Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | JOSÉ CAPACETE | ||
Descritores: | PROCESSO CIVIL REQUERIMENTO PROBATÓRIO ALTERAÇÃO | ||
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Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 04/30/2019 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Texto Parcial: | N | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | IMPROCEDENTE | ||
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Sumário: | 1. A lei, estranhamente, não prevê a hipótese de a audiência prévia não se realizar e de, ainda assim, alguma das partes pretender alterar o seu requerimento probatório em função dos temas de prova selecionados pelo tribunal, impondo, no entanto, o direito à prova das partes, essa possibilidade, que deve ser exercida através de um requerimento dirigido ao tribunal. 2. A alteração do requerimento probatória prevista no n.º 1 do art. 598.º do C.P.C., não conhece restrições, apenas se exigindo que a parte tenha apresentado inicialmente requerimento probatório, condição para se falar em alteração. 3. Na alteração prevista naquele preceito inclui-se a hipótese de a parte requerer meios de prova não indicados inicialmente, pelo que constitui lícita alteração de requerimento probatório a circunstância de vir arrolar testemunhas ou requerer perícia, quando, com a petição inicial ou com a contestação, apenas havia apresentado documentos para prova dos fundamentos da ação ou defesa. 4. Assim, a mera apresentação de um documento com a petição inicial ou com a contestação, para efeitos probatórios, compreende um requerimento, mesmo que implícito, de admissão como meio de prova, tanto bastando para que o autor ou o réu fiquem habilitados a alterar este requerimento em qualquer um dos momentos referidos em 1., apresentando, por exemplo, um rol de testemunhas. 5. Questão diferente é a que se prende com a alteração do rol de testemunhas, pois que, uma coisa é alterar o requerimento probatório, que pode abranger prova pericial, documental, testemunhal, etc., outra coisa, bem mais limitada, é alterar ou aditar o rol de testemunhas, que é apenas um dos segmentos do requerimento probatório. 6. Enquanto a alteração do requerimento probatório pode ocorrer na audiência prévia, quando a esta haja lugar, ou mediante requerimento nos termos já referidos, ou seja, quando aquela diligência seja dispensada, o rol de testemunhas pode ser aditado ou alterado até 20 dias antes da data em que se realize a audiência final. | ||
Decisão Texto Parcial: | ![]() | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam na 7.ª Secção do Tribunal de Relação de Lisboa: I – RELATÓRIO: JM e MB, intentaram ação declarativa de condenação contra Z. Na contestação apresentada a ré indicou, como meios de prova: - a documental; e - a pericial. Foi dispensada a realização da audiência prévia, tendo a ré apresentado o requerimento com a Refª 31029314, certificado a fls. 13-15 deste apenso, do qual consta, além do mais, o seguinte: «Z, notificada do despacho saneador que foi proferido na sequência da dispensa da audiência prévia, vem nos termos do art. 598.º, n.º 1 proceder ao aditamento ao seu requerimento probatório, nos seguintes moldes (...)», arrolando, em seguida, cinco testemunhas. Os autores opuseram-se à admissão de tal requerimento, alegando, para o efeito, que na contestação, a ré não apresentou qualquer rol de testemunhas, como era sua incumbência. Nos termos do art. 572.