Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | CARLOS CASTELO BRANCO | ||
Descritores: | INCUMPRIMENTO DE ALIMENTOS EXECUÇÃO POR ALIMENTOS REQUERIMENTO EXECUTIVO | ||
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Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 04/15/2021 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Texto Parcial: | N | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | REVOGADA A DECISÃO | ||
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Sumário: | I) Em caso de incumprimento da obrigação alimentar, o credor tem ao seu dispor três meios que se articulam entre si numa relação alternativa, segundo escolha do credor, de acordo com os respetivos pressupostos de cada um: o incidente de incumprimento das responsabilidades parentais, previsto no artigo 41.º do RGPTC; o mecanismo do artigo 48.º do RGPTC; e a execução especial por alimentos, regulada nos artigos 933.º a 937.º do Código de Processo Civil. II) De harmonia com o regime previsto no n.º 4 do artigo 724.º do CPC, na apresentação do requerimento executivo basta a junção de cópia do título executivo, se o requerimento executivo for entregue por via eletrónica, só sendo necessária a apresentação do original do título, no caso de tal requerimento ser apresentado em papel. III) A sentença judicial, transitada em julgado, que reconheceu a obrigação do progenitor satisfazer a prestação de alimentos relativamente aos seus filhos, reveste condições de exequibilidade, podendo sustentar, em conjunto com o requerimento executivo onde sejam invocados os factos constitutivos da obrigação exequenda, uma execução especial de alimentos nos termos do processo regulado nos artigos 933.º e ss. do CPC. IV) Para a instauração da execução especial de alimentos a que se reporta este normativo não é necessário o prévio recurso ao incidente de incumprimento do artigo 41.º do RGPTC, nem, igualmente, ao mecanismo do artigo 48.º do mesmo diploma, muito embora, claro está, não possa o credor de alimentos receber duplamente a prestação de que é credor numa das vias processuais, se já a recebeu noutra. V) A insuficiência de título executivo prevista na al. a) do nº 2 do artigo 726º do CPC para determinar o indeferimento liminar do requerimento executivo, tem de ser manifesta. VI) Fora dos casos previstos no n.º 2, do artigo 726.º do CPC, o juiz convida o exequente a suprir as irregularidades do requerimento executivo, bem como a sanar a falta de pressupostos, aplicando-se, com as necessárias adaptações, o disposto no n.º 2 do artigo 6.º do CPC (cfr. n.º 4 do mesmo artigo). VII) Não sendo a falta ou insuficiência de título executivo manifesta em face do requerimento executivo e dos documentos que o acompanharam, deve ser apurado se os valores peticionados foram ou não objeto de pagamento, se quanto aos mesmos é procedente exceção de litispendência ou caso julgado e, bem assim, se não foram cumpridas as condições de prévia interpelação para determinados valores reclamados, de harmonia com o invocado pelo embargante nos embargos deduzidos, mostrando-se necessário o prosseguimento dos autos, com a produção da prova que se mostre necessária e pertinente, de harmonia com a tramitação a que se reporta o n.º 2 do artigo 732.º do CPC, inexistindo fundamento para a extinção da instância executiva, por inutilidade superveniente da lide. | ||
Decisão Texto Parcial: | ![]() | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam na 2.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa: * 1. Relatório: Por apenso à execução especial para cobrança de alimentos instaurada por (…), o executado (…) deduziu embargos, concluindo pela procedência das exceções que invocou e sua absolvição, bem como, pedindo a condenação da exequente no pagamento da indemnização de € 30.000,00. Alegou, para tanto: - Que não demonstra a exequente qualquer documento de interpelação que prove o que alega. - Que a mera remissão para o título executivo sem os necessários documentos de suporte, não consubstanciam título executivo, pelo que deve a exequente ser convidada a aperfeiçoar o requerimento executivo; - Que peticiona a exequente quantias que bem sabe não lhe serem devidas por já lhe terem sido pagas e por serem objeto de petições de incumprimentos promovidos pela própria exequente noutros processos, que já foram objeto de decisão anterior, e inclusivamente pagos; - Que peticiona a exequente valores, que como bem sabe não lhe serem devidos por tais valores fazerem parte de incidentes de incumprimento a que a própria exequente deu causa e ainda não decididos; - Que ao requerer a execução da quantia de 237,62€, referente a pensão de alimentos de julho de 2016 parcialmente não paga não deveria a exequente ignorar que no mesmo processo, tal matéria foi objeto de incidente de incumprimento e sobre a mesma recaiu decisão/sentença proferida em 29/5/2017 (processo 74/15.0TBSXL B), condenado o executado a esse pagamento no prazo de 30 dias o que veio a acontecer conforme documento comprovativo da transferência junto aos autos como doc 1; - Que, nos termos do artigo 729.º, al. f) do CPC, um dos fundamentos da oposição á execução baseada em sentença é a exceção de caso julgado que invoca; - Que a exequente pretende receber 1400€ relativos a deduções que o executado efetuou de Janeiro a Junho de 2017, matéria controvertida que está a aguardar decisão no processo 74/15.0BSXL-E; - Que pretende a exequente ao arrepio da decisão que vier a ser proferida no apenso referido, cobrar algo que ainda não foi objeto de decisão, verificando-se exceção de litispendência, ao vir solicitar duplamente em sede de execução o que já havia peticionado, razão pela qual, nos termos do artigo 729.º, al. g), do CPC deverá a presente exceção ser julgada procedente, ao consubstanciar facto extintivo do direito invocado; - Que quanto a 2400€ referentes ao não pagamento das pensões de alimentos de Julho, Agosto e Setembro de 2017, o exequente transferiu para conta da executada a quantia de 480€ em 12/7/2018, e a quantia de 800€ em 2/8/2017, conforme comprovativos de transferência que se juntam como documento Nº 3, o que nos termos do artigo 729.º, g), do CPC constitui facto extintivo da obrigação dada a execução; - Que desconhece a razão de ser peticionada 1986.59€ relativas a despesas de educação e saúde e escolares, com exceção de reconhecer o envio de despesas referentes ao ano de 2015 no valor de 348€ , conforme doc. nº 4 e quanto a estas e por se tratar de despesas de saúde, não logrou a exequente, face a interpelação do executado por email de 17/03/2015, justificar a sua pertinência e veracidade, não juntando receita médica, o comprovativo de não assunção do valor comparticipado pelo seguro de saúde que o executado suporta para os seus filhos, e comprovativo do adiantamento alegadamente pago por parte da exequente; - Que enviou a exequente outros mails, nomeadamente em 16-11-2016, em que solicita pagamento de despesas extra curriculares, declinado o executado a assunção do mesmo por tal não lhe ser exigido, nunca concordando com as atividades extra curriculares que a exequente promoveu sem o consultar para o efeito, ao arrepio do estabelecido no acordo de regulação das responsabilidades parentais, processo 74/15.0TBSXLB conforme estipulado no acordo de Regulação de Responsabilidades parentais (docs. 5 a 9). - Que a quantia de 817€ relativa à falta de pensão de alimentos de agosto de 2016, de facto assim foi mas com a concordância da exequente o Progenitor deduziu os valores dos fatos de banho para os filhos que a exequente se esqueceu de enviar, e igualmente pelo facto destes terem também passado 3 das 4 semanas de férias de agosto com o Pai tendo este assumido todos os gastos com as crianças durante os 23 dias que com ele estiveram. Conforme documento que se junta com nº 10; - Que quanto a quantia exequenda de despesas escolares (478€) e de 21,28€ de despesas de saúde do ano de 2017, no valor total de 499,28€ desconhece a existência ou sequer a justificação das mesmas por nunca lhe terem sido enviadas/ comunicadas; - Que a quantia exequenda é incerta – art. 729.º e) do CPC- não logrando a exequente demonstrar, nem fundamentar especificadamente os valores que peticiona e, quanto aos juros, com exceção da taxa aplicável de 4%, desconhece o numero de dias que fundamentaram o calculo, bem como a base dos mesmos, pelo que não devem ser atendidos no valor de 295,36€; e - Que a exequente litiga de má fé e deve ser condenada a indemnizar o executado em valor não inferior a 30.000€. * Proferido despacho a receber os embargos, a declarar suspensa a execução e a determinar a notificação da exequente para contestar, a exequente deduziu contestação aos embargos concluindo pela improcedência das exceções invocadas e da oposição à execução deduzida, devendo o executado ser condenado como litigante de má fé. * O executado respondeu, concluindo pela improcedência do pedido de condenação como litigante de má fé formulado pela Exequente. * Em 14-09-2020 teve lugar audiência, na qual foi lavrado o seguinte despacho: “Não tendo sido possível à Juiz signatária consultar no fim de semana os autos de execução que determinaram os presentes embargos de execução junto deste apenso T, no dia de hoje solicitou a signatária à secção de processos que o requerimento executivo lhe fosse presente conjuntamente com titulo executivo que tinha sido apresentado e que justificava a automática penhora por parte da Senhora Agente de Execução. Não tendo esta juiz encontrado outro título executivo junto ao requerimento executivo que não fosse a sentença por si só, que regulou as responsabilidades parentais “ab initio”, e inexistindo junto ao processo qualquer outra sentença deste tribunal ou de outro Tribunal, com o necessário trânsito em julgado, a declarar o pai incumpridor, e por conseguinte, condenado aos vários valores que se mostram peticionados/executados em sede desta execução e, em face de tal questiona-se na presente diligência a Ilustre Advogada da exequente se porventura