Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
| Processo: |
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| Relator: | MANUEL RIBEIRO MARQUES | ||
| Descritores: | IMPUGNAÇÃO DA DECISÃO ARBITRAL ORDEM PÚBLICA AVALIAÇÃO PODERES DA RELAÇÃO | ||
| Nº do Documento: | RL | ||
| Data do Acordão: | 09/09/2019 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Texto Parcial: | N | ||
| Meio Processual: | IMPUGNAÇÃO DA DECISÃO ARBITRAL | ||
| Decisão: | IMPROCEDENTE | ||
| Sumário: | 1.– O conceito de ordem pública é um conceito indeterminado, pelo que só perante as circunstâncias do caso concreto se pode dizer se uma determinada violação de um princípio ou norma fundamental é intolerável. 2.– Como resulta expressamente do n.º 9 do artigo 46 da LAV (Lei n.º 63/2011), o juízo de avaliação na acção de impugnação da decisão arbitral não comporta qualquer juízo sobre a adequação da aplicação nela feita do direito tido por aplicável: a acção preclusiva da ordem pública internacional incide unicamente sobre os efeitos jurídicos que, para o caso, defluem da decisão. 3.– Não pode por isso a Relação controlar a exactidão das apreciações de facto ou de direito inerentes ao raciocínio seguido pelo Tribunal Arbitral. | ||
| Decisão Texto Parcial: | |||
| Decisão Texto Integral: | Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa: I.– M., S.A., com sede …, notificada que foi da prolação do Acórdão arbitral e da subsequente decisão proferida sobre o requerimento apresentado pela ora Impugnante nos termos do artigo 45.º da Lei n.º 63/2011, no âmbito do proc. 21/2016/INS/ASB que decorreu no Centro de Arbitragem da Câmara de Comércio e Indústria Portuguesa, vem, nos termos do artigo 46.º da Lei supra indicada, interpor IMPUGNAÇÃO DA DECISÃO ARBITRAL contra T., S.A., com sede …, e F., com sede …, representado pela O., S.A., com sede …, peticionando a anulação do segmento decisório da alínea b) da secção IX do Acórdão Arbitral, o qual indeferiu o pedido de nulidade da cláusula 13ª do CCVA. Alegou, em síntese, que: 1.– Em 26 de dezembro de 2016, a T., S.A. (“T.”), apresentou um requerimento de arbitragem no Centro de Arbitragem da Câmara de Comércio e Indústria Portuguesa contra a M., S.A., ora Impugnante, no qual pediu que se declarasse «a inexistência dos vícios alegados pela M. na execução do mecanismo de ajustamento de Preço previsto na Cláusula 13ª do Contrato de Compra e Venda de Ações e Cessão de Créditos relativo à P., S.A., e, em consequência, (...)» se declarasse «legítimo o exercício pela T. do direito a adquirir à M., nos termos e para os efeitos da Cláusula 13ª do Contrato de Compra e Venda de Ações e Cessão de Créditos (i) 5% das ações representativas do capital social da P., S.A., correspondente a 685.000 (seiscentas e oitenta e cinco mil) ações e (ii) os Créditos Acionistas M. por si detidos». 2.– Em 27 de janeiro de 2017, a Impugnante apresentou a sua Contestação com Reconvenção, na qual pediu: «A)-a presente acção arbitral ser declarada inviável, improcedendo a mesma, com todas as demais legais consequências, B)-caso assim não se entenda, ser a presente acção arbitral julgada não provada e improcedente, e, em consequência, não reconhecido o direito da Demandante a adquirir à Demandada 5% das acções representativas do capital social da P., S.A., correspondente a 685.000 acções e os Créditos Accionistas M., com todas as demais legais consequências, C)-ser admitida a Reconvenção e, por via dela, ser: C1.)-declarada a nulidade do CCVA celebrado entre a Reconvinte e as Reconvindas, com todas as demais legaisconsequências; e, uma vez declarada a nulidade do CCVA, ser fixado um prazo razoável às Partes para que estas restituam, em simultâneo, tudo quanto tenham recebido por conta do contrato declarado nulo; Caso assim não se entenda, C2.)-declarada a nulidade da Cláusula 13.ª do CCVA celebrado entre a Reconvinte e as Reconvindas, com todas as demais legais consequências; e, uma vez declarada a nulidade do CCVA, ser fixado um prazo razoável às Partes para que estas restituam, em simultâneo, tudo quanto tenham recebido por conta da aplicação da Cláusula 13.a do CCVA declarada nula; Caso assim não se entenda, C3.)-deverá ser declarada a anulabilidade/modificabilidade da Cláusula 13.a do CCVA celebrado entre a Reconvinte e as Reconvindas, nos exactos termos requeridos no artigo 394.º da Reconvenção, que aqui se dá integralmente como reproduzido e integrado. C4.)-e, nessa sequência, ser declarado o incumprimento do CCVA pela Reconvinda por inobservância do disposto na Cláusula modificada nos termos da alínea anterior; D)-Caso assim não se entenda, subsidiariamente, deverá o Tribunal: D1.)-integrar a cláusula constante de Doc. B5, que se dá aqui por integralmente reproduzida e aqui integrada, como pressuposto do mecanismo de ajustamento previsto na Cláusula 13.a do CCVA, à luz e nos termos do disposto no artigo 239.o do Código Civil, e D2.)-Caso assim não se entenda, declarar como válida a cláusula acessória constante de Doc. B5, que se dá aqui por integralmente reproduzida e aqui integrada, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 222.º do Código Civil.» (negrito nosso). 3.– Constituído o Tribunal Arbitral e realizada a audiência de julgamento, veio este a proferir o Acórdão Final sobre o litígio no dia 27 de setembro de 2018. 4.– Na parte dispositiva da decisão arbitral, nomeadamente na alínea b) da sua secção IX — a qual ora se impugna —, deliberou o Tribunal Arbitral o seguinte: «Julgar improcedentes por não provados, todos os pedidos reconvenionais formulados, a título principal ou subsidiário, pela Demandada M., SGPS, S.A e, em consequência absolver a Demandante e o Interveniente Reconvindo dos pedidos de condenação contra estes deduzidos». 5.– Ora, o Acórdão em crise violou a ordem pública existente — e fê-lo por aceitar como válida e plenamente operante uma cláusula manifestamente desequilibrada, permitindo, consequentemente, manipulações genéticas de objetos contratuais em relações societárias já por si, no caso, acentuadamente desfasadas. 6.– Tal violação constitui fundamento de anulação da sentença arbitral, nos termos do art. 46.º/3/b/ii da LAV. 7.– Indo ao busílis do nosso caso, o princípio estruturante do edifício civil que ativa a ordem pública e que condena a cláusula 13 do Contrato de compra e venda de ações e cessão de créditos (“CCVA”) à nulidade é o da proibição do controlo arbitrário da prestação contratual aleatória. 8.– Neste caso, tal princípio emerge por 3 fundamentos: i)-os valores do direito civil — razoabilidade como valor fundante que implica a rejeição dos desequilíbrios contratuais manifestos e o puro arbítrio da parte forte do contrato; ii)-a teleologia societária — a proteção da posição do sócio minoritário e do seu direito a sê-lo; iii)-a intangibilidade aleatória. V- O caso sub judice - A arbitrariedade da cláusula 13ª do CCVA e consequente nulidade por violação da ordem pública civil 9.– A cláusula 13ª do CCVA, toscamente apelidada (epigrafada) de “ajuste de preço”, cuida, muito sucintamente, de uma transmissão de participações sociais entre comprador e vendedor em função de resultados operacionais da empresa objeto do contrato — transmissão essa que, in casu, se efetua em dois momentos (2013 e 2015). 10.