Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
189/23.0T8LRS-A.L1-7
Relator: CRISTINA SILVA MAXIMIANO
Descritores: EXECUÇÃO
LETRA
ACEITANTE
VINCULAÇÃO DE SOCIEDADE
PODERES DE REPRESENTAÇÃO
EXCEPÇÃO OPONÍVEL
RELAÇÕES PESSOAIS
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 06/04/2024
Votação: MAIORIA COM * VOT VENC
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: A excepção fundada no vício de falta de poderes de representação societária decorrente da infracção ao método da representação conjunta da sociedade pela actuação de um só gerente - por as assinaturas apostas nas letras, no local de aceitante, em representação da sociedade apenas terem sido lavradas por um dos gerentes, quando do contrato de sociedade resulta que a forma de obrigar a sociedade é mediante a intervenção dos dois gerentes - é oponível pelo sujeito a que respeita a qualquer credor cambiário, independentemente da existência de relações pessoais, podendo, por isso, ser oposta ao portador cambiário, mesmo que de boa-fé.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam na 7ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa:

I - RELATÓRIO
A intentou, em 06/01/2023, o processo de execução ordinária – de que estes autos são Apenso - para pagamento de quantia certa, contra B , ascendendo a quantia exequenda ao valor total de € 24.660,75, apresentando, como títulos executivos, duas letras, de que é portadora, em que é sacadora a sociedade “Lider ….., Lda” e aceitante a sociedade B , ora executada.
A executada deduziu os presentes embargos de executado, alegando que: a sociedade executada não aceitou as mencionadas letras, nem autorizou que as mesmas fossem aceites em seu nome, nem teve intervenção em nenhuma transacção comercial com a entidade sacadora que justificasse a emissão de tais letras; tais letras são o resultado de um conluio entre a sacadora e um anterior sócio e gerente da executada, JJ ……, que combinaram a criação das mesmas, em benefício da sacadora, sem o  conhecimento da executada e do outro gerente desta, PP ….., com vista ao desconto bancário das letras, para obtenção de capital pela sacadora; resulta dos estatutos da executada que a mesma se obrigava com a assinatura conjunta de dois gerentes; o gerente da executada, JJ …., não tinha poderes suficientes de representação da executada, agindo como se os tivesse, em total abuso de representação; a concessão de crédito ou de financiamento pela executada à sociedade sacadora tratar-se-ia sempre de uma liberalidade, que é um acto fora do objecto social da executada e que, no mínimo, requeria a autorização da executada por deliberação votada em Assembleia Geral; e, a exequente estava obrigada, nem que fosse por dever institucional de prudência bancária e por dever profissional de diligência e de rigor, a conferir a regularidade dos títulos que decidiu voluntariamente descontar a crédito à sacadora.
A embargada contestou, pugnando pela improcedência dos embargos, alegando que as letras em causa, enquanto títulos cambiários, caracterizam-se pela literalidade, autonomia, abstracção e independência da relação subjacente ou fundamental na qual teve a sua origem; e existe a favor da exequente uma presunção de que a executada é devedora dos valores apostos nas letras, presunção que advêm diretamente do título executivo e que é suficiente para o prosseguimento da ação executiva, sem que a exequente tenha de alegar qualquer outro facto para justificar o seu direito ao valor peticionado.
Foi realizada audiência prévia, onde foi proferido despacho saneador, fixado o objecto do litígio e enunciados os temas da prova.
Efectuada audiência final, foi proferida sentença, julgando procedentes os embargos de executado e totalmente extinta a execução de que estes autos constituem apenso, com o levantamento da(s) penhora(s) efectuada(s).
Inconformada, a embargada recorre desta sentença, requerendo a respectiva revogação, terminando as suas alegações de recurso com as seguintes conclusões:
“A) Com o devido respeito e salvo melhor entendimento, a fundamentação da Sentença peca por falta de rigor, não correspondendo à verdade dos factos, porquanto não se verifica qualquer prescrição.
B) Quanto à causa de pedir na ação executiva, tem-se entendido que a mesma é constituída pela factualidade essencial de onde emerge o direito, refletida no próprio título executivo
C)A letra constitui um título cambiário, sujeito a certas formalidades, pelo qual uma pessoa se compromete para com outra a pagar-lhe determinada quantia em certa data (artº 1º da LULL).
D)As letras em causa, enquanto títulos cambiários, caracterizam-se pela literalidade, autonomia, abstracção e independência da relação subjacente ou fundamental na qual teve a sua origem, contrariamente ao que pretende demonstrar o Embargante.
E) O Banco Exequente tem meras relações mediatas, não lhe podendo, portanto, opor as excepções fundadas nas relações pessoais com a sacadora/endossante, a menos que alegue, e prove, que passou a ser portador do título com consciência do detrimento da aceitante.
F) resulta do artº. 17º da LULL, atentos os princípios da literalidade e segurança de circulação dos títulos de crédito, parece que a decisão a quo não teve esta importante norma em consideração,
G) Nas relações mediatas - as que se verificam quando a letra está na posse de pessoa estranha à convenção extra-cartular, havendo interesses de terceiros em jogo, que é preciso garantir, prevalece o princípio da autonomia, abstracção e literalidade da relação cambiária, independente por isso mesmo da causa que deu lugar à sua assunção.
H)Os subscritores da letra não podem discutir com terceiros a convenção extra-cartular, a menos que se verifique a situação que se previne no art. 17.º do L.U.L.L. onde se estatui que «as pessoas accionadas por parte de uma letra não podem opor ao portador as excepções fundadas sobre as relações pessoais delas com o sacador ou com portadores anteriores, a menos que o portador, ao adquirir a letra, tenha procedido conscientemente em detrimento do devedor.
I)Os embargos deveriam ter sido votados ao insucesso, pois não é o Banco portador endossado quem tem de provar que usou do mínimo de diligência para se inteirar das condições em que as letras descontadas foram adquiridas,
J)O Tribunal a quo incorreu assim em erro de julgamento e em erro de direito ao julgar procedentes os embargos.
K) Sendo inoponíveis ao portador mediato e de boa-fé as excepções cambiais: falta, nulidade ou ilicitude da relação fundamental, exceptio inadimplenti contractus, etc., porque decorrem de uma convenção extra-cartular, exterior ao negócio cambiário .
L)A Embargante não alegou factos relativos à verificação da «exceptio doli» prevista na parte final do artº 17°, cuja prova era indispensável para que a defesa pudesse surtir efeito e ser eficaz contra o Banco ora recorrente.
M) No caso em apreço, a oponibilidade ao Banco só se verificaria caso tivesse sido invocado, e provado, que sabia, ou não podia ignorar, que a sociedade só se vinculava com a assinatura de dois gerentes, não sendo suficiente para tal demonstração a publicidade conferida pelo registo comercial
N) - Na verdade, a sentença recorrida padece de vicio - nulidade - já que se constata da mesma a ausência total de explicação da razão por que foi tomada a decisão em crise,
O)- Inexistindo fundamentação, ou sequer explicação plausível que pudesse escrutinar o bom juízo,
P) Existe clara violação do artigo 607º do CPC, que impõe ao juiz o dever de discriminar os factos que considera provados e de indicar, interpretar e aplicar as normas jurídicas correspondentes.