º, do C.P.C., a apresentação do requerimento probatório com a contestação passou a ser um dever, ressalvando-se a possibilidade de ajustamento do rol à factualidade ulteriormente alegada pelo autor, caso seja apresentada reconvenção. No caso dos autos, o facto de a ré só agora vir apresentar rol de testemunhas deveu-se a um lapso seu, o qual não pode ser agora colmatado. Assim, conclui, não pode ser admitido o rol de testemunhas apresentado pela ré através daquele requerimento. * No dia 7 de janeiro de 2019 foi proferido o despacho certificado a fls. 18, com a Refª 47515418, que admitiu o rol de testemunhas apresentado pela ré através daquele requerimento. * Os autores não se conformaram com o assim decidido, pelo que interpuseram o presente recurso, o qual foi admitido como de apelação, com subida imediata, em separado, e efeito meramente devolutivo, concluindo assim as respetivas alegações: A - No âmbito da ação declarativa intentada pelos recorrentes contra a recorrida esta, devidamente citada, apresentou contestação, reconhecendo a dinâmica do acidente, bem como reconhecendo a sua responsabilidade. B - Na sua contestação a Recorrida, apresenta o seu requerimento probatório: prova documental e requerendo a realização de perícia medico legal dos AA. C - Não apresentando, contudo, qualquer prova testemunhal. D - Dispensada a realização de audiência previa, veio a Ré, através de requerimento datado de 18.12.2018 apresentar requerimento intitulado “Requerimento Probatório”, através do qual a Recorrida refere proceder ao aditamento do seu requerimento probatório, quando, na realidade utilizou o mesmo, somente para arrolar prova testemunhal. E - Por despacho proferido em 07.01.2019, foi o rol de testemunhas apresentado pela Recorrida em 18.01.2019 admitido. F - O Tribunal a quo proferiu o despacho recorrido quando ainda se encontrava a decorrer prazo para que os Recorrentes se pronunciassem quanto ao mesmo, prazo esse que terminava em 14.01.2019 - artigo 255° do Código de Processo Civil. G - Ainda assim os Recorrentes exerceram contraditório, o qual não foi, ainda, apreciado. Mas, H - Não podia a Recorrida, após apresentação da contestação, na qual não indica qualquer prova testemunhal, vir em momento posterior, concretamente através de requerimento apresentado apos prolação de despacho saneador, apresentar prova testemunhal. I - Nos termos do disposto no artigo 572° do CPC, era incumbência da Recorrida apresentar rol de testemunhas com a sua contestação, o que não fez. J - A apresentação do requerimento probatório com a contestação, passou a ser um dever “deve o réu”, sendo que apos esse momento apenas poderá ser alterado e não apresentado ex novo. K - Ao não ter apresentado rol de testemunhas com a sua contestação, precludiu o seu direito a apresentar prova testemunhal. L - Por mera cautela sempre se diga que a apresentação apos contestação de prova testemunhal por parte da Recorrida, nem poderia, sequer, ser enquadrada no disposto no artigo 146.º do C.P.C. N- Ao admitir a apresentação, agora, de rol de testemunhas por parte da Recorrida, violou o Tribunal a quo o disposto nos artigos 146°, n. 2, art. 3°, n. 3, artigo 572° alínea d), todos do Código de Processo Civil. Termos em que e nos demais de direito deve ser dado provimento ao presente recurso e, por via dele, revogado o despacho proferido em 07.01.2019, com certificação Citius datada de 09.01.2019, na parte em que admite o rol de testemunhas apresentado pela Recorrida/Ré, fazendo-se, assim, a habitual e necessária Justiça. * A ré não apresentou contra-alegações. * II – ÂMBITO DO RECURSO: Nos termos dos arts. 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1, do CPC, é pelas conclusões do recorrente que se define o objeto e se delimita o âmbito do presente recurso, sem prejuízo das questões de que este tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, apenas estando adstrito à apreciação das questões suscitadas que sejam relevantes para conhecimento do objeto do recurso. Assim, perante as conclusões da alegação dos apelantes, a única questão a decidir neste recurso consiste em saber se é admissível o rol de testemunhas apresentado pela ré nos termos do requerimento acima referido. * III – FUNDAMENTOS: 3.1 – Fundamentação de facto: A factualidade relevante para a decisão do presente recurso é a que decorre do relatório que antecede. * 3.2 – Do mérito do recurso: Dispõe: - o art. 572.