– Ora, a caracterização desta cláusula 13ª é-nos dada pelos seus números 1 a 4, traduzindo-se: numa obrigação unilateral de dare — a cargo de qualquer uma das partes, concretizada numa cessão de participações sociais —, dependente de um facto futuro e supostamente incerto (a variação do EBITDA); sendo que a esta obrigação não corresponde qualquer correspectivo adicional a cargo da parte que a recebe, limitando-se esta última a recebê-la sem mais. 11.– Por conseguinte, as prestações das partes estão sujeitas a um mecanismo de transmissão supostamente aleatória de participações sociais. Com efeito, estamos perante duas atribuições patrimoniais incertas (transmissão de uma quantidade variável de participações sociais), nas quais a existência de uma exclui a da outra, estando ambas teoricamente submetidas a um facto pretensamente incerto quanto à sua verificação (a variação do EBITDA ser de «x» ou «y»). 12.– Ora, em 3 de julho de 2013, a Impugnante e o F. Impugnado também celebraram um Acordo Parassocial — indissociável do CCVA (v. considerando H do mesmo) — cuja cláusula 7 prevê que a composição do Conselho de Administração da P.,SA seja, toda ela, designada pela Impugnada, com exceção de apenas 1 (um) membro (não executivo) que é designado pela Impugnante. 13.– Assim, o comprador, ou seja, a Impugnada, dispõe dos meios e instrumentos necessários e bastantes para controlar a gestão da atividade comercial das sociedades do Grupo Prio. 14.– E quanto às sociedades operacionais detidas pela P., SA, a Reconvinte nem sequer dispõe da faculdade de designar quem quer que seja para os seus Conselho de Administração. 15.– E sendo assim, como indiscutivelmente é, quem tem o poder de gestão, tem a faculdade de determinar sempre, não a subida (é certo), mas a descida do EBITDA. 16.– Com efeito, o poder de determinar a subida não tem, mas a descida inquestionavelmente tem. 17.– Ou seja, está na faculdade de uma das partes estabelecer, a priori, não só o quantum da prestação, mas até, pasme-se, determinar a própria existência da mesma, o que significa que, na realidade, estamos na presença de um critério de determinabilidade da prestação aparentemente objectivo, perante uma aleatoriedade meramente formal – já que, em última análise, a própria prestação depende da subjectividade de uma das partes (que teoricamente deveria estar a arriscar num evento futuro e incerto, mas que, na realidade, não está, pois este depende exclusivamente do seu arbítrio). 18.– Ora, o Direito não se compadece com o controlo arbitrário de prestações contratuais aleatórias. 19.– O que significa que a cláusula é nula por violar o princípio de ordem pública da proibição do controlo arbitrário da prestação contratual aleatória, especialmente acentuado no quadro de uma relação societária em que o sócio fundador pode ser expulso da empresa em que participa (e que criou). 20.– Contra a ativação das consequências previstas para esta invalidade genética (i.e., a declaração de nulidade) poder-se-ia alegar que existiriam alternativas — qual não fosse a de, por exemplo, mobilizar uma eventual responsabilidade civil sobre os gestores a aferir a posteriori. 21.– Ora, não há as mínimas condições de procedência para tal concepção, pois que a configuração das invalidades e o respetivo regime prende-se com a defesa do sistema jurídico às suas próprias estruturas, enquanto que a construção da responsabilidade civil se dirige, tão-só, à eliminação do dano sofrido (ou quando muito, e quando se ultrapassa o dano efetivamente sofrido, à punição de um comportamento altamente culposo) — ou seja, estamos perante institutos completamente diferentes que, no limite, traduzem entre si uma relação cumulativa (e não uma relação de alternatividade, já que prosseguem a conformação de situações distintas e a realização de valores jurídicos diferentes); 22.– A responsabilidade civil jamais assegura a concretização do valor jurídico da razoabilidade e o interesse do sócio minoritário imprimido na teleologia societária. 23.– Noutro plano, poder-se-ia também alegar que a arguição da nulidade da cláusula 13 (e não só do CCVA) por parte da Impugnante seria ilegítima, por consubstanciar um pseudo abuso de direito — nomeadamente, nas vestes do venire contra factum proprium e da supressio. 24.– Se assim fosse, jamais teríamos declarações de nulidades contratuais (por um lado, porque para haver contratos, mesmo que nulos, tem de haver sempre um encontro de vontades e uma concordância com o conteúdo negocial, não colhendo o argumento que a invocação de uma nulidade contradiz tal comportamento; por outro lado, porque na execução do “jogo” de certas cláusulas, mesmo que nulas, o facto de se suportar um resultado desfavorável num primeiro momento não pode ter - não faz sentido que tenha – o condão de expiar os males intrínsecos àquelas). 25.– No que respeita à supressio, o período de pouco mais de três anos não permite a sua ativação. Na oposição ao pedido de anulação, os Requeridos T., S.A. e F., para além de arguirem a nulidade da citação (posteriormente desistiram dessa arguição) alegaram, em suma, que: 1.– A apreciação da alegada violação de ordem pública internacional não pode envolver um reexame do mérito da sentença, atento o princípio geral que neste sentido fica consagrado no n.º 9 do art. 46.º. 2.– Acresce que o controlo da violação da ordem pública internacional assume sempre carácter excecional, pelo que somente deve ser anulada uma decisão arbitral em casos de extrema gravidade. 3.– Ou seja, é um mecanismo de funcionamento excepcional, não é um mecanismo destinado a procurar um equilíbrio contratual perfeito (porventura diferente do que as partes efetivamente quiseram). 4.– A Sentença Arbitral não viola qualquer princípio de ordem pública internacional, nem interna. 5.– Não existe qualquer “princípio de ordem pública da proibição do controlo arbitrário da prestação contratual aleatória, especialmente acentuado no quadro de uma relação societária em que o sócio fundador pode ser expulso da empresa em que participa (e que criou)” e; 6.– Em concreto, e no que é mais relevante para esta ação de anulação, não foi provado ter havido por parte do Conselho de Administração da sociedade qualquer ação para prejudicar a evolução do EBITDA. 7.– Efetivamente, foi dado como “2.º Não Provado que a transação das ações e dos créditos a ceder pela M. tenha ocorrido num "estado de sujeição" desta, que se vira forçada a entregar ativos a um veículo de investimento participado por bancos contra a redução da dívida da M. aos mesmos bancos. 8.– É hoje pacífico na doutrina, que as normas (ainda que) imperativas só estarão abrangidas pela ordem pública internacional quando constituírem princípios fundamentais constitucionalmente consagrados. 9.– A Requerente baseia-se no direito de a Requerida T. designar a maioria dos administradores para concluir que o comprador influenciaria a gestão da atividade comercial das sociedades do Grupo P., controlando-a no sentido de influenciar o EBITDA. 10.– Além de no processo arbitral se ter provado exatamente o oposto, esta alegação é desprovida de sentido do ponto de vista legal, contrariando, desde logo, os mais elementares princípios de direito aplicáveis às sociedades comerciais: (i)-Os administradores, embora indicados por um acionista, são eleitos por todos os acionistas em Assembleia Geral – art. 391.º do Código das Sociedades Comerciais; (ii)-Compete ao Conselho de Administração deliberar sobre qualquer assunto de administração da sociedade, estando, consequentemente, vedada aos acionistas a possibilidade de instruir os administradores por si nomeados (ou outros) – arts. 405.