Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
197/17.0TNLSB.L1-3
Relator: A. AUGUSTO LOURENÇO
Descritores: EMBARCAÇÃO
REGISTO
CONTRA-ORDENAÇÃO MARÍTIMA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 05/02/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: 1. O actual Regulamento das Embarcações Utilizadas na Actividade Marítimo-Turística (REUAMT), aprovado pelo D. L. 149/2014 de 10.10, modificou entre outras regras a não obrigatoriedade de utilização de uma embarcação de assistência, quando sejam operadas embarcações dispensadas de registo e motas de água, desde que as actividades decorram em locais em que haja impossibilidade física de utilização da referida embarcação.
2. Esta não obrigatoriedade é ainda aplicável aos operadores que utilizem embarcações dispensadas de registo e motas de água, que naveguem em águas interiores ou no mar até uma distância não superior a 300 metros da linha de costa.
3. A tutela da segurança e integridade física dos tripulantes de embarcações de recreio como a referida, apenas pode ser garantida com a presença de uma embarcação de apoio e socorro pronta a actuar no local percorrido pelos engenhos locados pelo operador marítimo-turístico.
4. O regulamento em vigor deve ser interpretado no sentido de que lei sanciona não apenas os casos em que inexiste fisicamente a embarcação de assistência, mas também os casos em que o operador, ainda que a possua ou dela seja proprietário, não a tenha disponível no local onde opera e no momento em que foi necessária.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam em Conferência os Juízes da 3ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Lisboa

RELATÓRIO
 Por decisão administrativa de 15.11.2017, proferida no âmbito do processo de contra­ordenação que correu termos na Capitania do Porto de Portimão sob o nº 070.40.01 - 226/16, o Senhor Capitão do Porto de Portimão condenou a Arguida C..., Ldª, contribuinte nº 506 ... ... com sede na Rua do C…, nº …, P…, 8…-5… L…, pela prática, em autoria material, de uma contra-ordenação de exercício da actividade marítimo-turística com embarcações dispensadas de registo sem possuir qualquer embarcação de assistência, prevista e punida nos arts. 16º, nº 1, al. b), e 3, do DL nº 149/2014, de 10-10, na coima de € 1000.
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 Inconformada com a decisão proferida, a sociedade arguida, C..., Ldª, impugnou judicialmente, aquela decisão administrativa ao abrigo do disposto no artº 59º, nº 1 do Decreto-Lei nº 433/82, de 27 de Outubro, sendo o recurso recebido, autuado com o nº 197/17.0TNLSB e julgado pelo Tribunal Marítimo de Lisboa, o qual veio a decidir nos seguintes termos:
«Nestes termos, e com tais fundamentos, decido julgar improcedente o recurso interposto pela Arguida C..., Ldª e, consequentemente, mantenho a decisão impugnada.
 Condeno ainda a Arguida no pagamento das custas do presente processo, fixando em 2 (duas) UC's a taxa de justiça, nos termos do art. 93º, nº 3, do RGCOC.
 Após trânsito, comunique à Autoridade Administrativa recorrida (art. 70º, nº 4, do RGCOC)».
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Da decisão judicial supra, recorreu a sociedade arguida, C..., Ldª, nos termos de fls. 66 a 78, pugnando pela revogação da decisão recorrida e respectiva absolvição, terminando com as seguintes conclusões:
«1. Lê-se em síntese, na fundamentação do despacho decisório que o Mmº Juiz do Tribunal Marítimo de Lisboa tirou, a confirmar a aplicação, à Recorrente, da coima de (1.000,00 (mil euros) que lhe havia sido aplicada pelo Capitão do Porto de Portimão:
a) “Por decisão administrativa de 15.11.2017, proferida no âmbito do processo de contra­ordenação que correu termos na Capitania do Porto de Portimão (…), o Senhor Capitão do Porto de Portimão condenou a Arguida, (…) pela prática, em autoria material, de uma contra-ordenação de exercício da actividade marítimo-turística com embarcações dispensadas de registo sem possuir qualquer embarcação de assistência, prevista e punida nos arts. 16º, nº 1, al. b), e 3, do DL nº 149/2014, de 10-10, na coima de € 1000”, (cfr. 1º § do Relatório).
b) “Inconformada com tal decisão, a Arguida impugnou-a judicialmente, tendo alegado - em síntese - que não cometeu a infracção imputada pois dispunha de uma embarcação de assistência, a qual, porém, se encontrava num apoio recreativo sito noutra praia, mas ainda assim actuou licitamente e sem culpa”, (cfr. 2º § do Relatório).
c) “Terminou pugnando pela sua absolvição e consequente arquivamento dos autos”, (idem).