ocorreu/houve algum lapso, ou se, por sinal, o eventual titulo executivo/sentença de incumprimento/condenação do pai, estaria noutro apenso, ou por lapso, teria sido junto a outros autos. Ouvida a Ilustre Advogada que despoletou a execução em apreço, a mesma confirmou a este tribunal que o título executivo que indicou/juntou para a penhora do vencimento do pai, foi tão somente, a sentença da regulação das responsabilidades parentais que está no processo e nada mais”. * Na ocasião, a Advogada da exequente disse que a exequente desistia do presente apenso de execução, desistência que não foi aceita pelo executado, após o que foi proferido o seguinte despacho: “Não sendo possível homologar a desistência apresentada, em virtude de não estarem reunidos todos os pressupostos legais para o efeito. Nada mais havendo a requerer e a alegar pelas Ilustres Advogadas, nem a promover pelo Digníssimo Procurador, oportunamente, e após a disponibilidade da Ata para ser corrigida e assinada, e assim que se mostrem concretizadas todas as diligências, não só no presente Apenso, como nos demais Apensos hoje em realização, para que se abra conclusão, nos autos, a fim de ser proferida Sentença (…)”. * Em 27-09-2020 foi proferida sentença que, nomeadamente, concluiu que, “perante, a (…) inexistência de título executivo que sustente a presente execução, indefere-se liminarmente, a presente execução, extinguindo-se assim a instância executiva e por conseguinte, declara-se a inutilidade superveniente da presente lide – cfr. al. e) do artº 277º do CPC”. * Notificada da sentença de 27-09-2020 e não se conformando com a mesma, dela apela a exequente, concluído pela revogação da mesma e sua substituição por decisão que considere a existência do titulo executivo, “prosseguindo os autos de execução com todas as legais consequências”, tendo formulado as seguintes conclusões: “1. O presente recurso incide sobre a douta decisão no apenso acima mencionado quanto à execução de alimentos, que o tribunal a quo entendeu indeferir liminarmente, extinguindo assim a instância executiva e por conseguinte, declarar a inutilidade superveniente da lide – cfr. al. e) do artº 277º do CPC. 2. Decisão com a qual não se pode concordar nem tão pouco, a ora recorrente, se conformar. 3. A obrigação de alimentos surge no universo do Direito Civil, dentro do instituto “família”, podendo ainda, o incumprimento dessa obrigação, originar um procedimento criminal. 4. A dúvida sobre a existência do direito exequendo é solucionada através de exibição de documento que o acautele. Esse documento é o ponto de partida da ação executiva, pois a realização coativa da prestação pressupõe a definição dos elementos da relação jurídica de que ela é objeto. O título executivo é a base da execução, é ele que determina os seus fins e limites, o tipo de ação, a legitimidade, a certeza, liquidez e exigibilidade da obrigação. 5. É requisito formal para a instauração da ação executiva, a apresentação de título executivo (art.º 10.º, n.º 5, do CPC), pois é através do mesmo que a lei presume que existe um direito e uma obrigação. 6. A execução especial por alimentos, tal como exposto supra, tanto pode fundar-se em sentença como em acordo homologado, onde as partes tenham estipulado as prestações alimentares. 7. A sentença que se reporta às prestações alimentares é título suficiente (contém uma condenação numa prestação certa e determinada com trânsito em julgado) para que a exequente instaure uma execução, requerendo que o executado lhe pague as prestações vencidas e não pagas, bastando para isso que no requerimento inicial alegasse a existência da referida obrigação e o não pagamento, por parte do executado, o que sucede in casu. 8. Se a lei afirma que as sentenças condenatórias formam título executivo (art.º 703.º, n.º 1, al. a), do CPC), porquê esta questão? 9. Não se justifica que cada vez que o executado incumpra o estipulado quer em sentença condenatória, quer em acordo homologado, se tenha de recorrer ao incidente de incumprimento previsto no art.º 41.º, do RGPTC. 10. O que está em causa são os alimentos devidos a menores, e como tal, têm de ser cobrados o mais rápido possível de forma a que as necessidades primárias do menor nunca sejam postas em causa, exige-se celeridade processual, o que não justifica apenas o recurso a procedimentos injustificados que poderiam atrasar a execução do valor em dívida. 11. Salvo melhor opinião, o artigo 48.º do Regime Geral do Processo Tutelar Cível não exclui a possibilidade de utilização de outros meios para obtenção dos alimentos, nomeadamente o processo especial de execução por alimentos previsto nos artigos 933.º e seguintes do Código de Processo Civil (CPC). 12. Vem o presente recurso da sentença que indeferiu liminarmente a presente execução alegadamente por inexistência de título executivo, quando, a exequente é detentora de título executivo. 13. O alegado título executivo, em causa, reconhece ao credor o direito de receber o montante referente aos alimentos devidos aos filhos menores de exequente e executado. 14. Sendo assim, tal documento constitui condição necessária e suficiente para instaurar execução contra o alegado devedor da prestação exequenda. 15. O título executivo é o documento donde resulta a exequibilidade de uma pretensão, e por conseguinte, a possibilidade da realização coactiva da correspondente prestação através de uma acção executiva. 16. Entre as espécies de títulos executivos tipificados (taxativamente) no art. 703º do CPC surgem, em primeiro lugar, as de natureza judicial, mais propriamente as “sentenças condenatórias” (expressão utilizada em sentido amplo, abrangendo quer as sentenças propriamente ditas, quer os despachos que contenham uma decisão condenatória), mas para que constituam título executivo, é necessário, em regra, que as sentenças tenham transitado em julgado, o que sucede in casu. 17. Por isso com o devido respeito, não nos podemos conformar com a decisão a quo ora recorrida, já que esta, em nossa opinião, contraria não só as regras atinentes ao processo executivo, como as regras gerais do direito civil e é até contrária à lógica inerente a este tipo de obrigações. 18. Em primeiro lugar, a decisão ora recorrida é contrária às regras que regulam o processo executivo porque a dita sentença era (e é) título suficiente (tem todos os ingredientes legalmente exigíveis para tal, na medida em que contém uma condenação numa prestação certa e determinada e transitou em julgado) para que a exequente, ora recorrente com base nela, instaurasse a presente execução requerendo que (após a efectivação da penhora, na medida em que na execução especial por alimentos este acto precede sempre a citação do executado para pagar a dívida exequenda ou deduzir oposição à execução e/ou à penhora, conforme consta do nº 5 do art. 933 º). 19. A tese defendida na decisão a quo ora recorrida contraria a própria lógica das coisas pelo simples facto de que a ser seguida e de cada vez que o executado deixasse de pagar uma das mensalidades de alimentos, a exequente, para a poder cobrar no processo executivo, teria que, previamente, recorrer ao incidente de incumprimento para aí obter decisão que reconhecesse esse mesmo incumprimento por parte do executado, só depois podendo exigi-los nos termos do art. 933º do CPC ou do art. 41ºdo RGPTC, seria, com o devido respeito, uma duplicação absurda de procedimentos num segmento em que está em causa a prestação de alimentos a dois menores. 20. Munida, como estava, da sentença que havia fixado a prestação de alimentos a favor dos menores, a exequente recorreu à execução. 21. Não deve ser rejeitada a execução especial por alimentos (devidos a menor), com base em (manifesta) falta de título executivo, quando na base da mesma está uma sentença – transitada em julgado – onde ficou estipulada uma determinada prestação mensal a título de alimentos. 22. Tal sentença é título executivo suficiente para a propositura da execução para pagamento das prestações entretanto vencidas e não pagas pelo progenitor-devedor e, bem assim, para cobrança coerciva das prestações/mensalidades que se forem vencendo na pendência do processo executivo, não havendo necessidade de recurso prévio ao incidente de incumprimento, previsto no art. 41º do RGPTC, a fim de aí se obter decisão que reconheça o não pagamento das prestações vencidas a executar. 23. Assim, com o devido respeito, somos da modesta opinião que o Tribunal recorrido não ponderou adequadamente a aplicação, ao caso em apreço, do regime jurídico vigente e da demais doutrina e jurisprudência firmada sobre os procedimentos legais destinados à cobrança coerciva da obrigação de alimentos, e que veio a determinar a falta de titulo executivo. 24. Entendemos que “o incidente «pré-executivo» regulado no art. 41º do RGPTC não pode configurar-se como um processo «especialíssimo», relativamente à execução especial por alimentos, regida pelo CPC, cabendo, em consequência, ao interessado optar pela via procedimental que, em concreto, considere mais favorável a uma plena e eficaz realização coerciva do seu direito. 25. Pelo que dúvidas inexistem, como cremos, que é legítimo que a exequente se podia ter socorrido da execução especial por alimentos prevista nos artigos 933.º e seguintes do C.P.C. para cobrança coerciva das prestações alimentares vencidas e vincendas. 26. A execução especial por alimentos é um dos procedimentos legalmente previstos para a cobrança coerciva da obrigação de alimentos e a que, in casu, melhor acautela, no entendimento da exequente, os superiores interesses dos menores, sendo certo que os procedimentos não se encontram, entre si, numa relação de subsidiariedade, de dependência ou de prejudicialidade. 27. Assim, falece, no nosso modesto entendimento, a fundamentação sustentada na douta decisão do tribunal a quo. 28. Atento todo o exposto, entendemos que a decisão proferida, ao ter decidido, como decidiu, violou as normas – arts. 10.º, 193.º, n.ºs 1 e 2, 200.º, n.º 2, 278.º, n.º 1, al.ª b), 933.