Q) Estatui o mesmo artigo que na fundamentação da sentença, o juiz tomará em consideração os factos admitidos por acordo, provados por documentos ou por confissão reduzida a escrito e os que o tribunal colectivo deu como provados, fazendo o exame crítico das provas de que lhe cumpre conhecer.
R) - A justificação de qualquer sentença não pode consistir na simples adesão aos fundamentos alegados no requerimento.
S)- In casu, verificando-se o vazio de fundamentação da sentença, esta é, sem mais, nula.
T)- A Recorrente continua sem ver o seu crédito ressarcido e a divida ainda por liquidar, da qual é ainda devedora, deve-se em exclusivo aos actos censuráveis praticados pelos Recorridos, cuja condenação no pagamento de viu a Recorrente ser declarada, pasme-se, improcedente.
U)- Devendo o presente recurso ser julgado procedente por provado e bem assim a decisão do Tribunal a quo ser anulada e substituída por outra que determine a condenação dos Executados no pagamento da divida peticionada.”
A embargante apresentou contra-alegações, pugnando pela improcedência da apelação.
II - QUESTÕES A DECIDIR
De acordo com as disposições conjugadas dos arts. 635º, nº 4 e 639º, nº 1, ambas do Cód. Proc. Civil, é pelas conclusões da alegação do Recorrente que se delimita o objecto e o âmbito do recurso, seja quanto à pretensão do Recorrente, seja quanto às questões de facto e de direito que colocam. Porém, esta limitação objectiva da actuação do Tribunal da Relação não ocorre em sede de qualificação jurídica dos factos ou relativamente a questões de conhecimento oficioso, desde que o processo contenha os elementos suficientes a tal conhecimento (cfr. art. 5º, nº 3 do Cód. Proc. Civil). Acresce que, não pode também este Tribunal conhecer de questões novas que não tenham sido anteriormente apreciadas, porquanto, por natureza, os recursos destinam-se apenas a reapreciar decisões proferidas - cfr., neste sentido, Abrantes Geraldes, in “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, 5ª Ed., Almedina, 2018, p. 114 a 116.
Nestes termos, as questões a decidir neste recurso são [a al. A) das conclusões recursórias – “a fundamentação da Sentença peca por falta de rigor, não correspondendo à verdade dos factos, porquanto não se verifica qualquer prescrição” - corresponde, certamente, a mero lapso de inserção de escrita por parte da apelante, porquanto na decisão recorrida não foi apreciada, nem julgada procedente “qualquer prescrição”, pelo que não há, em sede deste recurso, que emitir pronúncia sobre tal questão]:
a) existência de nulidade da decisão recorrida por não especificar os fundamentos de facto e de direito que a justificam – al. b) do nº 1 do art. 615º do Cód. Proc. Civil;
b) mérito da decisão recorrida.
III – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
A sentença recorrida considerou como provados os seguintes factos:
1. Pela apresentação nº 35 de 23 de Fevereiro de 2018 foi registada a constituição da sociedade Embargante, então denominada Gra…., Lda., sendo sócios gerentes PP ……… e JJ …………, sendo a forma de obrigar a sociedade, pela intervenção dos dois gerentes e tendo como objecto social, o comércio a retalho e por grosso de bebidas, distribuição, importação e exportação.
2. Em 2 de Janeiro de 2023, a Exequente, ora Embargada, A , intentou a execução comum para pagamento de quantia certa de que os presentes autos constituem um apenso contra a Embargante B. e dando à execução as seguintes letras, ambas assinadas pela gerência da sociedade Líder …., Lda., na qualidade de sacadora:
a) letra de câmbio n.º 500792887210714522, emitida em 29.11.2021 e com vencimento em 25.02.2022, no montante de € 11.899,66 (onze mil oitocentos e noventa e nove euros e sessenta e seis cêntimos);
b) letra de câmbio n.º 500792887200283138, emitida em 29.11.2021 e com vencimento em 24.02.2022, no montante de € 11.978,66 (onze mil novecentos e setenta e oito euros e sessenta e seis cêntimos).
3. Nas letras supramencionadas, no local destinado à identificação do aceitante/sacado consta aposto o carimbo da Embargante B. e a assinatura de JJ, um dos seus gerentes.
4. A Embargante não teve intervenção em nenhuma transacção comercial com a sociedade Líder Atlantic, Lda., que justificasse a emissão das letras bancárias mencionadas em 2., não tendo subjacente qualquer emissão de facturas da Líder Atlantic, Lda. à Embargante, nem nenhuma entrada de mercadoria/existências no stock da Embargante.
5. O sócio e gerente da Embargante, JJ, e o sócio e gerente da Líder Atlantic Lda. eram amigos e combinaram a criação das letras referidas em 2. e de outros títulos de crédito, em benefício da sacadora Líder Atlantic Lda., com vista ao desconto bancário das mesmas letras, para obtenção rápida de capital à sociedade sacadora e garantir a continuação da sua actividade.
6. As letras mencionadas em 2. foram emitidas sem o conhecimento e autorização da Embargante e do seu outro sócio gerente, PP.
7. Aquando da emissão das letras, JJsabia que a Embargante apenas se obrigava pela intervenção dos dois gerentes e que a Embargante não era devedora de qualquer quantia à Líder Atlantic, Lda. e que não havia sido deliberado conceder-lhe crédito ou garantia.
8. As duas letras mencionadas em 2. foram descontadas junto da ora Embargada, a pedido da Líder Atlantic, Lda..
9. A Embargada, no exercício da sua actividade bancária, decidiu descontar a crédito à Líder Atlantic, as letras que esta lhe apresentou a desconto, a troco de juros, comissões ou outras remunerações convencionadas.
10. A Embargante, através do seu outro sócio, PP apenas teve conhecimento do aceite das letras e do seu desconto bancário, em Junho de 2022.
11. Após a data de vencimento das letras, a Líder Atlantic, Lda. foi declarada insolvente.
12. As letras aludidas em 2. não foram pagas na data dos respectivos vencimentos, nem posteriormente.
13. Pela apresentação n.º 46 de 15.02.2023 foi registada a cessação de funções do gerente JJ.
*
Na sentença recorrida foram julgados não provados os seguintes factos:
i) a Embargada solicitou à sacadora Líder Atlantic, Lda. as certidões de registo comercial dos intervenientes nas letras, antes de proceder à operação de crédito.
IV - FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO
Cumpre apreciar as questões a decidir neste recurso pela sua ordem de análise e precedência lógica, começando pela invocada nulidade da decisão, por não especificação dos fundamentos, quer de facto, quer de direito, que a sustentam, nos termos do disposto no art. 615º, nº 1, al. b) do Cód. Proc. Civil – cfr. als. N) a S) das conclusões de recurso.
A Mmª Juíza a quo sustentou a sua decisão, pugnando pela improcedência da nulidade - cfr. art. 617º, nº 1 do Cód. Proc. Civil e despacho proferido em 18/04/2024 (Referência Citius nº 150512321).