º e 406.º do Código das Sociedades Comerciais; (iii)-Os administradores são independentes dos acionistas que os nomeiam, encontrando-se sujeitos a deveres de cuidado e lealdade, devendo agir no interesse da sociedade –art. 64.º do Código das Sociedades Comerciais; (iv)-O desrespeito pelos referidos princípios gera responsabilidade civil dos administradores – arts. 72.º a 79.º do Código das Sociedades Comerciais. 11.– Os exemplos de contrariedade à ordem pública que, em relação a contratos, têm sido apresentados no direito português e noutros direitos, respeitam geralmente à dignidade da pessoa humana, ao princípio pacta sunt servanda, à proibição de contratos que exigem esforços desmesurados ao devedor, que restringem demasiado a sua liberdade pessoal ou económica ou que estabelecem obrigações perpétuas, ilimitadas ou gravemente desproporcionadas.” 12.– O princípio do “pacta sunt servanda” estabelece que, “uma vez celebrado, o contrato plenamente válido e eficaz constitui lei imperativa entre as partes («lex privata»)”. 13.– Este princípio é verdadeiramente estruturante da ordem constitucional portuguesa, encontrando o seu fundamento último quer na noção de ‘Estado de Direito’, quer nos princípios da segurança jurídica e da proteção da confiança, consagrados no art. 2.º da Constituição da República Portuguesa. 14.– Também a Convenção de Viena sobre os Tratados2, de 23 de Maio de 1969, que Portugal aprovou para adesão através da Resolução da Assembleia da República n.º 67/2003, integra o princípio do “pacta sunt servanda” não só entre as suas disposições – cfr. artigo 26.º – mas também nos considerandos que conformam os princípios comuns a todos os Estados signatários, onde se pode ler que “Constatando que os princípios do livre consentimento e da boa fé e a regra pacta sunt servanda são universalmente reconhecidos”. 15.– Por outro lado, o que se clarifica na Sentença Arbitral é que a prestação contratual em causa não pode ser considerada como “aleatória” e que, mesmo que o fosse (que não é), para que se considerasse relevante a “aleatoriedade” alegada, seria necessário que a “álea” constituísse elemento que “caracteriza, com caráter de essencialidade, a estrutura do contrato” 16.– A perda da qualidade de sócia acionista da P.ENERGY, é sem dúvida a consequência jurídica que decorre do acordo corporizado no CCVA. Colhidos os vistos legais, cumpre decidir. * O tribunal é o competente, o processo o próprio, sem nulidades que o invalidem. Não há outras excepções ou nulidades de que cumpra conhecer. * II.– A questão a decidir é a de saber se a decisão do tribunal arbitral ofende os princípios da ordem pública internacional do Estado Português. * III.– Factos que se consideram provados (por acordo das partes e documento) e que se apresentam como relevantes para a prolação do presente acórdão: 1.- Em 3 de julho de 2013, entre a M., na qualidade de Vendedora, e o F. representado pela O., SA, na qualidade de Comprador, foi celebrado o Contrato designado como "Contrato de Compra e Venda de Ações e de Cessão de Créditos" ("CCVA") relativo à P., S.A., cujo teor integral consta do CD junto aos autos, o qual se dá por reproduzido. 2.- Na cláusula 13ª desse acordo estabeleceu-se: «13.– Compra e Venda de Acções Adicionais ou Revenda Parcial de Acções 13.1.- As Partes acordam em rever o Preço em 2014, obrigando-se a transmitir entre si as quantidades de acções representativas do capital social da Sociedade necessárias para que a participação detida por cada uma das Partes no capital social da Sociedade seja ajustada nas percentagens indicadas na tabela infra para cada valor do EBITDA Recorrente determinado, por referência às contas consolidadas das Sociedades respeitantes ao exercício de 2013, nos termos dos números 13.3 e seguintes infra.
Comprador
Vendedora Ajustada
13.2.- Cumulativamente com o ajuste ao Preço previsto no número anterior, as Partes acordam em obrigando-se as Partes a transmitir entre si as quantidades de acções representativas do capital social da Sociedade necessárias para que a participação detida por cada uma das Partes no capital social da Sociedade seja ajustada nas percentagens indicadas na tabela infra para cada valor do EBITDA rever de novo o Preço em 2016, Recorrente determinado, por referência às contas consolidadas das Sociedades respeitantes ao exercício de 2015, nos termos dos números seguintes: Ajustamento na participação +5% +4% +3% +2% 0% -2% -3% -4% -5% do comprador Participação da Vendedora Ajustada Ajustamento na participação -5% -4% -3% -2% 0% +2% +3% +4% +5% da vendedora 13.3.- Nos casos mencionados no número anterior, as Partes ajustarão correspondentemente, na mesma proporção que as acções representativas do capital social da Sociedade a transmitir ao abrigo desta Cláusula 69, a percentagem dos Créditos Accionistas M. detida por cada uma das Partes. 13.4.- As Partes acordam que o valor das percentagens em que as respectivas participações no capital social da Sociedade serão ajustadas, nos termos dos números anteriores, será, por sua vez, reduzido na proporção da relação de troca aplicada em operações de consolidação da Sociedade que provoquem a alteração do respectivo capital social (como fusões ou aumentos de capital por entradas em espécie) e a diluição das participações de ambas as Partes na mesma proporção. 13.5.- As Partes acordam que o valor do EBITDA Recorrente relevante para aplicação do disposto nos números anteriores, será determinado por aquela das Auditoras que apresentar a proposta de honorários mais baixa e não seja excluída por nenhuma das Partes (“Primeira Auditora”), sendo que cada uma das Partes tem o direito de excluir discricionariamente uma Auditora. A proposta para a prestação do serviço de cálculo do valor do EBITDA Recorrente pode ser pedida a partir de Outubro de 2013 e de 2015 pela Parte mais diligente, devendo ser facultado às Auditoras um prazo de 10 (dez) dias para apresentarem proposta. 13.6.- A Primeira Auditora determinará o EBITDA Recorrente recorrendo, subsidiariamente, aos critérios e princípios aplicados na elaboração do Relatório de Due Diligence Financeiro e Fiscal realizado às Sociedades em preparação da transacção formalizada pelo presente Contrato. 13.7.- Terminado o cálculo previsto no número anterior, a Primeira Auditora enviará projecto de relatório por escrito a ambas as Partes até ao fim de Abril de 2014 e de 2016, conforme aplicável, dispondo as Partes de um prazo de 10 (dez) dias para providenciar comentários escritos e devidamente fundamentados à Primeira Auditora sobre o relatório. A Primeira Auditora apreciará livremente os comentários das Partes e enviará relatório definitivo, no prazo de 10 (dez) dias após ter recebido os comentários de ambas as Partes ou do termo do prazo de 10 (dez) dias para as Partes comentarem o projecto de relatório. 13.8.- As Partes acordam que o relatório definitivo da Primeira Auditora que calcule o valor do EBITDA Recorrente é vinculativo para as Partes e não é susceptível de qualquer impugnação ou contestação pela Partes, excepto em caso de erro manifesto, contradição insanável ou fraude, sendo que neste caso qualquer das Partes pode, no prazo de 10 (dez) dias, apresentar à outra Parte por escrito o valor do EBITDA Recorrente que considera correcto. Se as Partes não chegarem a acordo quanto ao valor do EBITDA Recorrente no prazo de 10 (dez) dias, a Parte que não aceite o relatório da Primeira Auditora pode, no prazo de 5 (cinco) dias, exigir uma revisão do cálculo do EBITDA Recorrente à Auditora que tenha apresentado a segunda proposta de honorários mais baixa e não tenha sido excluída por nenhuma das Partes (“Segunda Auditora”). 