Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | RUI VOUGA | ||
Descritores: | EXECUÇÃO | ||
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Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 10/23/2012 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | IMPROCEDENTE | ||
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Sumário: | 1. No processo de execução, passado o momento do despacho liminar, é ainda possível ao juiz vir a conhecer, até ao primeiro acto de transmissão de bens penhorados (venda, adjudicação, entrega de dinheiro) ou, por extensão, de consignação dos respectivos rendimentos, de qualquer das questões que, nos termos do art. 812º-E, nºs 1 a 4, do CPC, podiam ter conduzido ao convite ao aperfeiçoamento ou ao indeferimento liminar do requerimento executivo (art. 820º do mesmo diploma). 2. Porém, a mera circunstância de a fórmula executória ter sido, porventura, indevidamente aposta no requerimento de injunção (porque, por exemplo, o requerido deduziu tempestivamente oposição que, todavia, não foi, indevidamente, tomada em consideração), não constitui, em si mesma, um caso de falta ou insuficiência do título executivo, passível de ditar o indeferimento liminar do requerimento executivo (nos termos do cit. art. 812º-E, nº 1, al. a)). 3. Efectivamente, desde que o requerimento executivo se mostre acompanhado do requerimento de injunção no qual tenha sido aposta (bem ou mal) a fórmula executória, nunca se poderá sustentar que inexiste ou é insuficiente o título executivo. 4. Dito isto, não pode negar-se ao executado a possibilidade de alegar e provar (em sede de oposição à execução) que, afinal, contrariamente à aparência resultante do exame visual do título executivo no qual se funda a execução, foi por ele tempestivamente deduzida Oposição ao requerimento de injunção, tendo, por isso, sido indevidamente aposta a fórmula executória. 5. Na verdade, o disposto no nº 1 do art. 814º do CPC acerca dos fundamentos que legitimam a oposição à execução baseada em sentença, aplica-se, com as necessárias adaptações, nos termos do nº 2 do mesmo preceito, à oposição à execução fundada em requerimento de injunção no qual tenha sido aposta a fórmula executória, desde que o procedimento de formação deste título executivo admita oposição pelo requerido. 6. Ora, a hipótese em que a fórmula executória é aposta no requerimento executivo a despeito do facto de o requerido ter deduzido tempestivamente oposição, é equiparável ao caso contemplado na al. b) do cit. nº 1 do art. 814º: falsidade total do processo de declaração ou, pelo menos, falsidade da sentença. 7. Porém, num tal cenário, o executado só pode obter ganho de causa, na oposição por si deduzida à execução, se lhe não for imputável, a nenhum título, a desconsideração, pelo Balcão Nacional de Injunções, da Oposição que o Requerido ora Executado/Opoente remeteu pelo correio àquele organismo, com destino a ser junta ao procedimento injuntivo que ali fora instaurado contra si pelo ora Exequente. 8. Tal não sucede se o ora Executado/Opoente identificou erroneamente o processo a cuja injunção se pretendeu opor, apondo no seu articulado de oposição um nº correspondente a um outro procedimento de injunção no qual também era requerido. 9. De facto, a responsabilidade pelo envio de peças processuais recai sobre a parte que as remete e não sobre os destinatários destas. Sobre o Balcão Nacional de Injunções não recai qualquer dever de diligenciar no sentido de verificar a regularidade das peças processuais que lhe são remetidas (pelo correio ou por qualquer outra via), nem de providenciar para que a parte seja informada dos lapsos porventura existentes nas mesmas peças. 10. Ademais, o lapso em questão não configura sequer um lapso manifesto, ostensivo, designadamente se se tiver em linha de conta que o ora Executado também era parte (enquanto Requerido) naqueloutra Injunção a que, alegadamente, endereçou a sua Oposição. 11. Tão pouco se tratou de um mero lapso de escrita, já que a errónea identificação do nº do processo a que respeita o articulado de Oposição remetido pelo correio ao Balcão Nacional de Injunções não é imediatamente perceptível pelo destinatário. 