Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | CARLOS CASTELO BRANCO (VICE-PRESIDENTE) | ||
Descritores: | CONFLITO DE COMPETÊNCIA EXECUÇÃO DE SENTENÇA VERIFICAÇÃO E GRADUAÇÃO DE CRÉDITOS INSOLVÊNCIA | ||
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Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 12/04/2024 | ||
Votação: | DECISÃO INDIVIDUAL | ||
Texto Integral: | S | ||
Texto Parcial: | N | ||
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Meio Processual: | CONFLITO DE COMPETÊNCIA | ||
Decisão: | RESOLVIDO | ||
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Sumário: | A execução fundada em sentença de verificação e graduação de créditos proferida no processo de insolvência é da competência do juízo onde tal decisão foi proferida, em conformidade com o disposto no artigo 85.º, n.º 1, do CPC. | ||
Decisão Texto Parcial: | ![]() | ||
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Decisão Texto Integral: | ** I. 1. Em 27-10-2021, Fca Capital Portugal – Instituição Financeira de Crédito, S.A. instaurou contra “A” e “B”, acção executiva para pagamento de quantia certa, com base em decisão judicial, dirigida ao processo n.º (…)/13.4TBOER, que correu termos no Juízo de Comércio de Sintra – Juiz “X”. Alegou, para tanto e em síntese, no requerimento executivo, que: “1.º Como melhor consta dos autos na Reclamação de Créditos apresentada, foi celebrado entre a Exequente e o Executado marido, o contrato n.º (…)66 de financiamento para aquisição a crédito, por parte deste último, de um veículo automóvel. 2.º Este contrato não foi pontualmente cumprido pelos Executados, tendo por isso a Exequente reclamado os seus créditos no âmbito da acção de Insolvência, no valor então em dívida de 5.321,46€. 3.º O crédito da Exequente foi reconhecido pelo Exm.º Senhor Administrador de Insolvência (DOC. 1) e como melhor consta da acção de insolvência, 4.º Foi reconhecido e graduado por sentença que se junta como (DOC. 2). 5.º No âmbito da acção de insolvência, enquanto acção de execução universal, não foram apreendidos bens ou valores, tendo o processo sido encerrado por insuficiência da massa (DOC. 3), 6.º No referido processo de insolvência foi ainda proferida decisão de admissão inicial do pedido de exoneração do passivo restante, sendo que, no entanto, 7.º Os deveres a que os aí Devedores estavam vinculados no período de cessão não foram cumpridos, pelo que, foi determinada a cessação antecipada do procedimento de exoneração, após conclusão de 14/01/2020 (DOC. 4). 8.º Com as decisões nos autos de Insolvência, de cessação antecipada do procedimento de Exoneração do Passivo Restante e de encerramento do processo, foram produzidos os efeitos aludidos no Art.º 233.º/1, alíneas c) do CIRE, cessando assim todos os efeitos da declaração de insolvência, e podendo os credores exercer os seus direitos contra os Devedores. 9.º Os Executados são assim devedores para com a Exequente da quantia global de 8.273,92€, sendo o capital em dívida de 5.321,46€ e de 2.952,46€ a título de juros calculados à taxa legal comercial supletiva sucessivamente em vigor, desde a data de vencimento de cada prestação e sobre o capital vincendo desde a data da resolução do contrato, até à presente data. 10.º Tanto o contrato (DOC. 5), atenta a data da sua celebração, como a sentença de verificação e de graduação de créditos, consubstanciam título executivo, podendo a Exequente prevalecer-se indistintamente de qualquer um deles. 11.º A dívida é comum, as partes são legítimas e o Tribunal o competente”. 2. Em 02-03-2023, o Juízo de Comércio de Sintra – Juiz “X” proferiu decisão, julgando verificada a exceção dilatória de incompetência e declarou tal Juízo incompetente em razão da matéria para conhecer da ação executiva, determinando a remessa desta ao Juízo de Execução de Sintra nos termos do art.º 85.º, n.º 2, do CPC, constando da referida decisão, nomeadamente, escrito o seguinte: “Fca Capital Portugal - Instituição Financeira de Crédito, S.A. veio instaurar contra “A” e “B”, por apenso ao processo de insolvência, acção executiva pretendendo em suma executar a sentença de reclamação de créditos proferida nos presentes autos. Alega, em síntese que o seu crédito foi reconhecido pelo Exm.º Senhor Administrador de Insolvência, verificado e graduado na sentença de graduação de créditos. Uma vez que a acção de insolvência foi encerrada por insuficiência da massa e foi também determinada a cessação antecipada do procedimento de exoneração do passivo restante, tal significa que se produziram os efeitos aludidos no art.º 233.º/1, alíneas c) do CIRE, cessando assim todos os efeitos da declaração de insolvência, e podendo os credores exercer os seus direitos contra os Devedores. (…) Tendo-se afigurado não ser este o tribunal materialmente competente para a presente execução, foram as partes notificadas, nos termos do art.º 3.º, n.º 3, do CPC, aplicável ex vi do art.º 17.º do CIRE, para, querendo se pronunciarem quanto à verificação de eventual excepção de incompetência absoluta. No exercício do contraditório, defendeu a exequente a competência deste Juízo do Comércio para conhecer da execução. Cumpre apreciar e decidir: Tendo em conta o objecto da acção, que se extrai da factualidade acima enunciada, vejamos, então, se este Tribunal é materialmente competente para conhecer da presente acção executiva para pagamento de quantia certa. A competência em razão da matéria – que é a que ora releva – é a competência das diversas espécies de tribunais dispostos horizontalmente, isto é, no mesmo plano, sem relação de sobreposição ou subordinação entre eles. Os Tribunais Judiciais têm uma competência material residual, competindo-lhes conhecer de todas as causas que não sejam atribuídas a outra ordem jurisdicional e, dentro dessa ordem, a competência em razão da matéria distribui-se entre tribunais de competência genérica e tribunais de competência especializada segundo o mesmo critério de competência material residual para os primeiros, em tudo o que não seja atribuído, por lei, aos segundos – arts. 37.