Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | MARIA DO ROSÁRIO MORGADO | ||
Descritores: | DANOS NÃO PATRIMONIAIS MONTANTE | ||
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Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 09/30/2014 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Texto Parcial: | N | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | PARCIALMENTE PROCEDENTE | ||
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Sumário: | 1. A par da ressarcibilidade dos danos patrimoniais, na fixação da indemnização deve, como se sabe, atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito – art. 496º, n.º 1, do CC.
2. O seu montante será fixado equitativamente pelo tribunal tendo em conta as circunstâncias referidas no art. 494º, do CC (art. 496º, n.º 3, do CC), ou seja, o grau de culpabilidade do agente, a situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias do caso, entre as quais se contam as lesões sofridas e os correspondentes sofrimentos, não devendo esquecer-se ainda, para evitar soluções demasiadamente marcadas pelo subjetivismo, os padrões de indemnização geralmente adotados na jurisprudência. 3. Importa, essencialmente, garantir que a compensação por danos não patrimoniais, para responder actualisticamente ao comando do artigo 496º, do CC, e constituir uma efetiva possibilidade compensatória, seja significativa de forma a viabilizar um lenitivo para os danos suportados e, porventura, a suportar. 4. A fixação da indemnização deve, sobretudo, dar particular relevo à gravidade das consequências danosas do evento. | ||
Decisão Texto Parcial: | ![]() | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa
1. LJ instaurou a presente ação declarativa de condenação, com processo ordinário, contra “L, S.A.” pedindo que a ré seja condenada a pagar-lhe: - EUR 38.37, a título de indemnização, por danos patrimoniais; - EUR 25.000,000[1], a título de indemnização, por danos não patrimoniais; - EUR 400,00, a título de indemnização provisória, por danos futuros. Para tanto, alegou, em síntese, que, em 3/5/2006, ocorreu um embate entre o veículo por si conduzido e um veículo conduzido pelo segurado da ré, por ter desrespeitado as regras estradais, deve ser considerado culpado pela produção do acidente. 2. A ré contestou. Em síntese, considera que os valores peticionados a título de indemnização são excessivos. Além disso, sendo o acidente simultaneamente de viação e de trabalho, deve ter-se em conta que o autor já recebeu da respectiva seguradora, a título de indemnização, por danos patrimoniais, o capital correspondente à remição de uma pensão anual e vitalícia. 3. Realizado o julgamento, foi proferida sentença que, julgando a ação parcialmente procedente, condenou a R. a pagar ao A. a quantia de EUR 7.504,62 (sendo EUR 7.500,00, a título de danos não patrimoniais), acrescida de juros de mora à taxa legal, vencidos e vincendos desde a citação e até integral pagamento. 4. Inconformado, apela o autor e, em conclusão, diz: Entendeu o Tribunal “ a quo “, não ter resultado provado, que as sessões de fisioterapia correspondam a 22 sessões diárias. No nosso modesto entendimento não se entende como chegou o Tribunal “a quo“ a essa conclusão, na medida em que existe prova documental junta aos autos pela Ré, que indicam que o Autor não só foi só sujeito a secções de fisioterapia, como também foi sujeito a tratamentos de mesoterapia (relatório médico do Centro Hospitalar de Lisboa, datado de 29 de Outubro de 2012), junto com a Ref.: 19913778. Também, entendeu o Tribunal “a quo“, não dar como provado que o Autor se tivesse sujeitado a uma intervenção cirúrgica, onde mais uma vez se encontra junto aos autos documento junto pela Ré sob