12. Por isso, não era minimamente exigível que o Balcão Nacional de Injunções questionasse a bondade ou a oportunidade de um articulado que lhe estava a ser remetido por alguém que era, efectivamente, parte no procedimento de Injunção cujo número constava do articulado em causa, nada permitindo concluir, e muito menos de imediato, que tal articulado se destinaria a outro procedimento de Injunção. Neste quadro factual, com os dados de que dispunha, não competia ao Balcão Nacional de Injunções providenciar oficiosamente pela rectificação do que quer que fosse, mas tão só conferir força executiva ao requerimento de Injunção - como fez -, perante a constatação de que o Requerido ora Executado/Opoente não endereçara ao respectivo processo nenhum articulado de Oposição. 13. Assim, sendo exclusivamente imputável à falta de diligência e cuidado do Requerido ora Executado/Opoente o extravio do articulado de Oposição por ele alegadamente remetido, pelo correio, ao Balcão Nacional de Injunções, com a finalidade de ser junto ao procedimento de injunção contra si instaurado pelo ora Exequente, nada há a censurar àquele Balcão, no que toca à aposição da fórmula executória no requerimento injuntivo apresentado pela aqui Exequente/Apelada e, consequentemente, improcede a Oposição deduzida contra a Execução fundada em requerimento de injunção no qual tenha sido aposta a fórmula executória, tendo por único fundamento a alegação de que essa fórmula executória teria sido indevidamente aposta porque se extraviou a oposição oportunamente deduzida ao requerimento de injunção, pelo motivo supra indicado. (Sumário do Relator) | ||
Decisão Texto Parcial: | ![]() | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam na Secção Cível da Relação de Lisboa: “RMC, S.A.” instaurou contra “EF, S.A.” uma execução para pagamento de quantia certa fundada em Injunção na qual foi aposta fórmula executória. Em 28/1/2010, a Executada “EF”, invocando para tanto a inexistência de título executivo idóneo à prossecução desta execução (por a aposição da fórmula executória ter assento no pressuposto de que a ora Executada não teria deduzido a competente Oposição ao requerimento injuntivo, sendo certo que a Executada fez seguir, atempadamente, por correio registado, o seu articulado de Oposição à Injunção, dirigido aos serviços do Balcão Nacional de Injunções, só não tendo o mesmo sido junto aos autos de injunção por a Opoente ter identificado erroneamente o nº do respectivo procedimento injuntivo [Proc. nº …./09.…], no seu articulado de oposição à injunção, fazendo menção a um outro processo em que também é Requerida [Proc. nº …./09.….] – o que constituiria mero lapso de escrita passível de ser corrigido nos termos do art. 249º do Código Civil), requereu ao juiz da execução a anulação dos autos da referida acção executiva, nos termos do art. 201º do CPC. A Exequente “RMC” opôs-se a esse requerimento da Executada, pugnando pela improcedência da invocada nulidade do título executivo e pelo consequente prosseguimento da execução, para cobrança da quantia exequenda peticionada. Por despacho proferido em 12/3/2010, o juiz dos Juízos de Execução de Sintra indeferiu o aludido requerimento da Executada e determinou o prosseguimento da Execução, por ter considerado (em síntese) que não caberia ao tribunal da execução determinar a rectificação de articulados que foram dirigidos ao Balcão Nacional de Injunções, nem tão pouco sindicar a diligência ou não de tais serviços. A Executada EF, inconformada com esse despacho, interpôs recurso do mesmo, que foi recebido como de Apelação (a subir imediatamente, nos próprios autos da execução, com efeito suspensivo do processo executivo), tendo rematado as concernentes alegações com as seguintes conclusões: «A) Entendeu o Tribunal a quo não ter competência para rectificar lapsos de escrita ou erros materiais que tenham ocorrido fora do processo, considerando, outrossim, apenas ter competência para proceder às rectificações que ocorram no âmbito do processo que tramita, decidindo-se pela prossecução da acção executiva em questão. B) Ora, a aposição da fórmula executória no requerimento de injunção em referência resultou de um lapsus linguae da aqui Apelante a que concorreu um erro praticado pela secretaria do Balcão Nacional de Injunções, na medida em que a aqui Recorrente, aquando da elaboração da oposição à injunção identificou erroneamente os autos em apreço, tendo dirigido a outro distinto a que já havia deduzido oposição à injunção. C) Na verdade, a injunção em que tenha sido aposta fórmula executória tem natureza não judicial, por não provir de uma entidade dotada de poderes soberanos como são os tribunais representados pelo respectivo Magistrado Judicial, podendo e devendo, por isso, o Juiz da execução censurar a correspondência do mesmo documento com os requisitos legais, para em cumprimento do