De acordo com o art. 615º, nº 1, al. b) do Cód. Proc. Civil, a sentença é nula “quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão”.
A Doutrina e a Jurisprudência têm entendido que este vício – que emerge da violação do dever de fundamentação das decisões judiciais, consagrado no art. 205º, nº 1 da Constituição da República e no art. 154º do Cód. Proc. Civil - só se verifica em situações de falta absoluta ou total ininteligibilidade de indicação das razões de facto e de direito que justificam a decisão e não também quando tais razões constem da sentença, mas de tal forma que pela sua insuficiência, laconismo ou mediocridade, se deve considerar a fundamentação deficiente.
Com efeito, já Alberto dos Reis, in “Código de Processo Civil Anotado”, V Volume, 3ª Ed., Coimbra Editora, p. 140, ensinava que: “Há que distinguir cuidadosamente a falta absoluta de motivação da motivação deficiente, medíocre ou errada. O que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação; a insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente, afecta o valor doutrinal da sentença, sujeita-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz nulidade. Por falta absoluta de motivação deve entender-se a ausência total de fundamentos de direito e de facto.”.
No mesmo sentido, e ainda na Doutrina, cfr.: Rodrigues Bastos, in “Notas ao Código de Processo Civil”, III Vol.; Lebre de Freitas e Outros, in “Código de Processo Civil Anotado”, II Vol., 2001, p. 669; Artur Anselmo de Castro, in “Direito Processual Civil Declaratório”, vol. III, p. 141/142; e Manuel Tomé Soares Gomes, in “Da Sentença Cível”, in “O novo processo civil”, caderno V, E-book publicado pelo Centro de Estudos Judiciários, Janeiro 2014, p. 370, acessível em http://www.cej.mj.pt/cej/recursos/ebooks/ProcessoCivil/CadernoV_NCPC_Textos_Jurisprudencia.pdf.
De igual forma e no mesmo sentido tem sido o entendimento da Jurisprudência, sendo possível confrontar, por todos, os Acórdãos do STJ de: 26/04/1995, relator Raul Mateus, CJ 1995, II, p. 58; e de: 19/10/2004, relator Oliveira Barros; 15/12/2011, relator Pereira Rodrigues [onde se precisa que a nulidade da sentença por falta de fundamentação não se verifica quando apenas tenha havido uma justificação deficiente ou pouco persuasiva, antes se impondo, para a verificação da nulidade, a ausência de motivação que impossibilite o anúncio das razões que conduziram à decisão proferida a final]; 02/06/2016, relatora Fernanda Isabel Pereira [“Só a absoluta falta de fundamentação – e não a sua insuficiência, mediocridade ou erroneidade – integra a previsão da al. b) do n.º 1 do art. 615.º do NCPC, cabendo o putativo desacerto da decisão no campo do erro de julgamento”]; 28/05/2015, relator Granja da Fonseca; e 10/05/2016, relator João Camilo – todos acessíveis em www.dgsi.pt.
A exigência de fundamentação incide quer sobre os fundamentos de facto, quer sobre os fundamentos de Direito. Na verdade, como esclarecem Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, in “Manual de Processo Civil”, 2ª ed. revista e actualizada, Coimbra Editora, 1985, p. 687: “(…) é preciso que haja falta absoluta, embora esta se possa referir só aos fundamentos de facto ou só aos fundamentos de direito.”.
O que significa que uma sentença ou despacho que decide uma questão suscitada pelas partes é nula: (i) quer se contiver a indicação dos factos, mas for absolutamente omissa quanto às razões de Direito que a sustentam; (ii) quer se contiver a indicação das razões de Direito que a fundamentam, mas for absolutamente omissa quanto aos factos em que se alicerça; (iii) quer se faltarem ambas as indicações: dos factos e das razões de direito.
Descendo ao caso dos autos, constata-se que estamos perante uma situação em que a sentença recorrida preenche, de forma manifesta, os requisitos exigidos pela lei quanto à motivação (de facto e de direito) das decisões.
Na verdade, a sentença recorrida encontra-se motivada de facto [conforme resulta da sua leitura: enuncia os Factos Provados (sob os nºs 1 a 13) e Não Provados (sob a al. i), ao que se segue a respectiva fundamentação/Motivação (baseada, como ali se lê, na análise crítica e conjugada dos documentos - que ali são identificados - juntos ao processo com as declarações de parte do legal representante da embargante e com os depoimentos das testemunhas), extraindo-se da mesma a justificação para os concretos factos que foram dados como provados e não provados, segundo a convicção do tribunal a quo] e de direito (tendo sido invocado na sentença, nomeadamente, os concretos preceitos legais em que a mesma se fundamenta e a Doutrina e Jurisprudência que foi considerada pertinente).
Desta forma, de acordo com o disposto no art. 205º, nº 1 da Constituição da República e nos arts. 154º e 615º, nº 1, al. b), ambos do Cód. Proc. Civil, e tendo em atenção as considerações acima aduzidas a propósito da interpretação e sentido último daquelas disposições legais, conclui-se que não se verifica, no caso dos autos, a falta absoluta ou a total ininteligibilidade de indicação das razões de facto e de direito que justificaram a decisão, susceptíveis da cominação legal de nulidade da decisão. Como também resulta do antes enunciado, questão diversa é a (eventual) errada fundamentação da referida decisão, questão essa, que, tendo também sido objecto deste recurso, é matéria a apreciar infra, em sede de mérito.
O exposto determina a improcedência, nesta parte, da apelação.
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Do mérito da decisão
Os títulos executivos que servem de fundamento à execução são duas letras de câmbio, sacadas por “Líder Atlantic, Lda”, constando, no local destinado à identificação do aceitante/sacado, aposto o carimbo da embargante/apelada “B” e a assinatura de JJ ….., um dos seus gerentes; letras essas, que foram descontadas junto da exequente, a pedido da “Líder …, Lda”, antes do seu vencimento, a troco de juros, comissões ou outras remunerações convencionadas, e que, chegadas as datas dos respectivos vencimentos e apresentadas para pagamento, não foram pagas pela embargante (cfr. factualidade provada).
A defesa da embargante apresentada nos embargos centra-se no entendimento de que as referidas letras foram assinadas em nome da embargante, mas com o seu desconhecimento e apenas por um dos seus dois gerentes, sendo a forma de obrigar a embargante pela intervenção de dois gerentes.
O tribunal a quo julgou a defesa da embargante procedente, concluindo:
“Ora, constata-se que à data da subscrição das letras, a Embargante tinha dois sócios gerentes e a sociedade obrigava-se pela intervenção dos dois gerentes, ou seja, em conformidade com a norma legal supletiva prevista no n.º 1 do artigo 261.º do supra referido código.
Não estava em causa qualquer limitação estatutária quanto à forma de obrigar a sociedade Embargante, mas a mera reprodução do regime legal supletivo. Deste modo, o então sócio gerente da Embargante, JJ ….., ao assinar sozinho as letras dadas à execução, actuou fora dos poderes conferidos por lei, não podendo vincular validamente a Embargante e, por outro lado, a factualidade apurada não permite concluir pela sua ratificação desses negócios cambiários. Para além disso, a matéria de facto apurada não permite sequer concluir que, ao invocar agora a falta de poderes daquele seu sócio gerente, a Embargante actua em abuso de direito e tal falta de poderes, uma vez que resulta da lei, é oponível à Embargada, ainda que de boa fé.
