Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | TRIGO MESQUITA | ||
Descritores: | OFENSA À INTEGRIDADE FÍSICA DESISTÊNCIA DA QUEIXA CRIME QUALIFICADO | ||
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Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 05/22/2003 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | RECURSO PENAL. | ||
Decisão: | CONCEDER PROVIMENTO AO RECURSO. | ||
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Sumário: | |||
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Decisão Texto Integral: | Acordam na 9.ª Secção Criminal de Lisboa: I. No processo comum n.° (...) do 1.º Juizo Criminal do Tribunal Judicial da Comarca de Vila Franca de Xira, o Digno Magistrado do Ministério Público nesta comarca, não se conformando com o douto despacho judicial que julgou válida e relevante a desistência de queixa - razão pela qual a homologou - apresentada pelo ofendido A, em relação ao crime de ofensa à integridade física qualificada por que foi acusado o arguido J , veio interpor recurso da mesma. II. Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir. A questão a resolver, no presente recurso, é, unicamente, a de saber qual a natureza do crime de ofensa à integridade física qualificada p. e p. no art. 146.º do C. Penal, com referência ao art. 143.º do mesmo Código, no texto resultante da revisão levada a efeito pelo DL n.º 48/95, de 15 de Março: semi-pública, como se considerou na decisão recorrida ou pública, como defende o Digno Recorrente. Como se anota no preâmbulo do DL n.º 48/95, "Também no domínio dos crimes contra a integridade física optou-se por uma sistemática mais coerente, operando-se uma considerável simplificação: fazer incidir critérios de agravação e de privilégio sobre a base de existência de um crime de ofensa à integridade física simples. De referir ainda a consagração de um tipo de ofensa à integridade física qualificado por circunstâncias que revelam especial censurabilidade ou perversidade do agente, a exemplo do que sucede no homicídio". Como se considerou no Ac. da RP de 18 de Outubro de 2000, publicado na CJ Ano XXV, Tomo IV, p. 234, com o qual concordamos e aqui subscrevemos: - ".... no caso das ofensas corporais, o tipo legal fundamental é o de ofensas à integridade física simples p. e p. pelo art. 143.º do C. Penal. Todavia, (...), não se trata, apenas, de acrescentamento de elementos que agravam a pena; a qualificação do art. 146.º do C. Penal "não é determinada por razões de ilicitude ligadas à gravidade do resultado das ofensas, mas antes por razões de agravamento de culpa, derivado da especial censurabilidade e perversidade do agente" - Ac. do STJ de 1/3/2000, in Col. Jur., Acs do STJ, ano VIII, tomo I, p. 219. Significa isto que ao tipo legal fundamental crime de ofensa à integridade física simples vão-se buscar os seus elementos típicos ofensa no corpo ou na saúde, com todas as suas envolventes; mas, criou-se um tipo novo, resultante do acrescentamento de novos elementos que incide sobre a culpa, e que exigem uma valoração própria e independente a este respeito. Pelo que se conclui que estamos em face de um tipo autónomo relativamente ao de ofensa à integridade física simples". É o que resulta da citada passagem do preâmbulo do DL n.º 48/95, que reviu o C. Penal. Assim, nada se dizendo no artigo 146.º do C. Penal sobre a natureza do crime, dever-se-á entender que o mesmo reveste natureza pública. A não se entender, deste forma, estar-se-ia, como se ponderou no mesmo Acórdão citado, perante uma contradição do legislador que, na revisão do C. Penal, de 1995, visou, precisamente, o reforço da tutela dos bens jurídicos pessoais. Tendo-se criado um tipo novo, com a pena agravada, abarcando situações que no anterior Código, eram crimes de natureza pública: v.g. as dos arts. 144.º, n.º 2 (utilização de meios particularmente perigosos ou insidiosos com três ou mais pessoas, ou quando o meio empregado se traduzisse num crime de perigo comum) e n.º 3 (ofensa contra alguma das pessoas indicadas na então alínea h) do n.º 2 do art. 132.º); 146.º (envenenamento); e 385.º (ofensa a funcionário do C. Penal, na redacção dada pelo DL 400/82, de 29 de Setembro, compreender-se-ia mal que o mencionado crime dependesse, agora, de queixa. Em consequência, estando o arguido acusado de um crime de ofensa qualificada à integridade física (art. 146.º, n.º 1, do C.P.), crime público, é, em principio, irrelevante a desistência da queixa, salvo se, em julgamento, a circunstância qualificativa não vier a comprovar-se ou, se comprovada, não vier a revelar-se, confrontada com as demais circunstâncias de "especial censurabilidade". III. - 1.º Em face do exposto, acordam os Juízes desta Relação em conceder provimento ao recurso, revogando a decisão recorrida, que deve ser substituída por outra que, não considerando válida a desistência de queixa relativamente ao mencionado crime previsto e punido pelas disposições conjugadas dos artigos 143.º e 146.º, ambos do Código Penal, determine o prosseguimento dos ulteriores termos do processo. 2.º Sem custas. Lisboa, 22.05.2003 (Trigo Mesquita) (Maria da Luz Batista) (Almeida Cabral) |