2.  Ora - acrescenta o mesmo Senhor Juiz:
d) “A Arguida dispõe apenas de uma embarcação a motor destinada a dar assistência às naves por si alugadas nos seus dois apoios recreativos”, (cfr. al. d) dos factos provados).
e) “O apoio recreativo da Arguida sito na UB 1 da Praia do Vale de Centeanes esteve desprovido de qualquer embarcação motorizada ou meios alternativos de assistência desde - pelo menos - as 14:20 horas até às 20:00 horas do dia 21 de Julho de 2016”, (cfr. al. h) dos factos provados).
f) “A Arguida dispõe de uma embarcação motorizada de assistência a qual afectou no dia acima referido à actividade desenvolvida no apoio recreativo explorado na Praia do Carvoeiro, a qual fica a Oeste da Praia do Vale de Centeanes e não é visível a partir desta”, (cfr. al. i) dos factos provados).
3. Por isso, remata o mesmo Magistrado:
"(...) invés do alegado pela Arguida, importa atentar que a lei não sanciona apenas os casos em que inexiste fisicamente a sobredita embarcação de assistência ou a mesma não se encontra disponível. Com efeito, é bom não olvidar que os nº 1 e 2 do art. 5º do REUNAT visam fundamentalmente a tutela da integridade física e da vida dos tripulantes de embarcações particularmente sensíveis aos eventos do mar (corrente e ondulação) e do tempo (vento) - já que não dispõem de meios de propulsão próprios - que mais interferem no governo de uma nave, que ademais é governada por indivíduos que não carecem de qualquer tipo de habilitação para comandá-las. Essa tutela apenas pode ser garantida com a presença de uma embarcação de apoio e socorro pronta a actuar no local percorrido pelos engenhos locados pelo operador marítimo-turístico, cabendo a este organizá-los de modo a poder cumprir a obrigação de auxílio postulada pela lei com a imposição de uma nave de assistência".
4. Não tem razão o Senhor Juiz!
5. Para bem se entender a sua falta de razão na interpretação que faz da lei, mister é ter presente quanto é dito nos nº 2 e 3 do art. 9º do cód. civil.
6. Sem nos olvidarmos da lição de Oliveira Ascensão (In “O Direito - introdução e Teoria Geral”, 1978, pág. 350), quando diz que:
"A letra da lei não é só o ponto de partida, é também um elemento irremovível de toda a interpretação. Quer dizer que o texto funciona também como limite de busca do espírito”.
7. Daqui que:
- "Não pode ser considerado como compreendido entre os sentidos possíveis da lei aquele pensamento legislativo «que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso» (Ac. do STJ de 6/10/93, in BMJ 430/431).
8. Ora, é manifesto que o pensamento do Senhor Juiz da 1ª Instância não contém nas forças de nenhuma interpretação que da lei se faça, por mais generosa que a mesma pretenda ser, com vista a sufragar aquela sua tese.
9. Com efeito, se compulsarmos todo o D. L. 149/2014, de 10/10, muito em especial os seus arts, 3º/2, 5º (em especial o nº 2) e 16º/1-b), concluímos que a interpretação dada pelo mesmo Magistrado, não encontra o mais ínfimo respaldo verbal na letra da lei, pelo que não pode ser aceite!
10. A interpretação correcta é aquela que a Recorrente faz, e sempre fez, ou seja, o que a lei exige é tão só que, quem opera com motas de água e/ou com embarcações dispensadas de registo, tem de possuir uma embarcação com motor, destinada prioritariamente à assistência daquelas.
11. A Recorrente tinha e tem uma dessas embarcações, como o Capitão do Porto de Portimão e o próprio Senhor Juiz reconheceram!