º e seguintes do C.P.C. e 40º, 41º, 48º do RGPTC – e princípios expostos, devendo ser substituída por uma outra, que receba e ordene o prosseguimento dos autos, com as devidas e legais consequências (…)”. * O recorrido contra-alegou concluindo pela improcedência do recurso interposto. * Admitido liminarmente o requerimento recursório e colhidos os vistos legais, cumpre decidir. * 2. Questões a decidir: Sendo o objecto do recurso balizado pelas conclusões do apelante, nos termos preceituados pelos artigos 635º, nº 4, e 639º, nº 1, do CPC - sem prejuízo das questões de que o tribunal deva conhecer oficiosamente e apenas estando adstrito a conhecer das questões suscitadas que sejam relevantes para conhecimento do objeto do recurso - , a única questão a decidir é a de saber: A) Se a decisão recorrida, que concluiu inexistir titulo executivo, violou os artigos 10.º, 193.º, n.ºs 1 e 2, 200.º, n.º 2, 278.º, n.º 1, al. b), 933.º e seguintes do C.P.C. e 40º, 41º, 48º do RGPTC? * 3. Fundamentação de facto: São elementos processuais relevantes para a apreciação do recurso os elencados no relatório e ainda os seguintes: 1. Por requerimento de 21-12-2017, que deu origem ao apenso S, a exequente instaurou execução especial de alimentos, tendo invocado no requerimento executivo que: “1.Foi dissolvido o casamento entre exequente e executado por sentença de divorcio proferida em 09-10-2016 e transitada em julgado em 16-11-2016. 2. Embora já existindo regime provisorio, por sentença proferida em 07/10/2016 nos termos do art. 40º do RGPTC, com decisão quanto às matérias que ainda faltavam regular quanto ao exercício das responsabilidades parentais ficou o ora Executado obrigado: a) A pagar € 800 a título de pensão de alimentos para os dois menores, valor a pagar por transferência bancária até ao fim do mês a que diz respeito; b) A pagar as despesas com o Colégio dos menores, nomeadamente, matrícula, mensalidades, seguros, livros e material escolar, incluindo fardamento, visitas de estudo, refeições, actividades de enriquecimento curricular, desde que todos estes itens sejam fornecidos pelo Colégio. 3.Sendo certo que já existia um regime anterior provisorio que o executado teria de cumprir. 4. Até à presente data a referida partilha de bens comuns ainda não se concretizou. 5. Acontece que o ora Executado nem sempre tem liquidado as prestações a que fora e está obrigado. Na verdade, 6. Relativamente ao ano de 2015 e até Setembro de 2016, o ora Executado não liquidou diversas despesas de saude e escolares perfazendo um total de 1986.59 €. 7. Em Julho de 2016 só liquidou parte da pensão de alimentos ficando por liquidar €237,62. 8. Em Agosto de 2016 só liquidou parte da pensão de alimentos ficando por liquidar €817,42. 9. Em Setembro de 2016 só liquidou parte da pensão de alimentos ficando por liquidar €43,98 10. Relativamente ao ano de 2017, o ora Executado não liquidou as prestações mensais na totalidade descontando valores dos meses de Janeiro a Junho perfazendo um total de €1400 11.. Relativamente aos meses de Julho, Agosto e Setembro de 2017 o ora Executado não liquidou qualquer prestação, perfazendo nesses meses o total em dívida de €2.400 12. Relativamente a despesas escolares (€478) e de saude (€21,28)de 2017 o ora Executado não liquidou o valor total de €499,28 13. Assim, encontra-se por pagar por parte do ora executado à exequente até à presente data o valor total de 7384,92(sete mil trezentos e oitenta e quatro euros e noventa e dois centimos) 14. O valor é devido, pelo que se intenta a presente execução especial por alimentos. 15. Mais, deve o Executado, a título de juros a quantia de €295,36 16. Ao valor peticionado acrescerão também os juros vincendos, os quais deverão ser contabilizados a final. (…). Requerimento Executivo entregue por via electrónica na data e hora indicadas junto da assinatura electrónica do subscritor (cfr. última página), aposta nos termos previstos na Portaria n.º 280/2013, de 26 de Agosto (…)”. 2. Com o requerimento executivo referido em 1., a exequente juntou a sentença proferida no apenso B, datada de 05-09-2016, em cujo dispositivo consta, nomeadamente, o seguinte: “Nos termos do art. 40º do RGPTC, decido as matérias que ainda faltava regular nestes autos quanto o exercício das responsabilidades parentais da forma seguinte: a) Os menores estarão com pai de 15 em 15 dias desde as 20:00 de 6ª feira até às 20:00 de Domingo, podendo os menores serem buscados e levados por quem o pai indicar, desde que seja pessoa conhecida dos menores. b) Os menores no mínimo contactarão com o pai, preferencialmente por videochamada, às 20:00 das terças e quintas-feiras, ainda que por breves momentos, e ainda nos Sábados em que não estejam com o pai no referido horário. Se passarem a semana com o pai, contactam pelo menos a mãe nos mesmos termos. O mesmo se aplica às férias com cada um dos progenitores. c) Ambos os progenitores, quando estiverem com os menores, devem estar contactáveis e passar o telefone aos filhos, devendo ainda informar o outro progenitor, caso estejam em local distinto das rotinas habituais ou da residência, do local onde os menores se encontram no momento. d) Os menores passarão pelo menos 30 dias de férias de Verão com o pai em termos a acordar entre os progenitores. Na falta ou ausência de acordo observar-se-á o seguinte regime: - Nos anos pares passam férias de Verão das 09:00 de 01.07 até às 09:00 de 16.07 com a mãe e das 09:00 de 16.07 até às 09:00 de 01.08 com o pai. De novo, passam das 09:00 de 01.08 até às 09:00 de 16.08 com a mãe e das 09:00 de 16.08 até às 09:00 de 01.09 com o pai. Nos anos ímpares será ao contrário. e) O pai pagará € 800 a título de pensão de alimentos para os dois menores, valor a pagar por transferência bancária até ao fim do mês a que diz respeito. f) A pensão será actualizada segundo o IPC do ano anterior, em Janeiro de cada ano, ocorrendo a primeira actualização em Janeiro de 2018. g) O pai pagará as despesas com o Colégio dos menores, nomeadamente, matrícula, mensalidades, seguros, livros e material escolar, incluindo fardamento, visitas de estudo, refeições, actividades de enriquecimento curricular, desde que todos estes itens sejam fornecidos pelo Colégio, excluindo-se transportes casa/colégio os quais ficam a cargo da mãe. h) Tudo o que sejam materiais escolares e livros não fornecidos pelo colégio será pago em partes iguais por ambos os progenitores. i) As actividades extracurriculares, ATL, sala de estudo, explicações em que haja acordo entre ambos os progenitores serão pagas em partes iguais por cada progenitor. j) No caso de consultas de psicologia o pagamento das mesmas será efectuado na proporção de 5/6 pelo pai e 1/6 pela mãe. Caso a progenitora não pague a sua parte, aquando da consulta, o pai pagará a totalidade e deduzirá a parte da A. na pensão seguinte. k) Para efeito do pagamento de despesas, a progenitora remeterá uma cópia do comprovativo da despesa por si suportada no prazo de 30 dias após o seu pagamento e o pai procederá ao pagamento da mesma com a pensão seguinte.”. * 4. Fundamentação de Direito: De acordo com o disposto no artigo 637.º, n.º 2, do CPC, “versando o recurso sobre matéria de direito, as conclusões devem indicar: a) As normas jurídicas violadas; b) O sentido com que, no entender do recorrente, as normas que constituem fundamento jurídico da decisão deviam ter sido interpretadas e aplicadas; c) Invocando-se erro na determinação da norma aplicável, a norma jurídica que, no entendimento do recorrente, devia ter sido aplicada”. Vejamos, pois, o recurso apresentado, apreciando a questão enunciada. * A) Se a decisão recorrida, que concluiu inexistir titulo executivo, violou os artigos 10.º, 193.º, n.ºs 1 e 2, 200.º, n.º 2, 278.º, n.º 1, al. b), 933.º e seguintes do C.P.C. e 40º, 41º, 48º do RGPTC? O Regime Geral do Processo Tutelar Cível (abreviadamente, RGPTC), aprovado pela Lei n.º 141/2015, de 8 de setembro, regula o processo aplicável às providências tutelares cíveis e respetivos incidentes (cfr. artigo 1.º). De harmonia com o disposto no artigo 3.º do RGPTC entre as providências tutelares cíveis conta-se a regulação do exercício das responsabilidades parentais e o conhecimento das questões a este respeitantes. Nos termos consignados no artigo 4.º do RGPTC, os processos tutelares cíveis regem-se pelos princípios orientadores de intervenção estabelecidos na lei de proteção de crianças e jovens em perigo e ainda pelos seguintes: a) Simplificação instrutória e oralidade - a instrução do processo recorre preferencialmente a formas e a atos processuais simplificados, nomeadamente, no que concerne à audição da criança que deve decorrer de forma compreensível, ao depoimento dos pais, familiares ou outras pessoas de especial referência afetiva para a criança, e às declarações da assessoria técnica, prestados oralmente e documentados em auto; b) Consensualização - os conflitos familiares são preferencialmente dirimidos por via do consenso, com recurso a audição técnica especializada e ou à mediação, e, excecionalmente, relatados por escrito; c) Audição e participação da criança - a criança, com capacidade de compreensão dos assuntos em discussão, tendo em atenção a sua idade e maturidade, é sempre ouvida sobre as decisões que lhe digam respeito, preferencialmente com o apoio da assessoria técnica ao tribunal, sendo garantido, salvo recusa fundamentada do juiz, o acompanhamento por adulto da sua escolha sempre que nisso manifeste interesse. Os processos tutelares cíveis têm a natureza de jurisdição voluntária (art. 12.º) e são processos urgentes (arts. 13.º e 14.º). Nos termos do artigo 17.º do RGPTC: “1 - Salvo disposição expressa e sem prejuízo do disposto nos artigos 52.º [respeitante à inibição e limitações ao exercício das responsabilidades parentais] e 58.º [atinente a medidas limitativas do exercício das responsabilidades parentais], a iniciativa processual cabe ao Ministério Público, à criança com idade superior a 12 anos, aos ascendentes, aos irmãos e ao representante legal da criança. 