Pelo exposto, face ao previsto no artigo 8.º da LULL, a Embargante não é responsável cambiariamente pelo pagamento das letras dadas à execução.”
Sustenta a apelante em sede deste recurso que o tribunal a quo incorreu em erro de direito ao julgar os embargos procedentes, porquanto o banco exequente tem meras relações mediatas com a demandada, pelo que não lhe podem ser opostas as excepções fundadas nas relações pessoais com a sacadora/endossante, a menos que prove que o banco exequente passou a ser portador da letra com consciência do detrimento da aceitante – prova essa, que não foi feita.
Vejamos.
No caso dos autos, os títulos executivos dados à execução são as duas mencionadas letras enquanto documentos cartulares ou cambiários, nos termos do art. 703º, nº 1, al. c) do Cód. Proc. Civil – ou seja, enquanto “documentos que incorporam certo direito de crédito – o crédito não existe sem o título -, caracterizados pela literalidade, autonomia e abstração. Eles valem nos estritos limites objetivos e subjetivos do que enunciam e independentemente das vicissitudes que afetem a relação subjacente que lhes dá causa. Por isso […] a causa de pedir da sua execução consiste no facto aquisitivo do direito à prestação pecuniária – cambiária, diga-se – e não a relação subjacente (causa debendi) correspondente a esse direito.” – Rui Pinto, in “A Acção Executiva”, 2019, Reimpressão, p. 193. O que significa que a exequente/apelada configurou a sua pretensão como uma típica acção cambiária de natureza executiva
Como é sabido, a letra de câmbio, cujo documento deve conter os dados indicados no art. 1º da Lei Uniforme relativa a Letras e Livranças [estabelecida pela Convenção Internacional assinada em Genebra em 07/06/1930, aprovada em Portugal pelo Decreto-Lei nº 23721, de 29/03/1934, e ratificada pela Carta de Confirmação e Ratificação, no suplemento do “Diário do Governo”, nº 144, de 21/06/1934; doravante, denominada LULL], é um título de crédito à ordem (circula por endosso: art. 11º ), sujeito a determinadas formalidades, pelo qual uma pessoa (sacador) ordena a outra (sacado) que lhe pague a si ou a terceiro (tomador) determinada importância, representando, pois, a forma de uma ordem de pagamento.
Como já se adiantou, as letras, enquanto títulos de crédito, têm como traços principais a incorporação da obrigação no título (“a obrigação e o título constituem uma unidade”); a literalidade da obrigação (“a reconstituição da obrigação faz-se pela simples inspecção do título”); a abstracção da obrigação (“a letra é independente da "causa debendi"); a independência recíproca das várias obrigações incorporadas no título (“a nulidade de uma das obrigações que a lei incorpora não se comunica às demais”); e a autonomia do direito do portador (“o portador é considerado credor originário”) – Acórdão do STJ de 03/05/2005, relator Azevedo Ramos (proc. nº 05A1086), acessível em www.dgsi.pt.
Para o que aqui especialmente releva, temos: a literalidade da letra [apenas o que consta na letra delimita o conteúdo do direito nele incorporado; “quer isto dizer que os títulos de crédito são sempre documentos escritos e que das palavras e algarismos escritos no documento (litteris) consta ou resulta o direito nele documentado. O conteúdo e extensão do direito incorporado no título são aqueles que dele constarem escritos. O direito vale precisamente com esses conteúdo e extensão, o que permite a quem examinar o título ter conhecimento completo preciso do direito incorporado possibilita a sua mobilização e circulação” (Pedro Pais de Vasconcelos, in “Direito Comercial, Títulos de Crédito”, AAFDL, 1990, p. 6)]; e a característica de abstracção [a declaração aposta no título dá forma a um novo direito, o direito cartular, independente da relação fundamental. O negócio jurídico cambiário pode preencher diversas funções económico-jurídicas (“a obrigação cambiária pode ser assumida “pro soluto” ou “pro solvendo”, com uma função de garantia ou de pagamento, com ou sem eficácia novadora, e pode ser assumida em face das mais diversas relações jurídicas: compra e venda, mútuo, etc.” – Ferrer Correia, in “Lições de Direito Comercial”, Vol. III Letra de Câmbio, p. 47), não tendo uma causa própria, legalmente típica e é independente da causa que, em cada caso concreto, vise. Ou seja, embora seja abstracto, o negócio cambiário radica sempre numa causa, sucedendo, apenas, que esta é separada daquele, decorrendo não dele próprio, mas de uma convenção subjacente, extra-cartular].
Note-se, ainda, que, à luz dos princípios da abstracção e da incorporação, tendo a exequente apresentado como título executivo duas letras, não estava obrigada a alegar no Requerimento Executivo a relação jurídica subjacente, da qual o título cambiário se abstrai – bastaria invocar, como fez, a qualidade das letras como títulos de crédito e alegar ser portadora das mesmas, respectivos valores, data de vencimento e o seu não pagamento, nem na data do seu vencimento, nem posteriormente.
Como é sabido, estes princípios da incorporação, da literalidade, da autonomia e da abstracção, a que vimos aludindo, apenas são válidos nas denominadas relações mediatas [quando a letra está na posse duma pessoa estranha às convenções extra-cartulares],  mas já não nas relações imediatas [as estabelecidas entre um subscritor e o sujeito cambiário imediato (relações sacador-sacado, sacador-tomador, tomador primeiro endossado, etc.), isto é, nas relações nas quais os sujeitos cambiários o são concomitantemente das convenções extra-cartulares: Abel Delgado, in “Lei Uniforme sobre Letras e Livranças”, em anotação ao art. 17º, apud Ac. STJ. de 13/04/2011, relator Fonseca Ramos, proc. 2093/04.2TBSTB-A.L1.S1].
Nas relações imediatas, a letra não entrou ainda em circulação e as partes são os subscritores da letra, não havendo interesses de terceiros a proteger. Nestas relações (imediatas) tudo se passa como se a obrigação cambiária deixasse de ser literal e abstracta, ficando sujeita às excepções que se fundamentam nessas relações pessoais. Assim, qualquer das partes pode apelar às relações extra-cartulares que estiverem na origem do título cambiário e invocar contra o portador do título que contra ele pretenda exercer o direito cambiário, eventuais excepções resultantes da relação causal que tenha por sujeito aqueles sujeitos cartulares que concomitantemente o são da relação subjacente ou fundamental.
Nas relações mediatas, existem interesses de terceiro em presença, que importa tutelar, pelo que, nessas relações, prevalecem os enunciados princípios da autonomia, da abstracção e da literalidade da relação cambiária, estatuindo o art. 17º da LULL que “as pessoas accionadas em virtude de uma letra não podem opor ao portador as excepções fundadas sobre as relações pessoais delas com o sacador ou com os portadores anteriores, a menos que o portador, ao adquirir a letra, tenha procedido conscientemente em detrimento do devedor”.