12. Cumpriu e cumpre, por isso, a lei!
13. E, por isso, não devia ter sido acoimada!
14. No entanto, e porque o foi, o que é injusto, devem Vªs Exªs, Mmºs Juízes Desembargadores, absolvê-la da coima em que foi condenada!».
O Ministério Público junto do Tribunal de 1ª Instância contra alegou, nos termos de fls. 86 a 90, defendeu a improcedência do recurso e a confirmação da sentença recorrida, nos seguintes termos:
- «Efectivamente, como doutamente refere a sentença recorrida a lei não sanciona apenas os casos em que inexiste fisicamente a sobredita embarcação de assistência ou a mesma não se encontra disponível, porquanto os nº 1 e 2 do artº 5 do D. L. nº 149/2014 visam fundamentalmente proteger a integridade física e da vida dos tripulantes de embarcações particularmente sensíveis, aos eventos do mar (corrente e ondulação) e do tempo, (vento) - já que não dispõem de meios de propulsão próprios - que mais interferem no governo de uma nave, que ademais é governada por indivíduos que não carecem de qualquer tipo de habilitação para comandá-las. Essa tutela apenas pode ser garantida com a presença de uma embarcação de apoio e socorro pronta a actuar no local percorrido pelos engenhos locados pelo operador marítimo-turístico, cabendo a este organizá-los de modo a poder cumprir a obrigação de auxílio postulada pela lei com a imposição de uma nave de assistência.
O entendimento pugnado pelo recorrente, como bem salienta a douta sentença recorrida levaria à aberração de um operador marítimo­turístico que explora vários apoios recreativos separados por dezenas ou (até) centenas de quilómetros apenas carecer de ter uma nave destinada ao auxílio daquelas outras por si locadas. Não é esse o escopo dos nºs 1 e 2 do art. 5º do nem o sentido contido na letra de tais normas referenciadas. Pelo exposto e por se concordar em absoluto, com os fundamentos enunciados na douta sentença recorrida, o Ministério Publico adere, na íntegra, à mesma, devendo, em consequência, ser proferida decisão que mantenha integralmente a douta sentença recorrida e considere improcedente o recurso interposto. Contudo, Exas farão, como sempre, Justiça».
Neste Tribunal a Exmª Procuradora-Geral Adjunta emitiu o Douto Parecer de fls. 97, tendo aderido à posição do Ministério Público em 1ª instância e defendido a improcedência do recurso.
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O recurso foi tempestivo, legítimo e correctamente admitido.
Colhidos os vistos, cumpre decidir.
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FUNDAMENTOS
O âmbito dos recursos é delimitado pelas conclusões extraídas pelo recorrente da respectiva motivação, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso[1].
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Objecto do recurso
A única questão a apreciar extraída das conclusões do recurso interposto, consiste em apurar se houve uma correcta aplicação da lei aos factos provados ou se o tribunal recorrido errou na qualificação jurídica e interpretação do disposto nos artº 5º nº 1 e 2 do D. L. 149/2014 de 10/10.
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FACTOS PROVADOS
Foram dados como provados os seguintes factos:
a) A Arguida é um operador marítimo-turístico que se dedica à actividade marítimo-turística mediante - designadamente - o aluguer sem tripulação de embarcações dispensadas de registo, como seja, caiaques.
b) A Arguida explora um apoio recreativo na Unidade Balnear nº 1 da Praia do Vale de Centeanes e um outro na Praia do Carvoeiro, sendo que em ambos aluga embarcações dispensadas de registo.
c) A Arguida aluga embarcações dispensadas de registo nos seus dois apoios recreativos.
d) A Arguida dispõe apenas de uma embarcação a motor destinada a dar assistência às naves por si alugadas nos seus dois apoios recreativos.
e) No dia 21 de Julho de 2016, pelas 15:55 horas, no mar territorial, na posição geográfica determinada pelas coordenadas 37º05.121N - 008º25.839'W (Datum WGS 84), em frente à Praia do Carvalho, a cerca de 2200 m a Leste da Unidade Balnear nº 1 (UB 1) da Praia de Vale de Centeanes, encontrava-se em plena operação no espelho de água um caiaque, o qual era governado por um casal de turistas argentinos, sendo que ambos remavam com dificuldade por causa do vento e da maré que então se faziam sentir no local.