º, n.º 1, 40.º e 79.º a 81.º da Lei de Organização do Sistema Judiciário (doravante LOSJ), aprovada pela Lei n.º 62/2013, de 26-08. São, além do mais, juízos de competência especializada, os juízos do comércio e os juízos de execução (art.º 81.º, n.º 3, als. i) e j), da LOSJ. Dispõe o artigo 128.º, n.º 1, da LOSJ que “compete aos juízos de comércio preparar e julgar: a) Os processos de insolvência e os processos especiais de revitalização; b) As ações de declaração de inexistência, nulidade e anulação do contrato de sociedade; c) As ações relativas ao exercício de direitos sociais; d) As ações de suspensão e de anulação de deliberações sociais; e) As ações de liquidação judicial de sociedades; f) As ações de dissolução de sociedade anónima europeia; g) As ações de dissolução de sociedades gestoras de participações sociais; h) As ações a que se refere o Código do Registo Comercial; i) As ações de liquidação de instituição de crédito e sociedades financeiras. Acrescenta o n.º 3 do mesmo normativo que a competência a que se refere o n.º 1 abrange os respetivos incidentes e apensos, bem como a execução das decisões (sublinhado nosso). Compete, por sua vez, nos termos do artº 129 daquele diploma, aos juízos de execução exercer, no âmbito dos processos de execução de natureza cível, as competências previstas no Código de Processo Civil, estando, porém, excluídos os processos atribuídos ao tribunal da propriedade intelectual, ao tribunal da concorrência, regulação e supervisão, ao tribunal marítimo, aos juízos de família e menores, aos juízos do trabalho, aos juízos de comércio, bem como as execuções de sentenças proferidas em processos de natureza criminal que, nos termos da lei processual penal, não devam correr perante um juízo cível (art.º 129.º, n.ºs 1 e 2, da LOSJ). Preceitua, para além disso, o art.º 85.º, n.º 1, do CPC que na execução de decisão proferida por tribunais portugueses, o requerimento executivo é apresentado no processo em que aquela foi proferida, correndo a execução nos próprios autos e sendo tramitada de forma autónoma, exceto quando o processo tenha entretanto subido em recurso, casos em que corre no traslado; esclarecendo o n.º 2 do mesmo normativo que Quando, nos termos da lei de organização judiciária, seja competente para a execução secção especializada de execução, deve ser remetida a esta, com caráter de urgência, cópia da sentença, do requerimento que deu início à execução e dos documentos que o acompanham. Acontece que o art.º 233.º, n.º 1, al. c), do CIRE não rege sobre a competência material do Tribunal e o art. 85.º do CPC não pode ser visto isoladamente, mas antes em conjugação com a LOSJ, na qual se prevê, no que ora releva, a competência material dos juízos de competência especializada. Com efeito, o que se estabelece no art.º 233.º, n.º 1, al. c), do CIRE é apenas que, uma vez encerrado o processo de insolvência, os credores poderão exercer os seus direitos contra o devedor sem outras restrições que não as constantes do eventual plano de insolvência e plano de pagamentos e do n.º 1 do artigo 242.º, constituindo para o efeito título executivo a sentença homologatória do plano de pagamentos, bem como a sentença de verificação de créditos ou a decisão proferida em acção de verificação ulterior, em conjugação, se for o caso, com a sentença homologatória do plano de insolvência. No fundo, o legislador apenas pretendeu clarificar, com este normativo, que as enunciadas decisões judiciais constituem título executivo, afastando, assim, qualquer dúvida que se pudesse suscitar quanto à sua força fora do processo de insolvência. Nesta conformidade, é incontornável que a sentença de verificação de créditos proferida no processo de insolvência de que a presente execução constitui apenso tem a natureza de título executivo. A questão que importa apreciar é, contudo, a de saber se para a execução dessa decisão é materialmente competente este Juízo do Comércio. Crê-se que a resposta não pode deixar de ser negativa, pois a competência material dos Juízos do Comércio gira em torno do direito comercial ou do direito societário, estando, portanto, a sua competência relacionada com os aspectos específicos desses ramos do direito. A competência para a execução das decisões que é conferida aos Juízos do Comércio no art.º 128.º, n.º 3, da LOSJ abrange apenas e tão só as decisões que se inscrevem na esfera de competência especializada a que se aludiu. E bem se compreende que assim seja, posto que a especialização que se pretenda que exista para as acções declarativas que tenham por base conflitos de direito comercial ou de direito societário, é a mesma que deve ser “aproveitada” para a execução dessas decisões, i.e., para as decisões que versem, especificamente, sobre os referidos conflitos. Trata-se, de resto, de regra de atribuição de competência que vigora igualmente e pelas mesmas razões para os tribunais de competência territorial alargada – vejam-se os arts. 112.º, n.º 5, e 113.º, n.º 2, da LOSJ, com redacção igual ao art.º 128.º, n.º 3, da mesma Lei, que regem, respectivamente, para a competência do Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão e do Tribunal Marítimo (art.º 113.º, n.º 2, da LOSJ) – e para os juízos de competência especializada, como sucede, designadamente, com os Juízos do Trabalho (art.º 126.º, n.º 1, al. m), da LOSJ). Em todos esses casos, se confere aos ditos Tribunais competência para a execução das suas decisões. Em consequência e atendendo à ratio dessas normas, tem-se por certo que não foi, seguramente, intenção do legislador, ao ter consagrado que compete aos Juízos do Comércio a execução das suas decisões, estender essa competência a decisões que não se inscrevem na referida esfera de competência especializada, como sucede com a sentença de verificação de créditos. Com efeito, tendo o processo de insolvência – enquanto processo de execução universal – como finalidade a satisfação dos credores, designadamente pela liquidação do património do devedor insolvente e pela repartição do produto obtido por aqueles, a sentença de verificação e graduação de créditos destina-se a verificar todos os créditos sobre a insolvência, qualquer que seja a sua natureza e fundamento, com vista a permitir o seu pagamento e por isso é que os credores, que nele quiseram obter pagamento, não estão dispensados de reclamar o seu crédito, mesmo que o tenham reconhecido por decisão definitiva (arts. 1.