13.9.- A Segunda Auditora deve proceder à revisão do cálculo do valor do EBITDA Recorrente nos 20 (vinte) dias imediatamente seguintes à sua designação e incide apenas nos aspectos que a Parte que solicite a revisão identifique como viciados por erro manifesto, contradição insanável ou fraude, sendo os respectivos resultados considerados como definitivos pelas Partes. 13.10.- As Partes acordam que os honorários da Segunda Auditora serão suportados por cada uma das Partes na proporção do desvio do valor do EBITDA Recorrente constante dos relatórios da Primeira e da Segunda Auditora, considerando-se que o valor indicado no relatório da Primeira Auditora é o valor defendido pela Parte que não tenha pedido a respectiva revisão. 13.11.- Para efeitos dos números anteriores, as Partes obrigam-se a assegurar que a Primeira e a Segunda Auditora têm acesso a todos os dados e documentos necessários durante os primeiros 4 (quatro) meses de cada um dos anos de 2014 e 2016, por forma a que o valor do EBITDA Recorrente esteja determinado até ao fim do mês de Junho de 2014 e 2016, conforme aplicável, obrigando-se as Partes ainda a assegurar a vinculação da Primeira e da Segunda Auditora ao cumprimento dos prazos aqui previstos. 13.12.- As Partes obrigam-se reciprocamente a praticar todos os actos e a preencher todas as formalidades necessárias à transmissão válida, eficaz e definitiva de acções e Créditos Accionistas M. entre si, livres de quaisquer Ónus, em cumprimento do disposto nesta Cláusula 69.» 3.– O EBITDA mostra-se definido no CCVA como significando: “o resultado liquido consolidado das Sociedades durante um determinado exercicio financeiro, excluindo o que seja gerado par qualquer activo, sociedade ou entidade adquirida pelas Sociedades ou nelas integrado ap6s a Data de Transmissão, preparado de acordo com as Normas lnternacionais de Relato Financeiro emitidas pelo International Accounting Standards Board que tenham sido adoptadas na Uniao Europeia , e acrescido de: i.-impostos do exercicio; ii.-amortizações e depreciações; iii.-resultados financeiros negativos associados a divida financeira, e iv.-custos de natureza não recorrente ou não operacionais; E deduzido de: i.-proveitos de natureza não recorrente ou não operacionais; ii.-resultados financeiros positivos; E ajustado nos demais termos previstos no Anexo 10”. 4.– A compra e venda de 5.343.000 ações ordinárias tituladas ao portador, representativas de 39% do capital da sociedade P.ENERGY — SGPS,S.A., com o valor nominal de €1,00, cada, ficou sujeita à verificação (ou renúncia à verificação) de condições suspensivas. A cessão de créditos ao F. ficou igualmente sujeita à verificação (ou renúncia à verificação) das condições suspensivas, devendo produzir efeitos na Data de Transmissão; 5.– O F., foi substituído na posição contratual de Comprador, em 23 de outubro de 2013, pela T. ENERGIA, SGPS, S.A., substituição aceite pela vendedora; 6.– A Data de Transmissão ocorreu em 1 de novembro de 2013; 7.– O preço pago pelo F. pela venda das ações e cessão de créditos foi de €31.200.000,00, correspondendo o preço das ações a €28.899.000,00, e o preço da cessão de créditos a €2.301.000,00; 8.– O pagamento do preço global da transação foi feito por compensação, operada nos termos da Cláusula 6.1. do CCVA na Data da Transmissão, com o montante dos créditos detidos por diferentes instituições bancárias sobre a vendedora à data do CCVA e que, na Data da Transmissão, tinham sido efetivamente transmitidos ao F., sendo detidos por este; 9.– Em 26 de dezembro de 2016, a T., S.A. (“T.”), ora Impugnada, apresentou um requerimento de arbitragem no Centro de Arbitragem da Câmara de Comércio e Indústria Portuguesa contra a M., S.A.(“M.”), ora Impugnante, no qual pediu que se declarasse «a inexistência dos vícios alegados pela M. na execução do mecanismo de ajustamento de Preço previsto na Cláusula 13ª do Contrato de Compra e Venda de Ações e Cessão de Créditos relativo à P., S.A., e, em consequência, (...)» se declarasse «legítimo o exercício pela T. do direito a adquirir à M., nos termos e para os efeitos da Cláusula 13ª do Contrato de Compra e Venda de Ações e Cessão de Créditos (i) 5% das ações representativas do capital social da P., S.A., correspondente a 685.000 (seiscentas e oitenta e cinco mil) ações e (ii) os Créditos Acionistas M. por si detidos». 10.– Em 27 de janeiro de 2017, a Impugnante apresentou a sua Contestação com Reconvenção, na qual pediu: «A)-a presente acção arbitral ser declarada inviável, improcedendo a mesma, com todas as demais legais consequências, B)-caso assim não se entenda, ser a presente acção arbitral julgada não provada e improcedente, e, em consequência, não reconhecido o direito da Demandante a adquirir à Demandada 5% das acções representativas do capital social da P., S.A., correspondente a 685.000 acções e os Créditos Accionistas M., com todas as demais legais consequências, C)-ser admitida a Reconvenção e, por via dela, ser: C1.)-declarada a nulidade do CCVA celebrado entre a Reconvinte e as Reconvindas, com todas as demais legaisconsequências; e, uma vez declarada a nulidade do CCVA, ser fixado um prazo razoável às Partes para que estas restituam, em simultâneo, tudo quanto tenham recebido por conta do contrato declarado nulo; Caso assim não se entenda, C2.)-declarada a nulidade da Cláusula 13.ª do CCVA celebrado entre a Reconvinte e as Reconvindas, com todas as demais legais consequências; e, uma vez declarada a nulidade do CCVA, ser fixado um prazo razoável às Partes para que estas restituam, em simultâneo, tudo quanto tenham recebido por conta da aplicação da Cláusula 13.a do CCVA declarada nula; Caso assim não se entenda, C3.)-deverá ser declarada a anulabilidade/modificabilidade da Cláusula 13.a do CCVA celebrado entre a Reconvinte e as Reconvindas, nos exactos termos requeridos no artigo 394.o da Reconvenção, que aqui se dá integralmente como reproduzido e integrado. C4.)-e, nessa sequência, ser declarado o incumprimento do CCVA pela Reconvinda por inobservância do disposto na Cláusula modificada nos termos da alínea anterior; D)-Caso assim não se entenda, subsidiariamente, deverá o Tribunal: D1.)-integrar a cláusula constante de Doc. B5, que se dá aqui por integralmente reproduzida e aqui integrada, como pressuposto do mecanismo de ajustamento previsto na Cláusula 13.a do CCVA, à luz e nos termos do disposto no artigo 239.o do Código Civil, e D2.)-Caso assim não se entenda, declarar como válida a cláusula acessória constante de Doc. B5, que se dá aqui por integralmente reproduzida e aqui integrada, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 222.º do Código Civil.». 11.– Na acção arbitral, a requerimento da M., o F., representado por O., S.A. passou a intervir como co-demandado quanto ao pedido reconvencional deduzido pela M. contra a T., tendo aquele aceite a sua intervenção, tal como esta última. 12.– Por Acórdão Final (junto a fls. 41 e segs., e cujo teor se dá por reproduzido), proferido no dia 27 de setembro de 2018, o Tribunal Arbitral decidiu: a.