º, al. c), do C.P.C.[1], que «na contestação deve o réu (...) apresentar o rol de testemunhas e requerer outros meios de prova; tendo havido reconvenção, caso o autor replique, o réu é admitido a alterar o requerimento probatório inicialmente apresentado, no prazo de 10 dias a contar da notificação da réplica»; - o art. 598.º: 1 - O requerimento probatório apresentado pode ser alterado na audiência prévia quando a esta haja lugar nos termos do disposto no artigo 591.º ou nos termos do disposto no n.º 3 do artigo 593.º. 2 - O rol de testemunhas pode ser aditado ou alterado até 20 dias antes da data em que se realize a audiência final, sendo a parte contrária notificada para usar, querendo, de igual faculdade, no prazo de cinco dias. Resulta do n.º 1 do art. 598.º que os requerimentos probatórios apresentados pelas partes podem ser alterados na audiência prévia, quer quando esta se realize nos termos da lei, quer quando ela seja imposta potestativamente por qualquer das partes. Estranhamente, a lei não prevê a hipótese de a audiência prévia não se realizar e de, ainda assim, alguma das partes pretender alterar o seu requerimento probatório em função dos temas de prova selecionados pelo tribunal. O direito à prova das partes impõe, no entanto, essa possibilidade, que deve ser exercida através de um requerimento dirigido ao tribunal[2]. Posto este esclarecimento, entremos na análise da questão que constitui o objeto deste recurso. Segundo Abrantes Geraldes/Paulo Pimenta/Luís Sousa, «o requisito mínimo é que tenha sido anteriormente apresentado algum requerimento probatório, podendo a alteração traduzir-se, se necessário, na indicação de outros meios de prova que tenham sido indicados ou apenas na alteração dos meios de prova que não tenham sido indicados ou apenas na alteração dos meios de prova já enunciados»[3]. Segundo Rui Pinto, está em causa a alteração de requerimento probatório que foi apresentado no momento devido, ou seja, com o respetivo articulado. Se a parte não apresentou requerimento algum com os articulados, não o pode fazer depois, ao abrigo do art. 598.º, n.º 1, por preclusão da faculdade processual, porquanto não se altera ou adita o que não existe. «Coisa diferente é a parte é a parte ter apresentado certo requerimento probatório junto com os articulados e vem mais tarde requerer meio de prova diverso. Ora, visto que o artigo 598.º, n.º 1 se refere a este ato processual, sem mais distinções, forçoso é concluir que os concretos meios de prova nele indicados podem ser alterados». Ainda segundo o mesmo Autor, «a alteração do requerimento probatório tanto pode corresponder a uma substituição de provas anteriormente requeridas, como a um aditamento de provas novas relativamente às já requeridas»[4]. Segundo Paulo Pimenta, a alteração prevista no n.º 1 do art. 598.º do C.P.C., «não parece conhecer restrições, apenas se exigindo que a parte tenha apresentado inicialmente requerimento probatório, condição para se falar em alteração. (...) Na alteração prevista no n.º 1 do art. 598.º inclui-se, naturalmente, a hipótese de requerer meios de prova não indicados inicialmente. E também constitui alteração de requerimento probatório (permitida pois) a circunstância de a parte vir agora arrolar testemunhas ou requerer perícia, quando (apenas) juntou à petição inicial ou à contestação documentos para prova dos fundamentos da ação ou defesa»[5]. Segundo Ramos de Faria / Ana Luísa Loureiro, «a alteração do requerimento probatório pressupõe que já tenha sido apresentado um requerimento que, que então se altera. Essa modificação pode, todavia, ser da mais diversa ordem, desde a ampliação do rol de testemunhas – dentro dos limites fixados por lei –, até à apresentação