º e 128.º, n.º 5, do CIRE). Na referida sentença, podem, portanto, ser verificados créditos de natureza muito diversa e, muitas vezes, em grande número. Ora, como é evidente não faria qualquer sentido que o Juízo do Comércio fosse competente para executar a decisão (sentença de verificação de créditos) na qual tivesse sido reconhecido um crédito tributário ou até um crédito laboral e muito menos se compreenderia que num caso em que tivessem sido reconhecidos centenas de créditos na dita decisão, fossem os Juízos do Comércio os competentes para a execução de todos eles, pois que ficaria esvaziado de sentido o objectivo tido em vista com a criação dos Juízos de Execução, que, como é sabido, foi o de que estes, por razões de eficiência, celeridade e racionalização de meios, passassem a abranger a anterior competência executiva dos diversos tribunais de competência genérica, especializada ou específica espalhados pelo país. Destarte, restringindo-se a competência dos Juízos do Comércio à execução das decisões para as quais os mesmos são competentes por força da sua especialização, dúvidas não restam que este Juízo do Comércio carece de competência material para a presente acção executiva que, tendo por base decisão judicial que não se insere nessa esfera de especialização, pertence, ao invés, ao Juízo de Execução de Sintra. A infracção das regras de competência em razão da matéria determina a incompetência absoluta do tribunal, a qual constitui excepção dilatória insuprível, que é de conhecimento oficioso e que dá lugar à absolvição da instância – arts. 96.º, al. a), 97.º, n.º 1, 98.º, 99.º, n.º 1, 577.º, al. a), 578.º, 726.º, n.º 2, al. b), e 734.º, todos do CPC (…)”. 3. Em 25-10-2024, o Juízo de Execução de Sintra – Juiz “Y”, a quem os autos foram distribuídos, proferiu decisão, julgando-se incompetente, em razão da matéria, para conhecer do litígio e determinando a devolução do processo de execução e respetivos apensos – ao Juízo do Comércio de Sintra - Juiz “X”, constando escrito da respetiva decisão – ora transitada em julgado - nomeadamente, o seguinte: “(…) No caso, está em questão um processo executivo onde a exequente veio dar à execução sentença de verificação e graduação de créditos, transitada em julgado, que reconheceu o seu crédito, sem que tenha sido ressarcida da totalidade do mesmo, tendo sido, entretanto, indeferida a exoneração do passivo restante do executado, por violação das obrigações previstas no artigo 239.º, n.º 4, als. c) e d), do CIRE. Estabelece o art. 244.º do CIRE, sob a epígrafe, “Decisão final da exoneração”, que: 1 - Não tendo havido lugar a cessação antecipada, ouvido o devedor, o fiduciário e os credores da insolvência, o juiz decide, nos 10 dias subsequentes ao termo do período da cessão, sobre a respetiva prorrogação, nos termos previstos no artigo 242.º-A, ou sobre a concessão ou não da exoneração do passivo restante do devedor. 2 - A exoneração é recusada pelos mesmos fundamentos e com subordinação aos mesmos requisitos por que o poderia ter sido antecipadamente, nos termos do artigo anterior. 3 - Findo o prazo da prorrogação do período de cessão, se aplicável, o juiz decide sobre a concessão ou não da exoneração do passivo restante nos termos dos números anteriores. Resulta deste preceito, em conjugação a contrario sensu com o vertido no art.º 245.º do CIRE que, no caso de não ser proferida decisão positiva de exoneração do passivo restante, os créditos respetivos sobre a insolvência não serão considerados extintos, podendo os credores da insolvência exercer os seus direitos contra o devedor sem outras restrições que não as constantes do eventual plano de insolvência e plano de pagamentos e do n.º 1 do art.º 242.º, “constituindo para o efeito título executivo a sentença homologatória do plano de pagamentos, bem como a sentença de verificação de créditos ou a decisão proferida em acção de verificação ulterior, em conjugação, se for o caso, com a sentença homologatória do plano de insolvência” (cfr. art.º 233.º, n.º 1, al. c), do CIRE). Escreveu-se no acórdão do TRP, de 06.09.2021, Proc. n.º 265/18.1T8AMT-B.P1, relatado por Mendes Coelho, quanto a esta matéria o seguinte: “I - Ainda que a verificação e graduação de créditos tenha sido só efectuada em vista de eventual distribuição de remanescente de rendimento cedido, no seguimento do disposto no art.º 241º nº1 d) do CIRE - pois aí se diz que tal distribuição de remanescente deve ser efetuada “nos termos previstos para o pagamento dos credores no processo de insolvência”, que remete para o regime estatuído nos arts. 173º e sgs. e, como naquele art.º 173º se prevê, com base em sentença de verificação de créditos - , tal não retira a qualidade de título executivo à sentença em causa conferida pelo art.º 233º nº1 c) do CIRE. II -Não existe qualquer disposição legal a conferir eficácia restrita da sentença de verificação e graduação de créditos ao processo de insolvência e, ao invés, da qualificação de tal decisão judicial como título executivo no art.