f) Tal caiaque havia sido alugado pelo referido casal à Arguida na UB 1 Praia do Vale de Centeanes.
g) Os tripulantes do mencionado caiaque pediram auxílio aos agentes da Polícia Marítima que se encontravam no local a bordo da lancha fiscalizadora S/R ALVOR, tendo esta rebocado o caiaque até ao apoio recreativo da Arguida sito na UB 1 da Praia do Vale de Centeanes.
h) O apoio recreativo da Arguida si to na UB 1 da Praia do Vale de Centeanes esteve desprovido de qualquer embarcação motorizada ou meios alternativos de assistência desde - pelo menos - as 14:20 horas até às 20:00 horas do dia 21 de Julho de 2016.
i) A Arguida dispõe de uma embarcação motorizada de assistência a qual afectou no dia acima referido à actividade desenvolvida no apoio recreativo explorado na Praia do Carvoeiro, a qual fica a Oeste da Praia do Vale de Centeanes e não é visível a partir desta. j) O local onde o caiaque foi abordado pelos agentes fiscalizadores não é avistável da Praia do Vale de Centeanes nem da Praia do Carvoeiro.
k) A Arguida quis e soube alugar o sobredito caiaque no apoio recreativo por si explorado na Praia do Vale de Centeanes sem dispor naquele local ou na zona percorrida pela nave locada de qualquer embarcação motorizada ou meio alternativo de assistência.
l) A Arguida sabia que essa actuação era contrária à lei e motivou-se conscientemente dessa contrariedade.
m) Não são conhecidos antecedentes contra-ordenacionais à Arguida.
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Motivação da decisão de facto pelo tribunal “a quo:
«A convicção do tribunal estribou-se no auto de notícia de fls. 5-6, o qual, por ter sido levantado por um agente de autoridade no exercício das suas funções e dentro dos seus limites de competência, é um documento autêntico e, consequentemente, faz prova plena dos factos que refere terem sido directamente percepcionados pelo autuante - mormente que no dia 21-07-2016, pelas 15:55 horas, um caiaque da Arguida, tripulado por um casal de turistas argentinos, foi encontrado em dificuldades em frente à praia do Carvalho e rebocado pela lancha policial até ao apoio recreativo da praia do Vale de Centeanes, local que, para além de não ser visível da Praia do Vale de Centeanes nem da Praia do Carvoeiro, não estava apetrechado com qualquer embarcação motorizada ou meio de assistência alternativo desde as 14:20 horas desse mesmo dia -, os quais não foram infirmados por qualquer meio de prova com força superior; na confissão vertida na impugnação (na qual se admitiu a indisponibilidade de qualquer embarcação ou meio de assistência na praia do Vale de Centeanes, já que o único existente estava afecto a outro apoio recreativo); e, na interpretação (censurável e, como tal, reveladora da culpa) que a Arguida efectuou da disciplina fixada pelas normas preteridas.
O desconhecimento de passado contra-ordenacional foi apurado com base na inexistência nos autos de qualquer registo respeitada à Arguida».
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 DO DIREITO
 O recurso interposto não põe em causa a factualidade provada, apenas questiona a interpretação e aplicação da lei aos factos, todavia, desde já se diga, que o faz sem qualquer razão ou fundamento minimamente sustentável.
Vejamos.
Com interesse para a questão suscitada, importa reter os seguintes factos provados:
- “A Arguida é um operador marítimo-turístico que se dedica à actividade marítimo-turística mediante - designadamente - o aluguer sem tripulação de embarcações dispensadas de registo, como seja, caiaques, (al. a).
- A Arguida explora um apoio recreativo na Unidade Balnear nº 1 da Praia do Vale de Centeanes e um outro na Praia do Carvoeiro, sendo que em ambos aluga embarcações dispensadas de registo, (al. b).
(…)
- A Arguida dispõe apenas de uma embarcação a motor destinada a dar assistência às naves por si alugadas nos seus dois apoios recreativos, (al. d).
- No dia 21 de Julho de 2016, pelas 15:55 horas, no mar territorial, na posição geográfica determinada, (…) encontrava-se em plena operação no espelho de água um caiaque, o qual era governado por um casal de turistas argentinos, sendo que ambos remavam com dificuldade por causa do vento e da maré que então se faziam sentir no local, (al. e).