2 - Compete especialmente ao Ministério Público instruir e decidir os processos de averiguação oficiosa, representar as crianças em juízo, intentando ações em seu nome, requerendo ações de regulação e a defesa dos seus direitos e usando de quaisquer meios judiciais necessários à defesa dos seus direitos e superior interesse, sem prejuízo das demais funções que estão atribuídas por lei. 3 - O Ministério Público está presente em todas as diligências e atos processuais presididos pelo juiz”. No artigo 41.º do RGPTC regula-se o incidente de “Incumprimento” do seguinte modo: “1 - Se, relativamente à situação da criança, um dos pais ou a terceira pessoa a quem aquela haja sido confiada não cumprir com o que tiver sido acordado ou decidido, pode o tribunal, oficiosamente, a requerimento do Ministério Público ou do outro progenitor, requerer, ao tribunal que no momento for territorialmente competente, as diligências necessárias para o cumprimento coercivo e a condenação do remisso em multa até vinte unidades de conta e, verificando-se os respetivos pressupostos, em indemnização a favor da criança, do progenitor requerente ou de ambos. 2 - Se o acordo tiver sido homologado pelo tribunal ou este tiver proferido a decisão, o requerimento é autuado por apenso ao processo onde se realizou o acordo ou foi proferida decisão, para o que será requisitado ao respetivo tribunal, se, segundo as regras da competência, for outro o tribunal competente para conhecer do incumprimento. 3 - Autuado o requerimento, ou apenso este ao processo, o juiz convoca os pais para uma conferência ou, excecionalmente, manda notificar o requerido para, no prazo de cinco dias, alegar o que tiver por conveniente. 4 - Na conferência, os pais podem acordar na alteração do que se encontra fixado quanto ao exercício das responsabilidades parentais, tendo em conta o interesse da criança. 5 - Não comparecendo na conferência nem havendo alegações do requerido, ou sendo estas manifestamente improcedentes, no incumprimento do regime de visitas e para efetivação deste, pode ser ordenada a entrega da criança acautelando-se os termos e local em que a mesma se deva efetuar, presidindo à diligência a assessoria técnica ao tribunal. 6 - Para efeitos do disposto no número anterior e sem prejuízo do procedimento criminal que ao caso caiba, o requerido é notificado para proceder à entrega da criança pela forma determinada, sob pena de multa. 7 - Não tendo sido convocada a conferência ou quando nesta os pais não chegarem a acordo, o juiz manda proceder nos termos do artigo 38.º e seguintes e, por fim, decide. 8 - Se tiver havido condenação em multa e esta não for paga no prazo de 10 dias, há lugar à execução por apenso ao respetivo processo, nos termos legalmente previstos”. O incumprimento pode derivar de um vasto leque de fatores. Entre estes podem enumerar-se, a título exemplificativo: as grandes dificuldades de sobrevivência; o difícil relacionamento entre os progenitores; a persistente resistência a convivência por parte de outros familiares; a alienação parental; o abandono afetivo parental, etc. O incumprimento pode incidir sobre o direito de visitas, sobre a divisão e partilha de períodos festivos ou sobre outros aspetos atinentes à regulação estabelecida para as responsabilidades parentais. No caso de o incumprimento derivar de ambos os pais ou de terceira pessoa não será pelo mecanismo do artigo 41.º, mas sim pelo do artigo 42.º - respeitante à alteração de regime de responsabilidades parentais – que o diferendo se resolverá (neste sentido, o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 28-01-1988, in C.J., Tomo I, 1988). No que concerne à matéria de alimentos, esta encontra-se regulada nos artigos 45.º a 48.º do RGPTC. E, especificamente, sobre o modo de tornar efetiva a prestação de alimentos, consagra-se no artigo 48.º do RGPTC, o processo especial de “efetivação da prestação de alimentos”. Dispõe-se no referido artigo 48.º o seguinte: “1 - Quando a pessoa judicialmente obrigada a prestar alimentos não satisfizer as quantias em dívida nos 10 dias seguintes ao vencimento, observa-se o seguinte: a) Se for trabalhador em funções públicas, são-lhe deduzidas as respetivas quantias no vencimento, sob requisição do tribunal dirigida à entidade empregadora pública; b) Se for empregado ou assalariado, são-lhe deduzidas no ordenado ou salário, sendo para o efeito notificada a respetiva entidade patronal, que fica na situação de fiel depositário; c) Se for pessoa que receba rendas, pensões, subsídios, comissões, percentagens, emolumentos, gratificações, comparticipações ou rendimentos semelhantes, a dedução é feita nessas prestações quando tiverem de ser pagas ou creditadas, fazendo-se para tal as requisições ou notificações necessárias e ficando os notificados na situação de fiéis depositários. 2 - As quantias deduzidas abrangem também os alimentos que se forem vencendo e são diretamente entregues a quem deva recebê-las”. Este preceito, correspondente ao anterior artigo 189.º da OTM, tem como objetivo o cumprimento coercivo da obrigação de alimentos - tal como a ação executiva especial por alimentos, presente nos artigos 933.º e seguintes do CPC. O mecanismo previsto no artigo 48.º do RGPTC visa reintegrar ou restaurar o direito do credor de alimentos, que foi violado, afigurando-se ter feição executiva. “Aqui, não assistimos a uma função conservatória: o que se pretende não é estabelecer um mecanismo preventivo da falta de pagamento da prestação de alimentos – até porque o próprio mecanismo do artigo 48.º surge, precisamente, em detrimento do incumprimento da obrigação de alimentos a criança ou jovem, constituindo prestações já vencidas (não obstante estarem abrangidas as prestações vincendas – n.º 2). Deste modo, acompanhamos REMÉDIO MARQUES quanto ao facto de que, sendo que as obrigações alimentares devidas a crianças ou jovens implicam a prévia condenação do obrigado a prestar alimentos, a providência especial executiva do artigo 48.º do RGPTC é um modo de obter o cumprimento coercivo dessa obrigação. A verdade é que, como nos diz a própria epígrafe do artigo em análise, este mecanismo enumera meios de tornar efetiva a prestação de alimentos, pelo que se tem como intuito a coatividade da prestação, parecendo-nos, claramente, que estamos perante um preceito de natureza executiva” (assim, Andreia Cristina Nascimento Canha; Cumprimento Coercivo das Obrigações Alimentares (a Crianças e Jovens); Dissertação apresentada ao Instituto Superior de Contabilidade e Administração de Coimbra; 2016, pp. 31-32, consultada em https://comum.rcaap.pt/bitstream/10400.26/17870/1/Andreia_Canha.pdf). O artigo 48.º do RGPTC – que constitui um dos processos especiais previstos no Capítulo III do RGPTC - tem por objetivo a cobrança coerciva da prestação de alimentos, traduzida na dedução de rendimentos do devedor. Concomitantemente, se o obrigado a alimentos não satisfizer as quantias que se encontram em dívida nos 10 dias seguintes ao vencimento, a lei prevê a sua realização coativa, sendo necessário que a prestação de alimentos, bem como a sua periodicidade, tenham sido fixadas judicialmente, devendo o mecanismo ser intentado no processo que as fixou (assim, Tomé Ramião; Organização Tutelar de Menores, Anotada e Comentada – Jurisprudência e Legislação Conexa, 10.ª Edição, Quid Juris, Lisboa, 2012, p. 190). Se o devedor de alimentos for funcionário em funções públicas, deduzem-se-lhe, do respetivo do vencimento, as quantias em dívidas, “sob requisição do tribunal dirigida à entidade empregadora pública”. Se o obrigado a prestar alimentos for empregado ou assalariado, a respetiva entidade patronal é notificada para que deduza as quantias em falta no ordenado ou salário do devedor, ficando na situação de fiel depositário. Se, não trabalhando, o devedor de alimentos receber rendas, pensões, subsídios, comissões, percentagens, emolumentos, gratificações, comparticipações ou rendimentos semelhantes, as quantias são deduzidas nessas prestações quando tiverem de ser pagas ou creditadas, “fazendo-se para tal as requisições ou notificações necessárias e ficando os notificados na situação de fiéis depositários”. Após a dedução das quantias em dívida no rendimento do devedor, estas deverão ser diretamente entregues a quem deva recebê-las, abrangendo as prestações que se forem vencendo. A dedução de rendimentos abrange o montante dos atrasos e as prestações de alimentos a vencer no futuro. “Uma questão que se coloca quanto a esta matéria é de saber se, atendendo ao incumprimento efetivo de uma obrigação de alimentos a criança ou jovem, partimos imediatamente para o mecanismo previsto no artigo 48.º, ou se, por outro lado, recorremo-nos do artigo 41.º do mesmo diploma legal, que respeita ao incidente de incumprimento das responsabilidades parentais, sendo que na regulação do exercício das responsabilidades parentais, está incluída a matéria de alimentos (…). A par da questão suscitada, urge questionar se, estando previsto o mecanismo do artigo 48.º do RGPTC vocacionado para o incumprimento de alimentos, deverá ser utilizado, para obter o cumprimento coercivo da prestação alimentícia, o mecanismo do artigo 41.º do mesmo diploma legal. Na senda de REMÉDIO MARQUES, e de modo a dar resposta a ambas as questões, tratando-se de um incumprimento efetivo de uma obrigação de alimentos devida a um menor, aplica-se o processo executivo especialíssimo do artigo 48.º do RGPTC, sem necessidade de incitar o incidente de incumprimento do artigo 41.º do mesmo diploma. No mesmo sentido, TOMÉ D’ALMEIDA RAMIÃO diz-nos que se se trata apenas de incumprimento quanto à prestação de alimentos, partimos logo para o artigo 48.º do RGPTC. Também do mesmo entendimento, HELENA BOLIEIRO e PAULO GUERRA opinam no sentido de que o incidente de incumprimento deve ser incitado independentemente do mecanismo do artigo 48.º, corroborando jurisprudencialmente a sua opinião através do Acórdão da Relação de Lisboa de 09/02/1988, que proferiu que “o procedimento previsto na alínea a) do artigo 189.