-Julgar procedente a ação arbitral, declarar inexistentes os vícios alegados pela M. na execução do "mecanismo de ajustamento de Preço" previsto na Cláusula 13.a do Contrato de Compra e Venda de Ações e Cessão de Créditos relativo à P., S.A., e, em consequência, declarar também legítimo o exercício pela T., S.A., do direito a adquirir à M., nos termos e para os efeitos da Cláusula 13.a do mesmo Contrato (i) 5% das ações representativas do capital social da mesma P., correspondentes às últimas 685.000 (seiscentos e oitenta e cinco mil) ações detidas pela mesma M. e (ii) os Créditos M. detidos por esta última; b.-Julgar improcedentes por não provados, todos os pedidos reconvencionais formulados, a título principal ou subsidiário, pela Demandante M., S.A. e, em consequência absolver a Demandante e o Interveniente Reconvindo dos pedidos de condenação contra estes deduzidos; c.-Julgar procedente, por provado, o pedido de condenação da Demandada M., S.A. a pagar à Demandante T., SGPS, S.A., na qualidade de subrogada da credora E. o montante de 18.338,64 (dezoito mil trezentos e trinta e oito euros e sessenta e quatro cêntimos), acrescido dos juros de mora que se vencerem às sucessivas taxas comerciais supletivas legais desde a data de 31 de março de 2017 (data da notificação à Demandada da resposta à contestação reconvenção), até integral e efetivo pagamento; d.-Julgar improcedente, por não provado, o pedido ilíquido de condenação formulado pela Demandante T., S.A., contra a Demandada M., S.A., pelos prejuízos causados com a contingência da pendência da presente ação. e.-Condenar a Demandante e o Reconvindo, por um lado, e a Demandada, por outro, a suportarem as percentagens de 20% e de 80%, respetivamente, de todos os custos incorridos com a presente arbitragem e documentados nos autos, incluindo encargos de arbitragem — honorários e despesas dos árbitros, encargos administrativos do processo e despesas com a produção de prova — custos com honorários dos Advogados de cada parte, custos com honorários dos autores de Pareceres jurídicos ou de outros consultores, desta forma compensando cada Parte a outra, em função das percentagens de decaimento recíproco, e operando, em seguida, a compensação entre os montantes devidos a cada uma. 13.– Esse acórdão obteve o voto unânime dos três árbitros, tendo um deles formulado uma declaração de voto. 14.– Por requerimento de 30 de outubro de 2018, a ora Impugnante apresentou perante o Tribunal Arbitral um requerimento, nos termos do art. 45.º da LAV, a pedir vários esclarecimentos e a invocar uma omissão sobre o pedido formulado por aquela sob a alínea D2 e a prolação de uma decisão arbitral adicional. 15.– Por decisão do Tribunal Arbitral de 22 de Novembro de 2018 foram desatendidos os pedidos de esclarecimento e indeferido o pedido de prolação de sentença arbitral adicional. *** IV.–Do mérito da apelação: Na presente acção a autora pretende a anulação do segmento decisório do acórdão proferido pelo tribunal arbitral, no qual se decidiu “julgar improcedentes por não provados, todos os pedidos reconvencionais formulados, a título principal ou subsidiário, pela Demandante M., S.A. e, em consequência absolver a Demandante e o Interveniente Reconvindo dos pedidos de condenação contra estes deduzidos”. Tal improcedência decorreu da circunstância daquele tribunal ter julgado válida a cláusula 13ª do Contrato de Compra e Venda de Ações e Cessão de Créditos relativo à P., S.A., celebrado dia 3 de julho de 2013, entre a M., na qualidade de Vendedora, e o F. representado pela O. SA, na qualidade de Comprador (em 23 de outubro de 2013 o F. foi substituído na posição contratual de Comprador pela T., S.A., substituição aceite pela vendedora) e teve, além do mais, por objecto a compra e venda de 5.343.000 ações ordinárias tituladas ao portador, representativas de 39% do capital da sociedade P.,S.A., com o valor nominal de €1,00, cada. A autora M., SA estriba a sua pretensão, na (alegada) violação pelo acórdão arbitral da ordem pública do Estado Português, ao aceitar como válida e plenamente operante a cláusula 13ª do CCVA que, segundo aquela, é manifestamente desequilibrada, por ofender o princípio da proibição do controlo arbitrário da prestação contratual aleatória (especialmente vincado pela consequente eliminação da teia societária do sócio fundador), bem como a sua violação por força de uma ostensiva cláusula leonina. Estatui o art. 46º, nº 3, b), ii), da LAV, que a sentença arbitral pode ser anulada se o tribunal estadual competente verificar que o conteúdo da sentença ofende os princípios da ordem pública internacional do Estado português. Para Mota Pinto, (Teoria Geral do Direito Civil, pag. 434) deve entender-se por ordem pública “o conjunto dos princípios fundamentais, subjacentes ao sistema jurídico, que o Estado e a sociedade estão substancialmente interessados em que prevaleçam e que têm uma acuidade tão forte que devem prevalecer sobre as convenções privadas (…) que não são susceptíveis de uma catalogação exaustiva, até porque a ordem pública é variável com os tempos” . Por seu lado, Manuel de Andrade (Teoria Geral da Relação Jurídica, vol. II, pags. 334-335) reconduz a ordem pública «aos interesses fundamentais que o nosso sistema jurídico procura tutelar e aos princípios correspondentes que constituem como que um substrato desse sistema». Baptista Machado (Lições de Direito Internacional privado, 2ª edição, pag. 254) definia o conceito como “aquelas normas e princípios jurídicos absolutamente imperativos que formam os quadros fundamentais do sistema, sobre eles se alicerçando a ordem económica e social, pelo que são inderrogáveis pela vontade dos indivíduos. Serão assim de ordem pública, entre outras, aquelas normas que estabelecem regras fundamentais da organização económica, as que visam garantir a segurança do comércio jurídico e proteger terceiros, as que tutelam a integridade dos indivíduos e a independência da pessoa humana e protegem os fracos e incapazes, as que respeitam à organização da família e ao estado das pessoas, visando satisfazer um interesse geral da colectividade,etc” . Nas definições indicadas evidencia-se a ideia de que cláusula geral da ordem pública internacional veicula princípios e normas fundamentais em que se baseia a ordem jurídica, económica, social e ética da comunidade, como são, desde logo, os que pela sua relevância, integrem a Constituição em sentido material, pois são as normas e princípios constitucionais, sobretudo, os que tutelam direitos fundamentais, que não só informam mas também conformam a ordem pública internacional, bem como os princípios fundamentais de Direito da União Europeia. E são, ainda, referenciados como integrando a ordem pública internacional de cada Estado, princípios fundamentais como os da boa-fé, dos bons costumes, da proibição do abuso de direito, da proporcionalidade, da proibição de medidas discriminatórias ou espoliadoras, da proibição de indemnizações punitivas em matéria cível e os princípios e regras basilares do direito da concorrência, tanto de fonte comunitária – cfr. Ac. STJ de 26/9/2017, Alexandre Reis (relator), acessível in www.dgsi.pt. Não é assim a violação de qualquer princípio de ordem pública que pode ser invocado como fundamento do pedido de anulação, mas apenas do núcleo mais restrito daqueles princípios de ordem pública interna que sejam também princípios de ordem pública internacional - Dário Moura Vicente e outros, LAV Anotada, 2ª edição, revista e actualizada, Almedina, pags. 126/127. Sendo, porém, o conceito de ordem pública um conceito indeterminado, «só perante das circunstâncias do caso concreto se pode dizer se uma determinada violação de um princípio ou norma fundamental é intolerável» (Lima Pinheiro, Direito Internacional Privado, I, 2014, p. 659). Por outro lado, como resulta expressamente do n.º 9 do artigo 46 da LAV, o juízo de avaliação na impugnação não redunda na substituição da sentença arbitral proferida por outra de sentido diferente, mas apenas à sua anulação, ao seu expurgo da ordem jurídica. Na linha dos considerandos exarados no Ac STJ de 26/9/2017, citado, o juízo a formular opera, simplesmente, ao nível do caso concreto – “e em função dos seus particularismos – e a sua actuação positiva sobre o resultado obtido pela decisão arbitral não comporta qualquer juízo sobre a adequação da aplicação nela feita do direito tido por aplicável: a acção preclusiva da ordem pública internacional incide unicamente sobre os efeitos jurídicos que, para o caso, defluem da decisão. Depois, não se confunde com revisão o controlo que o juiz tem de fazer para aquilatar da ofensa da ordem pública internacional do Estado do foro: o juiz, ao apreciar a sentença arbitral em questão, não julga novamente o litígio decidido pelo tribunal arbitral para verificar se chegaria ao mesmo resultado a que este chegou, apenas deve verificar se tal sentença, pelo resultado a que conduz, ofende algum princípio considerado como essencial pela ordem jurídica do foro: «O tribunal estadual que anule a sentença arbitral não pode conhecer do mérito da questão ou questões por aquela decididas», como estatui o art. 46º nº 9 da LAV, pelo que, a apreciação de uma alegada violação de ordem pública internacional, não podendo envolver um reexame do mérito da decisão, deve limitar-se, numa avaliação prima facie, aos casos de aparente ou manifesta contradição com os princípios que integram essa ordem, ponderando a situação que a decisão estabelece e não os fundamentos em que esta assenta”. Posto isto, vejamos os contornos do caso apreciado pelo Tribunal Arbitral. Como se refere no acórdão do Tribunal Arbitral, no CCVA celebrado dia 3 de julho de 2013 as acções da P., SA objecto de transmissão por parte de M., na qualidade de Vendedora, a favor do F., na qualidade de Comprador (em 23 de outubro de 2013 este veio a ser substituído na sua posição contratual pela T., S.A., substituição aceite pela vendedora), tinham o valor nominal de € 5.343.000 e foram vendidas pelo valor de € 28.899.000. Atendendo ao disposto na cláusula 13ª, as Partes entenderam que aquele preço do contrato se justificava na justa medida em que (i) no exercício de 2013, o EBITDA recorrente, determinado por referências às contas consolidadas das sociedades constante do Anexo 1 ao contrato, se localizasse entre os € 21.000.000 e € 23.000.000; e (ii) no exercício de 2015, o EBITDA recorrente, determinado por referências às contas consolidadas das mesmas sociedades, se localizasse entre os € 24.600.000 e € 26.600.000. E que, caso o EBITDA recorrente se viesse a manter nos valores indicados, não haveria lugar à aplicação da cláusula 13: o ajustamento seria de 0%. Tendo em conta que se trata de uma compra e venda, e não sendo, no caso, exequível, a reposição contratual do equilíbrio através de um ajustamento do preço, pois que o pagamento deste operou por compensação, o ajustamento far-se-ia não pelo preço, mas pelo activo que constituía objeto (mediato) do contrato. Assim, na cláusula 13ª do CCVA, estipulou-se, em resumo e no essencial, a manutenção do preço global do contrato, obrigando-se porém a vendedora (T.) a transmitir à compradora (M., SA) ou a compradora a transmitir à vendedora, em 2014 e 2016, percentagens certas de ações, consoante fossem inferiores ou superiores a valores de referência indicados na cláusula os resultados líquidos (“EBITDA Recorrente”), certificados por auditores, da P.e de sociedades subsidiárias desta, relativos aos anos de 2013 e de 2015. A particularidade consiste em que, corrigido esse preço unitário, o efeito não se traduz na modificação do preço total, para mais ou para menos, mas na modificação, para menos ou para mais, da quantidade de acções vendidas. E foi aquela cláusula que o tribunal arbitral considerou válida, sustentando a sua decisão em raciocínio cujas premissas aqui se deixam realçadas: “O Tribunal encontra-se numa posição diversa da dos Autores dos Pareceres atrás analisados. De facto, esses Jurisconsultos elaboraram os Pareceres em função dos dados fornecidos por cada uma das Partes, antes de se ter produzido a totalidade da prova testemunhal e pericial no processo arbitral. Em contrapartida, o Tribunal está em condições de decidir na posse de todos os dados de facto apurados na atividade probatória. Nessa medida, está em condições de afirmar que não se provou que tenha havido qualquer manipulação por parte da administração da P.ENERGY para "travar" os resultados do Grupo nos anos de 2013 ou de 2015. Assim sendo, está arredado que a determinação do preço tenha resultado da alegada arbitrariedade e da possível violação da ordem pública pela cláusula em causa (…). (…) tratando-se in casu de um contrato de compra e venda de ações e de cessão de créditos de um acionista sobre a sociedade em que detém essas ações, estamos perante o que se designa vulgarmente por um share deal, forma indireta de adquirir o controlo ou uma posição relevante na sociedade detentora da empresa. (…) Como escreve entre nós o Prof. José Engrácia Antunes, "[a] relevância das transmissões de participações societárias de controlo como forma de transmissão indireta da empresa é bastante discutida e controversa na doutrina e jurisprudência, sobretudo estrangeira I" ("A Empresa como Objeto de Negócios — «Asset Deals» versus «Share Deals »" , in Revista da Ordem dos Advogados, ano 68.°, 2008, III-IV, pág. 725). E acrescenta que "nenhumas dúvidas podem existir que, no quadro de um universo económico protagonizado por empresários coletivos de significativa dimensão, a transmissão indireta se transformou hoje na principal, senão mesmo hegemónica, modalidade de negociação empresarial: o negócio prototípico nesta sede é a transmissão de participação sociais de controlo (ou seja, de frações do capital da empresa societária suscetíveis de atribuir ao seu titular um poder jurídico de controlo sobre o respetivo governo e órgãos sociais), ao lado do qual se vêm somando muitos outros negócios jus mercantis alternativos suscetíveis de conduzir a resultados funcionalmente equivalentes («maxime», fusão, cisão, aumentos de capital reservados, «operações acordeão», «leverage buy ont», negócios insolvenciais, etc) [ ...] " (mesmo artigo e revista, pág. 724). No que toca ao pagamento do preço nos share deals, há, segundo o Prof. Engrácia Antunes, estipulações muito variadas. Preços desde logo determinados (baseados em uma enorme quantidade de métodos de avaliação empresarial); preços de determinação indireta ou mediata, "sendo a fixação do «quantum» pecuniária abandonada para momento futuro segundo critérios estabelecidos pelas próprias partes ou terceiros (arts. 440. ° e 883. ° do Código Civil, art. 466.° do Código Comercial). (…) Manifestamente, a Cláusula 13.