- Tal caiaque havia sido alugado pelo referido casal à Arguida na UB 1 Praia do Vale de Centeanes, (al. f).
(…)
- O apoio recreativo da Arguida sito na UB 1 da Praia do Vale de Centeanes esteve desprovido de qualquer embarcação motorizada ou meios alternativos de assistência desde - pelo menos - as 14:20 horas até às 20:00 horas do dia 21 de Julho de 2016, (al. h).
(…)
- A Arguida quis e soube alugar o sobredito caiaque no apoio recreativo por si explorado na Praia do Vale de Centeanes sem dispor naquele local ou na zona percorrida pela nave locada de qualquer embarcação motorizada ou meio alternativo de assistência, (al. k).
O exercício da actividade marítimo-turística com embarcações dispensadas de registo foi objecto de várias regulamentações ao longo do tempo, cuja resenha histórico-legislativa se mostra devidamente descrita na sentença recorrida e para a qual remetemos, dispensando-nos de repetir aqui o que foi profusamente explicado.
Com a publicação do D. L. 149/2014 de 10.10, que aprovou o Regulamento das Embarcações Utilizadas na Actividade Marítimo-Turística (REUAMT), alargou-se a tipologia de embarcações que podem ser afectas àquela actividade, bem como as modalidades de diversão permitidas, encontrando-se a factualidade em causa abrangida pelas disposições legais consagradas naquele diploma. 
O actual regulamento, (REUAMT) modificou entre outras regras a não obrigatoriedade de utilização de uma embarcação de assistência quando sejam operadas embarcações dispensadas de registo e motas de água, desde que as actividades decorram em locais em que haja impossibilidade física de utilização da referida embarcação.
Esta não obrigatoriedade é ainda aplicável aos operadores que utilizem embarcações dispensadas de registo e motas de água e que naveguem em águas interiores ou no mar até uma distância não superior a 300 metros da linha de costa. Nestes casos, os operadores devem dispor de um meio de comunicação que permita uma chamada de socorro e garantir, por si ou através da celebração de protocolos com as entidades de serviços de emergência, a existência dos meios necessários ao apoio e socorro em toda a zona de navegação autorizada.
Nos termos do artº 2º al. h) do D. L. 149/2014, h), entende-se por:
- «Operador marítimo-turístico», uma pessoa singular ou coletiva que se encontre habilitada a exercer a atividade marítimo-turística, nos termos previsto no Decreto-Lei n.º 108/2009, de 15 de maio, alterado pelo Decreto-Lei n.º 95/2013, de 19 de julho;
Por sua vez o artº 3º refere que:
«1.       Na atividade marítimo-turística podem ser utilizados:
a) Embarcações marítimo-turísticas;
b) Embarcações de comércio;
c) Embarcações de pesca;
d) Rebocadores;
e) Embarcações de recreio;
f) Embarcações dispensadas de registo;
g) Embarcações tradicionais ou barcos típicos.
2. Podem ser utilizadas embarcações de assistência com motor prioritariamente destinadas a prestar assistência a embarcações dispensadas de registo e motas de água, nos termos do disposto no artigo 5º.
3. Podem ainda ser utilizadas embarcações de apoio à embarcação principal utilizada na atividade marítimo-turística, nos termos do disposto no artigo 6º.
4. O exercício, em simultâneo, da atividade marítimo-turística e da atividade da pesca profissional, a bordo das embarcações referidas na alínea c) do nº 1, é regulado em diploma próprio.
5. A utilização das embarcações referidas na alínea g) do nº 1 na atividade marítimo-turística é regulada em diploma próprio».

Refere-se no artº 5º do mesmo diploma:
«1. Para os efeitos do presente Regulamento, são dispensadas de registo as pequenas embarcações sem motor, nomeadamente, canoas, caiaques, botes, charutos, barcos pneumáticos, gôndolas, pranchas com ou sem vela e embarcações exclusivamente destinadas à prática do remo.
2. Sem prejuízo do disposto nos números seguintes, os operadores marítimo-turísticos que apenas utilizem embarcações dispensadas de registo e motas de água devem dispor de embarcações, com motor, prioritariamente destinadas a assistência das restantes.