Ref.: 19913778, elaborado pelo Hospital de S…, onde é expressamente referido que o Autor, não só foi operado uma vez, mas sim duas vezes, uma ao cubital direito e outra a STC à direita em 2010. Acrescenta ainda o referido relatório que as alterações encontradas na neurografia do mediano direito podem persistir indefinidamente. Acresce que o Autor, esteve de baixa durante o período de 22-04-2009 a 28-11-2012, não tendo nesse tempo auferido nenhum valor a título de baixa, sendo que se encontrou sem nenhum tipo de rendimentos, conforme documentos também juntos pelo Autor em 22/11/2013. Sendo que, em 04-12-2012, foi o Autor internado novamente no Hospital LS a fim de ser operado. E tal aconteceu, na medida em que o Autor não se encontrando melhor, solicitou novamente ao Tribunal de Trabalho de S… a intervenção da seguradora. Dessa forma, ficou novamente com uma Incapacidade Temporária Absoluta desde 28-11-2012 até 01-07-2013, sendo que a partir dessa data foi-lhe dada alta, ficando com uma Incapacidade Temporária Parcial de 30%. E, mais, o Tribunal “a quo“, só considerou que o Autor se encontrou limitado para a sua atividade profissional durante o período de 03/05/2006 a 12/06/2007, onde em bom rigor o mesmo esteve limitado durante o período de 22-04-2009 a 01-07-2013, período este que passou novamente a ter alta com uma incapacidade de 30%. Também, foi entendimento do Tribunal “a quo “ que as despesas enunciadas em 19 a 40 dos factos provados não correspondiam às satisfações médicas e medicamentosas referidas em 16 dos factos provados. Vejamos, no ponto 16 dos factos dados como provados, refere-se que “para ultrapassar tais dores e sofrimento o Autor tem necessidade de recorrer regularmente a medicamentos analgésicos, antiespasmódicos ou antipilépticos, podendo ainda beneficiar de tratamentos de fisioterapia para alívio desses sintomas, e carecendo ainda de ser vigiado pela especialidade médica da ortopedia. Acontece, que os documentos juntos correspondem na realidade a tratamentos e consultas de forma e ultrapassar as dores, nomeadamente mesoterapia, conforme documento junto pela Ré sob a ref. 19913778 onde consta relatório do Centro Hospitalar de Lisboa, onde é referido e indicado o tratamento através da mesoterapia. Desta forma, o valor em que a Ré foi condenada a título de indemnização no montante de EUR 7.500,00 é de todo um valor muito abaixo, ao que de facto deveria ter sido atribuído face ao sofrimento psicológico, às dores físicas, estados de ansiedade, de angústia e demais estados de afetação psicológica. O Autor fez prova de que esteve durante os períodos de 22-04-2009 a 01-07- 2013, sem poder exercer a sua atividade profissional, também se encontra junto aos autos recibo de vencimento no montante de €1.350,00, que revela o nível de vida a que o Autor estava habituado e o quanto a ocorrência do acidente alterou a mesma. Em sequência do que foi explanado o Autor sentiu-se bastante deprimido, angustiado e preocupado com o seu futuro, na medida em que deixou de auferir o que estava habituado a auferir. Sendo, que após o acidente de viação a vida do Autor mudou, e fez com que o mesmo tivesse grande sofrimento psicológico. Sendo que tal sofrimento é susceptível de ser indemnizável. Devendo, assim a indemnização corresponder ao peticionado pelo Autor, no montante de EUR 25.000,00. No caso em apreço, entendemos que não foram apreciados os documentos onde constam os períodos em que o Autor esteve sem trabalhar, bem como os danos psicológicos, familiares e sociais advindos de tal situação. Isto, porque o Autor não auferiu nenhum subsídio por parte da Segurança Social durante esse período. Sendo que tais documentos foram juntos aos autos pelo Autor em 22/11/2013, comprovando