Este preceito - alicerçado no princípio res inter alios acta – determina a inoponibilidade das vicissitudes emergentes de relações jurídicas que envolvem o devedor demandado mas não o credor demandante: as “excepções fundadas sobre relações pessoais” dele com outros sujeitos - Carolina Cunha, in “Letras e Livranças - Paradigmas Actuais e Recompreensão de um Regime”, 2012, Almedina, p. 483.
Estas excepções pessoais (que o art. 17º da LULL torna inoponíveis a terceiro não interveniente na relação jurídica de onde promanam) são, segundo os ensinamentos desta Autora (Carolina Cunha), in ob. cit., p. 267 e ss e p. 483 e ss:
(i) as que decorrem da relação fundamental: as denominadas excepções causais. A determinação das vicissitudes da relação subjacente susceptíveis de configurar tais excepções causais (podendo, como tais, ser opostas pelo devedor cambiário no campo das relações imediatas) deverá ser levada a cabo partindo da convenção executiva ou extra-cartular e dependerá dos contornos da situação concreta – ob. cit., p. 268-269. A convenção executiva ou extra-cartular atribui ao devedor o poder potestativo de negar o cumprimento da obrigação cambiária verificadas que estejam determinadas circunstâncias, o que só vale contra o sujeito que tomou parte na convenção que o gerou, sendo inoperante contra terceiros que venham a ocupar a posição de credor cambiário – ob. cit., p. 484;
(ii) as excepções que decorrem de convenções sobre o exercício do direito cartular (respeitam aos impedimentos emergentes de convenções ad hoc sobre o exercício do direito cambiário) – ob. cit., p. 484;
(iii) as excepções que decorrem de relações obrigacionais estranhas ao título estabelecidas entre um devedor cartular e o sujeito que, a dada altura, ingressou na posição de credor cambiário (a circunstância de, num plano totalmente alheio à relação jurídica cartular, o devedor cambiário ser credor do sujeito que concretamente o demanda) – ob. cit., p. 485.
A propósito da (in)oponibilidade de excepções ao portador cambiário, explicita Evaristo Mendes, em “Letra de Câmbio e Direito Comercial centrado na Empresa. O Legado de Paulo Sendin”, in “Estudos em memória do Professor Doutor Paulo M. Sendim”, Lisboa (UCE) 2012, p. 65-66, que existem três tipos de excepções que um obrigado cambiário pode, em tese geral, opor ao portador proponente da acção: (i) excepções absolutas; (ii) pessoais‑absolutas; (iii) pessoais em sentido estrito.
Para o citado Autor:
“As excepções absolutas respeitam à própria Letra em si (pondo em causa todo o título e todas as respectivas operações ou parte delas), podendo ser invocadas por qualquer signatário perante qualquer portador. Assim acontece, por exemplo, se o saque é inválido e «a situação de invalidade não é remediada pela tutela da circulação normal» dos arts. 16.º II e 40.º III.
As excepções pessoais‑absolutas [ou mistas] são aquelas que determinado subscritor (e apenas ele – daí o carácter pessoal) pode opor a todo e qualquer (eventual) portador (absolutas, neste sentido). Exemplos: excepção oponível por incapaz, pelo desapossado de letra ou por subscritor de letra depois alterada («falsificada» – art. 69.º).” [existindo, ainda, esclarece o Autor, “excepções oponíveis por qualquer subscritor a certo portador (máxime, a de falta de legitimidade deste)” (nota 69)].
As excepções pessoais, ainda seguindo o mesmo Autor, “são aquelas que certo subscritor pode, pessoalmente, opor a determinado portador, previstas no art. 17º da LULL, sendo a regra a da inoponibilidade deste tipo de excepções, fora das relações imediatas, ao portador, nos termos deste preceito, tendo, porém, um limite: “a LULL ainda estende a oponibilidade ao portador mediato, quando se verifique a situação especial da parte final do art. 17.º; ou seja, um devedor cambiário pode opor certa excepção pessoal a um terceiro, portador mediato (ao qual esse obrigado não está ligado por relações extracambiárias), se este, ao adquirir o título, na circulação normal, procedeu conscientemente em seu detrimento (agiu com «consciência de prejudicar» o subscritor‑obrigado em causa).”
No caso dos autos, a exequente/apelante é portadora das duas letras, figurando a executada/apelada como aceitante, não existindo entre ambas uma relação extra-cambiária. Donde, é cristalino – e matéria completamente pacífica nos autos - que estamos no campo das relações mediatas.
Assim, de acordo com o que acima deixámos dito e considerando que da factualidade provada não resulta que a exequente/apelante, enquanto portadora, ao adquirir a letra, tenha procedido conscientemente em detrimento do devedor (art. 17º, parte final, da LULL), resulta à saciedade que àquela não lhe poderá ser oposta pela executada/aceitante qualquer tipo de excepção pessoal – quer sejam excepções causais que decorram da relação fundamental; quer decorram de convenções sobre o exercício do direito cartular; quer decorram de relações obrigacionais estranhas às letras estabelecidas entre a executada/devedora cartular e a exequente (cfr. supra os ensinamentos de Carolina Cunha).
Todavia, poderão já à exequente, enquanto portadora das letras, ser-lhe opostas pela executada/aceitante as apelidadas (na terminologia de Evaristo Mendes: cfr. supra)  excepções “pessoais‑absolutas [ou mistas]”.
Feitas estas considerações, urge saber, no caso dos autos, se a assinatura de um dos gerentes da sociedade embargante (sociedade por quotas) a vincula quando resulta do pacto social (cfr. factos provados sob o nº 1) que a forma de obrigar a sociedade é mediante a intervenção dos dois gerentes - representação conjunta maioritária, em consonância, aliás, com o regime legal supletivo de representação na gerência plural, consagrado no art. 261º, nº 1 do Código das Sociedades Comerciais (doravante, CSC).
Consta dos seguintes artigos do CSC (aplicáveis às sociedades por quotas):
- art. 252º, com a epígrafe “Composição da gerência”:
“1 - A sociedade é administrada e representada por um ou mais gerentes, que podem ser escolhidos de entre estranhos à sociedade e devem ser pessoas singulares com capacidade jurídica plena.”;
- art. 260º, com a epígrafe “Vinculação da sociedade”:
“1 - Os actos praticados pelos gerentes, em nome da sociedade e dentro dos poderes que a lei lhes confere, vinculam-na para com terceiros, não obstante as limitações constantes do contrato social ou resultantes de deliberações dos sócios.
2 - A sociedade pode, no entanto, opor a terceiros as limitações de poderes resultantes do seu objecto social, se provar que o terceiro sabia ou não podia ignorar, tendo em conta as circunstâncias que o acto praticado não respeitava essa cláusula e se, entretanto, a sociedade o não assumiu, por deliberação expressa ou tácita dos sócios.
3 - O conhecimento referido no número anterior não pode ser provado apenas pela publicidade dada ao contrato de sociedade.”;
- art. 261º, com a epígrafe “Funcionamento da gerência plural”:
“1 - Quando haja vários gerentes e salvo cláusula do contrato de sociedade que disponha de modo diverso, os respectivos poderes são exercidos conjuntamente, considerando-se válidas as deliberações que reúnam os votos da maioria e a sociedade vinculada pelos negócios jurídicos concluídos pela maioria dos gerentes ou por ela ratificados.”