º 233 º nº1 c) do CIRE resulta precisamente o oposto, pois tal qualificação está ali prevista exactamente para poder ser utilizada pelo credor depois do encerramento daquele processo e em vista do exercício, por si, do seu direito contra o devedor. III -Com a atribuição da natureza de título executivo àquela decisão, mais não se faz do que facultar aos credores um meio processual para realizarem coercivamente os seus créditos insatisfeitos pelas forças de património que não foi apreendido no processo de insolvência, evitando duplicações desnecessárias de procedimentos declarativos para verificação dos seus créditos. É, pois, o juízo de comércio onde a decisão foi proferida que tem competência para a respetiva execução. (…) E também a jurisprudência assim tem entendido de forma que julgamos ser unânime (cfr. o acórdão do TRP, de 21.03.2022, no Proc. 3630/21.3T8VLG.P1 (relatado por Carlos Gil), publicado no DR, as decisões do TRE de 30.11.2023, Proc. 300/21.6T8STR.E1 (relatada por José Lúcio), e de 25.03.2024, Proc. 203/24.2T8ENT.E1 (relatada por Albertina Pedroso), todas disponíveis in www.dgsi.pt, e a decisão sumária (relatada por Carlos Castelo Branco) proferida no Proc. 10261/24.4T8SNT-B.L1, em conflito de competência suscitado entre este Juízo de Execução e o Juízo de Comércio de Sintra). A infração das regras de competência em razão da matéria é de conhecimento oficioso e determina a incompetência absoluta do Tribunal, acarretando, no caso, a devolução do processo ao Juízo do Comércio de Sintra (Juiz 6) para apensação ao Proc. n.º 6604/13.4TBOER onde a decisão que se pretende executar foi proferida e aonde o requerimento de execução foi corretamente dirigido (arts. 96.º, 97.º, 99.º, n.º 1, 278.º, n.º 1, al. a), 576.º, n.º 2, 577.º, al. a), e 726.º, n.º 2, al. b), todos do Código do Processo Civil). Acresce que, no caso, ainda que este Juízo de Execução fosse competente em razão da matéria, nunca o seria em razão do território, porquanto, tendo a sentença dada à execução sido proferida pelo extinto 1.º Juízo de Competência Cível do Tribunal Judicial de Oeiras, e tendo as partes, exequente e executados, todas elas o seu domicílio na área territorial do Juízo de Execução de Oeiras, seria este o competente para a tramitação da execução (…)”. 4. Na referida decisão de 25-10-2024, o Juízo de Execução de Sintra – Juiz “Y” suscitou a resolução do conflito de competência. 5. O processo foi continuado com vista ao Ministério Público, nos termos do artigo 112.º, n.º 2, do CPC, que – em 02-12-2024 - se pronunciou, concluindo o seguinte: “(…) Dispõe o n.º 2, do artigo 109.º do CPC que “Há conflito positivo ou negativo de competência quando dois ou mais tribunais da mesma ordem jurisdicional se consideram competentes ou incompetentes para conhecer da mesma questão”. Nos termos da supracitada disposição verifica-se um conflito negativo de competência quando dois tribunais, chamados a decidir um determinado pleito, se declaram ambos incompetentes para o efeito, no mesmo processo. Sendo pressuposto necessário que ambas as decisões se mostrem transitadas em julgado, ou seja, não há conflito enquanto forem suscetíveis de recurso as decisões proferidas sobre a competência (cfr. artigo 109.º, n.º 3, do CPC). Os autos foram remetidos a este tribunal para distribuição 26.11.2024, tendo sido instruídos após despacho de 25.10.2024 do Juiz “Y” do Juízo de Execução de Sintra, do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Oeste, decisão essa que foi notificada às partes a 29.10.2024. Porém, muito embora, assista razão ao Juiz “Y” do Juízo de Execução de Sintra, do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Oeste, pelas razões expostas no seu despacho de 25.10.2024, no que respeita a ser incompetente em razão da matéria, certo é que foi ordenado naquele a extração de certidão e remessa a este tribunal, para efeitos de resolução do conflito negativo de competência, sem que tal despacho tenha transitado em julgado. Pelo exposto, não se pode considerar, que na data em que foram remetidos os autos, a decisão de 25.10.2024 já se mostrava transitada, nos termos do art.º 628:º do CPC, pelo que não estamos perante duas decisões definitivas e consequentemente perante um conflito negativo de competência. Nestes termos, entendemos que deverá ser indeferido o pedido de resolução de conflito suscitado pelo Juiz “Y” do Juízo de Execução de Sintra, do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Oeste. (…)". ** II. Cumpre apreciar e decidir: Nos termos do n.º 2 do artigo 109.º do CPC, há conflito, positivo ou negativo, de competência quando dois ou mais tribunais da mesma ordem jurisdicional se consideram competentes ou incompetentes para conhecer da mesma questão. Não há conflito enquanto forem suscetíveis de recurso as decisões proferidas sobre a competência (cfr. artigo 109.º, n.º 3, do CPC). Quando o tribunal se aperceba do conflito, deve suscitar oficiosamente a sua resolução junto do presidente do tribunal competente para decidir (cfr. artigo 111.º, n.º 1, do CPC). Entendem ambos os tribunais não serem competentes para dirimir o processo. ** III. A aferição do pressuposto processual da competência é determinada à luz da estrutura do objeto do processo, envolvida pela causa de pedir e pelo pedido formulado na petição inicial, no momento em que a mesma é intentada (vd., entre muitos outros, os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 20-02-2019, Pº 9086/18.0T8LSB-A.L1.S1, rel. RIBEIRO CARDOSO, de 07-03-2019, Pº 13688/16.1TBPRT.P1.S1, rel. FERNANDO SAMÕES e do TRL de 01-07-1993, in C.J., t. 3, p. 144, de 26-05-1999, Pº 0023414, rel. PEREIRA RODRIGUES e de 10-04-2024, Pº 31189/22.7T8LSB-A.L1-4, rel. SÉRGIO ALMEIDA e Ac. do Tribunal da Relação do Porto de 18-11-2021, Pº 1475/09.8TBPRD-N.P1, rel. ANA VIEIRA). Conforme salienta Mariana França Monteiro (A Causa de Pedir na Acção Declarativa, Almedina, 2004, pp. 507-508): “Para efeitos de competência, a causa de pedir deve ser identificada com os factos jurídicos alegados pelo autor que, analisados na lógica jurídica da petição inicial, permitam a aplicação de uma norma de competência. Isto significa que a estrutura de causalidade entre causa de pedir e pedido que o autor estabelece na petição inicial, ou no conjunto dos seus articulados, é suficiente, é o contexto, o enquadramento da relação jurídica alegada e, em consequência, da aplicação das normas de competência”. A competência material do tribunal traduz a medida da jurisdição interna atribuída a cada tribunal atendendo à matéria da causa que lhe é submetida. Conforme salientam Antunes Varela, Miguel Bezerra e Sampaio e Nora (Manual de Processo Civil, 2.