dessa forma os períodos em que o mesmo esteve impossibilitado de exercer a sua atividade profissional. Entende-se que a interpretação feita pelo Tribunal “a quo“, não fez jus à realidade sofrida pelo Autor, que em sequência do acidente de viação sofrido teve, tem e terá sequelas para o resto de sua vida, tendo tais sequelas causado prejuízos irreparáveis ao Autor, visto que o mesmo em sequência do referido acidente mudou como o mesmo passou a ver o seu futuro, passando a ser com muita incerteza, angústia, sem no entanto ter sido o próprio a causar tal situação. E, por tudo o que foi explanado, entende-se que a indemnização atribuída a título de danos não patrimoniais pelo Tribunal “ a quo “ não é suficiente de forma a proporcionar ao Autor a alegria ou satisfação que, de algum modo, possam contrabalançar as dores, desilusões, desgostos ou outros sofrimentos tidos em sequência do acidente. Assim, é de concluir que o Autor deve ter uma compensação adequada às sequelas decorrentes do acidente que sempre o afetarão, sendo que é para esse fim que deve servir o constante aumento dos prémios dos seguros Assim, atendendo a todos os factos que resultaram provados e especialmente, à culpa do lesante, ao grau de incapacidade e à idade do Autor, entendemos que o valor adequado para ressarcir os danos sofridos pelo Autor, a título de indemnização por danos não patrimoniais será o montante de EUR 25.000,00. 5. Nas contra alegações, pugna-se pela manutenção da sentença recorrida. 6. Os factos 6.1. É a seguinte a factualidade dada como provada: 1. Em …/5/2006, pelas 13.15 h., ocorreu um acidente de viação, que consistiu numa colisão lateral na R. …, entre os veículos de matrícula …-…-…, conduzido pelo A., e …-…-…. (acordo das partes) 2. O A. circulava na R. D. A.., no sentido Av. S. …, e ao aproximar-se do cruzamento com a R. …, foi surpreendido pelo AG, que circulava nessa rua. (acordo das partes) 3. O AG apresentou-se pelo seu lado esquerdo, não respeitando o sinal de prioridade que se apresentava na sua faixa. (acordo das partes) 4. Resultou dessa forma o embate com o MF, ficando o AG encostado à parte lateral do condutor do MF. (acordo das partes) 5. À data do acidente a responsabilidade civil por danos causados a terceiros, emergentes da circulação do veículo com a matrícula …-…-…, mostrava-se transferida para a R., através de contrato de seguro titulado pela apólice …. (acordo das partes) 6. A reparação do MF foi realizada, tendo a R. suportado o pagamento do valor da mesma à sociedade “RT, Ld.ª”, proprietária do veículo. (acordo das partes) 7. No processo especial emergente de acidente de trabalho com o nº …, que correu termos no Tribunal de Trabalho de S…, foi aí atribuída ao A. uma I.P.P. de 8%. (acordo das partes) 8. Nesse processo o A. invocou um rendimento mensal de € 389,50, pela sua atividade de estofador/sócio gerente da sociedade “RT, Ld.ª”, tendo sido acordado que a sua seguradora de acidentes de trabalho, “FM”, lhe pagaria o capital de remição de uma pensão anual e vitalícia de € 302,55, capital que o A. recebeu em 28/4/2008. (acordo das partes) 9. Em 27/5/2009 a “FM” apresentou à R. o pedido de reembolso do montante global de € 11.229,62, respeitante às obrigações assumidas para com o A., nos termos que melhor consta do documento 3 junto com a contestação (fls. 118) e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido. (acordo das partes) 10. Em 3/6/2009 a R. reembolsou a “FM” de tal valor. (acordo das partes) 11. Depois do acidente o A. foi assistido no Hospital de …, onde lhe foi diagnosticado traumatismo cervical e lhe foi colocado um colar cervical. 12. Na sequência do acidente, o A. teve de se submeter a sessões de fisioterapia. 