extrai do que estabelecem os arts. 5º, 220º, 227º e 228º do Tratado de Roma e que se faz sentir, particularmente, no caso das decisões prejudiciais (V. Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 98.11.11, in Ac. Doutrinais 447º, p.378).
A “interpretação conforme” constitui assim uma obrigação que impende sobre os tribunais nacionais, cujo fundamento decorre do princípio da cooperação vertido no art. 5º do TCE.
Embora a doutrina e a jurisprudência comunitária venham atribuindo limites diferentes a este princípio da actuação conforme (defendendo por exemplo Liberal Fernandes, in “Transmissão do estabelecimento e oposição do trabalhador à transferência do contrato: uma leitura do art. 37º da L.C.Trabalho conforme o direito comunitário”, publicado na revista Questões Laborais, n. 14, p. 237 e citando os Acs. TJ Comunidades de 94.05.06, de 96.07.11, de 96.09.26, de 97.03.20 e de 98.09.02, que se a norma de direito é oposta à directiva, deve ser interpretada pelos tribunais nacionais de acordo com o teor e finalidades do direito comunitário, de modo a tornar eficazes as suas disposições; e Júlio Gomes nos seus estudos intitulados “O conflito entre a Jurisprudência Nacional e a Jurisprudência do TJ das CCEE em matéria de transmissão do estabelecimento no Direito do Trabalho: o art. 37º da L. C. Trabalho e a Directiva 77/187/CEE” publicado na RDES 1996, nº1-2-3-4, p. 79 e “A jurisprudência Recente do TJ das CE em matéria de transmissão de empresa, estabelecimento, ou parte de estabelecimento – inflexão ou continuidade?” publicado nos Estudos do Instituto do Direito do Trabalho, I, pp. 481 e ss. - que os “tribunais nacionais, têm o dever de interpretar o Direito Pátrio de um modo conforme às directivas e à interpretação que delas é feita pelo Tribunal de Justiça das Comunidades, quando não existe uma contradição expressa entre aquele direito e as directivas”), entende-se que a interpretação conforme não deverá ser possível quando implique uma interpretação “contra-legem”.
Como refere Maria João Palma, in obra acima citada pp. 48, “a interpretação conforme apenas deve actuar quando o sentido da norma nacional for ambíguo, comportando, entre os vários sentidos possíveis, uma interpretação que seja conforme ao direito comunitário”.
Assim, lendo o conceito de estabelecimento contido no art.º 318.º do
CT numa interpretação conforme à jurisprudência comunitária é considerada transmissão a transferência de uma unidade económica que mantém a sua identidade, entendida esta como um conjunto de meios organizado, com objectivo de prosseguir uma actividade económica, seja ela essencial ou acessória.
No caso dos autos ficou assente que os autores eram trabalhadores da ré D, que tinha as suas instalações situadas em Alverca.
O sócio gerente da R D, em Abril de 2008, constituiu as outras duas sociedades RR, (a ora recorrente E e a ré F), sendo que o património da R D foi transferido para a R F (facto sob 6).
Daqui resulta, desde já, que o património da empregadora dos autores foi transferido para a ré F, que foi absolvida nos presentes autos, e, não tendo os autores recorrido em tempo dessa decisão, não está, agora, em causa a análise da eventual transmissão do estabelecimento entre a ré D e a ré F.
Dos factos assentes não se vislumbra que entre as rés D e E tenha havido a transmissão do que quer que seja.
Sabe-se apenas que “pelo menos, até ao início do mês de Maio de 2008, que todas as RR exerceram a sua actividade, nas mesmas instalações, e no mesmo estabelecimento, em Alverca, tendo todas, até 29.04.2008, o mesmo sócio gerente” (facto sob 14)
Ou seja, todas as sociedades existiam simultaneamente e exerciam a sua actividade nas mesmas instalações, sendo que dos factos resulta que os autores, mesmo nesse período, apenas eram trabalhadores por conta da ré D.
Estando legalmente constituídas com objecto diferenciado e a exercer a actividade, simultaneamente e nas mesmas instalações, não pode ser o simples facto de uma das rés – a D, entidade empregadora dos autores, - ter deixado de exercer a sua actividade naquelas instalações, que indicie a existência de transmissão de estabelecimento para qualquer das outras sociedades comerciais que continuaram com a sua actividade nas mesmas instalações.
Para que se pudesse falar em transmissão de estabelecimento, haveria que ter-se provado a transferência de uma unidade económica, entendida esta como um conjunto de meios organizado, com objectivo de prosseguir uma actividade económica, seja ela essencial ou acessória.
Ora dos autos não resulta ter havido qualquer transferência entre a ré D e a ré E, ora recorrente.
Tudo o que se sabe é que coexistiram a exercer as suas actividades nas mesmas instalações e que, a partir de 2 de Maio de 2008 a ré D, entidade empregadora dos autores, transferiu o seu património para a ré F – que foi absolvida, com trânsito em julgado uma vez que não foi admitido o recurso subordinado dos autores em que pretendiam a condenação solidária das RR. – não existindo o mínimo indício de que tenha havido, entre a ré D e a ré E, a transmissão de qualquer bem corpóreo ou incorpóreo, de qualquer unidade económica, ou parte de unidade económica.
Tal como refere a recorrente, os autores não provaram (nem sequer alegaram) que a recorrente assumiu os efectivos da ré D ou que lhe tenha sido transmitida qualquer estrutura organizativa, ou qualquer outra clientela.
Não havendo, nos autos, factos que demonstrem ter havido qualquer transmissão de bens corpóreos ou incorpóreos, ou a assunção da actividade anteriormente desenvolvida pela entidade empregadora dos autores, tem de concluir-se não ter havido transmissão do estabelecimento nos termos do art.º 318.º do CT.
E, não tendo havido transmissão do estabelecimento, a ré/recorrente não pode ser responsabilizada pelo pagamento das importâncias devidas aos trabalhadores da ré D.
Procedem, assim, na totalidade, as conclusões do recurso.


IV - DECISÃO
Em conformidade com os fundamentos expostos, concede-se provimento ao recurso, revoga-se a sentença recorrida e absolve-se a recorrente dos pedidos contra si efectuados.

Custas em ambas as instâncias pelos recorridos sem prejuízo do apoio judiciário

Lisboa, 23 de Fevereiro de 2011

Natalino Bolas
Leopoldo Soares
Seara Paixão
Decisão Texto Integral: