Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | AMÉLIA ALVES RIBEIRO | ||
Descritores: | BANCO INTERMEDIÁRIO FINANCEIRO RESPONSABILIDADE CIVIL DEVER DE INFORMAÇÃO CLIENTE IDOSO | ||
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Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 03/09/2021 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Texto Parcial: | N | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | PARCIALMENTE PROCEDENTE | ||
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Sumário: | I. O intermediário financeiro está obrigado ao dever de completude, veracidade, actualidade, clareza, objectividade e licitude das informações que presta aos clientes. II. A extensão e a profundidade da informação devem ser tanto maiores quanto menor for o grau de conhecimentos e de experiência do cliente (princípio da proporcionalidade inversa). III. Resultando dos factos provados que: - o banco prestou informação incompleta e não verdadeira a uma pessoa, traduzida na afirmação de que as obrigações em causa constituíam um produto com segurança equivalente a um depósito a prazo; - o cliente tinha a vulnerabilidade da idade avançada; - estava sujeito às contingências de uma instrução equivalente à 4ª classe completada quando adulto; - tinha características de cliente conservador, visíveis através do histórico do relacionamento com o banco (onde tinha pulverizado o seu dinheiro em várias contas de depósitos a prazo e à ordem e que - foi pela iniciativa do banco (um dos funcionários do R. deslocou-se a casa do A.) que foi convencido a adquirir o assinalado produto, é de concluir que houve violação do dever legal de informação a que o banco estava obrigado enquanto intermediário financeiro. IV. Um vez demonstrado que não fora a garantia dada pelo banco de que se tratava de um produto equivalente a um depósito a prazo, o cliente não teria anuído na subscrição mesmo, demonstrado fica o nexo causal entre a ilicitude da conduta do banco e o resultado danoso na esfera do cliente. V. Na ausência de elementos que tornem possível determinar o valor da indemnização, impõe-se condenar o R. a pagar ao A. a quantia que se vier a liquidar em execução de sentença, tendo em consideração os critérios fixados pelo tribunal nos termos do artigo 609º n.º 2 do Código de Processo Civil. | ||
Decisão Texto Parcial: | ![]() | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa: Pedido: “a) Ser o R. condenado a pagar aos AA. o capital de 50.000,00 €, bem como os juros vencidos até à presente data desde novembro de 2015 e vincendos desde a citação até efetivo e integral pagamento; Caso assim não se entenda: b) Ser declarado nulo qualquer eventual contrato de adesão que o R. invoque para ter aplicado os 50.000,00 € que o A. entregou ao R., em obrigações subordinadas S... 2006; c) Ser declarado ineficaz em relação aos AA. a aplicação que o R. tenha feito desses montantes; d) Ser o R. condenado a pagar aos AA. a quantia de 3.850,00 € a título de dano não patrimonial”. Alegaram, para tanto, e em síntese, que viram todo o seu dinheiro ser colocado em “obrigações S... 2006” sem que soubessem do que se tratava, dado que nunca lhes foi entregue qualquer documento, tendo sido dito ao A. marido que se tratava de um depósito a prazo, com capital garantido pelo Banco, sem qualquer risco. “Na data de vencimento estipulada” o R. não lhes restituiu o montante que lhe confiaram. Não existiu qualquer informação, pelo que, o negócio é nulo nos termos do art. 5º e ss. do D.L. nº 446/85, de 15/10. O Réu contestou, invocando a prescrição e concluindo pela sua absolvição do pedido. Notificados para o efeito, os AA. responderam à matéria de exceção, pugnando pela improcedência da exceção invocada. Foi dispensada a realização de audiência prévia, proferido despacho saneador, onde se relegou para final o conhecimento da exceção de prescrição, identificado o objeto do litígio e enunciados os temas da prova. Procedeu-se a julgamento, com observância do formalismo legal, tendo sido proferida decisão que absolveu o Banco do pedido. É contra desta decisão que recorrem os AA., formulando as seguintes conclusões: 1 - Por douta sentença proferida pelo Tribunal recorrido, foi julgado improcedente o pedido deduzido, pelos AA. aqui Apelantes contra o Banco Apelado e, este absolvido. 2 - Com tal douta decisão, os recorrentes não se conformam, por entenderem que o Tribunal recorrido procedeu a um erro de julgamento, fazendo uma errada interpretação dos factos e aplicação do direito, ao considerar não ter havido violação do dever de informação por parte dos funcionários do R. Apelado em representação deste e, a consequente ilicitude. 3 - Entendem os Apelantes que, mesmo que só se considerassem os factos dados por provados na douta decisão recorrida, que uma interpretação correta destes e uma correta aplicação do direito, deveria considerar ter havido ilicitude por parte do banco Apelado e, em consequência, deveria o Banco Apelado ter sido condenado no pedido por ter violado culposamente e de forma grave na sua qualidade de intermediário financeiro, os deveres de boa fé, lealdade, transparência e em especial, o dever de informação. 4 - Entendem ainda os Apelantes que, os factos que foram considerados não provados na douta sentença recorrida sob as alíneas a) a z) face à prova produzida e documentos juntos, deveriam ter sido considerados provados e, aditado um novo ponto aos factos provados, que os AA. não procuravam risco e que eram pessoas sem formação académica. 5 - Na douta sentença recorrida, foi considerado provado que os AA. ora apelantes eram clientes do Réu (B...) na sua agência do ... com as contas à ordem nº 4358552.10.001, onde movimentavam dinheiro, e que em 08 de maio de 2006, em casa dos AA., o A. marido subscreveu uma obrigação S... 2006 no valor de € 50.000,00 com um prazo de 10 anos. 6 - Foi ainda aí considerado provado que o Autor subscreveu a referida obrigação na sequência de um contacto de um funcionário do Banco e que, antes de subscrever a referida obrigação, o funcionário do Banco disse ao Autor que a obrigação era como um depósito a prazo, mas com uma taxa de juro mais alta, com juros eram semestrais e com capital garantido. 7 - Foi ainda considerado provado que no momento em que o Apelante subscreveu a obrigação, para os funcionários da agência a obrigação subordinada S... 2006 e um produto seguro, sem risco e com capital garantido, semelhante a um depósito a prazo. 8 - Mais foi dado por provado que o capital que os Autores utilizaram para subscrever a obrigação supra referida, no montante de € 50.000,00, não lhe foi devolvido e, que os AA. antes da subscreverem eram tidos pelos funcionários do Banco B... como bastante conservadores, sem capacidade de entender o que era uma obrigação, caso lhe fosse explicado. 9 – Mais consta dos factos provados no seu nº 8, que os AA. ficaram convictos quanto à segurança da aplicação que, como os juros foram pagos semestralmente, tinha as características de um depósito a prazo. 10 - Os funcionários do banco tinham os AA. como bastante conservadores e pessoas que, não procuravam produtos de risco. 11 - Da factualidade provada resulta em síntese que o Autor, ao subscrever a obrigação estava convencido que esta tinha as mesmas características de um depósito a prazo com uma taxa de juro mais rentável. Os funcionários da Ré estavam também convencidos que a subscrição da obrigação tinha capital garantido". 12 - Os funcionários do Réu nunca alertaram o A. que, caso a S... não pudesse reembolsar o valor investido no final do prazo contratado por ser declarada insolvente, os Autores muito provavelmente não seriam pagos desse mesmo valor através do património da S... e nunca explicaram aos mesmos o que era uma obrigação. 13 - Face aos factos considerados provados e, ao que consta em parte da fundamentação da douta sentença recorrida, deveria o Tribunal recorrido ter considerado, ter ocorrido a violação dos deveres de boa fé, lealdade, transparência, e em especial do dever de informação por parte dos funcionários do Banco Apelado em representação deste e, cuja culpa que é grave, se presume, conforme artigo 304-A nº 2 do CVM e, em consequência, que com tal atuação o Banco Apelado atuou de forma ilícita, o que levaria à responsabilização do Banco Apelado, quer a título extracontratual, quer contratual por factos ilícitos. 14 - Ao Banco Apelado na qualidade de intermediário financeiro, impunha-se transmitir ao A. através dos seus funcionários uma informação verdadeira e completa sobre as características do produto que lhe apresentou designadamente, esclarecendo-o sobre o que eram obrigações subordinadas, tanto mais que, tal como consta provado e, em parte da fundamentação da douta sentença recorrida, os AA. Apelantes eram considerados pessoas sem conhecimentos que lhes permitisse saber o que era uma obrigação, que não procuravam produto de risco, o que o Banco Apelado não fez. 15 - Pois consta dos factos dados por provados na douta decisão recorrida, que, foi transmitido pelo funcionário do Banco ao A. Apelante que estava a adquirir um depósito a prazo, com uma taxa de juro mais alta, que poderia recuperar o capital com rapidez, que os juros eram semestrais e o capital garantido. 16 - Mais resulta provado que foram os funcionários do Banco B... que, ofereceram a obrigação subordinada S... 2006 (que eles nem sabiam o que era, como resulta dos seus depoimentos) como um produto seguro, sem risco e com capital garantido, semelhante a um depósito a prazo. 17 - Acontece que, uma aplicação de dinheiro numa obrigação subordinada S..., nada tem a ver com uma aplicação de um depósito a prazo no Banco B.... 18- Os depósitos a prazo, são produtos simples, que as instituições financeiras utilizam para captar as poupanças dos investidores, que têm a particularidade de reembolso garantido do capital e tipicamente uma taxa de juro fixa, sendo que beneficia da proteção do fundo de garantia de depósitos que colmata o eventual risco de a instituição não cumprir com os seus devedores. 19 - Ao passo que, as obrigações, são títulos, de uma determinada entidade, que no caso concreto nem sequer eram do Banco, e cujo reembolso está dependente essencialmente da capacidade do emitente, ao contrário do que acontece nos depósitos a prazo em que o capital é garantido pelo fundo de garantia, sendo que, no caso das obrigações, em caso de incapacidade do emitente cumprir, dificilmente o investidor conseguirá receber o seu investimento. 20 - Acresce ainda que, o que foi vendido ao A. Apelante, segundo agora se sabe, foram obrigações subordinadas, ou seja, obrigações sujeitas à cláusula da subordinação, isto é, no caso de falência ou liquidação da entidade emitente, apenas seriam reembolsados após os demais credores das dívidas não subordinadas. 21 - Face ao exposto, resulta não ter sido transmitido ao A. pelos funcionários do Banco Réus em representação deste as verdadeiras características do produto que estava a vender e, o que lhe transmitiram, não era verdadeiro, sendo que tal atuação do Banco, levou o A. a investir o seu dinheiro num produto de risco que nunca quis e, em cujo investimento foi induzido de forma enganosa e com culpa grave do Banco Apelado, que aliás se presume. Artigo 304-A nº 2 do CVM. 22 - A atuação do Banco Apelado no exercício da atividade de intermediário financeiro, quer nos preliminares quer na conclusão de subscrição de obrigação, representa um ato doloso ou, pelo menos de culpa grave. 23 - Uma vez que se lhe impunha, como entidade patronal, dar instruções rigorosas aos seus funcionários para apresentarem o produto ao Apelante como as suas verdadeiras características, o que não fez. 24 - Assim, em face de todo o exposto, deve este Venerando Tribunal revogar a douta sentença recorrida e, substitui-la por outra, que condene o Banco Apelado nos termos peticionados na P.I. Pois conforme referido nestas alegações de recurso, o Tribunal recorrido efetuou uma errada interpretação dos factos e uma errada aplicação do direito, nomeadamente dos artigos supra descritos, artigos 73, 74, 75 e 77 do Regime Geral das Instituições de Crédito e ainda, dos artigos 7, 304, 304-A, 312, 312-A, 312-B, 314, 314-B do CVM. 25 - Acresce ainda que, todos os factos que foram considerados não provados deveriam ter sido considerados provados, devendo ainda ser aditado um novo ponto dado por provado o suprarreferido neste recurso. 26 - Relativamente aos factos não provados, resulta das declarações do A., bem como dos depoimentos das testemunhas que, o A. confiou nos funcionários do Banco, e que lhe foi dito que o produto era de capital garantido, como se de um depósito a prazo se tratasse. 27 - Relativamente às alíneas a) a f) dos factos não provados, há neste caso, um erro grosseiro na apreciação da prova ao considerá-los como não provados, dado que toda a prova produzida em audiência de julgamento é precisamente em sentido contrário, ou seja, no sentido de se considerar tais factos como provados. 28 - Face às declarações do A. marido conjugadas com o depoimento das testemunhas, suprarreferidas que lhe venderam o produto, resulta provado sem qualquer dúvida, que se os AA. tivessem tomado conhecimento que o produto que lhe foi apresentado não era de capital garantido, ou mesmo que apresentava algum risco, jamais teriam autorizado tal aplicação, pelo que deverá ser alterado igualmente este facto de forma a ser considerado provado. 29 - Resulta não só das declarações do Apelante como dos depoimentos dos funcionários e ex-funcionário do Banco que lhe venderam o produto, referindo a testemunhas nos seus depoimentos que, não explicaram o que eram obrigações. 30 – Por fim, em face do que consta da fundamentação da douta sentença verifica-se que, o Apelante não procurava produtos de risco, constando ainda do depoimento das testemunhas que os Apelantes eram pessoas sem formação académica devendo assim ser aditado um novo ponto aos factos provados, além do aí descrito, que os Apelantes não procuravam produtos de risco, que eram pessoas sem formação académica. 31 - Os factos cuja alteração se requer, reforçam, salvo melhor opinião, os factos descritos na primeira parte deste recurso, do que resulta não ter o Banco Apelado através dos seus funcionários prestado uma informação verdadeira e completa aos Apelantes sob as características do produto que viria a subscrever, designadamente não lhe tendo prestado informações sobre o que eram obrigações. 32 - Não tendo prestado os esclarecimentos necessários aos Apelantes e tendo convencido os mesmos de que o produto que estavam a adquirir era semelhante a um depósito a prazo, o Banco Apelado atuou culposamente no exercício da atividade de intermediação financeira, quer nos preliminares, quer nas conclusões do contrato de subscrição da obrigação, constituindo tal atuação um ato ilícito. 33 - A culpa do Apelado é grave, pois impunha-se-lhe como entidade patronal dar instruções rigorosas aos seus funcionários para que, ao apresentarem esse produto ao Apelante, o esclarecessem sobre as verdadeiras características do produto, o que não fez como suprarreferido. 34 - Normas violadas: Artigos 73, 74, 75 e 77 do Regime Geral das Instituições de Crédito, artigos 7, 304, 304-A, 312, 312-A, 312-B, 314, 314-B do CVM, e artigos 227, 483, 485, 487, 562, 563, 573, 762, 798, 799 e 800 do C. Civil. 35 - Pelo que, tendo o Banco Apelado causado de forma ilícita prejuízos aos Apelantes no valor do investimento de € 50.000,00 acrescido de juros e danos morais que esta situação lhes causou, deve a douta sentença ser revogada e substituída por outra que julgue procedente a ação e condene o Banco Apelado no valor do pedido deduzido na P.I. Questões a decidir: Recortadas nas conclusões de recurso (639/4 e 635/1 do0 CPC), importa resolver as seguintes questões: (i) quanto ao recurso de facto se é de dar como provados os factos considerados não provados pela primeira instância; (ii) quanto ao recurso de direito, se estão provados os pressupostos da responsabilidade contratual do banco R.. II – FUNDAMENTAÇÃO II.1. Dos factos Em primeira instância foram considerados provados os seguintes factos[1]: 1. Os Autores eram clientes do Banco …, S.A., atualmente Banco …, S.A., na sua agência do …, sendo titulares da conta à ordem com o nº …, através da qual movimentavam as suas poupanças. 2. Em 8 de maio de 2006, RF, então gerente do Balcão da agência do …, dirigiu-se a casa dos Autores e transmitiu ao Autor marido que tinha um produto que dava mais juros, que não era um depósito a prazo mas que era tão seguro como um depósito a prazo, porque era da “dona do Banco”, e que, apesar de ser a 10 anos, em qualquer altura ficava disponível porque havia sempre alguém interessado no produto, entregando-lhe o respetivo boletim de subscrição. 3. O Autor marido tem a 4ª classe. 4. O funcionário em questão conhecia bem os Autores, sabia que eram pessoas sem formação técnica que lhes permitisse ter conhecimentos para avaliar produtos financeiros, nomeadamente o seu risco. 5. Sabia inclusive que os Autores, até àquela data, como pessoas conservadoras que eram quanto à aplicação do seu dinheiro, nunca tinham efetuado outro tipo de depósitos sem ser depósitos a prazo. 6. Os Autores aplicaram € 50.000,00 em “obrigações S... 2006”. 7. O Autor marido assinou o “Boletim de subscrição”, pelo facto do gerente do balcão do V… ter informado que se tratava de um investimento seguro, que os juros eram semestrais e que o dinheiro investido poderia ficar disponível em qualquer altura porque havia sempre alguém interessado. 8. Os Autores ficaram convictos quanto à segurança da aplicação, cujos juros foram sendo semestralmente pagos. 9. Nunca qualquer contrato lhes foi entregue que contivesse cláusulas sobre “obrigações subordinadas S...” nem que contivesse prazos de resolução unilateral pelos Autores. 10. Na data de vencimento estipulada, não foi restituído aos Autores o capital investido. 11. A argumentação invocada pela Direção Comercial do B…, repetida pelos funcionários dos balcões do banco Réu, era de que se tratava de um investimento seguro. 12. As comunicações existentes no B... e que este transmitia aos seus comerciais nos respetivos balcões consistiam em afirmar a segurança da aplicação financeira em causa, a sua solidez, a boa rentabilidade. 13. Os Autores recebiam extratos mensais, onde todas as suas aplicações financeiras apareciam discriminadas e separadas de acordo com a sua natureza e em que a titularidade de “obrigações” vinha discriminada e identificada, de forma separada em relação aos “depósitos a prazo”. 14. Em maio de 2015, verificou-se o incumprimento do reembolso do capital por parte da entidade emitente dos títulos. 15. As Obrigações S... 2006 foram emitidas pela S..., …, S.A., sociedade que era titular de 100% do capital social do Banco Réu. 16. Participação que deteve de forma permanente até novembro de 2008, altura em que foi nacionalizado. 17. Com garantia de capital, no sentido de que o seu valor de reembolso não sofre variações de natureza especulativa ou que resultem de qualquer tipo de negociação. 18.Eliminado[2]. 19. O funcionário apresentou o produto como se tratando de uma representação de dívida da sociedade emitente, tendo explicado que tal sociedade-emitente se tratava da sociedade “dona do Banco”, pelo que se tratava de um produto seguro, com um nível de risco semelhante ao de um Depósito a Prazo. 20. Mais apresentou a sua remuneração, vantajosa relativamente aos depósitos a prazo, o seu prazo, de 10 anos, e as condições de reembolso e de obtenção de liquidez ao longo do prazo de 10 anos, que apenas seria possível por via de endosso. 21. O que era, à data, extremamente fácil e rápido, porquanto a procura superava a oferta. Pelas razões adiante indicadas, este Tribunal considera provado que: 22. Se em algum momento os Autores se tivessem apercebido que poderiam estar a comprar «obrigações S... 2006», produto com risco e sem capital garantido pelo B..., nunca o teriam feito[3]. 23. O reembolso do capital estava previsto para 06.05.2016 (fls. 15). São do seguinte teor os factos dados como não provados sob as alíneas a) a z): Com interesse para a boa decisão da causa, não resultou provado que: a) Eliminada[4]; b) Eliminada [5]; c) Eliminada [6]; d) Eliminada [7]; e) Eliminada [8]; f) Eliminada [9]; g) Era do conhecimento dos funcionários do Réu que os Autores a qualquer momento poderiam necessitar do dinheiro, porque não tinham quaisquer outras poupanças; h) (só) em novembro de 2015 deixaram de ser pagos os juros; i) em novembro de 2015, os Autores desconheciam por completo o que era a “S...”; j) Eliminada[10]; l) nunca conheceram os Autores qualquer título demonstrativo de que possuíam “obrigações S...”, não lhes tendo sido entregue documento correspondente; m) não existiu qualquer informação, quanto à liquidez do capital, vencimento de retribuição, nem prazos de reembolso; n) Eliminada[11]. o) na agência do ... informavam que “era melhor esperar, porque iria receber, era tudo uma questão de tempo”; p) contrataram uma taxa de 4,5% ao ano ilíquida e foram pagos juros na ordem de 1%, desde maio de 2009 e até novembro de 2015; q) o Réu foi sempre indicado pelo seu gerente como garante da aplicação financeira em causa; r) Eliminada [12]; s) Eliminada [13]; t) Eliminada [14]; u) com a sua atuação, o Réu colocou os Autores num permanente estado de preocupação e ansiedade, com o receio de não reaverem, ou de não saberem quando iam reaver o seu dinheiro, que são as únicas poupanças que têm e que amealharam ao longo da vida; v) toda esta situação tem provocado nos Autores muita ansiedade, tristeza e dificuldades financeiras para gerirem a sua vida; x) os Autores vivem em permanente estado de “stress”, doentes e sem alegria de viver, por terem sido desapossados das suas economias de uma vida; z) os Autores foram total e exaustivamente esclarecidos sobre as condições do produto, de forma acompanhada com a respetiva nota técnica. II.2.1. Recurso de facto A título prévio 1. Consigna-se que este Tribunal procedeu à audição integral da prova produzida em audiência de discussão e julgamento. 2. O R. critica a forma como o A. impugna a matéria não provada. Neste âmbito, como se vê da impugnação da matéria de facto, é verdade que a formulação dos AA. não constitui uma aplicação formalmente exemplar do art.º 640º do CPC. No entanto, percorrendo o corpo das alegações, do nosso ponto de vista, verifica-se que os AA. acabam por cumprir o citado dispositivo legal, quer pela identificação dos factos sob recurso e meios de prova que, no entender dos mesmos impunham decisão diferente, como melhor adiante se verá. 3. Da discussão da causa resultou que as obrigações subordinadas da S..., efetivamente dona do B..., comportavam um risco superior a um depósito a prazo. Na realidade, foi explicado pela testemunha PJC, funcionário do banco, os depósitos a prazo são garantidos por um fundo de garantia que, segundo se depreendeu do mesmo depoimento, tem expressão na informação contabilística do banco. Ora, a aplicação dos AA. não estava coberta por qualquer fundo de garantia, o que tanto bastava para impedir a conclusão ínsita no descrito facto nº 18. Assim, o enunciado que é conclusivo, não tem qualquer apoio visível na experiência comum nem resulta dos documentos juntos nem da prova produzida em audiência de julgamento. A motivação da matéria de facto, como se constata da simples leitura, não autoriza o juízo, aliás, conclusivo do ponto nº 18 dos factos. Nesta conformidade, considera-se o mesmo não escrito (artigo 607º nº 4 do CPC, segundo o qual devem constar da fundamentação da sentença os factos julgados provados e não provados, e não também a matéria que traduza juízos de valor ou conclusivos)[15]. 4. Atento o relevo que tem para a decisão da causa adita-se o facto 23, com a indicação da data prevista para o resgate do capital (fls. 15). Ainda a título prévio 1. O A. entende que a matéria provada, só por si, demonstra os pressupostos da responsabilização civil do banco por violação do dever de informação. Em todo o caso, insurge-se contra a circunstância de se terem dado como não provados os factos a) a z). No entanto, importa esclarecer que a referência à alínea z) só a mero lapso pode ser entendida, porquanto trata-se de matéria que, a ter sido provada, resultaria em favor do R.. Por comodidade de leitura, transcreve-se aqui esta alínea: z) os Autores foram total e exaustivamente esclarecidos sobre as condições do produto, de forma acompanhada com a respetiva nota técnica. Ora, não só careceria o A. de interesse em agir, neste âmbito, como resulta precisamente o contrário do contexto do corpo das alegações que, no que à impugnação da matéria de facto respeita, se quedou pela alínea x). Por conseguinte, não se toma conhecimento da parte do recurso de facto atinente à alínea z). Vejamos então, no que tange propriamente à matéria impugnada sobre as alíneas a) a x). O A. reporta-se aos depoimentos dos funcionários do banco mencionando que o produto foi apresentado como tendo o “capital garantido” e sustentando nomeadamente que: “Os funcionários do banco consideravam que o B... e a S... eram a mesma coisa, por a segunda ser mãe do primeiro, e a dizerem isto, asseguravam ao cidadão comum, com pouca instrução e conhecimentos a garantia do capital. É certo que para os funcionários do R. a obrigação em questão era semelhante a um depósito a prazo, porém, no caso concreto, não era uma obrigação do B..., era sim uma obrigação S..., pelo que não se infere que a garantia do capital fosse dada pelo B.... E acrescenta ainda o A., neste domínio, que “em relação aos factos considerados não provados, há que ter presente desde logo o que consta como provado nos pontos 3, 4, 5, 7, 8 e 9 dos factos provados e o que consta da fundamentação da douta decisão, ou seja, que foi transmitido ao A. marido pelo funcionário do banco antes de subscrever a obrigação, que era um produto semelhante a um depósito a prazo, com um capital garantido, que para os funcionários da agencia do B... a S... ou o B... eram a mesma coisa, que a aplicação numa obrigação subordinada era um produto seguro, sem risco e com capital garantido, semelhante a um depósito a prazo, que os AA. eram pessoas conservadoras e que não procuravam o risco, e que o que motivou a autorização para aplicar tal dinheiro foi o facto de ter sido dito pelos funcionários do banco B..., pessoas em quem os AA. Confiavam plenamente que, o capital era garantido como um depósito a prazo e com uma taxa de juros superior e, apenas e só por esse motivo o A. marido atuou convicto de que estava a colocar o seu dinheiro numa aplicação com as características de um depósito a prazo. Importa aqui reter que o A. marido tinha a 4ª classe feita em adulto e que ao longo da sua vida, nunca aplicou o seu dinheiro, sem ser em depósito a prazo de 180 dias. Pelo que, conjugados os facto considerados provados, com o que consta da fundamentação e, dos documentos juntos à P.I., e ainda, os depoimentos prestados pelas testemunhas adiante igualmente transcritas em partem entende-se que uma interpretação correta dos factos que foram considerados não provados, deveria ter considerado os mesmos todos por provados, venda ainda ser aditado um novo facto dado por provado, que: «os AA. nunca procuraram produtos de risco que eram pessoas sem formação académica»”. Note-se que os AA. transcreveram um conjunto de excertos dos depoimentos das testemunhas PC, DR e RF e das declarações de parte do A. AJ (fls. 13 e 56), o que, como se disse, não nos dispensou de ouvir a prova produzida. Por comodidade de leitura transcrevem-se aqui os factos dados como não provados sob as alíneas a) a x): a) o gestor de conta transmitiu ao Autor marido que tinha um depósito a prazo com excelentes condições para fazerem uma aplicação, com capital garantido pelo B... e com um juro bom; b) os Autores estavam confiantes que estavam a aplicar o seu dinheiro num depósito a prazo; c) o Autor marido assinou o “Boletim de subscrição” sem entender o conteúdo do mesmo; d) pelo facto do gerente ter informado que se tratava de um depósito a prazo, com o capital garantido pelo Banco Réu; e) os Autores estavam convictos de que estavam a aplicar o seu dinheiro num depósito a prazo, logo num produto sem qualquer risco, à semelhança do que fizeram ao longo da sua vida; f) se em algum momento os Autores se tivessem apercebido que poderiam estar a comprar “obrigações S... 2006”, produto com risco e sem capital garantido pelo B..., nunca o fariam; g) era do conhecimento dos funcionários do Réu que os Autores a qualquer momento poderiam necessitar do dinheiro, porque não tinham quaisquer outras poupanças; h) (só) em novembro de 2015 deixaram de ser pagos os juros; ]i) em novembro de 2015, os Autores desconheciam por completo o que era a “S...”; j) desconheciam por completo que tinham adquirido uma aplicação com características diferentes de um depósito a prazo, pois se disso tivessem conhecimento, não o teriam feito; l) nunca conheceram os Autores qualquer título demonstrativo de que possuíam “obrigações S...”, não lhes tendo sido entregue documento correspondente; m) não existiu qualquer informação, quanto à liquidez do capital, vencimento de retribuição, nem prazos de reembolso; n) os Autores não aceitariam investir em obrigações S... 2006 ou qualquer outro produto cujo capital não fosse garantido pelo Banco Réu; o) na agência do ... informavam que “era melhor esperar, porque iria receber, era tudo uma questão de tempo”; p) contrataram uma taxa de 4,5% ao ano ilíquida e foram pagos juros na ordem de 1%, desde maio de 2009 e até novembro de 2015; q) o Réu foi sempre indicado pelo seu gerente como garante da aplicação financeira em causa; r) a argumentação invocada pela Direção Comercial do B..., repetida pelos funcionários dos balcões do banco Réu, era de que este assegurava o reembolso do capital investido e juros; s) as comunicações existentes no B... e que este transmitia aos seus comerciais nos respetivos balcões consistiam em assegurar que o Banco garantia o capital investido; t) o Réu pretendia que os seus funcionários passassem a ideia de que a estes produtos não estavam associados quaisquer riscos quanto ao reembolso do capital e juros, garantindo ele próprio a satisfação de tais encargos; u) com a sua atuação, o Réu colocou os Autores num permanente estado de preocupação e ansiedade, com o receio de não reaverem, ou de não saberem quando iam reaver o seu dinheiro, que são as únicas poupanças que têm e que amealharam ao longo da vida; v) toda esta situação tem provocado nos Autores muita ansiedade, tristeza e dificuldades financeiras para gerirem a sua vida; x) os Autores vivem em permanente estado de “stress”, doentes e sem alegria de viver, por terem sido desapossados das suas economias de uma vida; Verifica-se que esta matéria prende-se essencialmente com os seguintes temas: termos da divulgação pelo R. do produto em causa como sendo seguro e de risco equivalente a um depósito a prazo e das instruções que os funcionários do banco tinham nesse sentido [alíneas a), d); m); q); r), s) e t)]; confiança que isso gerou nos AA. que, assim, aderiram com a subscrição do produto em questão (als. b) e e)]; equívoco em que os AA. incorreram [alíneas c), l); i) j); l);)]; no qual não incorreriam se tivessem tido acesso a informação correta e completa [alíneas f) e n) ] e sobre o estado psicológico dos AA. em razão do comportamento do R. [(alíneas u) a x)]. Poder-se-á dizer que estas matérias estão de algum modo cobertas nomeadamente pelos factos 2, 7, 8, 9, 11, 12, 17, 19 e 20, como resulta do simples cotejo. Conexas são também as matérias alusivas a que o A. tem a 4ª classe (segundo ele próprio referiu, concluída já em adulto – facto n.º 3) e tem hoje a idade de 93 anos (com referência a fevereiro de 2020, segundo também referiu em declarações de parte) a matéria do conhecimento do banco de que os AA. eram clientes que tinham um perfil conservador pois apenas tinham investido em depósitos a prazo (n.º 5 dos factos). Debruçando-nos sobre, quer os factos provados quer sobre os meios de prova convocados pelos AA. verificamos, portanto, que, em boa medida, não poderia tal matéria ser considerada não provada, até porque já consta no essencial dos factos provados e dos meios de prova pertinentes. O exercício consistirá em selecionar o que efetivamente e em concreto não ficou provado e restringir a matéria não provada em conformidade e fazer o correspetivo ajuste, acrescentando à matéria provada a matéria ainda não constante dos factos provados que em nosso entender e pelas razões indicadas, consideramos provada. Vejamos. No que toca às alíneas a), b), d) e e) Por comodidade de leitura, lembra-se o teor desta matéria: a) o gestor de conta transmitiu ao Autor marido que tinha um depósito a prazo com excelentes condições para fazerem uma aplicação, com capital garantido pelo B... e com um juro bom; b) os Autores estavam confiantes que estavam a aplicar o seu dinheiro num depósito a prazo; d) pelo facto do gerente ter informado que se tratava de um depósito a prazo, com o capital garantido pelo Banco Réu; e) os Autores estavam convictos de que estavam a aplicar o seu dinheiro num depósito a prazo, logo num produto sem qualquer risco, à semelhança do que fizeram ao longo da sua vida; Como se vê, estamos perante matéria considerada não provada o que, de alguma maneira, contradiz o que se deixou consignado quanto à apresentação do produto junto do A. como sendo um produto seguro e que gerou confiança nos AA. que ficaram convencidos quanto à segurança da aplicação. Consideramos que, no essencial, a matéria está coberta pelos factos 2, 7, 8, 11, 12, 17 e 19. Como se verifica dos depoimentos das testemunhas e resulta, aliás, da matéria provada e adiante assinalada, o banco afirmou a segurança do produto. No que toca especificamente à matéria da garantia do capital depôs a testemunha PJC que, como se diz na motivação da sentença, atendia o A. como cliente. Esta testemunha, apesar de expressamente ter aludido à apresentação do produto ao A., como sendo um produto seguro, fez uma alusão indireta à garantia do capital quando afirmou que se tivesse sido explicado ao A. que se tratava de um produto de risco e sem capital garantido ele não teria feito a aplicação. Acrescentou que