13. Na sequência do acidente o A. passou a padecer de dores ao nível do ombro direito, agravadas com a realização de esforços, tendo por isso sido sujeito a infiltrações no mesmo ombro direito. 14. Após o acidente e até 12/6/2007, data em que as lesões sofridas em consequência do acidente foram consideradas consolidadas, e em consequência das mesmas, o A. viu condicionada a sua autonomia na realização dos atos inerentes à sua atividade profissional habitual de estofador. 15. Após a consolidação das lesões sofridas no acidente, e em consequência das mesmas, o A. continuou e continua a sofrer de dores no ombro direito, que não o afetam em termos de autonomia e independência nas atividades da vida diária, incluindo as familiares e sociais, mas que lhe causam sofrimento físico e o obrigam a esforços suplementares no exercício da sua atividade profissional habitual de estofador. 16. Para ultrapassar tais dores e sofrimento físico o A. tem necessidade de recorrer regularmente a medicamentos analgésicos, antiespasmódicos ou antiepilépticos, podendo ainda beneficiar de tratamentos de fisioterapia para alívio desses sintomas, e carecendo ainda de ser vigiado pela especialidade médica da ortopedia. 17. Antes do acidente o A. era uma pessoa alegre, ativa e saudável, que exercia a sua atividade profissional de modo pleno, gerindo sozinho a sua empresa, angariando clientes e procedendo à elaboração dos orçamentos. 18. Em 21/9/2007 o A. despendeu a quantia de € 4,62 com medicação. 19. Em 20/2/2008 o A. despendeu a quantia de € 19,65 com a realização de um eletromiograma. 20. Em 23/12/2008 o A. despendeu a quantia de € 2,15 com uma consulta de ortopedia. 21. Entre 9/12/2008 e 3/12/2012 o A. despendeu € 95,90 com 28 consultas de medicina familiar na extensão de …do Centro de Saúde de …. 22. Em 20/1/2009 o A. despendeu a quantia de € 2,15 com uma consulta de ortopedia. 23. Em 11/5/2009 o A. despendeu a quantia de € 16,67 com uma infiltração articular. 24. Em 13/7/2009 o A. despendeu a quantia de € 2,20 com uma consulta de ortopedia. 25. Em 15/7/2009 o A. despendeu a quantia de € 9,65 com a realização de análises clínicas. 26. Em 18/8/2009 o A. despendeu a quantia de € 0,40 com a realização de análises clínicas. 27. Em 24/11/2009 o A. despendeu a quantia de € 2,20 com uma consulta de ortopedia. 28. Em 15/11/2011 o A. despendeu a quantia de € 4,60 com uma consulta externa no Centro Hospitalar de …, E.P.E. 29. Em 13/1/2012 o A. despendeu a quantia de € 14,00 com a realização de uma eletromiografia. 30. Em 27/1/2012 o A. despendeu a quantia de € 7,50 com uma consulta externa no Centro Hospitalar de …, E.P.E. 31. Em 3/2/2012 o A. despendeu a quantia de € 42,00 com a realização de uma ressonância magnética da coluna cervical. 32. Em 23/3/2012 o A. despendeu a quantia de € 6,00 com a realização de uma ecografia articular. 33. Em 23/3/2012 o A. despendeu a quantia de € 7,50 com uma consulta externa no Centro Hospitalar de …, E.P.E. 34. Em 29/5/2012 o A. despendeu a quantia de € 9,50 com uma consulta externa e com uma sessão de mesoterapia no Centro Hospitalar de …, E.P.E. 35. Em 31/5/2012 o A. despendeu a quantia de € 93,00 para pagamento de 15 sessões de fisioterapia. 36. Em 14/6/2012 o A. despendeu a quantia de € 9,50 com uma consulta externa e com uma sessão de mesoterapia no Centro Hospitalar de …, E.P.E. 37. Em 29/6/2012 o A. despendeu a quantia de € 94,50 para pagamento de 15 sessões de fisioterapia. 