Parte (minoritária) da doutrina e parte da jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça tem sustentado, com base no citado art. 260º, nº 1 do CSC, que, independentemente da regra legal sobre o funcionamento da gerência plural (art. 261º do CSC), a sociedade fica vinculada perante a intervenção de qualquer gerente, com indicação dessa qualidade, uma vez que a protecção da confiança de terceiro de boa-fé deve prevalecer sobre a tutela dos interesses da sociedade. Ou seja, de acordo com este entendimento, o disposto no art. 260º, nº 1 do CSC prevalece sobre o disposto no art. 261º, nº 1 do mesmo diploma, atribuindo-se primazia aos interesses dos terceiros de boa-fé sobre os interesses da sociedade, relegando-se para as relações internas as consequências inerentes à inobservância das regras da representatividade constantes do pacto social, perspectivando, pois, o art. 261º do CSC como norma interna, sem impacto na vinculação da sociedade. Desta forma, segundo este entendimento, mesmo quando resulta do pacto social que a forma de obrigar a sociedade é mediante a intervenção dos dois gerentes, a assinatura de um único gerente vincula a sociedade perante terceiros.
Cfr., neste sentido, por todos:
- na jurisprudência do STJ: Acórdãos de: 20/05/2004, relator Ferreira de Almeida (proc. nº 04B1522); 23/09/2008, relator Azevedo Ramos (proc. nº 08A2239); e 09/02/2011, relator Lopes do Rego (proc. nº 2971/07.7TBAGD-A.C1.S1) – todos, acessíveis em www.dgsi.pt;
- na doutrina: Paulo Olavo Cunha, in “Direito das Sociedades Comerciais”, 7ª ed., Almedina, Coimbra, 2019, p. 777 e ss; Pedro Pais de Vasconcelos, in “Vinculação das sociedades comerciais”, publicado em “Direito das Sociedades em Revista”, Coimbra, Almedina, Ano 6, v. 12 (novembro 2014), p. 91 e ss; e Rita Albuquerque, in “A vinculação das sociedades anónimas e a limitação dos poderes de representação dos administradores”, publicado em “O Direito”, Ano 2007, nº 1, p. 126-132.
Entende, porém, a maioria da doutrina e parte da jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça que, no que diz respeito à representação orgânica, decorre do citado art. 261º, nº 1 do CSC que, salvo cláusula em sentido diferente do contrato de sociedade, esta só fica vinculada se, no negócio, intervier a maioria dos gerentes ou se esta maioria o ratificar. Assim, consagra a lei a regra (dispositiva) da representação conjunta maioritária dos gerentes. Donde, vigorando, supletiva ou estatutariamente, a conjunção, a sociedade não fica vinculada pelos actos jurídicos praticados por um só gerente, sendo tais actos ineficazes relativamente à sociedade representada, sendo, pois, aquela violação oponível a terceiros que contratem com a mesma. Por outras palavras, o método conjuntivo, se legal ou estatutariamente previsto, não pode ser derrogado.
Sustentando este entendimento, argumenta Jorge Manuel Coutinho de Abreu, in “Curso de Direito Comercial – Das Sociedades”, vol. II, 8ª ed., 2024, Almedina, p. 596-598 [no mesmo sentido, pode, ainda, ser consultada a obra do mesmo Autor: “Diálogos com a jurisprudência: IV - Vinculação de sociedades”, publicado em “Direito das Sociedades em Revista”, Coimbra, Almedina, Ano 6, v. 12 (novembro 2014), p. 95-105] que, no art. 260º, nº 1 do CSC, a referência aos “gerentes” é feita em abstracto; o preceito não diz que basta a intervenção de um gerente, nem diz qual o número dos gerentes intervenientes exigido – isso é dito no art. 261º do CSC. E se, por força deste art. 261º ou de cláusulas estatutárias, os poderes de representação têm de ser exercidos conjuntamente por dois ou mais gerentes, actua sem poderes o gerente que actuar sozinho (não “dentro dos poderes que a lei lhe confere”).
Aduz, ainda, o mesmo Autor, in ob. cit. “Curso de Direito …”, local cit.:
“Por outro lado, não são “limitações constantes do contrato social” (ou “contrato de sociedade”, ou estatuto social) aos poderes dos administradores as prescrições estatutárias segundo as quais a sociedade fica vinculada pelos negócios concluídos pela maioria dos administradores ou por número (plural) inferior. No primeiro caso, a cláusula estatutária repete a regra legal dispositiva (arts. 261º, nº 1, 408º, nº 1) – os administradores ficam (pelos estatutos) com os mesmos poderes que a lei lhes confere; no segundo caso, os administradores ficam com poderes mais extensos do que os conferidos por lei. Somente nos casos em que os estatutos estabelecem conjunção maioritária reforçada ou integral (casos raros na prática, parece…) há limitações (pessoais) aos poderes dos administradores – limitações permitidas com eficácia externa (…) nas sociedades por quotas (…).
Depois, faz pouco sentido apelar aqui aos interesses dos terceiros de boa fé. E os interesses da sociedade acauteláveis pelos métodos da conjunção? De outra banda, não é tarefa espinhosa para terceiros saber quem pode vincular a sociedade (v. o CRCom., art. 70º,1, a), 2 (…), 73º e 74º (…)). O cuidado e esforço exigidos a um terceiro que pretenda confirmar a qualidade de administrador de pessoa que o contacta invocando representar uma sociedade são praticamente os mesmos cuidado e esforço exigidos para se saber por quem fica a sociedade vinculada. Por outro lado ainda, quando vigora a conjunção, é a lei que impede a vinculação social por negócios concluídos por um só administrador (arts. 261º,1, 408º,1); logo, “a confiança de terceiros não pode ser invocada, porque não há confiança legítima contra o que dispõe a lei”.
Ainda quanto à protecção dos interesses dos terceiros de boa fé, como salienta Diogo Pereira Duarte, in “Código das Sociedades Comerciais Anotado, Coordenação de António Menezes Cordeiro, 5ª ed. revista e actualizada, Almedina, 2022, p. 918-919: “(…) como estamos perante um problema de atuação de uma situação jurídica que tem de ser atuada por vários intervenientes, por efeito da lei, o terceiro não fica numa situação pior de que aquela que tem perante um cenário de contitularidade ou até de procuração voluntária conferida a mais do que um procurador: tem de assegurar que estão presentes tantos quantos podem atuar naquela situação jurídica, e pode fazê-lo através de uma análise estritamente objetiva. No limite, terá de saber quantos gerentes tem aquela sociedade, questão sobre a qual pode pedir à sociedade a justificação dos poderes (artigo 260.º do CC), e constatar, em função dessa informação, se a maioria deles teve, ou não, intervenção no ato. Ora isto é completamente diferente da ponderação sobre a extensão dos poderes de representação que ele teria de fazer por interpretação do objeto social e das deliberações internas da sociedade ao abrigo do artigo 260.º, daí se justificando a diferença de proteção de terceiro. Por outro lado, a referência da lei à vinculação da sociedade (“considerando-se /… / a sociedade vinculada /…/”) parece-nos afastar a hipótese de se tratar de qualquer norma de organização com um efeito apenas interno.”.