disposto no art. 812º-E do CPC rejeitar o mesmo requerimento se o referido título apresentado não observar aqueles requisitos, o que in casu sucede. D) Neste sentido, e, não tendo sido colocado em causa quer pelo Tribunal a quo, quer pela Apelada, a verificação, ou não, do aludido lapso de escrita invocado pela Apelante, o princípio consagrado no artigo 249º do Código Civil, de que o erro de cálculo ou de escrita revelado no contexto da declaração ou através de circunstâncias em que a declaração é feita dá direito à rectificação desta em actos judiciais produzidos no decurso de um processo, o que impunha que o Tribunal a quo, face aos elementos trazidos à presente lide, indeferisse liminarmente o requerimento executivo em crise. E) Pelo que, tendo sido junta a oposição em tempo a processo indicado erradamente, por lapso, no cabeçalho da respectiva peça, impõe-se concluir que o Apelante se opôs em tempo e, consequentemente, não podendo subsistir a ulterior tramitação processual baseada na falta de oposição, in casu, a prossecução da acção executiva. F) Acresce que os serviços de secretaria do Balcão Nacional de Injunções mal andaram ao recepcionarem a oposição à injunção deduzida em 07/10/09 que deveria ter sido dirigida ao Proc. nº 370081/09.4YIPRT, reitera-se, após a distribuição ocorrida no Proc. nº 226914/09.1YIPRT, reencaminharam-na para as Varas Mistas de Competência Mista do Tribunal Judicial de Setúbal, ao invés de cuidarem de apurar se tal articulado dizia respeito a processo distinto. G) Havendo, por isso, um erro praticado pela secretaria do Balcão Nacional de Injunções à luz do disposto no nº 6 do art. 161º do CPC que não pode prejudicar a aqui Recorrente. H) Face ao exposto, verifica-se a nulidade dos presentes autos de acção executiva nos termos do disposto no art. 201º do CPC, na medida em que inexiste título executivo idóneo à prossecução da lide e, consequentemente, a nulidade de todo o processo, nos termos da al. b) do art. 494º do mesmo Diploma. Normas Jurídicas violadas: • art.º 46º, 161º, nº 6, 201º, 494º, al. b) e 812º-E, todos do CPC • art. 249º do Código Civil Nestes termos e nos mais de Direito que V. Exas. Doutamente suprirão, deverá o Despacho ora posto em crise ser substituído por outro que indefira liminarmente o requerimento executivo na base da presente acção executiva, nos termos do art. 812º - E do CPC ASSIM SE FAZENDO A COSTUMADA JUSTIÇA!» A Exequente “RMC” contra-alegou, pugnando pela improcedência do recurso da Executada EF e formulando as seguintes conclusões: «1ª - Do procedimento de Injunção requerido pela aqui Recorrida não consta qualquer Oposição deduzida pela Requerida, ora Recorrente, razão pela qual foi conferida força executiva à Injunção. 2ª - A ora Recorrente teve oportunidade de exercer o seu direito ao contraditório, em fase de procedimento injuntivo, o que não fez. 3ª – Não se mostra provado que a ora Recorrente tenha deduzido Oposição à Injunção em causa. 4ª – A existir algum lapso relativamente à indicação do número de Injunção a que se destinaria a suposta Oposição da Requerida, tal lapso apenas a esta poderá ser imputado. 5ª – A responsabilidade pelo envio de peças processuais recai sobre a parte que as remete e não sobre os destinatários destas. 6ª – Sobre o Balcão Nacional de Injunções não recai qualquer dever de diligenciar no sentido de verificar a regularidade das peças processuais que lhe são remetidas, nem de providenciar para que a parte seja informada dos lapsos existentes nas mesmas. 7ª – O eventual lapso alegado pela ora Recorrida não configura um lapso manifesto, designadamente, atendendo-se a que a mesma era parte (Requerida) na Injunção a que dirigiu a suposta Oposição. 8ª – Também não configura um mero lapso de escrita, já que não é imediatamente perceptível pelo destinatário. 9ª – Não era exigível que o Balcão Nacional de Injunções questionasse a bondade ou a oportunidade de um articulado que lhe estava a ser apresentado por uma parte no procedimento de Injunção cujo número consta do articulado em causa, nada permitindo concluir, e muito menos de imediato, que tal articulado se destinaria a outro procedimento de Injunção. 10ª – Ao Balcão Nacional de Injunções nada cabia rectificar, mas conferir força executiva ao requerimento de Injunção, como fez. 11ª – A alegada inexistência de título executivo apenas poderá ser apreciada em sede de Oposição à execução, nos termos do disposto no artigo 814º, nº 1, alínea a) do Código de Processo Civil, sendo que o requerimento da Executada que motivou o douto despacho sob recurso não configura qualquer Oposição à execução. 12ª – De qualquer forma, ao Tribunal a quo nada cabia censurar uma vez que a Injunção cumpre todos os requisitos legais e observou todos os formalismos aplicáveis, sendo plenamente válida e tem força executiva. 13ª – A douta decisão sub judicio não violou as disposições legais invocadas pela Recorrente, nem quaisquer outras. Nestes termos e nos mais de Direito que V. Exas. Doutamente suprirão, deve ser negado provimento ao presente recurso, mantendo-se na íntegra a decisão proferida, assim se fazendo JUSTIÇA!». Corridos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir. O OBJECTO DO RECURSO Como se sabe, sem embargo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer ex officio, é pelas conclusões com que o recorrente remata a sua alegação (aí indicando, de forma sintéctica, os fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão recorrida: art. 690º, nº 1, do C.P.C.) que se determina o âmbito de intervenção do tribunal ad quem [1] [2]. Efectivamente, muito embora, na falta de especificação logo no requerimento de interposição, o recurso abranja tudo o que na parte dispositiva da sentença for desfavorável ao recorrente (art. 684º, nº 2, do C.P.C.), esse objecto, assim delimitado, pode vir a ser restringido (expressa ou tacitamente) nas conclusões da alegação (nº 3 do mesmo art. 684º) [3] [4]. Por isso, todas as questões de mérito que tenham sido objecto de julgamento na sentença recorrida e que não sejam abordadas nas conclusões da alegação do recorrente, mostrando-se objectiva e materialmente excluídas dessas conclusões, têm de se considerar decididas e arrumadas, não podendo delas conhecer o tribunal de recurso. Por outro lado, como meio impugnatório de decisões judiciais, o recurso visa tão só suscitar a reapreciação do decidido, não comportando, assim, ius novarum, i.é., a criação de decisão sobre matéria nova não submetida à apreciação do tribunal a quo. Ademais, também o tribunal de recurso não está adstrito à apreciação de todos os argumentos produzidos em alegação, mas apenas – e com liberdade no respeitante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito (art. 664º, 1ª parte, do C.P.C., aplicável ex vi do art. 713º, nº 2, do mesmo diploma) – de todas as “questões” suscitadas, e que, por respeitarem aos elementos da causa, definidos em função das pretensões e causa de pedir aduzidas, se configurem como relevantes para conhecimento do respectivo objecto, exceptuadas as que resultem prejudicadas pela solução dada a outras (art. 660º, nº 2, do C.P.C., ex vi do cit. art. 713º, nº 2). No caso sub judice, emerge das conclusões da alegação de recurso apresentada pela Executada ora Apelante que o objecto do presente recurso de apelação está circunscrito a uma única questão: 1) Se o facto de a requerida em procedimento de injunção ter deduzido Oposição que, todavia, não foi tempestivamente junta aos autos, devido à errónea identificação do número do processo a que tal articulado se destinava, consequência que a execução posteriormente instaurada pelo requerente da injunção, fundada no requerimento de injunção a que foi aposta pelo secretário do Balcão Nacional de Injunções fórmula executória atestando que tal requerimento tem força executiva, constitui, por si só, fundamento bastante para o juiz dever indeferir liminarmente o requerimento executivo, perante a manifesta falta do título executivo. A DECISÃO RECORRIDA O Despacho que constitui objecto do presente recurso de apelação é do seguinte teor : «Requerimento de fls. 12 e seguintes do processo físico: Veio a executada nos presentes autos – EF, SA suscitar a “validade do título executivo” que serve de base à presente execução – injunção. Alega, em resumo, que por lapso enviou atempadamente articulado de oposição à injunção que lhe era movida por RMC, SA, porém, ao endereçar tal articulado remeteu-o a outro processo. Invoca que se trata de um mero erro material que carece de correcção e que houve actuação pouco diligente dos serviços do Balcão Nacional de Injunções. A este requerimento respondeu a exequente, alegando que o título executivo foi validamente constituído. Cumpre apreciar e decidir. Entende este Tribunal que, independentemente da bondade, ou não, dos argumentos apresentados pela executada, não tem competência para rectificar, ou não, lapsos de escrita ou erros materiais que tenham ocorrido fora do processo. A possibilidade que a lei confere de correcção dos sobreditos lapsos de escrita e erros materiais circunscreve-se à possibilidade dada ao juiz de proceder às referidas rectificações quando estas ocorram no âmbito do processo que tramita. Considera-se que este Juízo de execução não tem competência para determinar a rectificação de articulados que foram dirigidos ao Balcão Nacional de Injunções, nem tão pouco sindicar da diligência ou não de tais serviços. Pelo que, deverá a executada apresentar a sua reclamação contra o acto praticado junto do Balcão nacional de Injunções, que terá competência decisória nessa matéria. Pelo exposto, indefiro a requerida rectificação do lapso material e consequentemente, face à injunção com força executória junta como título executivo determinar o prosseguimento dos autos. Notifique.» FACTOS PROVADOS COM RELEVÂNCIA PARA O JULGAMENTO DO MÉRITO DO PRESENTE RECURSO Os factos relevantes para a apreciação do mérito do presente Recurso são unicamente os já descritos no Relatório, para os quais se remete. O MÉRITO DO RECURSO 1) O facto de o requerido em procedimento de injunção ter deduzido Oposição que, todavia, não foi tempestivamente junta aos autos, devido à errónea identificação do número do processo a que tal articulado se destinava, consequência que a execução posteriormente instaurada pelo requerente da injunção, fundada no requerimento de injunção a que foi aposta pelo secretário do Balcão Nacional de Injunções fórmula executória atestando que tal requerimento tem força executiva, constitui, por si só, fundamento bastante para o juiz dever indeferir liminarmente o requerimento executivo, perante a manifesta falta do título executivo ? Face ao disposto no art. 812º-C, al. b), do CPC (aditado pelo Decreto-Lei n.º 226/2008, de 20 de Novembro), não há sequer lugar a despacho liminar nas execuções baseadas em Requerimento de injunção no qual tenha sido aposta a fórmula executória. Porém, se o agente da execução suspeitar da ocorrência dum fundamento de indeferimento liminar (designadamente, insuficiência do título executivo; ocorrência de excepção dilatória de conhecimento oficioso; manifesta inviabilidade da execução), pode e deve suscitar a intervenção do juiz para despacho liminar (art. 812º-D, alíneas e) e f), do CPC [preceito igualmente aditado pelo cit. DL. nº 226/2008]). Passado o momento do despacho liminar, é ainda possível ao juiz vir a conhecer, até ao primeiro acto de transmissão de bens penhorados (venda, adjudicação, entrega de dinheiro) ou, por extensão, de consignação dos respectivos rendimentos, de qualquer das questões que, nos termos do art. 812º-E, nºs 1 a 4, do CPC, podiam ter conduzido ao convite ao aperfeiçoamento ou ao indeferimento liminar do requerimento executivo (art. 820º do mesmo diploma). Porém – como é de meridiana evidência -, a mera circunstância de a fórmula executória ter sido, porventura, indevidamente aposta no requerimento de injunção (porque, por exemplo, o requerido deduziu tempestivamente oposição que, todavia, não foi, indevidamente, tomada em consideração), não constitui, em si mesma, um caso de falta ou insuficiência do título executivo, passível de ditar o indeferimento liminar do requerimento executivo (nos termos do cit. art. 812º-E, nº 1, al. a)). Efectivamente, desde que o requerimento executivo se mostre acompanhado do requerimento de injunção no qual tenha sido aposta (bem ou mal) a fórmula executória, nunca se poderá sustentar que inexiste ou é insuficiente o título executivo. Dito isto, não poderá negar-se ao executado a possibilidade de alegar e provar (em sede de oposição à execução) que, afinal, contrariamente à aparência resultante do exame visual do título executivo no qual se funda a execução, foi por ele tempestivamente deduzida Oposição ao requerimento de injunção, tendo, por isso, sido indevidamente aposta a fórmula executória. Na verdade, o disposto no nº 1 do art. 814º do CPC acerca dos fundamentos que legitimam a oposição à execução baseada em sentença, aplica-se, com as necessárias adaptações, nos termos do nº 2 do mesmo preceito, à oposição à execução fundada em requerimento de injunção no qual tenha sido aposta a fórmula executória, desde que o procedimento de formação deste título executivo admita oposição pelo requerido. Ora, a hipótese em que a fórmula executória é aposta no requerimento executivo a despeito do facto de o requerido ter deduzido tempestivamente oposição, é equiparável ao caso contemplado na al. b) do cit. nº 1 do art. 814º: falsidade total do processo de declaração ou, pelo menos, falsidade da sentença. Simplesmente, no caso dos