º da OTM [correspondente ao artigo 48.º do RGPTC] não tem de ser precedido por notificação ao requerido para dizer o que tiver por conveniente, nem de inquérito sumário, pois não lhe é aplicável o estabelecido no artigo 181.º [que corresponde ao artigo 41.º do RGPTC]; o requerido só tem de ser notificado do despacho que haja ordenado os descontos no seu vencimento, após estes se terem iniciado” (assim, Andreia Cristina Nascimento Canha; Cumprimento Coercivo das Obrigações Alimentares (a Crianças e Jovens); Dissertação apresentada ao Instituto Superior de Contabilidade e Administração de Coimbra; 2016, p. 35). Nesta mesma linha, decidiu o Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 14-01-2016 (Processo 809/15.0T8VCT.G1, rel. EVA ALMEIDA) que “o credor de alimentos devidos a menor, com vista à cobrança de alimentos vencidos e não pagos, pode optar entre os meios processuais à sua disposição – incidente previsto no artº 189º da LTM (artº 48º da Lei 141/2015) ou execução especial por alimentos – não tendo previamente de recorrer ao incidente de incumprimento previsto no artº 181º da LTM (artº 41.º da Lei 141/2015), cuja previsão nem sequer se refere ao incumprimento da obrigação de alimentos”. Assim, conclui-se que o credor de alimentos ou o Ministério Público podem lançar mão, quer do incidente previsto no artigo 41.º, quer a providência constante do artigo 48.º, ambos do RGPTC. Isso mesmo se assinalou em acórdão desta Relação e Secção, relatado pelo ora relator, de 06-02-2020 (Pº 1642/19.6T8PDL.L1-2): “No caso de não ser pago pelo progenitor adstrito à respetiva obrigação, o valor da prestação alimentícia fixado no processo de regulação das responsabilidades parentais, considerando a atualização aí prevista, o Ministério Público pode lançar mão do mecanismo previsto no artigo 41.º do Regime Geral do Processo Tutelar Cível (RGPTC) ou, em alternativa, do processo especial de “efetivação da prestação de alimentos”, regulado pelo artigo 48.º do RGPTC, não tendo previamente de recorrer ao incidente de incumprimento previsto no mencionado artigo 41.º”. Ambos os institutos comportam vantagens e desvantagens relativamente ao credor e ao devedor de alimentos. Assim, o incidente de incumprimento do artigo 41.º permite ao credor solicitar a condenação do devedor faltoso em multa até vinte UC, o que configura um elemento desvantajoso para o devedor, relativamente ao mecanismo do artigo 48.º. Mas, ao invés, intentado o incidente de incumprimento, o devedor pode exercer o seu direito de contradizer, podendo comportar tal contraditório algum elemento modificativo da obrigação a cargo do devedor de alimentos. Por outro lado, se intentado o mecanismo dos descontos, o devedor não terá ao seu alcance o prévio exercício do contraditório. O artigo 48.º do RGPTC afigura-se mais célere do que o mecanismo do incumprimento, consignado no artigo 41.º do RGPTC, para satisfazer o interesse da criança ou jovem relativamente à satisfação da obrigação alimentar (cfr., neste sentido, o Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 23-10-2017, Pº 942/12.0TAFAF.G1, rel. ALDA CASIMIRO). Para além disso, mantém-se previsto no CPC e regulado nos artigos 933.º a 937.º, o processo especial intitulado “execução especial por alimentos”, afigurando-se que, entre esta ação especial e o procedimento do artigo 48.º do RGPTC também ocorre uma relação de alternatividade no seu uso, segundo escolha do credor de alimentos. Dispõe o artigo 933.º do CPC o seguinte: “1 - Na execução por prestação de alimentos, o exequente pode requerer a adjudicação de parte das quantias, vencimentos ou pensões que o executado esteja percebendo, ou a consignação de rendimentos pertencentes a este, para pagamento das prestações vencidas e vincendas, fazendo-se a adjudicação ou a consignação independentemente de penhora. 2 - Quando o exequente requeira a adjudicação das quantias, vencimentos ou pensões a que se refere o número anterior, é notificada a entidade encarregada de os pagar ou de processar as respetivas folhas para entregar diretamente ao exequente a parte adjudicada. 3 - Quando requeira a consignação de rendimentos, o exequente indica logo os bens sobre que há de recair e o agente de execução efetua-a relativamente aos que considere bastantes para satisfazer as prestações vencidas e vincendas, podendo para o efeito ouvir o executado. 4 - A consignação mencionada nos números anteriores processa-se nos termos dos artigos 803.º e seguintes, com as necessárias adaptações. 5 - O executado é sempre citado depois de efetuada a penhora e a sua oposição à execução ou à penhora não suspende a execução.”. A esta execução especial por alimentos aplicam-se as regras do processo comum para pagamento de quantia certa, mas não há citação prévia do executado, para além de que, não é necessário que o exequente alegue factos que justificam o receio da perda da garantia patrimonial do seu crédito de alimentos e, também, a oposição à execução ou à penhora não suspende o processo executivo. “Outra especialidade desta ação é que, tendo sido efetuada penhora de bens do executado ou bens de terceiro especialmente afetos ao pagamento da dívida alimentícia, “esta deve assegurar o pagamento das prestações vencidas, bem como das prestações vincendas”, consoante o que resulta do n.º 1 do artigo 933.º do CPC. Na ação executiva especial por alimentos, o exequente “pode requerer a adjudicação de parte das quantias, vencimentos ou pensões que o executado esteja percebendo, ou a consignação de rendimentos pertencentes a este, para pagamento das prestações vencidas e vincendas, fazendo-se a adjudicação ou a consignação independentemente de penhora”. Quando seja requerida a adjudicação das quantias, vencimentos ou pensões, a entidade encarregada de os pagar ou de processar as respetivas folhas é notificada, nos termos do n.º 2 do artigo 933.º do CPC, para entregar diretamente ao exequente a parte adjudicada. No caso da consignação de rendimentos relativamente a bens do executado, uma vez requerida, o exequente deve indicar logo os bens sobre que há-de recair. De seguida, o agente de execução efetua a consignação de rendimentos consoante o que considerar bastante para satisfazer as prestações vencidas e vincendas, podendo ouvir o executado, conforme o que resulta do n.º 3 do artigo 933.º do CPC. Nos termos gerais, a consignação de rendimentos incide sobre bens já penhorados ao executado, seguindo o previsto nos artigos 803.º e seguintes do CPC. Neste âmbito, o executado pode requerer a venda dos bens penhorados, impedindo a consignação de rendimentos (artigo 803.º, n.ºs 2 e 3 do CPC), situação que não se verifica na ação executiva especial por alimentos. Como refere REMÉDIO MARQUES, a consignação de rendimentos consiste na afetação dos bens para pagamento de um débito de alimentos, não deve ordenar-se a restituição das sobras da execução ao executado sem que se mostre assegurado o pagamento das prestações vincendas até ao montante que o juiz, em termos de equidade, considerar adequado, salvo se for prestada caução ou outra garantia idónea”. Outra diferença entre a ação executiva e o mecanismo dos descontos, presente no artigo 48.º do RGPTC, é que, naquela, é possível enxertar o pedido de cessação ou de alteração de alimentos, provisórios ou definitivos (artigo 936.º CPC)” (assim, Andreia Cristina Nascimento Canha Cumprimento Coercivo das Obrigações Alimentares (a Crianças e Jovens); 2016, pp. 64-65, consultado em: https://comum.rcaap.pt/bitstream/10400.26/17870/1/Andreia_Canha.pdf). Conforme explicam Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa (Código de Processo Civil Anotado, vol. II, Almedina, 2020, p. 379), “na base desta execução tanto pode estar uma decisão judicial que fixe alimentos, provisórios (art. 384.º) ou definitivos, como um documento dotado de força executiva (art. 703.º, n.º 1, al. b) ) que expresse um acordo em conformidade. (…) O art. 48.º do Reg. Geral do Proc. Tutelar Cível consagra um procedimento específico pré-executivo de cobrança da prestação de alimentos cuja utilização (opcional) impede o recurso a esta ação executiva. Cabe ao credor dos alimentos optar, em alternativa, pelo procedimento do referido normativo ou por esta execução, em função da avaliação do seu próprio interesse na reintegração efetiva do direito lesado com o incumprimento da obrigação alimentar (STJ 8-10-09, 305-H/2000). Conforme se referiu neste acórdão do STJ de 08-10-2009, Pº 305-H/2000.P1.S1, rel. LOPES DO REGO (ainda por referência ao precedente artigo 189.º da OTM, mas que corresponde, no essencial, ao meio previsto no actual artigo 48.º do RGPTC): “1 - O incidente «pré-executivo» regulado no art. 189º da OTM não pode configurar-se – atento o âmbito limitado dos bens do devedor que nele podem ser atingidos com vista à satisfação da prestação alimentar - como um processo «especialíssimo», relativamente à execução especial por alimentos, regida pelo CPC, e que deva ter necessária prioridade sobre a via da execução autónoma, em termos de só poder lançar-se mão desta quando não for possível obter o pagamento pelo meio ali previsto. 2. Cabe, deste modo, ao credor dos alimentos optar , em alternativa, por um desses meios procedimentais, em função da avaliação que realiza, em concreto, acerca dos seu próprio interesse na reintegração efectiva do direito lesado com o incumprimento da obrigação alimentar”. Conforme se lê na respetiva fundamentação do citado acórdão, o meio coercivo antes previsto no artigo 189.