ª ed., Coimbra Editora, 1985, p. 207), “[n]a base da competência em razão da matéria está o princípio da especialização, com o reconhecimento da vantagem de reservar para órgãos judiciários diferenciados o conhecimento de certos sectores do Direito, pela vastidão e pela especificidade das normas que os integram”. A competência em razão da matéria afere-se em função da relação material controvertida configurada pelo autor, “tendo presente que o sistema judicial não é unitário, mas constituído por várias categorias de tribunais, separados entre si, com estrutura e regime próprios” (assim, o Acórdão do STJ de 09-11-2017, Pº 8214/13.7TBVNG-A.P1.S1, rel. ANTÓNIO PIÇARRA). Atendendo ao âmbito da questão em apreço, cumpre aferir o que a Lei de Organização do Sistema Judiciário (abreviadamente LOSJ, aprovada pela Lei n.º 62/2013, de 26 de agosto) estipula, quanto à competência. Em particular, importa convocar os seguintes preceitos da LOSJ: - Artigo 29.º, n.º 3: “Os tribunais judiciais de primeira instância são, em regra, os tribunais de comarca”; - Artigo 33.º (Tribunais judiciais de primeira instância): “1 - Os tribunais judiciais de primeira instância incluem os tribunais de competência territorial alargada e os tribunais de comarca. 2 - O território nacional divide-se em 23 comarcas, nos termos do anexo ii à presente lei, da qual faz parte integrante. 3 - Em cada uma das circunscrições referidas no número anterior existe um tribunal judicial de primeira instância. 4 - A sede, a designação e a área de competência territorial são definidas no decreto-lei que estabelece o regime aplicável à organização e funcionamento dos tribunais judiciais.”; - Artigo 79.º (Tribunais de comarca): “Os tribunais judiciais de primeira instância são, em regra, os tribunais de comarca”; - Artigo 80.º (Competência): “1 - Compete aos tribunais de comarca preparar e julgar os processos relativos a causas não abrangidas pela competência de outros tribunais. 2 - Os tribunais de comarca são de competência genérica e de competência especializada”; - Artigo 81.º (Desdobramento): “1 - Os tribunais de comarca desdobram-se em juízos, a criar por decreto-lei, que podem ser de competência especializada, de competência genérica e de proximidade, nos termos do presente artigo e do artigo 130.º 2 - Os juízos designam-se pela competência e pelo nome do município em que estão instalados. 3 - Podem ser criados os seguintes juízos de competência especializada: a) Central cível; b) Local cível; c) Central criminal; d) Local criminal; e) Local de pequena criminalidade; f) Instrução criminal; g) Família e menores; h) Trabalho; i) Comércio; j) Execução. (…)”; - Artigo 117.º (Competência): “1 - Compete aos juízos centrais cíveis: (…) b) Exercer, no âmbito das ações executivas de natureza cível de valor superior a (euro) 50.000,00, as competências previstas no Código do Processo Civil, em circunscrições não abrangidas pela competência de juízo ou tribunal;(…) 2 - Nas comarcas onde não haja juízo de comércio, o disposto no número anterior é extensivo às ações que caibam a esses juízos (…).”; - Artigo 128.º (Competência): “1 - Compete aos juízos de comércio preparar e julgar: a) Os processos de insolvência e os processos especiais de revitalização; b) As ações de declaração de inexistência, nulidade e anulação do contrato de sociedade; c) As ações relativas ao exercício de direitos sociais; d) As ações de suspensão e de anulação de deliberações sociais; e) As ações de liquidação judicial de sociedades; f) As ações de dissolução de sociedade anónima europeia; g) As ações de dissolução de sociedades gestoras de participações sociais; h) As ações a que se refere o Código do Registo Comercial; i) As ações de liquidação de instituição de crédito e sociedades financeiras. 2 - Compete ainda aos juízos de comércio julgar as impugnações dos despachos dos conservadores do registo comercial, bem como as impugnações das decisões proferidas pelos conservadores no âmbito dos procedimentos administrativos de dissolução e de liquidação de sociedades comerciais. 3 - A competência a que se refere o n.º 1 abrange os respetivos incidentes e apensos, bem como a execução das decisões”; - Artigo 129.º (Competência): “1 - Compete aos juízos de execução exercer, no âmbito dos processos de execução de natureza cível, as competências previstas no Código de Processo Civil. 2 - Estão excluídos do número anterior os processos atribuídos ao tribunal da propriedade intelectual, ao tribunal da concorrência, regulação e supervisão, ao tribunal marítimo, aos juízos de família e menores, aos juízos do trabalho, aos juízos de comércio, bem como as execuções de sentenças proferidas em processos de natureza criminal que, nos termos da lei processual penal, não devam correr perante um juízo cível. 3 - Para a execução das decisões proferidas pelo juízo central cível é competente o juízo de execução que seria competente se a causa não fosse da competência daquele juízo em razão do valor”; - Artigo 130.º (Competência): “1 - Os juízos locais cíveis, locais criminais e de competência genérica possuem competência na respetiva área territorial, tal como definida em decreto-lei, quando as causas não sejam atribuídas a outros juízos ou tribunal de competência territorial alargada. 2 - Os juízos locais cíveis, locais criminais e de competência genérica possuem ainda competência para: (…) c) Exercer, no âmbito do processo de execução, as competências previstas no Código de Processo Civil, onde não houver juízo de execução ou outro juízo ou tribunal de competência especializada competente; (…) f) Exercer as demais competências conferidas por lei (…)”. Por outro lado, estando em questão um processo executivo, importa ainda convocar o que, relativamente à competências para a execução fundada em sentença, resulta do disposto no artigo 85.º do CPC: “1 - Na execução de decisão proferida por tribunais portugueses, o requerimento executivo é apresentado no processo em que aquela foi proferida, correndo a execução nos próprios autos e sendo tramitada de forma autónoma, exceto quando o processo tenha entretanto subido em recurso, casos em que corre no traslado. 