autos, a razão pela qual não foi tida em conta, pelo Balcão Nacional de Injunções, a Oposição que a Requerida ora Executada/Apelante remeteu pelo correio àquele organismo, com destino a ser junta ao procedimento injuntivo que ali fora instaurado contra si pela ora Exequente/Apelada – o que fez com que tivesse sido aposta a fórmula executória no requerimento de injunção apresentado pela aqui Exequente/Apelada, no pressuposto de que a requerida não havia deduzido qualquer oposição - , é-lhe inteiramente imputável só a ela. Na verdade, a fazer fé no requerimento sobre o qual recaíu o despacho ora sob censura e nos documentos a ele juntos pela Executada ora Apelante, esta identificou erroneamente o processo a cuja injunção se pretendeu opor, apondo no seu articulado de oposição um nº correspondente a um outro procedimento de injunção no qual também era requerida. Ora – como certeiramente fez notar a Exequente/Apelada (na sua contra-alegação de recurso) -, a responsabilidade pelo envio de peças processuais recai sobre a parte que as remete e não sobre os destinatários destas. Sobre o Balcão Nacional de Injunções não recai qualquer dever de diligenciar no sentido de verificar a regularidade das peças processuais que lhe são remetidas (pelo correio ou por qualquer outra via), nem de providenciar para que a parte seja informada dos lapsos porventura existentes nas mesmas peças. Ademais, o lapso invocado pela ora Recorrente não configura sequer um lapso manifesto, ostensivo, designadamente se se tiver em linha de conta que a mesma era parte (Requerida) naqueloutra Injunção a que, alegadamente, endereçou a sua Oposição. Tão pouco se tratou – contrariamente ao que ela agora sustenta – de um mero lapso de escrita, já que a errónea identificação do nº do processo a que respeita o articulado de Oposição remetido pelo correio ao Balcão Nacional de Injunções não é imediatamente perceptível pelo destinatário. Por isso, não era minimamente exigível que o Balcão Nacional de Injunções questionasse a bondade ou a oportunidade de um articulado que lhe estava a ser remetido por alguém que era, efectivamente, parte no procedimento de Injunção cujo número constava do articulado em causa, nada permitindo concluir, e muito menos de imediato, que tal articulado se destinaria a outro procedimento de Injunção. Neste quadro factual, com os dados de que dispunha, não competia ao Balcão Nacional de Injunções providenciar oficiosamente pela rectificação do que quer que fosse, mas tão só conferir força executiva ao requerimento de Injunção - como fez -, perante a constatação de a Requerida ora Executada/Apelante não endereçara ao respectivo processo nenhum articulado de Oposição. Assim, sendo exclusivamente imputável à falta de diligência e cuidado da Requerida ora Executada/Apelante o extravio do articulado de Oposição por ela alegadamente remetido, pelo correio, ao Balcão Nacional de Injunções, com a finalidade de ser junto ao procedimento de injunção contra si instaurado pela ora Exequente/Apelada, nada há a censurar àquele Balcão, no que toca à aposição da fórmula executória no requerimento injuntivo apresentado pela aqui Exequente/Apelada. Consequentemente, a Apelação improcede, devendo ser mantido o despacho recorrido. DECISÃO Acordam os juízes desta Relação em julgar improcedente o presente recurso de Apelação, mantendo inalterada a decisão recorrida. Custas a cargo da Executada, ora Apelante. Lisboa, 23 de Outubro de 2012 Rui Vouga Maria do Rosário Gonçalves Graça Araújo ----------------------------------------------------------------------------------------- [1] Cfr., neste sentido, ALBERTO DOS REIS in “Código de Processo Civil Anotado”, vol. V, págs. 362 e 363. [2] Cfr., também neste sentido, os Acórdãos do STJ de 6/5/1987 (in Tribuna da Justiça, nºs 32/33, p. 30), de 13/3/1991 (in Actualidade Jurídica, nº 17, p. 3), de 12/12/1995 (in BMJ nº 452, p. 385) e de 14/4/1999 (in BMJ nº 486, p. 279). [3] O que, na alegação (rectius, nas suas conclusões), o recorrente não pode é ampliar o objecto do recurso anteriormente definido (no requerimento de interposição de recurso). [4] A restrição do objecto do recurso pode resultar do simples facto de, nas conclusões, o recorrente impugnar apenas a solução dada a uma determinada questão: cfr., neste sentido, ALBERTO DOS REIS (in “Código de Processo Civil Anotado”, vol. V, págs. 308-309 e 363), CASTRO MENDES (in “Direito Processual Civil”, 3º, p. 65) e RODRIGUES BASTOS (in “Notas ao Código de Processo Civil”, vol. 3º, 1972, pp. 286 e 299). |