º da OTM constituía uma “providência «pré-executiva» ( no sentido de que a mesma, embora direccionada para uma efectiva reintegração dos direitos violados- cfr.Remédio Marques, Aspectos Sobre o Cumprimento Coercivo da Obrigação de Alimentos, in Comemorações dos 35 Anos do CC, pag. 619- não passa pela instauração de uma instância executiva autónoma) , de natureza «incidental» relativamente à causa em que foram arbitrados os alimentos – conduzindo o referido art 189º a que, em última análise, tais processos se conformem como procedimentos «mistos», podendo comportar uma fase declaratória e uma subsequente fase executiva; por outro lado , as providências de cariz executório aí reguladas caracterizam-se pela sua linearidade e simplicidade, já que os «descontos » aí previstos se efectivam à margem das regras sobre a penhora, sem envolverem a específica tramitação caracterizadora do processo executivo propriamente dito. Tal simplicidade procedimental tem, porém, como contraponto, uma substancial limitação do âmbito das medidas coercitivas possíveis, já que naturalmente apenas podem ser «agredidos» os rendimentos auferidos pelo devedor de alimentos, aí especificamente previstos, e não quaisquer outros bens de que este seja titular. Implica esta limitação que a vantagem ligada à informalidade e simplicidade do procedimento previsto no citado preceito legal ( expressa na dispensa de instauração de uma instância executiva autónoma, com os custos que lhe vão normalmente associados ) é, até certo ponto, aniquilada com a drástica restrição no tipo de bens do devedor que podem ser «agredidos» com vista a realizar coercivamente o direito do credor; na verdade, se o credor dos alimentos em dívida puder e quiser optar pela via da execução especial, regulada no CPC, para além de poder obter, em termos sensivelmente análogos, a adjudicação de parte das quantias, vencimentos e pensões que o executado esteja percebendo para pagamento das prestações vencidas e vincendas, fazendo-se tal adjudicação independentemente de penhora, nos termos do art.1118º,poderá ainda, nos termos gerais, requerer a penhora de quaisquer outros bens de que seja titular o devedor, ficando as sobras da execução, no caso de efectivação da venda, afectas à garantia das prestações vincendas, nos termos do art. 1121º-A. Ora, pelo menos nos casos em que se tenha acumulado um valor significativo de pensões em atraso e sejam conhecidos outros bens, susceptíveis de penhora, do devedor é manifesta a vantagem do credor da prestação alimentar em lançar mão da acção executiva, já que esta lhe pode eventualmente assegurar uma rápida e plena obtenção dos montantes acumulados e em dívida, sem ter de se submeter ao moroso processo de só faseadamente ir recebendo o montante correspondente à dívida acumulada, através dos descontos mensais efectuados no vencimento auferido pelo devedor.. É esta a razão que manifestamente impede que, numa interpretação funcionalmente adequada, os «descontos» previstos no citado art. 189º tenham necessária prioridade sobre a via executiva autónoma, de que só poderia lançar-se mão a título estritamente subsidiário: basta pensar na solução aberrante a que se chegaria num caso em que, estando acumulado um montante avultado de prestações já vencidas e não pagas, se verifica, por exemplo, que o devedor, além do seu vencimento, é titular de um depósito bancário que, só por si, permitiria realizar de imediato todas as prestações em dívida: qual o interesse que impede que, nesta situação, seja lícito ao credor lançar mão do processo executivo para aí, simultaneamente, obter o pagamento imediato das prestações atrasadas pelas forças do depósito bancário e a satisfação das prestações futuras através da adjudicação de uma parcela dos vencimentos ou salários auferidos pelo devedor?” (para além deste aresto, vd., no mesmo sentido e entre outros, o Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 08-06-2017, Pº 991/14.4T8GMR-F.G1, rel. JOÃO DIOGO RODRIGUES e o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 19-01-2021, Pº 516/16.97T8TVD-A.L1-7, rel. DIOGO RAVARA). Não obstante, poderá o credor de alimentos intentar ação executiva especial por alimentos sem ter recorrido ao mecanismo do artigo 48.º do RGPTC, uma vez que a lei nada dispõe em contrário. Todavia, enquanto Helena Bolieiro e Paulo Guerra (A Criança e a Família – Uma Questão de Direitos; Coimbra Editora, Coimbra, 2009, p. 247) consideram que, se for accionado o mecanismo incidental do artigo 48.º do RGPTC, já não se poderá lançar mão da execução especial por alimentos, já Clara Sottomayor (Regulação do Exercício das Responsabilidades Parentais nos Casos de Divórcio, 5ª edição (revista, aumentada e atualizada), Almedina, Coimbra, 2011, p. 361) considera que a utilização do mecanismo do artigo 48.º do RGPTC é independente da ação executiva especial por alimentos. Ou seja: O processo do artigo 48.º do RGPTC não excluiria a possibilidade de se vir a intentar uma acção coerciva de alimentos. Neste último sentido, refere Marta da Fonseca Morgado (A crise jurisprudencial na fixação de alimentos devidos a menores; Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, Lisboa, 2018, p. 25, consultada em https://repositorio.ul.pt/jspui/bitstream/10451/38309/1/ulfd138239_tese.pdf) que, “na senda de CLARA SOTTOMAYOR [Regulação do Exercício das Responsabilidades Parentais nos Casos de Divórcio, 5ª edição (revista, aumentada e atualizada), Almedina, Coimbra, 2011, pp. 359-360], afigura-se mais razoável permitir o recurso ao mecanismo do artigo 48.º independentemente do recurso prévio ao incidente de incumprimento das responsabilidades parentais, porquanto se assim fosse, tal implicaria “um atraso processual incompatível com a urgência das necessidades das crianças”, o que atrasaria a satisfação da prestação de alimentos”. Assim, conforme se entendeu no Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 14-01-2016 (Pº 809/15.0T8VCT.G1, rel. EVA ALMEIDA): “O credor de alimentos devidos a menor, com vista à cobrança de alimentos vencidos e não pagos, pode optar entre os meios processuais à sua disposição – incidente previsto no artº 189º da LTM (artº 48º da Lei 141/2015) ou execução especial por alimentos – não tendo previamente de recorrer ao incidente de incumprimento previsto no artº 181º da LTM (artº 41.º da Lei 141/2015), cuja previsão nem sequer se refere ao incumprimento da obrigação de alimentos”. Em face do exposto, conclui-se que, em caso de incumprimento da obrigação alimentar, o credor tem ao seu dispor três meios que se articulam entre si numa relação alternativa, segundo escolha do credor, de acordo com os respetivos pressupostos de cada um: o incidente de incumprimento das responsabilidades parentais, previsto no artigo 41.º do RGPTC; o mecanismo do artigo 48.º do RGPTC; e a execução especial por alimentos, regulada nos artigos 933.º a 937.º do Código de Processo Civil. Finalmente, importa salientar que, de harmonia com o regime previsto no n.º 4 do artigo 724.º do CPC, na apresentação do requerimento executivo basta a junção de cópia do título executivo, se o requerimento executivo for entregue por via eletrónica, só sendo necessária a apresentação do original do título, no caso de tal requerimento ser apresentado em papel. Caso seja apresentada cópia, caberá ao executado, em sede de oposição, exigir a apresentação do original do título executivo (cfr., neste sentido, entre outros, os acórdãos do STJ de 15-03-2012, Pº 227/10.7TBBGC-A.P1.S1, rel. GARCIA CALEJO e da Relação do Porto de 21-03-2013, Pº 88/12.1TBARC-A.P1, rel. ANA PAULA AMORIM), não havendo razões para extinguir a execução, por falta de apresentação do original do título, devendo ser proferido o despacho de aperfeiçoamento previsto no n.º 4 do artigo 726.º do CPC (cfr., neste sentido, o Acórdão do STJ de 24-10-2019, Pº 611/17.5T8LLE-A.E1.S3, rel. NUNO PINTO OLIVEIRA). Revertendo estas considerações para o caso dos autos, concluiu o Tribunal recorrido no sentido de que inexiste titulo executivo que sustente a execução. Na sentença proferida em 27-09-2020 foi expendida a seguinte fundamentação de direito: “Para o efeito de executar, a ora Exequente, (…), acima melhor identificada, refere como título executivo, a existência de uma sentença condenatória judicial, sendo certo que, junta ao requerimento executivo, a 18.12.2017, uma mera cópia da sentença de regulação das responsabilidades parentais proferida a 05.10.2016, no âmbito do Apenso B. Inexistindo assim, a necessária certidão judicial com a devida menção ao trânsito em julgado da dita decisão, para o efeito de instruir legalmente o seu requerimento executivo. Mas importa igualmente salientar, que a cópia da sentença em apreço junta, como título executivo, trata-se apenas e tão só, da fixação do regime da regulação das responsabilidades parentais, regulado pelo Tribunal, a titulo definitivo, não correspondendo a qualquer concreta condenação de qualquer um dos progenitores em valores monetários, que tenham sido declarados incumpridos e consequentemente devidos, pelo Tribunal. Desconhecendo-se por ausência de prova junta, se houve interpelação do visado progenitor para o efeito, se tais valores que se peticionam são devidos e a que título, e por via de que rubrica especificada, tendo sido, entretanto, pela Exequente, e a pedido do Tribunal, juntas várias faturas sem mais explicação acrescida. Mais, atendendo ao teor do requerimento executivo apresentado, a Exequente reclama valores de 2015, 2016 e 2017 ao abrigo de um regime de regulação das responsabilidades parentais parcial estabelecido a título provisório, e com esta sustentação, declara-os “ela própria” em dívida e sustenta nestes termos a sua liquidação. E nesta realidade avança com a execução a tramitar pela Sra. Agente de Execução, que, sem mais, passa a ordenar a imediata penhora do vencimento do ora executado e aqui embargante…com o acrescido enxovalho junto da sua Entidade Patronal e a lesão pronta e efetiva do seu património, sem se saber nem como nem porquê!? Mostra-se imprescindível mencionar que, já junto deste Tribunal tinha sido despoletada uma primeira execução de alimentos pela ora Exequente – cuja decisão proferida a 27.03.2016, julgou, já com trânsito em julgado, como se deixa transcrito: “A condenação no pagamento de alimentos provisórios fixada em tal sentença foi revogada pelo douto acórdão da Relação de Lisboa de 18.06.2015, acórdão já transitado. 