2 - Quando, nos termos da lei de organização judiciária, seja competente para a execução secção especializada de execução, deve ser remetida a esta, com caráter de urgência, cópia da sentença, do requerimento que deu início à execução e dos documentos que o acompanham (…)”. Por seu turno, relativamente à comarca dos Lisboa-Oeste, estabelece o artigo 68.º do Regulamento da Lei de Organização do Sistema Judiciário (abreviadamente, ROFTJ, aprovado pelo D.L. n.º 49/2014, de 27 de março) o seguinte: “Artigo 88.º Desdobramento 1 - O Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Oeste integra as seguintes secções de instância central: a) 1.ª Secção cível, com sede em Sintra; b) 1.ª Secção criminal, com sede em Sintra; c) 2.ª Secção cível, com sede em Cascais; d) 2.ª Secção criminal, com sede em Cascais; e) 1.ª Secção de instrução criminal, com sede em Sintra; f) 2.ª Secção de instrução criminal, com sede em Cascais; g) 1.ª Secção de família e menores, com sede em Sintra; h) 2.ª Secção de família e menores, com sede em Amadora; i) 3.ª Secção de família e menores, com sede em Cascais; j) 1.ª Secção do trabalho, com sede em Sintra; k) 2.ª Secção do trabalho, com sede em Cascais; l) Secção de comércio, com sede em Sintra; m) 1.ª Secção de execução, com sede em Sintra; n) 2.ª Secção de execução, com sede em Oeiras. 2 - O Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Oeste integra ainda as seguintes secções de instância local: a) Secção de competência genérica, desdobrada em matéria cível e criminal, com sede em Amadora; b) Secção de competência genérica, desdobrada em matéria cível e criminal, com sede em Cascais; c) Secção de competência genérica, desdobrada em matéria cível e criminal, com sede em Mafra; d) Secção de competência genérica, desdobrada em matéria cível e criminal, com sede em Oeiras; e) Secção de competência genérica, desdobrada em matéria cível, em matéria criminal e em matéria de pequena criminalidade, com sede em Sintra”. ** IV. Conforme decorre do disposto na al. a) do n.º 1 do artigo 128.º da LOSJ, a competência referente aos processos destinados à apreciação e eventual declaração da situação de insolvência do devedor e aqueles que tenham por objeto a revitalização, enquanto processos especiais, são da competência dos juízos do comércio (nas circunscrições onde estes estejam instalados). Quando a comarca não disponha de juízos de comércio, questiona-se qual será o tribunal competente para a tramitação de tais processos especiais. A questão em análise foi já objeto de várias decisões nos tribunais e de discussões doutrinárias, podendo referir-se a existência de três teses relativamente a esta matéria (conforme se dá nota no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 06-12-2018, Pº 282/18.1T8RGR-A.L1-2, rel. JORGE LEAL): 1ª) Todas as ações elencadas no artigo 128.º da LOSJ, independentemente da sua forma (comum ou especial) e do seu valor, são da competência do juízo central cível (é a posição perfilhada nos Acórdãos da Relação de Lisboa, de 26-03-2015, Pº 702/14.4T8PDL.L1-8, rel. CATARINA ARÊLO MANSO, de 16-06-2015, Pº 457/15.5T8PDL.L1, de 12-04-2016, Pº 507/15.5T8RGR.L1-7, rel. DINA MONTEIRO, de 10-10-2016, Pº 2245/16.2T8PDL.L1-2, rel. EZAGÜY MARTINS e de 12-02-2019, Pº 3396/17.1T8PDL-B.L1-1, rel. RIJO FERREIRA; Salazar Casanova; Notas Breves Sobre a Lei de Organização do Sistema Judiciário, ROA, Ano 73, n.ºs II/III, p. 468 e Bruno Bom Ferreira, “Insolvências – Central ou Local – Eis a Questão…”, in Julgar Online, Outubro de 2015, pp. 10-11). 2ª) As ações de valor superior a 50.000,00 euros, sejam elas de processo comum ou especial, das elencadas no artigo 128.º da LOSJ, são da competência do juízo central cível (é a orientação perfilhada na decisão do Vice-Presidente do Tribunal da Relação de Lisboa de 01-12-2014, Pº 70/14.4T8PDL.L1-1, a expressa nos acórdãos da Relação de Lisboa de 30-06-2015, Pº 431/15.1T8PDL.L1-7, de 28-04-2016, Pº 506/15.7T8RGR.L1-8, rel. MARIA ALEXANDRINA BRANQUINHO e de 02-06-2016, Pº 2210/15.7T8PDL.L1-2; Salvador da Costa e Rita Costa, Lei de Organização do Sistema Judiciário, Almedina, 2014, 2ª ed., p. 182). 3ª) Só as ações declarativas cíveis de processo comum e valor superior a 50.000,00 euros das elencadas no art.º 128º são da competência do juízo central cível, pelo que, as ações especiais de insolvência e de revitalização, ou as de processo comum de valor não superior a 50.000,00 euros, serão da competência do juízo local cível ou de competência genérica (é a posição perfilhada pelos acórdãos da Relação de Lisboa de 19-03-2015, Pº 1016-14.5T8PDL.L1-6, rel. MARIA MANUELA GOMES; de 22-06-2017, Pº 548/17.8T8PDL.L1-2, rel. ONDINA CARMO ALVES; de 23-10-2018, Pº 291/18.0T8AGH.L1-7, rel. ANA RODRIGUES DA SILVA; de 06-12-21018, Pº 282/18.1T8RGR-A.L1-2, rel. JORGE LEAL; acórdãos da Relação de Évora de 15-01-2015, Pº 469/14.6TBTG-A.E1, rel. MÁRIO SERRANO; de 12-03-2015, Pº 206/11.7TBPTG-M.E1, rel. SÍLVIO SOUSA; e de 29-04-2021, Pº 40/21.6T8ODM-A.E1, rel. FRANCISCO MATOS; Decisão do Vice-Presidente do TRE de 30-01-2015, Pº 163/14.8T8BJA.E1, rel. ANTÓNIO RIBEIRO CARDOSO; e os acórdãos do STJ de 04-07-2019, Pº 291/18.0T8AGH.L1.S2, rel. MARIA OLINDA GARCIA; de 17-10-2019, Pº 2687/18.9T8PDL.S1, rel. GRAÇA AMARAL; e de 08-09-2021, Pº 40/21.6T8ODM-A.E1.S1, rel. LUÍS ESPÍRITO SANTO; António Vieira Cura, Curso de Organização Judiciária, Coimbra Editora, 2ª ed. revista e atualizada, pp. 213 e 222; Teixeira de Sousa; Blog do IPPC, de 20-06-2016 - Jurisprudência (377) - Processo de insolvência; competência material). Como escrevemos noutro local – em apreciação do processo n.º 1001/24.9T8PDL.L1 – entendemos acolher, relativamente ao mencionado diferendo esta última orientação. Sucede que, no caso dos autos, está em questão um processo executivo, onde a exequente veio dar à execução sentença de verificação e graduação de créditos, proferida no processo n.º (…)/13.6T2SNT – em 23-04-2016 e transitada em julgado -, e que reconheceu o seu crédito, sem que tenha sido ressarcida da totalidade do mesmo, tendo sido, entretanto (por decisão de 02-05-2023), indeferida a exoneração do passivo restante do executado – por violação das obrigações previstas no artigo 239.