3. Desde que assegurem meios alternativos de assistência, os operadores marítimo-turísticos que apenas utilizem embarcações dispensadas de registo e motas de água não estão obrigados a cumprir o disposto no número anterior nas seguintes situações:
a) Navegação em locais em que a utilização de uma embarcação de assistência não seja possível, por impossibilidade física de a mesma poder navegar;
b) Navegação em águas interiores ou no mar até uma distância não superior a 300 metros da linha da costa.
4. Para efeitos do disposto no número anterior, os operadores marítimo-turísticos devem dispor de um meio de comunicação que permita uma chamada de socorro e devem garantir, por si ou através da celebração de protocolos com as entidades de serviços de emergência, a existência dos meios necessários ao apoio e socorro em toda a zona de navegação autorizada».
Conforme resulta do disposto no artigo 5º, as situações de excepção à exigência de ter disponível no respectivo local uma embarcação de assistência com motor, estão previstas no nº 3 e nele não se enquadra a situação da recorrente.
A recorrente explora um apoio recreativo na Unidade Balnear nº 1 da Praia do Vale de Centeanes e um outro na Praia do Carvoeiro, sendo certo que em ambos aluga embarcações dispensadas de registo. Porém, apenas dispõe de uma embarcação motorizada destinada a dar assistência às naves por si alugadas nos dois apoios recreativos.
A sua actividade enquadra-se nas normas citadas, cujos trechos realçámos e ainda que dispusesse de uma embarcação de assistência, a verdade é que não a tinha na praia referida, ou seja no local onde foi necessária, o que equivale a não ter, tornando-o um incumpridor da lei. É inaceitável o entendimento e pretensão da recorrente, ao tentar convencer este Tribunal de que o cumprimento da exigência legal prevista no nº 2 do artº 5º se basta com a propriedade ou detenção de tal meio de assistência, mesmo que a não tivesse disponível no local onde exercia a actividade marítimo-turística. 
A Arguida procedeu ao aluguer de uma embarcação dispensada de registo - caiaque - num apoio recreativo que não dispunha de qualquer embarcação de assistência destinada a garantir a segurança dos locatários, pronta a actuar em caso de emergência, na zona de navegação por si operada, tendo sido a Polícia Marítima a prestar esse auxílio e rebocar o caiaque até à praia.
À luz das regras de experiência comum, é inegável que a mesma tinha conhecimento das exigências legais e da obrigação de ter no local onde aluga os meios de recreio marítimo, a embarcação de assistência com motor.
Acolhemos aqui a tese defendida na sentença recorrida, de que a lei não sanciona apenas os casos em que inexiste fisicamente a embarcação de assistência ou a mesma não se encontra disponível, mas também os casos em que o operador não a tem disponível no local onde opera.

A tutela da segurança e integridade física dos tripulantes de embarcações de recreio como a referida, apenas pode ser garantida com a presença de uma embarcação de apoio e socorro pronta a actuar no local percorrido pelos engenhos locados pelo operador marítimo-turístico, cabendo a este organizá-los de modo a poder cumprir a obrigação de auxílio postulada pela lei com a imposição de uma nave de assistência.
Pelo exposto, é inequívoco que a conduta da recorrente, preenche todos os elementos objectivos e subjectivos da contra-ordenação em que foi sancionada, não tendo qualquer sustentação legal a interpretação que veio defender.
O recurso improcede.
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DECISÃO
Nestes termos, acordam os juízes da 3ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Lisboa, em negar provimento ao recurso, interposto pela arguida C..., Ldª.
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Custas a cargo da recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 4 UC (quatro unidades de conta).
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Lisboa 2 de Maio de 2018

A. Augusto Lourenço

João Lee Ferreira

[1] - Cfr. artigos 119º, nº 1, 123º, n.º 2, 410º, nº 2, alíneas a), b) e c) todos do cód. procº penal; acórdão de fixação de jurisprudência obrigatória do STJ de 19/10/1995, publicado em 28/12/1995 e, entre outros, os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, de 25.6.1998, in B.M.J. 478, p. 242 e de 3.2.1999, in B.M.J. 484, p. 271.