2. O disposto no art. 2007, n. 2 do Código Civil não parece deixar margem para dúvidas quanto à sua interpretação: 2. Não há lugar, em caso algum, à restituição dos alimentos provisórios recebidos. Ou seja, não se torna necessária a devolução do que já foi pago, mas também num caso como o dos autos, não há fundamento legal para se peticionarem e executarem as pensões que não foram pagas. Tendo sido revogada a sentença que fixava alimentos provisórios, a exequente deixou de ter título executivo. O que o art. 2007, n. 2 do CC nos diz é que a exequente não é obrigada a devolver o que recebeu a título de alimentos provisórios. Quanto ao que se venceu até trânsito do acórdão e não foi pago a exequente não tem qualquer direito a recebê-lo. Tendo sido já indeferida a execução quanto a pensões vincendas, impõe-se indeferir quanto às não pagas.”. A execução especial por alimentos só pode ser instaurada depois de alguma prestação estar vencida e não paga. Isto quer quanto a alimentos provisórios quer quanto a alimentos definitivos. A obrigação não é exigível antes de vencida. A propositura desta ação que, posteriormente, se venha a revelar injustificada vai trazer, forçosamente, prejuízos e danos para o executado, nomeadamente, por este ser um caso de penhora imediata, ou seja, de dispensa legal de citação prévia, já que o património do executado é atacado sem qualquer aviso prévio. Nestes casos, o risco de uma execução injusta é muito mais acentuado que nos restantes casos, justificando a responsabilização do exequente pelos danos causados ao executado (art.º 858.º, do CPC). O sistema da dispensa de citação prévia desprotege o executado não lhe garantindo a sua defesa até à efetiva penhora dos bens. A dúvida sobre a existência do direito exequendo é solucionada através de exibição de documento que o acautele. Esse documento é o ponto de partida da ação executiva, pois a realização coativa da prestação pressupõe a definição dos elementos da relação jurídica de que ela é objeto. O título executivo é a base da execução, é ele que determina os seus fins e limites, o tipo de ação, a legitimidade, a certeza, liquidez e exigibilidade da obrigação. É requisito formal para a instauração da ação executiva, a apresentação de título executivo (art.º 10.º, n.º 5, do CPC), pois é através do mesmo que a lei presume que existe um direito e uma obrigação. Houve inevitavelmente uma relação jurídica, judicial ou extrajudicial, na formação deste título, dele constando vários elementos que permitem identificar a referida relação subjacente. Dele extraímos a prestação a que o devedor se encontra obrigado, a espécie de execução que lhe corresponde e, o objeto da obrigação. O título executivo é condição necessária e suficiente para a propositura da ação executiva, é através dele que se determina o fim e os limites da ação executiva. O elenco dos títulos executivos consta do art.º 703.º, do CPC, obedecendo ao princípio da tipicidade, sendo irrelevante qualquer convenção, em qualquer contrato, conferindo natureza ou força executiva a um documento. A execução especial por alimentos, tanto pode fundar-se em sentença como em acordo homologado, onde as partes tenham estipulado as prestações alimentares, contudo, mesmo assim, algumas questões têm surgido quanto à sua qualificação como títulos executivos. Será que um credor de alimentos pode optar entre a ação executiva e o mecanismo do art.º 48.º, do RGPTC, sem antes ter recorrido ao incidente de incumprimento previsto no art.º 41.º, do RGPTC? O que está aqui em causa é saber se o título executivo pode ser uma sentença homologatória de um acordo ou se a execução só pode ser instaurada depois de o exequente estar munido de uma decisão que reconheça o incumprimento daquela obrigação de alimentos ali fixada. Ora sendo certo que, neste Tribunal foram suscitados vários incumprimentos quanto a alimentos e despesas devidas a estes menores filhos das partes aqui em litígio, importaria que a exequente tivesse apresentado os títulos declarativos de eventuais incumprimentos com as respetivas condenações transitadas. Até porque os valores que se peticionam não se tratam tão só de pensões de alimentos fixadas, mas de mais montantes que são reclamados como estando em dívida, desconhecendo-se se o executado foi anteriormente interpelado para os pagar, se foi, como tal sucedeu, e que faturas os sustentam, e a que título são ou não devidos. Ante a ausência de força executória legal, ante os termos que a lei exige, cumpra o título executivo apresentado, e, Pelo exposto, inexistindo direito a alimentos e aos demais valores titulados por título executivo junto que preencha todos os requisitos legais plasmados na lei, para o efeito, e seja inequívoco, e perante, a consequente, inexistência de título executivo que sustente a presente execução, indefere-se liminarmente, a presente execução, extinguindo-se assim a instância executiva e por conseguinte, declara-se a inutilidade superveniente da presente lide – cfr. al. e) do artº 277º do CPC”. Conforme decorre do disposto no artigo 10.º, nºs. 4 e 5 do CPC, a acção executiva visa a realização coactiva de uma obrigação e tem por base um título, pelo qual se determinam o fim a e os limites da acção executiva. O fundamento substantivo da acção executiva é, pois, a própria obrigação exequenda, constituindo o título executivo o seu instrumento legal da respetiva demonstração. O título constitui, para fins executivos, condição da acção executiva e a prova legal da existência do direito exequendo nas suas vertentes fáctico-jurídicas, assumindo, por isso, autonomia em relação à realidade que prova. O título executivo “é condição necessária da execução, na medida em que os actos executivos em que se desenvolve a acção não podem ser praticados senão na presença dele (...) [e é] condição suficiente da acção executiva, no sentido de que, na sua presença, seguir-se-á imediatamente a execução” (assim, Anselmo de Castro, A Acção Executiva, Singular, Comum e Especial, 1970, p. 10). Segundo refere Lebre de Freitas (Acção Executiva Depois da Reforma da Reforma, 5ª Edição, Coimbra Editora, pp. 69-70) “a função executiva do documento, embora pressupondo sempre a sua função probatória, não se confunde com ela e o documento constitui base da acção executiva, com autonomia relativamente à actual existência da obrigação, que não tem, em princípio, de ser questionada na acção executiva, e em conformidade com a lei vigente à data em que o tribunal tenha de verificar a exequibilidade (…)”. Para Antunes Varela (in RLJ n.º 121.º, pp. 147-148), “o título executivo é (…) o documento de que consta a obrigação, cujo cumprimento se pretende obter por via coactiva e que, dada a sua força probatória, faculta imediato recurso à acção executiva” (in RLJ, nº 121º, p. 147/148). O título executivo é, pois, um documento que confere o grau de certeza necessário para que possam ser concretizadas as diligências executivas sobre o património do devedor/executado (assim, Marco Carvalho de Gonçalves; Lições de Processo Civil Executivo. Almedina, Coimbra, 2017, p. 45). Em suma: “O título executivo, determina o porquê, contra quem e para que o credor requer a execução” (assim, Rui Pinto; Manual da Execução e Despejo, Coimbra Editora, 2013, p. 145). E pese embora, o título executivo represente o documento onde conste a obrigação, este consiste não na causa de pedir mas numa especial condição probatória da existência do direito em questão (cfr. Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 25-01-2011, Pº 906/10.9TBACB.C1, rel. FALCÃO DE MAGALHÃES) ou seja, a lei obriga a que a causa de pedir seja deduzida no requerimento executivo sob pena deste ser indeferido ao abrigo do artigo 726.º n.º1 e n.º 2 al. b) do CPC, independentemente de os factos já constarem do título executivo. Ora, a exequente fundamenta a respetiva pretensão na sentença de 05-10-2016, proferida no apenso B, que se mostra transitada em julgado, tendo lançado mão do processo executivo a que se refere o artigo 933.º do CPC. Peticionou do executado o pagamento das quantias que enunciou, que este não terá satisfeito o total de € 7.384,92, assim liquidando a obrigação exequenda, nos seguintes termos: - € 1.986,59, de despesas de saúde escolares relativas ao ano de 2015 e até Setembro de 2016; - € 237,62 de parte da pensão de alimentos de Julho de 2016; - € 817,42 de parte da pensão de alimentos de Agosto de 2016; - € 43,98 de parte da pensão de alimentos de Setembro de 2016; - € 1.400,00 de prestações referentes a 2017; - € 2.400,00 de prestações de Julho, Agosto e Setembro de 2017; - € 499,28 de despesas escolares (€478) e de saude (€21,28)de 2017; Peticionou, ainda, o pagamento de juros de mora, vencidos e vincendos. Conforme se referiu, entende-se que, para a instauração da ação especial de alimentos a que se reporta este normativo não é necessário o prévio recurso ao incidente de incumprimento do artigo 41.º do RGPTC, nem, igualmente, ao mecanismo do artigo 48.º do mesmo diploma, muito embora, claro está, não possa o credor de alimentos receber duplamente a prestação de que é credor numa das vias processuais, se já a recebeu noutra. Assim, ao contrário do que se entendeu na decisão recorrida, não se vê que previamente à execução o credor de alimentos tivesse de obter título executivo fundado em prévia decisão que reconhecesse o incumprimento por parte do executado. Também não teria, como viu, que juntar aos autos certidão judicial da sentença, não só porque o requerimento executivo foi apresentado por via eletrónica, como o título em questão foi formado no apenso B, que, constituindo apenso dos autos em apreço e dos de execução, terá todos os elementos necessários para sobre ele se aferir os requisitos de exequibilidade. De todo o modo, caso tal junção se impusesse em face de dúvidas suscitadas sobre a respetiva exequibilidade ou vencimento e não pagamento de prestações reclamadas, sempre deveria ser ordenada, previamente à decisão de indeferimento do requerimento inicial de execução e de extinção da execução, a junção dos elementos complementares que se justificassem, assim permitindo a sanação do vício encontrado (cfr., neste sentido, o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 10-09-2019, Pº 666/12.9TCFUN-A.L1-7, rel. ANA RODRIGUES DA SILVA). De facto, a sentença de 05-10-2016, que se encontra transitada em julgado, constitui, por si só, documento bastante para que a exequente reclamasse os valores peticionados. De todo o modo, caso não se verificassem os requisitos legais da obrigação exequenda, caberia desenvolver os necessários trâmites com vista a tornar a obrigação certa, exigível e líquida, se a mesma o não fosse em face do título executivo. É o que resulta do artigo 713.