ele frisava não querer ser condicionado pelo prazo porque poderia precisar do dinheiro. Este posicionalmente, segunda a testemunha, era, aliás, tido pelas pessoas com mais idade. Mas o banco dizia que teria uma posição pró-ativa e rapidamente disponibilizaria o dinheiro do cliente. Acrescentou também que nunca disse ao A. que se tratava de um produto da S.... De qualquer modo, este depoimento vem em reforço daquilo que já se encontra vertido na matéria de facto considerada provada: o produto em causa foi apresentado como sendo seguro e semelhante a um depósito a prazo e que em qualquer altura o dinheiro ficava disponível. Conjugando os assinalados factos provados e o depoimento da indicada testemunha, poder-se-á dizer com um elevado grau de certeza que o retorno do capital foi garantido pelo banco. Nesta conformidade e, como se deixou antevisto, a fim de evitar duplicações, determina-se a eliminação das alíneas a), b), d) e e) e não se determina neste particular qualquer ajuste à matéria de facto, por ser redundante. Quanto à alínea c) É do seguinte teor esta alínea: c) o Autor marido assinou o “Boletim de subscrição” sem entender o conteúdo do mesmo; Consideramos que no essencial A al. c) está coberta pelos factos 3, 4, 5, 7 e 8. Nesta conformidade e, como se deixou antevisto, a fim de evitar contradições e duplicações, determina-se a eliminação da alínea c). Não se determina, neste particular, qualquer ajuste à matéria de facto, por ser redundante. Quanto à alínea f) É do seguinte teor a alínea f): “se em algum momento os Autores se tivessem apercebido que poderiam estar a comprar “obrigações S... 2006”, produto com risco e sem capital garantido pelo B..., nunca o fariam”. Importa ter presente que, tal como foi reconhecido pelas testemunhas, o A. é uma pessoa com idade avançada (o que foi, aliás, confirmado quando foi ouvido em declarações de parte, quando disse ter 93 anos). Além disso, importa ter em conta que os AA. tinham alguns depósitos (à ordem e a prazo), tendo o A. dito e reafirmado que face à sua idade era para ele importante ter o dinheiro disponível. E era seu desígnio que o dinheiro não ficasse indisponível por mais de 180 dias. Outro dado a ter em conta é que o A. é uma pessoa que tirou a 4ª classe em adulto, segundo afirmou, já com mais de trinta anos. Ora, estes dados mostram que o A., pessoa de instrução modesta, tinha um histórico de cliente conservador. Segundo os meios de prova e os factos provados, a aplicação proposta pelo banco aos AA. só foi subscrita pelo A., não porque este tivesse procurado qualquer mudança mas porque este foi procurado em sua casa e ai foi (também) feita a divulgação do produto que foi apresentado pelo funcionário do banco como sendo mais vantajoso e com uma segurança semelhante a um depósito a prazo, sendo certo que o dinheiro “em qualquer altura ficava disponível porque havia sempre alguém interessado no produto” e, “entregando-lhe o respetivo boletim de subscrição” (facto n.º 2). Além disso, como resulta do facto n.º 7, “o A. marido assinou o «Boletim de subscrição», pelo facto do gerente do balcão do ... ter informado que se tratava de um investimento seguro, que os juros eram semestrais e que o dinheiro investido poderia ficar disponível em qualquer altura porque havia sempre alguém interessado”. E resulta do facto n.º 8 que: “Os Autores ficaram convictos quanto à segurança da aplicação, cujos juros foram sendo semestralmente pagos”. E do facto n.º 11 consta que: “A argumentação invocada pela Direção Comercial do B..., repetida pelos funcionários dos balcões do banco Réu, era de que se tratava de um investimento seguro”. E do facto n.º 12 consta que: “As comunicações existentes no B... e que este transmitia aos seus comerciais nos respetivos balcões consistiam em afirmar a segurança da aplicação financeira em causa, a sua solidez, a boa rentabilidade”. E do facto n.º 19 consta que: “O funcionário apresentou o produto como se tratando de uma representação de dívida da sociedade emitente, tendo explicado que tal sociedade-emitente se tratava da sociedade «dona do Banco», pelo que se tratava de um produto seguro, com um nível de risco semelhante ao de um Depósito a Prazo”. Ora, afigura-se-nos que o fraco grau de instrução e a idade do A. – ao contrário do afirmado pelos funcionários do banco em audiência de julgamento que reconheceram que a este tipo de pessoas não davam uma informação tão completa – impunha que o banco tivesse um maior cuidado no esclarecimento cabal dos clientes, a fim de os mesmos poderem tomar decisões esclarecidas, como melhor adiante explicitaremos, aquando da apreciação de direito. Ora, a ideia que fica depois de ouvidas as testemunhas, funcionários do banco, é que realmente nestes casos o banco fornece menos informação aos seus clientes. Naturalmente que, perante essa lacuna informativa, como melhor adiante se verá, em sede de discussão jurídica, exige-se algum esforço probatório ao banco no sentido de que ele demonstre que em qualquer circunstância o cliente subscreveria o mesmo produto. Ora, não só se provou que o banco não prestou uma informação adequada, neste caso, no sentido de informação completa, por forma a formar uma vontade esclarecida, como o banco se demitiu de qualquer esforço probatório visível, no sentido de demonstrar que, ainda que a informação tivesse sido prestada de forma adequada o cliente teria, ainda assim, subscrito o produto. Não foi esse o caso. Afigura-se-nos, pois, que algum défice que pudesse porventura ser apontado à prova do nexo de causalidade, faleceria qualquer razão ao R. para o poder invocar porque em termos processuais se demitiu de qualquer esforço probatório que, para lograr ganho de causa no contexto dos factos