de diferentes meios de prova, passando pelo requerimento de notificação das testemunhas já arroladas. A título de exemplo, a mera apresentação de um documento com a petição inicial[6] – para efeitos probatórios (...) – compreende um requerimento implícito de admissão como meio de prova, tanto bastando para que o autor[7] fique habilitado a alterar este requerimento na audiência prévia, apresentando, por exemplo, um rol de testemunhas»[8]. Era, por isso, perfeitamente lícito à ré, ora apelada, apresentar o rol de testemunhas no termos em que o fez. O que os apelantes parecem fazer é confusão entre a alteração do requerimento probatório (regulado no n.º 1 do art. 598.º) e o aditamento ou alteração ao rol de testemunhas (regulado no n.º 2 do mesmo artigo). Convém, por isso, estabelecer desde já a distinção entre as duas situações. Uma coisa é alterar o requerimento probatório, que pode abranger prova pericial, documental, testemunhal, etc., outra coisa, bem mais limitada, é alterar ou aditar o rol de testemunhas, que é apenas um dos segmentos do requerimento probatório. Também os tempos de apresentação desses pedidos são diferentes. Enquanto a alteração do requerimento probatório pode ocorrer na audiência prévia, quando a esta haja lugar, ou mediante requerimento nos termos já referidos, ou seja, quando aquela diligência seja dispensada, o rol de testemunhas pode ser aditado ou alterado até 20 dias antes da data em que se realize a audiência final. O n.º 2 do artigo 598º permite, portanto, que, até uma data muito próxima da audiência final, as partes substituam testemunhas constantes do rol que apresentaram no momento próprio, ou aditem testemunhas a esse mesmo rol, sem que se lhes exija qualquer justificação para a substituição ou para o aditamento[9]. No caso concreto, a ré, ora apelada, requereu, no momento processual próprio, a alteração do requerimento probatório, nos termos do n.º 1 do art. 598.º, e não o aditamento ou alteração do rol de testemunhas, nos termos do n.º 2, coisa que, aliás, não faria sentido, pois, como já se disse, não se adita ou altera ou o que não existe. Assim, apesar de a sua fundamentação não ser a devida, deve manter-se o despacho recorrido que admitiu a alteração do requerimento probatório inicialmente apresentado pela ré. * IV – DECISÃO: Por todo o exposto, acordam os juízes que integram esta 7.ª Secção do Tribunal de Relação de Lisboa em julgar improcedente o recurso, mantendo, em consequência, o despacho recorrido. Custas pelos apelantes – art. 527.º, n.ºs 1 e 2, do C.P.C. Lisboa, 30 de abril de 2019 (Acórdão assinado digitalmente) Relator José Capacete Adjuntos Carlos Oliveira Diogo Ravara [1] Pertencem ao C.P.C./13 os normativos que vierem ser mencionados sem indicação da respectiva fonte. [2] Sobre o despropósito que constituiria limitar a possibilidade de alteração dos requerimentos probatórios nesta fase processual, nos termos conjugados dos arts. 593.º, n.º 3 e 598.º, n.º 1, do CPC, aos casos de realização da audiência prévia, veja-se Ramos de Faria / Ana Luísa Loureiro, Primeira Notas ao Novo Código de Processo Civil, I Vol. Almedina, 2013, p. 520; no mesmo sentido, Lebre de Freitas/Isabel Alexandre, Código de Processo Civil Anotado, Vol. 2.º, 3.ª Edição, 2017, pp. 644 e 675. [3] Código de Processo Civil Anotado, Vol. I, Almedina, 2018, p. 704. [4] Código de Processo Civil Anotado, Vol. II, Almedina, 2018, pp. 141-142. No mesmo sentido, Ac. da R.L. de 23.03.2017, Proc. n.º 425/16.0YIPRT-A.L1 (Eduardo Petersen Silva), in www.dgsi.pt. [5] Processo Civil Declarativo, Almedina, 2014, p. 296 e nota 679. [6] Ou com a contestação, acrescentamos nós. [7] Ou o réu, acrescentamos nós. [8] Primeiras Notas ao Novo Código de Processo Civil, Vol. I, Almedina, 2013, pp. 519. [9] Cfr. Ac. da R.L. de 12.05.2015, Proc. n.º 7724/10.2TBMTS-B.P1 (Henrique Araújo), in www.dgsi.pt. |