º do CPC. No caso, contudo, como decorre da alegação da exequente no requerimento executivo, a mesma indicou não só a fonte da obrigação exequenda, como precisou os termos em que a mesma se concretizaria, alegando os factos que entendeu por pertinentes, tendo sido peticionado o pagamento de valores relacionadas com a pensão de alimentos fixada mensalmente e outras despesas de saúde e escolares. E, recorde-se que a decisão do apenso B fixou que o pai deveria pagar mensalmente € 800 a título de pensão de alimentos para os dois menores, que a pensão seria anualmente actualizada (segundo o IPC do ano anterior, em Janeiro de cada ano, ocorrendo a primeira actualização em Janeiro de 2018) e que também deveria pagar as despesas com o Colégio dos menores (nomeadamente, matrícula, mensalidades, seguros, livros e material escolar, incluindo fardamento, visitas de estudo, refeições, actividades de enriquecimento curricular, desde que todos estes itens sejam fornecidos pelo Colégio, excluindo-se transportes casa/colégio os quais ficam a cargo da mãe), sendo que, os materiais escolares e livros não fornecidos pelo colégio, as actividades extracurriculares, ATL, sala de estudo e explicações em que haja acordo entre ambos os progenitores, seriam pagos em partes iguais por ambos os progenitores. Mais se estabeleceu, na referida decisão, que, quanto a consultas de psicologia, o pagamento das mesmas seria efectuado na proporção de 5/6 pelo pai e 1/6 pela mãe e, caso a progenitora não pagasse a sua parte, aquando da consulta, o pai pagaria a totalidade e deduzirá a parte da A. na pensão seguinte. Mais ficou definido que, para efeito do pagamento de despesas, a progenitora remeteria uma cópia do comprovativo da despesa por si suportada no prazo de 30 dias após o seu pagamento e o pai procederia ao pagamento da mesma com a pensão seguinte. Ora, relativamente a uma tal pretensão da exequente, o executado poderia – como, aliás, o fez – deduzir, entre outros meios, oposição à execução por meio de embargos (cfr. artigo 728.º, n.º 1, do CPC), muito embora, atenta a especial execução em apreço, sujeita a regras especiais, conforme decorre do n.º 5 do artigo 933.º do CPC, o executado seja sempre citado depois de efetuada a penhora e a sua oposição (à execução ou à penhora) não suspende a execução. Invocou o executado/embargante, para além das excepções do pagamento e do caso julgado – quanto à quantia de € 237,62 – e de litispendência – quanto à quantia de € 1400 € -, diversos factos impeditivos relacionados com a pretensão de pagamento reclamada, tendo ainda sido suscitada a questão de litigância de má fé. Todavia, “no tocante ao ónus da prova dos fundamentos da oposição valem as regras gerais, cabendo, portanto, ao executado embargante a prova dos fundamentos de oposição invocados, o mesmo é dizer, dos factos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito cuja satisfação coativa constitui objeto da execução (art. 342º, nºs 1 e 2, do Código Civil)” (assim, o Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 25-06-2020, Pº 5381/15.9T8VNF-D.G1, rel. MARGARIDA SOUSA). Assim, aquando da apresentação do requerimento inicial, a exequente não tinha que juntar título que comprovasse o não pagamento das prestações periódicas vencidas até à instauração da execução, sendo certo que, tendo alegado o não pagamento, entre outras invocações, caberá ao executado a demonstração do pagamento, enquanto facto impeditivo da obrigação peticionada, bem como, a demonstração dos demais factos modificativos ou extintivos da obrigação exequenda por si invocados. Conforme decorre do n.º 2 do artigo 732.º do CPC, “se forem recebidos os embargos, o exequente é notificado para contestar, dentro do prazo de 20 dias, seguindo-se, sem mais articulados, os termos do processo comum declarativo”. E, se os embargos forem julgados procedentes, a acção executiva é julgada extinta, no todo ou em parte (cfr. artigo 732.º, n.º 4 do CPC). O artigo 726.º, n.º 2, do CPC contempla as situações em que é admissível o referido indeferimento liminar, dispondo que “o juiz indefere liminarmente o requerimento executivo quando: a) Seja manifesta a falta ou insuficiência do título; b) Ocorram exceções dilatórias, não supríveis, de conhecimento oficioso; c) Fundando-se a execução em título negocial, seja manifesta, face aos elementos constantes dos autos, a inexistência de factos constitutivos ou a existência de factos impeditivos ou extintivos da obrigação exequenda de conhecimento oficioso; d) Tratando-se de execução baseada em decisão arbitral, o litígio não pudesse ser cometido à decisão por árbitros, quer por estar submetido, por lei especial, exclusivamente, a tribunal judicial ou a arbitragem necessária, quer por o direito controvertido não ter caráter patrimonial e não poder ser objeto de transação”. Conforme é jurisprudência constante, a insuficiência de título executivo prevista na al. a) do nº 2 do art. 726º do Cód. Proc. Civil, que importa o indeferimento liminar do requerimento executivo, tem de ser evidente, incontroversa, insuprível, definitiva, excepcional, sendo esse o significado de “manifesta” (assim, os acórdãos da Relação de Lisboa de 15-12-2020, Pº 6175/18.5T8FNC-B.L1-7, rel. CARLA CÂMARA, de 24-09-2019, Pº 35949/11.6TYYLSB-L1-7, rel. CRISTINA SILVA MAXIMIANO; da Relação de Évora de 12-12-2011, Pº 31/11.5TBMAC-E1, rel. JOSÉ LÚCIO). Fora dos casos previstos no n.º 2, do artigo 726.º do CPC, o juiz convida o exequente a suprir as irregularidades do requerimento executivo, bem como a sanar a falta de pressupostos, aplicando-se, com as necessárias adaptações, o disposto no n.º 2 do artigo 6.º do CPC (cfr. n.º 4 do mesmo artigo). Ora, no caso, não se verifica qualquer das situações que determinariam o indeferimento liminar do requerimento executivo. E, parece-nos claro que, não obstante a previsão do artigo 734.º do CPC, que legitima a rejeição e extinção da execução, mesmo que tenha havido um despacho liminar a dar seguimento à execução (cfr., Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 10-09-2020, Pº 2942/20.8T8SNT.L1-2, rel. PEDRO MARTINS), os elementos dos autos, não comportam suficiente concludência sobre a ausência de título relativamente às quantias reclamadas, carecendo de ser apurado se se verifica algum dos fundamentos invocados nos embargos que determine a extinção, no todo ou em parte, da execução. Aliás, a referida norma do artigo 734.º do CPC, constitui “como que uma “válvula de segurança” em situações limite que não foram analisadas e decididas, concretizando o dever de gestão processual à luz do nº2 do artº 6 do NCPC. O que significa que este normativo não se sobrepõe aos embargos de executado, a impulsionar pela parte, porquanto são duas” plataformas” de controlo da legalidade, que se complementam, mas que não se substituem” (assim, o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 26-06-2014, Pº 562/13.2TBCSC-C.L1-8, rel. TERESA PRAZERES PAIS). Não sendo a falta de título executivo patente ou manifesta em face do requerimento executivo e dos documentos que o acompanharam, deve ser apurado se os valores peticionados foram ou não objeto de pagamento, se quanto aos mesmos é procedente exceção de litispendência ou caso julgado e, bem assim, se não foram cumpridas as condições de prévia interpelação para determinados valores reclamados, de harmonia com o invocado nos embargos. Para tal mostra-se necessário o prosseguimento dos autos, com a produção da prova que se mostre necessária e pertinente. A sentença judicial, transitada em julgado, que reconheceu a obrigação do progenitor satisfazer a prestação de alimentos relativamente aos seus filhos, reveste condições de exequibilidade, podendo sustentar, em conjunto com o requerimento executivo onde sejam invocados os factos constitutivos da obrigação exequenda, uma execução especial de alimentos, em conformidade com o disposto no artigo 933.º do CPC. Não se mostra, pois, comprovada causa que determine a inutilidade superveniente da lide. A decisão recorrida, indeferindo liminarmente a execução, extinguindo a instância, por inutilidade superveniente da lide, fora dos termos em que tal seria admissível, mostra-se desconforme com a adequada interpretação dos normativos dos preceitos legais citados, designadamente, constantes dos artigos 10.º, 277.º, al. e), 703.º e 726.º, n.º 2, al. a) do CPC. Em face do exposto, a apelação deverá ser julgada procedente, determinando-se a revogação da decisão recorrida, substituindo-se por outra que ordene o prosseguimento dos autos de oposição à execução, com a prática dos trâmites processuais pertinentes para o efeito, em conformidade com o disposto no artigo 732.º, n.º 2, do CPC. A responsabilidade tributária incidirá sobre o apelado/recorrido, atento o seu integral decaimento – cfr. artigo 527.º, n.ºs. 1 e 2, do CPC. * 5. Decisão: Pelos fundamentos expostos, acordam os Juízes que compõem o tribunal coletivo desta 2.ª Secção Cível, em julgar procedente a apelação, revogando-se a decisão recorrida, que se substitui pela presente, determinando o prosseguimento dos autos de oposição à execução, com a prática dos trâmites processuais pertinentes para o efeito, em conformidade com o disposto no artigo 732.º, n.º 2, do CPC. Custas pelo apelado/recorrido. Notifique e registe. * Lisboa, 15 de abril de 2021. Carlos Castelo Branco Lúcia Celeste da Fonseca Sousa Magda Espinho Geraldes |