38. Em 31/7/2012 o A. despendeu a quantia de € 9,50 com uma consulta externa e com uma sessão de mesoterapia no Centro Hospitalar de …, E.P.E. 39. Em 11/9/2012 o A. despendeu a quantia de € 9,50 com uma consulta externa e com uma sessão de mesoterapia no Centro Hospitalar de …, E.P.E. 40. Em 20/11/2012 o A. despendeu a quantia de € 9,50 com uma consulta externa e com uma sessão de mesoterapia no Centro Hospitalar de L…, E.P.E. 41. O A. nasceu em 12/3/1967 (certidão de assento de nascimento junta pelo A. em 17/11/2009 – fls. 47 a 49) 6.2. Não foi dado como provado que: As sessões de fisioterapia referidas em 12. dos factos provados corresponderam a 22 sessões diárias; Em consequência do acidente o A. teve de se sujeitar a uma intervenção cirúrgica; Em consequência do acidente e até ao presente o A. não conseguiu recuperar de modo pleno a total mobilidade e destreza física; Em consequência do acidente e até ao presente o A. não consegue assinar o nome como o fazia antes do acidente; As despesas mencionadas em 19. a 40 dos factos provados correspondam à satisfação das necessidades médicas e medicamentosas referidas em 16. 7. Cumpre apreciar e decidir. 8. Da alteração da decisão de facto Invocando a prova documental produzida, o apelante pretende que se dê como provada a seguinte factualidade (que o tribunal a quo considerou «não provada»): - As sessões de fisioterapia referidas em 12. dos factos provados corresponderam a 22 sessões diárias; - Em consequência do acidente o A. teve de se sujeitar a uma intervenção cirúrgica; - O autor manteve-se limitado para o exercício da sua atividade profissional no período de …-04-2009 a …-07-2013; - As despesas mencionadas em 19. a 40 dos factos provados correspondem à satisfação das necessidades médicas e medicamentosas referidas em 16. Não tem, porém, razão. Com efeito, a prova documental invocada (essencialmente documentação clínica e recibos de despesas) – atento o seu teor - não permite estabelecer o indispensável nexo causal entre o(s) facto(s) alegado(s) e o evento danoso. Note-se que a maior parte (ou mesmo a totalidade) dos documentos juntos aos autos tem data posterior à da consolidação das lesões sofridas pelo autor em consequência do acidente, o que, na ausência de outros elementos probatórios, permite razoavelmente suscitar dúvidas sobre se as quantias despendidas têm alguma conexão com os danos emergentes do acidente. Por outro lado, o apelante parece esquecer que sobre a matéria impugnada foi (também) produzida prova pericial e testemunhal, a qual - como se refere na motivação da decisão de facto – não fornece base factual suficiente para modificar o sentido da decisão de facto. Mantém-se, assim, inalterada a decisão proferida quanto à matéria de facto, a qual se encontra bem fundamentada, mostrando-se também coerente, não se evidenciando qualquer erro de apreciação e de valoração das provas que deva ser corrigida por esta Relação. Improcede, pois, o recurso de facto. 9. Danos não patrimoniais Não vem questionada no recurso a questão da verificação in casu dos pressupostos do dever de indemnizar no contexto da responsabilidade civil extracontratual, a saber: facto, ilicitude, culpa, dano e nexo de causalidade entre o facto e o dano (artigos 483º e 487º, nº2, do Código Civil). O apelante discorda apenas do montante arbitrado para ressarcir os danos não patrimoniais sofridos, pretendendo que, a este título, se condene a ré a pagar-lhe EUR 25.000,00. Vejamos, pois. A par da ressarcibilidade dos danos patrimoniais, na fixação da indemnização deve, como se sabe, atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito – art. 496º, n.º 1, do CC. O seu montante será fixado equitativamente pelo tribunal tendo em conta as circunstâncias referidas no art. 494º, do CC (art. 496º, n.