Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | ROSÁRIO GONÇALVES | ||
Descritores: | INSTITUTO NACIONAL DA PROPRIEDADE INDUSTRIAL RECURSO MARCAS | ||
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Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 04/21/2009 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | CONFIRMADA A DECISÃO | ||
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Sumário: | 1- A importância do registo da marca releva no sentido de se adquirir a sua propriedade, com o inerente direito de a usar em exclusivo, impedindo que terceiros, sem o consentimento do titular, usem na sua actividade económica de qualquer sinal idêntico ou confundível com a mesma marca, para produtos ou serviços idênticos ou afins àqueles para os quais a marca foi registada. 2- Imitação de marca não significa o mesmo que identidade de marca. 3- O risco de confusão tem de ser apreciado globalmente, fundado numa impressão de conjunto, perante os elementos distintivos e dominantes das marcas. 4- O Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias rejeitou face aos arts. 4º e 5º da Directiva nº.89/104/CEE do Conselho, de 21 de Dezembro de 1989, a interpretação que abrangeria o risco de associação, ou seja, a situação em que a mera percepção do sinal distintivo suscitasse no público a recordação da marca, sem que a mesma se confundisse. 5- O que a lei visa, além do mais, é a protecção do consumidor, com o fito de poder ajuizar da boa qualidade dos serviços. O público não está a pensar na existência ou não de imitação, mas no que lhe agradou de certa marca relativamente aos serviços prestados. (Sumário da Relatora) | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa 1-Relatório: V SA. interpôs recurso do despacho do Senhor Director do Serviço de Marcas do Instituto Nacional da Propriedade Industrial que concedeu o registo da marca nacional nº. 380172, pedindo que o mencionado despacho seja revogado e negada protecção à marca. Foi cumprida a legal tramitação. O titular da marca considerada obstativa apresentou resposta pugnando pela manutenção do despacho recorrido. Tendo prosseguido os autos, veio a ser proferida decisão a manter o despacho do Sr. Director do Serviço de Marcas do INPI. que concedeu protecção à marca nacional nº. 380172, Galo Negro, para assinalar na classe 33ª, bebidas alcoólicas à excepção de cervejas. Inconformada recorreu a apelante, concluindo nas suas alegações, em síntese: - A apelante é titular dos registos de marca "GALLO" n.°s 281.974, 351.941, 345.979, entre outros, destinados a assinalar azeites. - A marca "GALLO" é, aliás, usada desde 1860 e o seu primeiro registo remonta a 1919. - Sendo os registos de marca da apelante anteriores ao registo de marca ora em causa. - Foi concedido o registo de marca nacional n.° 380.172 GALO NEGRO destinado a assinalar "bebidas alcoólicas à excepção de cerveja. -Registo que o Tribunal a quo não revogou por entender inexistir afinidade entre azeites e bebidas alcoólicas à excepção de cerveja. - Todavia, nas condições de mercado actuais é vulgar o consumidor encarar vinho e azeite sob a mesma marca sendo caso paradigmático o da conhecida marca Herdade do Esporão. - Pelo que esta circunstáncia determina que o consumidor médio esteja acostumado a reconhecer a mesma proveniência empresarial em vinhos e azeites. - O que cumpre o conceito de afinidade tal como decorre do artigo 4.°, alínea b) da Directiva n.° 89/104/CEE, conforme é interpretado pelo TJCE e na alínea b) do n.° 1, do artigo 245.° do CPI, preceitos que a douta sentença violou. - Acresce ainda que, a marca da apelante encontra-se integralmente contida na marca ora em causa o que, atenta a notoriedade daquela, é susceptível de levar a que o consumidor médio lhes atribua a mesma proveniência empresarial ou julgue existirem laços empresariais entre as mesmas. - Pelo que também se encontra verificado o requisito da alínea c) do n.° 1, do artigo 245º.do CPI. Foram colhidos os vistos. 2- Cumpre apreciar e decidir: As alegações de recurso delimitam o seu objecto, conforme resulta do teor das disposições conjugadas dos artigos 660º, nº2, 684º, 664º e 690º, todos do CPC. A questão a dirimir consiste em aquilatar se, as marcas em causa são susceptíveis de se confundirem, quer por afinidade quer por confusão, perante o teor das alíneas b) e c) do nº.1 do art. 245º do CPI. A matéria de facto delineada na 1ª.instância foi a seguinte: 1 –Por despacho datado de 10.01.2006, o Sr. Director do Serviço de Marcas do Instituto Nacional de Propriedade Industrial concedeu protecção ao registo da marca nacional n.° 380172 "GALO NEGRO", pedido em 01.04.2004. 2 – A referida marca assinala na classe 33° "bebidas alcoólicas à excepção de cervejas". 