Cfr. neste sentido – ou seja, vigorando (supletiva ou estatutariamente) a representação conjunta de uma gerência plural, a sociedade não fica vinculada pelos actos jurídicos praticados por um só administrador/gerente (e não ratificados), sendo tais actos ineficazes relativamente à sociedade:
- na jurisprudência do STJ: Acórdãos de: 05/12/2006, relator Urbano Dias (proc. nº 06A3870); e 24/02/2015, relator Pinto de Almeida (proc. nº 580/11.5TBMMN.E1.S1) - ambos, acessíveis em www.dgsi.pt;
- na doutrina: Jorge Manuel Coutinho de Abreu, in “Curso de Direito Comercial – Das Sociedades”, vol. II, 8ª ed., 2024, Almedina, p. 596-598; e in “Diálogos com a jurisprudência: IV - Vinculação de sociedades”, publicado em “Direito das Sociedades em Revista”, Coimbra, Almedina, Ano 6, v. 12 (novembro 2014), p. 95-105; Carolina Cunha, in “Manual de Letras e Livranças”, 2ª ed. revista e actualizada, 2022, Almedina, p. 105, nota 275, e p. 122-124; Tiago Miguel dos Santos Esteves, in “Vinculação das sociedades anónimas e por quotas: notas sobre o seu regime jurídico”, publicado em “Revista de Direito das Sociedades”, Ano II (2010), número 1/2, Almedina, p. 393-395; Diogo Pereira Duarte, in “Código das Sociedades Comerciais Anotado, Coordenação de António Menezes Cordeiro, 5ª ed. revista e actualizada, Almedina, 2022, p. 918-919; e, ainda, entre outros, os seguintes Autores e obras citados por Jorge Manuel Coutinho de Abreu, in ob. cit. “Diálogos …”, p. 98, nota 4: Raúl Ventura, in “Sociedades por quotas”, vol. III, Almedina, 1991, p. 191; A. Soveral Martins, in “Os poderes de representação dos administradores de sociedades anónimas”, Coimbra Editora, 1998, p. 118; Oliveira Ascensão, in “Direito Comercial”, vol. IV, Lisboa, 2000, p. 484; João Espírito Santo, in “Sociedades por quotas e anónimas – Vinculação: objecto social e representação plural”, Almedina, 2000, p. 309, 471-472; P. Tarso Domingues, in “A vinculação das sociedades por quotas no Código das Sociedades Comerciais”, RFDUP, 1, 2004, p. 302; e, F. Cassiano dos Santos, in “Estrutura associativa e parti­cipação societária capitalística”, Coimbra Editora, 2006, p. 312-313, nota 518.
Subscrevemos este último entendimento - e respectiva argumentação -, tal como o fez a sentença recorrida, por só assim não se perder de vista que o art. 261º, nº 1 do CSC [que contém a norma fundamental relativa aos requisitos subjectivos ou pessoais da vinculação/representação activa das sociedades por quotas com órgão de administração plural] consagra, claramente, a regra (dispositiva) da representação conjunta maioritária dos gerentes; sendo que o entendimento diverso (ao sustentar que, mesmo quando resulta do pacto social que a forma de obrigar a sociedade é mediante a intervenção dos dois gerentes, a assinatura de um único gerente vincula a sociedade perante terceiros) institui “um funcionamento disjunto da administração, ao arrepio do modelo legal e comunitário” (como nota criticamente Tiago Miguel dos Santos Esteves, in ob. cit. “Vinculação  …”, p. 393).
Acresce que, o entendimento acolhido acautela suficientemente os interesses legítimos em presença: da sociedade [que se procuram acautelar com o método da conjunção] e dos terceiros, não sendo presentemente difícil para os terceiros saber quem pode vincular a sociedade (recorrendo aos meios previstos na lei para publicidade dos actos sociais), sendo certo, ainda, que os terceiros não estão desonerados de comprovar a identidade e a qualidade de gerente de pessoa que se lhes apresente invocando representar uma sociedade - ora, “um terceiro que assim se certifica, recorrendo designadamente ao registo comercial, em relação ao administrador X, facilmente pode ao mesmo tempo certificar-se em relação a Y ou a Z e à necessidade de estes (ou algum deles) intervirem” (J. M. Coutinho de Abreu, in ob. cit. “Diálogos …”, p. 102).
Donde, vigorando, no caso dos autos, a representação conjunta maioritária (a cláusula estatutária repete a regra legal supletiva prevista no art. 261º, nº 1 do CSC), a sociedade embargante não fica vinculada pelos actos jurídicos praticados por um só gerente (e não ratificados), sendo tais actos ineficazes relativamente à sociedade.
Ora, este vício de falta de poderes de representação societária, decorrente da infracção ao método da representação conjunta pela actuação de um só gerente, subsume-se, de forma manifesta, a uma das supra mencionadas excepções “pessoais‑absolutas [ou mistas]”, ou seja, aquelas que são, segundo a doutrina, oponíveis erga omnes, isto é, oponíveis pelo sujeito a que respeitam a qualquer credor cambiário, independentemente da existência de relações pessoais. Donde, poder ser oposta ao portador cambiário, mesmo que de boa-fé, como é o caso dos autos.
Cfr., neste sentido:
- Carolina Cunha, in “Manual de Letras e Livranças”, 2ª ed. revista e actualizada, 2022, Almedina, p. 105, nota 275 (com sublinhado nosso): “(…) Se o sujeito que assinou a letra ou a livrança não era titular do órgão de administração ou não tinha, por qualquer outra razão (legal ou estatutária), poderes para representar a sociedade, a LU dispõe de mecanismos que permitem solucionar satisfatoriamente o problema: a sociedade, uma vez demandada, poderá excepcionar (mesmo perante terceiros) a ausência de poderes do sujeito que agiu. Será o (eventualmente, falso) gerente ou administrador a responder cambiariamente, nos termos prescritos pelo art. 8º da LU - quer tenha indicado expressa, quer tacitamente a (falsa) qualidade em que agiu.”;
- Evaristo Mendes, in “Letra de Câmbio e Direito Comercial centrado na Empresa. O Legado de Paulo Sendin”, acessível em https://revistas.ucp.pt/index.php/direitoejustica/article/view/9856, p. 64 (com sublinhados nossos): “9.2. A realização de uma operação cambiária por representante sem poderes torna o acto ineficaz, no sentido de não ser imputável ao falso representado e, portanto, caindo a Letra no regresso, de não o constituir obrigado de regresso. Se estiver em causa o aceite, por exemplo, nem a Letra se encontra aceite, nem o falso representado responde por ela. O mesmo se diga do saque, de um endosso, etc. / Aplica‑se então o princípio da independência recíproca do artigo 7.º, quanto aos demais actos e obrigações («supra»). Todavia, a Lei reforça aqui a posição do portador‑credor, acrescentando à cadeia de responsáveis o pseudo‑representante (subscritor do título embora nomine alieno) (art. 8.º).”;
Também no Acórdão do TRP de 09/10/2006, relator Jorge Manuel Vilaça Nunes (proc. nº 0654321), acessível em www.dgsi.pt, se sustenta que (sublinhado nosso): “Se no pacto social de uma sociedade de quotas, consta que a sociedade só se vincula pela assinatura dos seus dois gerentes e se a letra exequenda apenas contém uma assinatura feita por um dos gerentes, a sociedade não se acha vinculada por aquela assinatura, facto que é oponível por ela a terceiro portador do título cambiário.”