º 3, do CC), ou seja, o grau de culpabilidade do agente, a situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias do caso, entre as quais se contam as lesões sofridas e os correspondentes sofrimentos, não devendo esquecer-se ainda, para evitar soluções demasiadamente marcadas pelo subjetivismo, os padrões de indemnização geralmente adotados na jurisprudência. Importa, essencialmente, garantir que a compensação por danos não patrimoniais, para responder actualísticamente ao comando do artigo 496º, do CC, e constituir uma efetiva possibilidade compensatória, seja significativa de forma a viabilizar um lenitivo para os danos suportados e, porventura, a suportar. A respeito das circunstâncias referidas no art. 494º, do CC, subscrevemos o entendimento perfilhado pelo Acórdão do STJ de 22 Outubro 2009 (JusNet 6042/2009) onde se pode ler: «É de afastar a referência à situação económica do lesado, por violação do princípio da igualdade, consignado no artigo 13.º da CRP, merecendo ainda atenção o texto, a tal propósito, de Maria Veloso, em Comemorações aos 35 Anos do Código Civil, III, 542. Aliás, o 12.º princípio da Resolução n.º 7/75, de 14.3. do Conselho da Europa (cujo texto se pode ver em Armando Braga, A Reparação do Dano Corporal na Responsabilidade Extracontratual, 295) já consigna que o cálculo da indemnização, por danos não patrimoniais, deve ser independente da situação económica da vítima.» Em nosso entender, a fixação da indemnização deve, sobretudo, dar particular relevo à gravidade das consequências danosas do evento. Concentremo-nos, então, no caso sub judice: Depois do acidente o A. foi assistido no Hospital de Santa Maria, onde lhe foi diagnosticado traumatismo cervical e lhe foi colocado um colar cervical. Na sequência do acidente, o A. teve de se submeter a sessões de fisioterapia e passou a padecer de dores ao nível do ombro direito, agravadas com a realização de esforços, tendo por isso sido sujeito a infiltrações no mesmo ombro direito. Até 12/6/2007, data em que as lesões sofridas em consequência do acidente foram consideradas consolidadas, e em consequência das mesmas, o A. viu condicionada a sua autonomia na realização dos atos inerentes à sua atividade profissional habitual de estofador. Após a consolidação das lesões sofridas no acidente, e em consequência das mesmas, o A. continuou e continua a sofrer de dores no ombro direito, que não o afetam em termos de autonomia e independência nas atividades da vida diária, incluindo as familiares e sociais, mas que lhe causam sofrimento físico e o obrigam a esforços suplementares no exercício da sua atividade profissional habitual de estofador. Para ultrapassar tais dores e sofrimento físico o A. tem necessidade de recorrer regularmente a medicamentos analgésicos, antiespasmódicos ou antiepilépticos, podendo ainda beneficiar de tratamentos de fisioterapia para alívio desses sintomas, e carecendo ainda de ser vigiado pela especialidade médica da ortopedia. Antes do acidente o A. era uma pessoa alegre, ativa e saudável, que exercia a sua atividade profissional de modo pleno, gerindo sozinho a sua empresa, angariando clientes e procedendo à elaboração dos orçamentos. No Tribunal de Trabalho, no âmbito de um processo de acidente de trabalho que ai correu termos, foi atribuída ao A. uma I.P.P. de 8%. Sendo este o quadro factual que importa considerar para efeitos da fixação da peticionada indemnização, afigura-se-nos que para compensar equitativamente o autor pelos danos não patrimoniais sofridos deve ser arbitrada a quantia de EUR 20.000,00. 10. Nestes termos, concedendo parcial provimento ao recurso, acorda-se em condenar a ré a pagar ao autor a quantia de EUR 20.000,00, a título de compensação por danos não patrimoniais, no mais se confirmando a sentença recorrida. Custas na proporção do decaimento. Lisboa, 30-09-2014 Maria do Rosário Morgado Rosa Maria Coelho Maria Amélia Ribeiro [1] [1]Cf.requerimentoe fls 35 e despacho de fls. 37. |