3 – A referida marca é constituída pelas palavras "GALO NEGRO" em letras de imprensa maiúsculas. 4 – A recorrente é titular da marca nacional n.° 281 974, pedida em 7 de Abril de 1992. 5 – A referida marca destina-se a assinalar "azeites". 6 – A mencionada marca é constituída da seguinte forma: 7 – A recorrente é titular da marca nacional n.° 351941, pedida em 12.12.2000. 8– A referida marca destina-se a assinalar "azeite, óleos e gorduras consumíveis". 9 – A mencionada marca é constituída da seguinte forma: 10 — A recorrente é titular da marca nacional n.° 345 979, pedida em 26.04.2000. 11— A referida marca destina-se a assinalar "azeite". 12— A referida marca é constituída pelas palavras "GALLO AZEITE NOVO". 13 — A utilização do sinal "GALLO" remonta a 1860. 14—O referido sinal foi pela 1a vez registado em 1919 pelo Sr. V, sócio gerente da empresa V & Co. que se dedicava ao comércio de artigos alimentares. 15 — Em 1938 a V & CO. adquire o estabelecimento com armazéns e fabrica "União Limitada", passando a exportação a sua produção, designadamente para os territórios ultramarinos. 16 — Em 1969 a sociedade altera a sua estratégia, passando a dirigir-se para o mercado doméstico de azeite, óleo embalado, sabão tradicional e azeitonas de conserva. 17 —Em Novembro de 1989 a totalidade das acções da recorrente foi adquirida pela FIMA, que alterou a forma de apresentação das garrafas aonde se colocava o azeite. 18 — A revista "Fortunas", publicou em Maio de 2001, o artigo junto como documento n.° 7 cujo teor se dá por integralmente reproduzido. 19 — Num estudo efectuado entre os consumidores de azeite, junto como documento n.° 8 e cujo teor se dá por integralmente reproduzido, a marca "GALLO" obteve o primeiro lugar em notoriedade, sendo imediatamente conhecida por 61 em cada 100 consumidores como primeira marca de que se recordavam sendo 25 em cada 100 conheceram-na espontâneamente e 14 tiveram de ser auxiliados no reconhecimento da mesma. Vejamos: Insurge-se a apelante relativamente à sentença proferida, uma vez que, do seu ponto de vista se encontram preenchidos todos os requisitos constantes do art. 245º do CPI., pelo que, o registo da marca devia ter sido revogado. Ora, como refere, M. Coutinho de Abreu, Marcas, in BFDUC, vol. LXXIII, pág. 121 « As marcas são signos ou sinais susceptíveis de representação gráfica destinados sobretudo a distinguir certos produtos de outros produtos idênticos ou afins». A importância do registo releva no sentido de se adquirir a propriedade da marca com o inerente direito de a usar em exclusivo, impedindo que terceiros, sem o consentimento do titular, usem na sua actividade económica de qualquer sinal idêntico ou confundível com a mesma marca, para produtos ou serviços idênticos ou afins àqueles para os quais a marca foi registada. Nos termos exarados no nº.1 do art. 245º do CPI., a marca registada considera-se imitada ou usurpada por outra, no todo ou em parte, quando, cumulativamente: a)- A marca registada tiver prioridade; b)- Sejam ambas destinadas a assinalar produtos ou serviços idênticos ou afins; c)- Tenham tal semelhança gráfica, figurativa, fonética ou outra que induza facilmente o consumidor em erro ou confusão, ou que compreenda um risco de associação com marca anteriormente registada, de forma que o consumidor não as possa distinguir senão depois de exame atento ou confronto. Tal como se escalpelizou na sentença recorrida, o primeiro dos requisitos, ou seja, a prioridade do registo encontra-se devidamente comprovado, nenhuma dúvida se suscitando. Porém, o mesmo não resulta relativamente aos restantes requisitos, começando aí a discórdia da recorrente. Com efeito, entende esta que se verifica no caso em apreço, uma afinidade dos produtos, bem como, atenta a notoriedade da sua marca, a possibilidade de um consumidor médio lhes atribuir a mesma proveniência empresarial ou julgar existirem laços empresariais comuns. Ora, perante a factualidade assente nos autos, adianta-se desde já, não assistir razão à recorrente, pois, para além do requisito da prioridade da marca, não se materializam os restantes elementos sobre a afinidade de produtos e indução do consumidor em confusão. Com efeito, imitação não significa o mesmo que identidade. Como se alude no Ac. do STJ. de 29-5-2003, in, http://www., «A imitação de marca deve ser apreciada, menos pelas dissemelhanças que ofereçam os diversos pormenores considerados isolada e separadamente do que pela semelhança que resulta do conjunto dos elementos que constituem a marca». Na esteira do Prof. Ferrer Correia, a comparação entre duas marcas deve ser feita tendo em conta que o comprador, quando compra um produto marcado com um sinal semelhante a outro que já conhecia, não tem simultâneamente as marcas sob os