º, n.º 4, als. c) e d), do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (abreviadamente, CIRE) - e a sentença de verificação de créditos constitui título executivo nos termos do art.º 233.º, n.º 1, al. c), do CIRE. Estabelece o artigo 244.º do CIRE (Decisão final da exoneração) que: “1 - Não tendo havido lugar a cessação antecipada, ouvido o devedor, o fiduciário e os credores da insolvência, o juiz decide, nos 10 dias subsequentes ao termo do período da cessão, sobre a respetiva prorrogação, nos termos previstos no artigo 242.º-A, ou sobre a concessão ou não da exoneração do passivo restante do devedor. 2 - A exoneração é recusada pelos mesmos fundamentos e com subordinação aos mesmos requisitos por que o poderia ter sido antecipadamente, nos termos do artigo anterior. 3 - Findo o prazo da prorrogação do período de cessão, se aplicável, o juiz decide sobre a concessão ou não da exoneração do passivo restante nos termos dos números anteriores”. Conforme resulta deste preceito, em conjugação – a contrario sensu – com o que consta vertido no artigo 245.º do CIRE, no caso de não ser proferida decisão positiva de exoneração do passivo restante, os créditos respetivos sobre a insolvência não serão considerados extinto, podendo os credores da insolvência exercer os seus direitos contra o devedor sem outras restrições que não as constantes do eventual plano de insolvência e plano de pagamentos e do n.º 1 do artigo 242.º, “constituindo para o efeito título executivo a sentença homologatória do plano de pagamentos, bem como a sentença de verificação de créditos ou a decisão proferida em acção de verificação ulterior, em conjugação, se for o caso, com a sentença homologatória do plano de insolvência” (cfr. artigo 233.º, n.º 1, al. c) do CIRE. E, conforme se escreveu no Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 06-09-2021 (Pº 265/18.1T8AMT-B.P1, rel. MENDES COELHO): “I – Ainda que a verificação e graduação de créditos tenha sido só efectuada em vista de eventual distribuição de remanescente de rendimento cedido, no seguimento do disposto no art.º 241º nº1 d) do CIRE – pois aí se diz que tal distribuição de remanescente deve ser efectuada “nos termos previstos para o pagamento dos credores no processo de insolvência”, que remete para o regime estatuído nos arts. 173º e sgs. e, como naquele art.º 173º se prevê, com base em sentença de verificação de créditos –, tal não retira a qualidade de título executivo à sentença em causa conferida pelo art.º 233º nº1 c) do CIRE. II – Não existe qualquer disposição legal a conferir eficácia restrita da sentença de verificação e graduação de créditos ao processo de insolvência e, ao invés, da qualificação de tal decisão judicial como título executivo no art. 233 º nº1 c) do CIRE resulta precisamente o oposto, pois tal qualificação está ali prevista exactamente para poder ser utilizada pelo credor depois do encerramento daquele processo e em vista do exercício, por si, do seu direito contra o devedor. III – Com a atribuição da natureza de título executivo àquela decisão, mais não se faz do que facultar aos credores um meio processual para realizarem coercivamente os seus créditos insatisfeitos pelas forças de património que não foi apreendido no processo de insolvência, evitando duplicações desnecessárias de procedimentos declarativos para verificação dos seus créditos”. Ora, de acordo com o disposto no n.º 1 do artigo 85.º do CPC, “na execução de decisão proferida por tribunais portugueses, o requerimento executivo é apresentado no processo em que aquela foi proferida, correndo a execução nos próprios autos e sendo tramitada de forma autónoma, exceto quando o processo tenha entretanto subido em recurso, casos em que corre no traslado”. Assim, “face ao disposto no artigo 85º do C.P.C., o requerimento inicial para execução de decisão judicial condenatória deve ser dirigido ao processo no qual foi proferida a sentença exequenda. De seguida, ao tribunal em que a ação declarativa foi julgada cabe dar cumprimento ao disposto no nº 2 do artigo 85º do C.P.C.” (cfr., o citado Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 19-03-2018, Pº 121/14.2TBAMT.P1, rel. AUGUSTO DE CARVALHO), ou seja, quando, nos termos da lei de organização judiciária seja competente para a execução secção especializada de execução, deve ser remetida a esta, com caráter de urgência, cópia da sentença, do requerimento que deu início à execução e dos documentos que o acompanham. De facto, estabelece o n.º 2 do artigo 85.º do CPC que: “2 - Quando, nos termos da lei de organização judiciária, seja competente para a execução secção especializada de execução, deve ser remetida a esta, com caráter de urgência, cópia da sentença, do requerimento que deu início à execução e dos documentos que o acompanham” Ora, para a consideração do regime estabelecido no n.º 2 do artigo 85.º do CPC, importa que, o juízo de execução seja competente para a respetiva execução, caso em que se segue a tramitação aí prevista. Conforme decorre do artigo 129.º da LOSJ, a competência dos juízos de execução restringe-se ao exercício “no âmbito dos processos de execução de natureza cível, as competências previstas no Código de Processo Civil” – n.º 1 -, considerando-se que “[e]stão excluídos do número anterior os processos atribuídos (…) aos juízos de comércio (…)” (cfr. n.º 2). Considerando que se visa executar decisão proferida pelo Juízo de Comércio – que constitui titulo executivo – e na qual se funda o crédito exequendo, não se encontram verificados os pressupostos de consideração da competência do juízo de execução – porque afastados por via do n.º 2 do artigo 129.º da LOSJ – e, consequentemente, mostra-se igualmente arredada a aplicação do n.º 2 do artigo 85.º do CPC. Assim, considerando a aplicação do n.º 1 do artigo 85.º do CPC e a circunstância de estar em causa a execução de sentença de verificação e graduação de créditos, referente a ação que correu termos no então 1.