O que significa que, a invocação do vício suscitado pela embargante - quanto à falta de poderes de representação do seu gerente que assinou as letras desacompanhado do outro gerente - não se inclui no regime do art. 17º da LULL; situando-se, antes, no domínio do art. 8º da LULL. Como salienta Soveral Martins, in “Títulos de crédito e valores mobiliários, Parte I – Títulos de crédito, Vol. I – I. Dos títulos de crédito em geral, II. A letra”, Almedina, Coimbra, 2008, p. 50, este último preceito aplica-se aos casos em que o sujeito apõe a sua assinatura “como representante voluntário (v.g., como procurador)”, e aos casos em que actua como “representante legal ou como representante orgânico (por exemplo, como gerente ou administrador de uma sociedade comercial)”.
A este propósito, refere, ainda, Catarina Cunha, in ob. cit. “Manual de Letras e Livranças”, p. 122-124 (sublinhado nosso):
“(…) o art. 8º LU aplica-se à subscrição da letra ou livrança por um falsus procurator, i.e., por um representante que "não tinha, de facto, poderes" ou "que tenha excedido os seus poderes". (…) O art. 8º não pretende tutelar a confiança numa aparência (pois os efeitos da declaração cambiária não vão produzir a vinculação do aparente dominus negotii)344, mas sim restabelecer, através da adição de um património responsável (de um sujeito diferente do dominus negotii), alguma confiança no plano da circulação do título345. O que o legislador uniforme faz é responsabilizar directamente o representante sem poderes pelo cumprimento da obrigação destinada ao representado - ou seja, é tratá-lo como se fosse o autor, em nome próprio, da declaração cambiaria emitida em nome de outrem346. / Poderá não ser uma solução ideal para o terceiro confiante: pelo menos em face da aparência documentada no título, não foi nisso que imediatamente confiou347. Aliás, se depositava expectativas quanto à vinculação do aparente representado (v.g., por ser alguém de conhecida solvência), sairá defraudado e até prejudicado348. Mas é sem dúvida um importante paliativo do ponto de vista do reforço da sua posição enquanto credor cambiário: ao contrário do que sucede nas restantes hipóteses mencionadas no art. 7º LULL, aqui a ausência de vinculação de um dos putativos obrigados cambiários é compensada pela vinculação de outrem no seu lugar. (…) Se por força das regras legais (arts. 261º, 1 e 408º, 1 CSC, que estabelecem a regra da conjunção maioritária para a representação activa das sociedades por quotas ou anónimas) ou de cláusula estatutária (que repita o comando legal ou estabeleça outro número plural) "os poderes de representação têm de ser exercidos conjuntamente por dois ou mais administradores", então "actua sem poderes o administrador que actua sozinho - ou seja, para efeito do disposto nos arts. 261º, 1 e 408º, 1 CSC, não actua "dentro dos poderes que a lei lhe confere")349. / Estaremos, portanto, em face de uma situação subsumível aos quadros do art. 8º LULL - e, por carência de poderes para representar a sociedade em cujo nome subscreveu o título cambiário, ficaria o gerente ou administrador pessoalmente vinculado ao pagamento da letra ou livrança que assinou.”.
De igual forma, conclui Jorge Manuel Coutinho de Abreu, in ob. cit. “Diálogos …”, p. 104-105 (sublinhados nossos): Se um administrador subscreve uma letra ou uma livrança em nome da sociedade, mas sem poderes para a vincular por infração ao método de representação conjunta nela vigente, a sociedade não fica obrigada cambiariamente. / Mas fica obrigado o administrador. É o que resulta dos arts. 8º e 77º da LULL.”
Donde, a improcedência da argumentação recursória da apelante, que se baseou na (alegada) inoponibilidade daquele vício à apelante, enquanto portadora de boa fé.
Desta forma, e mais nenhuma questão tendo sido suscitada nas conclusões recursórias, resta concluir pela manutenção da decisão recorrida, cujo entendimento – como deixámos dito - subscrevemos, ou seja: vigorando no caso dos autos uma situação de representação conjunta da gerência plural, a sociedade executada não ficou vinculada pelas assinaturas apostas nas letras apenas por um dos seus dois gerentes, sendo certo que tais actos jurídicos não foram ratificados por aquela e não se verifica uma conjuntura subsumível a uma situação de abuso de direito (cfr. factualidade provada). Em suma, tais assinaturas apostas nas letras apenas por um dos gerentes da sociedade executada/embargante são ineficazes relativamente à mesma, o que é oponível à portadora cambiária/exequente.
Por todo o exposto, improcede a apelação.
*
As custas devidas pela presente apelação são da responsabilidade da apelante - cfr. art. 527º, nºs 1 e 2 do Cód. Proc. Civil e art. 1º, nºs 1 e 2 do Regulamento das Custas Processuais.
V. DECISÃO
Pelo exposto, acordam os juízes desta 7.ª Secção do Tribunal de Relação de Lisboa, em julgar a presente apelação improcedente, e, em consequência, manter a decisão recorrida.
Custas pela apelante
*
Lisboa, 4 de Junho de 2024
Cristina Silva Maximiano
Carlos Oliveira (com voto vencido anexo)
Ana Rodrigues da Silva

Voto vencido
«Entendo que o Art. 8.º da LULL não se aplica ao caso concreto, porque quem subscreveu a letra como aceitante foi um sócio gerente invocando a qualidade de gerente da sociedade aceitante.
Os atos praticados pelos gerentes vinculam a sociedade que representam (cfr. Art. 260.º n.º 1 e n.º 3 do CSC).
O terceiro credor não está obrigado a saber que a sociedade tem mais de um gerente, ou que a sociedade só se obriga com a assinatura de todos os gerentes (cfr. Art. 260.º n.º 2 do CSC), mesmo que em causa esteja a simples aplicação do regime supletivo estabelecido no Art. 261.º do CSC.. Para mais, porque, nos termos do Art. 260.º n.º 3 do CSC, estabelece-se que não basta para este efeito ser invocada a publicidade ao pacto social no registo comercial.
Por isso, deve ser à sociedade devedora (aceitante) que compete provar que o terceiro, legítimo portador da letra, sabia ou não podia ignorar que a sociedade só se obrigaria com a assinatura conjunta de outro gerente (cfr. Art. 260.º n.º 2 do CSC).
A lei protege assim o terceiro de boa-fé, no âmbito das relações mediatas, quer por força do Art. 17.º da LULL, quer por força do Art. 260.º do CSC.. Nessa medida, julgaria a apelação procedente e revogaria a sentença recorrida.»

Carlos Oliveira