olhos para as comparar. Compra o produto por se ter convencido de que a marca que o assinala é aquela que retinha na memória. Na situação concreta, foi concedida protecção ao registo da marca «Galo Negro», que assinala na classe 33ª, bebidas alcoólicas à excepção de cervejas. A recorrente é titular da marca nacional nº.281974, destinada a assinalar azeites, da marca nacional nº.351941, destinada a assinalar azeite, óleos e gorduras consumíveis e da marca nacional nº.34 5979, destinada a assinalar azeite. As aludidas marcas são constituídas pelas figuras aludidas na factualidade sob os números 6 e 9 e pelas palavras, Gallo Azeite Novo, sob o nº. 12. Ora, desde logo, as marcas da recorrente nada têm em comum com a marca cuja protecção foi requerida, atenta a natureza em nada assemelhável, versando esta última sobre produto alcoólico, constituída pelas palavras «Galo Negro», em letras de imprensa maiúsculas e as restantes respeitarem a azeites, óleos e gorduras consumíveis. As bebidas alcoólicas nada têm de afinidade com os azeites. O consumidor normal sabe muito bem distinguir aqueles produtos, os quais não têm a mesma utilidade, nem proveniência, não sendo sequer concorrentes entre si. O risco de confusão tem de ser apreciado globalmente, fundado numa impressão de conjunto, perante os elementos distintivos e dominantes das marcas. Analisadas as marcas em confronto, constatamos que as diferenças são nítidas, não permitindo a um cidadão médio, na qualidade de consumidor/cliente ficar confundido ou indeciso. Com efeito, nem tão pouco a grafia e fonética são iguais. «Galo Negro» e «Gallo, Gallo Azeite Novo», não têm qualquer grau de semelhança, nem gráfica nem figurativa que permita induzir em erro o consumidor, no sentido de não distinguir o produto que pretende. A Directiva nº.89/104/CEE do Conselho, de 21 de Dezembro de 1989, aludida pela recorrente, só se aplica quando existe risco de confusão, o que não é o caso. O Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias rejeitou face aos arts. 4º e 5º da aludida Directiva, a interpretação que abrangeria o risco de associação, ou seja, a situação em que a mera precepção do sinal distintivo suscitasse no público a recordação da marca, sem que a mesma se confundisse. Nas marcas em apreço, não se denota que um consumidor médio possa ficar com a ideia que representem o mesmo produto, ou que estabeleçam uma ligação entre bebidas e azeites, sob a capa da mesma proveniência. A hipotética semelhança dos serviços em causa não pode ser apreciada em abstracto, mas avaliada em concreto, do ponto de vista das representações que se possam gerar na mente do consumidor. O que a lei visa, além do mais, é a protecção do consumidor, com o fito de poder ajuizar da boa qualidade dos serviços. Como se alude no Ac. do STJ. de 18-3-2003, in http://www., o público que a lei protege com o registo das marcas é o público em geral e não público especializado, visto ser aquele que facilmente pode ser vítima de confusão. O público não está a pensar na existência ou não de imitação, mas no que lhe agradou de certa marca relativamente aos serviços prestados e, no caso vertente, não se vislumbra que confusão possa haver entre bebidas alcoólicas e azeite e seus similares. Diga-se ainda que, no mercado português excluído um ou outro caso pontual, não é comum encarar vinho e azeite representados sob a mesma marca. Como já vimos, nas marcas em apreço não encontramos semelhanças gráficas ou figurativas que possam ocasionar qualquer confusão, nem se tratando de produtos afins. De igual modo, não resultou apurado qualquer elemento fáctico que permita a um consumidor padrão, atribuir a mesma proveniência empresarial às marcas em confronto. O que a lei proíbe, como se escreve no Ac. do STJ. de 27-3-2008, in http://www. «É que uma pessoa adopte na sua actividade empresarial um sinal característico, tendente a individualizar uma marca, idêntico ou semelhante a outro relativo a actividade empresarial de outra pessoa, susceptível de induzir em erro ou confusão o público consumidor, em termos de atribuir os produtos existentes no mercado a entidade diversa daquela de que provêm, tendo presente que mais releva a eventual semelhança do que a mera dissemelhança dos pormenores envolventes». Destarte, num juízo comparativo e objectivo às marcas, sub júdice, não encontramos materializados os requisitos cumulativos aludidos no art. 245º do CPI., nenhum reparo nos merecendo a sentença proferida, decaindo na totalidade as conclusões do recurso apresentado. 3- Decisão: Nos termos expostos, acorda-se em julgar improcedente a apelação, mantendo-se a sentença proferida. Custas a cargo da apelante. Lisboa, 21-4-2009 Maria do Rosário Gonçalves José Augusto Ramos João Aveiro Pereira |