º Juízo de Competência Cível do Tribunal Judicial de Oeiras, a que sucedeu o Juízo de Comércio de Sintra – Juiz “X”, a execução da sentença deverá correr nos próprios autos da ação preexistente, nos termos dos artigos 85.º, n.º 1 e 626º do Código de Processo Civil. Ou seja: A execução fundada na sentença de verificação e graduação de créditos, nos termos do disposto no artigo 233.º, n.º 1, al. c) do CIRE correrá no próprio processo onde foi proferida – artigo 85º, nº 1, do CPC. O objetivo estabelecido pelo legislador, efetivamente, foi o de que a sentença seja executada no próprio processo, por forma a vincar a continuidade entre a ação declarativa e a execução e a importância do caso julgado. No caso em apreço, pretende-se executar uma sentença referente ao Juízo de Comércio de Sintra – Juiz “X”. Atento o que já ficou escrito, o requerimento executivo deveria, então, ter sido apresentado em tal processo. Assim, conforme se concluiu no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 22-06-2023 (Processo: 2232/14.5T8LSB.L1-2, Relator: ARLINDO CRUA): “Estando-se perante decisão executável, proferida pelos tribunais portugueses, o princípio geral decorrente do nº. 1, do art.º 85º, do Cód. de Processo Civil, impõe que o requerimento executivo inicial seja apresentado no processo (declarativo) em que aquela foi prolatada, correndo a execução nos próprios autos declarativos, ainda que tramitada de forma autónoma”. Em conformidade com este entendimento e relativamente a execução de sentença apresentada com base em certidão de sentença junto do juízo de execução, subscreve-se o entendimento formulado no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 07-06-2018 (Pº 13487/17.3T8LSB.L1-8, rel. OCTÁVIA VIEGAS), de que, “[b]aseando-se a execução em sentença de homologação de pagamento proferida em processo judicial é nesse processo que deve ser apresentado o requerimento executivo (art.º 85, nº1, do CPC. Sendo apresentado requerimento executivo nos juízos de execução acompanhado de certidão da decisão, há lugar à sua rejeição”. No mesmo sentido, tem alinhado a seguinte jurisprudência (elencada por ordem cronológica decrescente) dos nossos tribunais superiores: - Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 04-06-2024 (Pº 277/23.3T8ACB.C1, rel. MARIA CATARINA GONÇALVES): “I – Desde que a decisão exequenda tenha sido proferida por um juízo de comércio – ressalvado o regime especial das execuções por custas –, a competência para a executar cabe ao tribunal que a proferiu, independentemente do estado em que se encontre o processo em que a mesma foi proferida. II – São os juízos do comércio os materialmente competentes para a execução das suas próprias decisões, e não os juízos de execução, mesmo que o processo de insolvência esteja já encerrado, sendo o título executivo a sentença de verificação de créditos”; - Decisão da Presidente do Tribunal da Relação de Évora de 25-03-2024 (Pº 203/24.2T8ENT.E1, rel. ALBERTINA PEDROSO): “(…) II - Da conjugação do disposto nos artigos 128.º, n.º 1, alínea a), e n.º 3, e 129.º, n.ºs 1 e 2, da LOSJ, decorre que são os Juízos do Comércio os materialmente competentes para a execução das suas próprias decisões, e não os Juízos de Execução. III – O facto de o processo de insolvência estar encerrado não afasta a manutenção da competência dos Juízos de Comércio, quando o título executivo seja a sentença de verificação de créditos, atento o disposto no artigo 233.º, n.º 1, alínea c) e n.º 4, do CIRE. IV – Com efeito, se o processo de verificação de créditos se mantém dependente do processo de insolvência, também a sua execução será por apenso a este, já que o artigo 129.º, n.º 2 exclui da competência dos juízos de execução os processos atribuídos aos juízos de comércio, prevalecendo a competência por conexão que o artigo 128.º, n.º 3, da LOSJ consagra”; - Decisão do Vice-Presidente do Tribunal da Relação de Évora de 30-11-2023 (Pº 300/21.6T8STR.E1, rel. JOSÉ LÚCIO): “O Juízo do Comércio é competente para a execução das suas decisões”; - Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 21-03-2022 (Pº 3630/21.3T8VLG.P1, rel. CARLOS GIL): “Desde que a decisão exequenda tenha sido proferida por um juízo de comércio e ressalvado o regime especial das execuções por custas decorrente das alterações introduzidas pela Lei nº 27/2019, de 28 de março, por força da conjugação do nº 3 do artigo 128º e do nº 2 do artigo 129º, ambos da Lei de Organização do Sistema Judiciário, a competência para executar essa decisão cabe ao tribunal que a proferiu, independentemente do estado em que se ache o processo em que a mesma foi proferida”; e - Acórdão do Tribunal da Relação de Évora (Pº 755/14.5T8STB.1.E1, rel. MATA RIBEIRO): “Em face do disposto no artº 128º da LOSJ são Juízos de Comércio, e não os Juízos de Execução, os materialmente competentes para executarem as decisões proferidas no âmbito das ações que neles correram termos”. Assim, a execução fundada em sentença de verificação e graduação de créditos proferida no processo de insolvência é da competência do juízo onde tal decisão foi proferida, em conformidade com o disposto no artigo 85.º, n.º 1, do CPC, pelo que, no caso, tendo a respetiva sentença sido prolatada e respeitante a processo do Juízo de Comércio de Sintra – Juiz “X”, aí correrá termos a respetiva execução, em conformidade com o que resulta da conjugação do disposto no referido preceito, com o disposto nos artigos 80.º, 81.º, 128.º, n.º 1, al. a) e n.º 3 e 129.º (a contrario sensu) da LOSJ, ponderando ainda o disposto no artigo 88.º do ROFTJ. ** V. Pelo exposto, em conformidade com o disposto no artigo 113.º, n.º 2, do CPC, decido este conflito, declarando competente para a tramitação da presente ação executiva, o Juízo de Comércio de Sintra – Juiz “X”. Sem custas. Notifique (cfr. artigo 113.º, n.º 3, do CPC). Baixem os autos. Lisboa, 04-12-2024, Carlos Castelo Branco. (Vice-Presidente, com poderes delegados – cfr. Despacho n.º 2577/2024, publicado no DR., 2.ª série, n.º 51, de 12-03-2024). |