ª é uma cláusula de preço simultaneamente determinado em parte e preço contingente ou eventual, aqui dependente da performance do grupo empresarial em dois anos interpolados. Tem a particularidade, posta em relevo no Parecer do Prof. Carlos Ferreira de Almeida, de o montante globalmente fixado para a transação ser fixo (€31.200.000, cabendo ao preço das ações transmitidas inicialmente o montante de €28.899.000), variando apenas o preço de cada ação do pacote adquirido de 5.343.000, em caso de revisão para o lado do comprador ou para o lado do vendedor, afetando, nessa medida o objeto do contrato translativo. O critério do EBITDA Recorrente é um critério claramente objetivo, intervindo, pelo menos, duas auditoras (a da sociedade gestora de participações sociais P. e a primeira auditora) no cálculo desse EBITDA Recorrente, tendo em vista a definição constante da Cláusula 1.1 do CCVA e o Anexo 10 a este. Poderá intervir a segunda auditora, se houver impugnação do valor da primeira. A eventualidade de existência de manipulação do EBITDA pode ocorrer, tal como pode haver manipulação de parte do fiduciário, pessoa singular escolhida para determinar o valor da empresa e corrigir o preço provisório, segundo os critérios convencionados. Simplesmente estas situações patológicas ou o risco de elas ocorrerem nunca podem redundar na proibição da solução com fundamento na violação da ordem pública ou do abuso do direito. Conclui-se, pois, que as cláusulas 13.1 e 13.2 do CCVA não estão afetadas de qualquer invalidade, nem existindo indeterminabilidade nem violação da ordem pública, e não resultando esta das referidas situações patológicas ou do risco de elas ocorrerem. Para essas situações, parece, aliás, inteiramente razoável a solução aventada pelo Prof. Ferreira de Almeida de recurso por analogia ao art. 275.°, n.° 2, do Código Civil, se se viesse a provar uma manipulação da performance levada a cabo pela administração designada pelo acionista majoritário: se tal manipulação impedisse a verificação da condição (de manter a percentagem das ações adquiridas inicialmente; de ter de revender parte destas ações), contra as regras da boa fé por aquele a quem prejudicava, ter-se-ia "por verificada" (1.a parte do n.° 2 do art. 275.° do Código Civil). Em qualquer caso, nunca estaria em causa a validade da cláusula. Deve notar-se que, como foi posto em relevo pela Demandada no articulado de contestação-reconvenção e nas Alegações Finais, e já foi reconhecido na presente Decisão, a estipulação da Cláusula 13.2 possibilita a ocorrência de um evento gravemente danoso para a M.. De facto, se o valor do EBITDA Recorrente em 2015 fosse inferior a €21.600.000, — como foi —deveria ocorrer uma transferência dos 5% restantes da participação da M. na PRIO, deixando aquela de ter a qualidade de sócia acionista da P.ENERGY, caducando o Acordo Parassocial. Do depoimento oral do Eng. C...M... resultou claro que a M. pretende "ir a jogo", na fase de desinvestimento do F. de Reestruturação Empresarial, bastando-lhe deter uma participação mínima de 1% ou 2% do capital da P.ENERGY para exercer os direitos consagrados no Acordo Parassocial. A verdade, porém, é que, não obstante se poder considerar excessiva a consequência da perda da qualidade de sócio devido ao que aconteceu no caso em apreciação (o EBITDA Recorrente referente ao ano de 2015 ficou aquém do referido valor e o Agente Escrow transmitiu as ações e os créditos da M. para T.), tal é sem dúvida a consequência jurídica que decorre do acordo corporizado no CCVA. Ainda que se pudesse censurar esse caráter excessivo da solução referida, a mesma decorre do CCVA, que foi estipulado livremente, estando já então os legais representantes das Partes cientes do risco da perda da última parcela de capital e de créditos, prefigurado no CCVA. O depoimento oral do Dr. Jorge Martins não deixou dúvidas sobre o conhecimento do risco, e, consequentemente, sobre a sua assunção com a celebração do contrato (embora pudessem confiar em que se não viria a concretizar). O risco de perda de qualidade de acionista da M. não se teria verificado se esta tivesse vendido apenas 29% do capital social da P., guardando para si 20% do capital, ainda que se mantivesse imutado o clausulado do CCVA. Neste caso, que coincide aliás com a proposta do FRE constante do Acordo de Investimento, a transmissão de 5% não afetaria a qualidade de acionista da M. (e o mesmo sucedendo se a transmissão inicial fosse inferior a 39% do capital da P.). Sendo exato o que acaba de referir-se, o Tribunal não dispõe nem de fundamento legal nem de competência para alterar o contrato livremente negociado e assinado em 2013, pois não está mandatado para resolver o litígio por equidade ou por composição de interesses. (…) A consequência da perda da qualidade de sócio é, pois, resultado da cláusula de ajuste livremente acordada pelas partes. (…) Tão pouco se vê que a estipulação da cláusula de ajuste constante da cláusula 13.1 e 13.2 do CCVA possa tornar-se nula por força da qualificação deste Contrato como aleatório. (…) o direito civil português não contém qualquer proibição genérica de contratos aleatórios, existindo muitos contratos deste tipo que desempenham funções socialmente úteis e que são eficazes e vinculativos. O Código Civil de 1966 apenas contém uma disciplina especial para o contrato de jogo e aposta, que é um tipo específico (que aliás o Código Civil não definiu) de contrato aleatório, prevendo que o jogo e a aposta apenas são válidos se forem lícitos e que mesmo nesse caso apenas geram obrigações naturais (art. 1245.° do citado Código). In casu, temos um contrato em que o objeto da prestação (preço unitário da ação; número de ações transmitidas) tem aparência de fixo, não se estando perante qualquer contrato de jogo e aposta, nem parecendo, sequer, que se justifique a sua qualificação como contrato aleatório. O clausulado do contrato admite que o objeto varie se o EBITDA Recorrente se situar em diferentes valores, tendo-se estipulado o critério para essa variação e a forma da sua determinação. Está-se aqui no domínio do art. 466.° do Código Comercial aplicável diretamente ou por analogia, razão por que se nega, pelas razões referidas atrás, que a Cláusula 13.1 e 13.2 seja arbitrária e que a cláusula possa ser nula por força do art. 280.°, n.° 1 (indeterminabilidade) ou 2 (violação da ordem pública), do Código Civil”. Em consonância com este raciocínio, o Tribunal Arbitral julgou improcedente o pedido de declaração da nulidade da Cláusula 13ª do CCVA. Dissentindo, diz a autora que aquela cláusula é inválida pois que a T. controlava a gestão da P.,S.A., na medida em que era ela quem dispunha do poder de nomear a maioria absoluta do Conselho de Administração e a totalidade dos membros do Conselho de Administração de cada uma das sociedades participadas pela PRIO, e quem controla a gestão, pode não controlar o aumento do valor do EBITDA, mas com toda a certeza consegue determinar a sua descida. Por essa razão sustenta que o acórdão arbitral, ao aceitar como válida e plenamente operante a cláusula 13ª, violou a ordem pública do Estado Português, por ofender o princípio da proibição do controlo arbitrário da prestação contratual aleatória (especialmente vincado pela consequente eliminação da teia societária do sócio fundador), bem como a sua violação por força de uma ostensiva cláusula leonina. Concretizando, diz a autora que, no caso, tal princípio emerge por 3 fundamentos: i)-os valores do direito civil — razoabilidade como valor fundante que implica a rejeição dos desequilíbrios contratuais manifestos e o puro arbítrio da parte forte do contrato; ii)-a teleologia societária — a proteção da posição do sócio minoritário e do seu direito a sê-lo, na medida em que o sócio forte e majoritário tem a possibilidade de, por seu exclusivo arbítrio, expulsar o sócio minoritário. iii)-a intangibilidade aleatória, pois que a álea tem de ser pura, intangível, assente em critérios objetivos e não disponível à vontade e ação das partes. Acrescenta dizendo que estamos na presença de um critério de determinabilidade da prestação aparentemente objectivo, perante uma aleatoriedade meramente formal – já que, em última análise, a própria prestação depende da subjectividade de uma das partes, pois que um dos contraentes (no caso, o comprador), fica, em função do critério eleito e das demais estipulações, com a possibilidade de, sem qualquer controlo da outra parte ou de terceiro ou e sem qualquer arrimo objetivo, determinar ou manipular no sentido que lhe é mais favorável (que é, obviamente, aquele que estende mais o número de acções a transmitir pela vendedora) a aplicação do aparente critério objectivo. O efeito jurídico que a aplicação do raciocínio do Tribunal Arbitral produziu não é, adiantamos desde já, manifestamente incompatível com os postulados basilares da ordem pública internacional do Estado português. Senão vejamos. Como já deixámos expresso, na cláusula 13ª do CCVA estebeleceu-se um mecanismo de revisão do preço unitário das acções vendidas (e não de ajuste do preço global) através do ajustamento das participações dos contraentes: começou por ser fixa essa participação, mas podia descer ou subir consoante a evolução do EBITDA Recorrente em dois anos alternados. Previa-se, pois, uma determinação indirecta da quantidade de acções vendidas, em função do resultado liquido consolidado das sociedades do grupo P. durante os exercícios financeiros de 2013 e 2015, repartindo assim as partes o risco do negócio. Ora, o resultado alcançado pelo tribunal arbitral, ao considerar a validade da cláusula 13ª, não colide, e muito menos de forma clamorosa e desproporcionada com os nossos bons costumes ou os mais basilares princípios estruturantes da nossa comunidade juridicamente organizada, o da proporcionalidade (ou da proibição do excesso). É certo que os administradores da P.eram nomeados pela T. e que a performance do grupo P.ficou abaixo da expectativa da M., não tendo o EBITDA atingido o valor necessário para esta não perder a posição accionista daquela sociedade. Porém, daí não decorre, sem mais, que o critério de determinação do montante das acções alienadas e do preço de cada uma viole a ordem pública internacional do Estado português, face à sua (alegada) subjectividade e arbitrariedade. É que, para além do EBITDA constituir um indicador do potencial de uma empresa muito utilizado para analisar e medir a produtividade e a eficiência do negócio, o seu valor depende de diversos factores e não só dos critérios de gestão. E, do ponto de vista legal, os administradores de uma empresa não se confundem com a pessoa jurídica que gerem/representam, sendo responsáveis perante esta – art. 72º do CSC. Para além disso, considerou o Tribunal Arbitral que se não provou que tenha havido qualquer manipulação por parte da administração da P. para "travar" os resultados do grupo nos anos de 2013 ou de 2015 e que, sendo assim, está arredado que a determinação do preço tenha resultado da alegada arbitrariedade. Concluiu ainda aquele tribunal que o critério estabelecido na cláusula 13.1 e 13.2 era objectivo e que não nos encontramos perante qualquer contrato de jogo e aposta, não parecendo sequer que seja de qualificar como aleatório. Ora, em sede de impugnação da decisão arbitral não pode a Relação controlar a exactidão das apreciações de facto ou de direito inerentes a este raciocínio do Tribunal Arbitral. Por idêntica razão, não se pode controlar o entendimento do Tribunal Arbitral no sentido da aplicabilidade, por analogia, do disposto no art. 275.°, n.° 2, do Código Civil, se se viesse a provar uma manipulação da performance levada a cabo pela administração designada pelo acionista majoritário, nem o entendimento de que o ónus da prova desse facto recaía sobre a ora apelante M.. O que esta Relação pode apreciar é unicamente se o resultado da decisão é manifestamente incompatível com os princípios da ordem pública internacional do Estado, o que não se evidencia no caso. E ainda que a consideração a que chegou o Tribunal Arbitral da validade do negócio acarrete a transferência de acções da M. para a T. e a perda da qualidade de sócio daquela na PRIO, tal constitui uma mera consequência de uma cláusula livremente acordada pelas partes, ou seja, de um efeito normal do negócio de ajuste da quantidade de acções vendidas e não uma expulsão do sócio minoritário pelo maioritário. Não sendo permitido censurar ou sindicar a legalidade ou mérito da decisão arbitral, e não constituindo aquela consequência um resultado chocante, não colidindo com os princípios jurídicos estruturantes da nossa comunidade, conclui-se que a decisão arbitral não viola a ordem pública internacional do Estado Português. Improcede, por isso, a presente acção. Do valor da acção: Na p.i. a autora atribuiu à acção o valor de €8.000.000,00, por ser esse o preço das acções (valor dos 10% das acções da P., S.A.) – arts. 297º e 301ºdo CPC. Na contestação não foi impugnado o valor atribuído à causa. Assim sendo, e na falta de outro critério mais preciso de avaliação do valor do acto jurídico, fixa-se em €8.000.000,00 o valor da causa – art. 306º do CPC. Das custas: A autora será condenada nas custas da acção, enquanto parte vencida (art. 527º, n.ºs 1 e 2, do CPC), dispensando-se, à luz do princípio da proporcionalidade, o pagamento do remanescente de taxa de justiça (na parte excedente ao valor tributário de €275.000,00), nos termos do art. 6º, n.º 7 do RCP, atenta a simplicidade do processado: dois articulados e desnecessidade de produção de prova. Sumário: 1. O conceito de ordem pública é um conceito indeterminado, pelo que só perante as circunstâncias do caso concreto se pode dizer se uma determinada violação de um princípio ou norma fundamental é intolerável. 2. Como resulta expressamente do n.º 9 do artigo 46 da LAV, o juízo de avaliação na acção de impugnação da decisão arbitral não comporta qualquer juízo sobre a adequação da aplicação nela feita do direito tido por aplicável: a acção preclusiva da ordem pública internacional incide unicamente sobre os efeitos jurídicos que, para o caso, defluem da decisão. 3. Não pode por isso a Relação controlar a exactidão das apreciações de facto ou de direito inerentes ao raciocínio seguido pelo Tribunal Arbitral. *** V.–Decisão: Pelo acima exposto, decide-se: 1.–Julgar improcedente a acção, absolvendo-se as rés do pedido; 2.–Fixar em €8.000.000,00 o valor da causa; 3.–Custas pela autora, dispensando-se o pagamento do remanescente de taxa de justiça (na parte excedente ao valor tributário de €275.000,00), nos termos do art. 6º, n.º 7 do RCP; 4.–Notifique. Lisboa, 9 de Setembro de 2019 (Manuel Ribeiro Marques - Relator) (Pedro Brighton – 1º Adjunto) (Teresa Henriques – 2ª Adjunta) |