provados, também lhe cabia. Não vá ainda sem se dizer que a testemunha PJC confirmou que se tivesse explicado qual o risco do produto e a ausência da garantia do capital estava convencido que o A. não teria feito a aplicação. E explicitou que o A. frisava que não queria ser condicionado, pois poderia precisar do capital, à semelhança do que muitas pessoas da idade dele dizem. Portanto, mesmo na estrita valoração dos meios de prova, temos a aparência de que efetivamente o A. não teria subscrito o produto caso soubesse que o mesmo não tinha a segurança de um depósito a prazo. E, na realidade, não tinha. Nesta conformidade, ponderando os factos provados e acima convocados, acima de tudo aquilo que foi garantido aos AA. pelos funcionários do R. o fraco grau de instrução do A. (que foi quem subscreveu a aplicação) e o histórico dos AA. enquanto clientes conservadores e, bem assim, o ativo empenho do banco em não aguardar a procura do cliente, mas o facto de ter sido ele próprio a procurar o cliente em sua casa, afigura-se-nos poder retirar-se sem margem para duvida razoável que se mostra provada a matéria da alínea f) cujo aditamento à matéria de facto se determina, sob o n.º 22, com o seguinte teor: “se em algum momento os Autores se tivessem apercebido que poderiam estar a comprar «obrigações S... 2006», produto com risco e sem capital garantido pelo B..., nunca o fariam”. Este facto, na perspetiva da decisão, torna redundantes os factos enunciados nas alíneas j) e n) e, de algum modo, também nas alíneas r), s) e t) da matéria não provada, cuja eliminação, por paralelismo de razões, ao que fica exposto, se determina. Quanto à alínea g) A alínea g) tem o seguinte teor: “era do conhecimento dos funcionários do Réu que os Autores a qualquer momento poderiam necessitar do dinheiro, porque não tinham quaisquer outras poupanças”. A formulação deste facto não coincide nomeadamente com a matéria do n.º 7 dos factos. Trata-se de matéria que os funcionários do banco não tinham obrigação de conhecer, muito embora tal resulte das afirmações do A. e seja afirmado que o A. se valeu na altura dessas mesmas afirmações. Por isso, deixa-se inalterada a al. g). Quanto à restante matéria Tal como foi julgado em primeira instância, entende-se que não foram produzidos meios de prova bastantes. II.2. Apreciação jurídica Discute-se nos autos a verificação dos pressupostos da responsabilidade contratual do banco R.. Como tem sido dito, “o objetivo essencial da atividade de intermediação é o de propiciar decisões de investimento informadas, em ordem a defender o mercado e a prevenir a lesão dos interesses dos clientes, importando que ao nível dos deveres impostos ao intermediário financeiro, incluindo o banco para tal autorizado, se destacam os deveres de informação, expressos no art.º 312.º do CVM, relativamente aos serviços que ofereça, lhe sejam solicitados ou que efetivamente preste, os quais deverão ser cumpridos através da prestação de “todas as informações necessárias para uma tomada de decisão esclarecida e fundamentada”, sendo que a informação a prestar pelo intermediário financeiro ao investidor não qualificado, será ilícita se ocorrer a violação do dever de informação, com os seus requisitos indispensáveis: completude, veracidade, atualidade, clareza, objetividade e licitude. A extensão e a profundidade da informação devem ser tanto maiores quanto menor for o grau de conhecimentos e de experiência do cliente (princípio da proporcionalidade inversa)[16]. Para que se verifiquem […] os pressupostos da responsabilidade civil contratual, do intermediário financeiro, é necessário demonstrar o facto ilícito (traduzido na prestação de informação errónea, no quadro de relação negocial bancária e intermediação financeira); a culpa (que se presume nos termos do art.º 799.º n.º 1 do Código Civil e art.º 304º-A do Código dos Valores Mobiliários); o dano (correspondente à perda do capital entregue para subscrição do ajuizado produto financeiro, a descontar o rendimento, entretanto percebido pela Autora); importando também apreciar o nexo de causalidade entre o facto e o dano […] devendo o nexo causal ser analisado através da demonstração, que decorre da matéria de facto).[17] O particularismo do presente caso que esteve no cerne do debate quer da matéria de facto que da matéria jurídica, traduz-se nas questões da ilicitude e do nexo de causalidade. Com efeito, não parece haver dúvida razoável de que os AA. sofreram prejuízo, na medida em que aplicaram €50.000,00 das suas poupanças, e ficaram privados desse mesmo valor. A medida do prejuízo naturalmente corresponde a esse mesmo valor de que ficaram privados e juros acordados, deduzido dos juros entretanto pagos, a liquidar oportunamente. A culpa naturalmente que, provada a ilicitude, é algo que se tem de presumir face ao estatuído no art.º 798º do CC. Como se disse, em discussão estão verdadeiramente apenas as questões da ilicitude e do nexo de causalidade. Quanto à ilicitude Importa ponderar o quadro normativo vigente à data dos factos. Nesse âmbito, - O artigo 7.º do CVM prescrevia que: “1 - Deve ser completa, verdadeira, actual, clara, objectiva e lícita a informação respeitante a valores mobiliários, a ofertas públicas, a mercados de valores mobiliários, a actividades de intermediação e a emitentes que seja susceptível de influenciar as decisões dos investidores ou que seja prestada às entidades de supervisão e às entidades gestoras de mercados, de sistemas de liquidação e de sistemas centralizados de valores mobiliários. 2 - O disposto no número anterior aplica-se seja qual for o meio de divulgação e ainda que a informação seja inserida em conselho, recomendação, mensagem publicitária ou relatório de notação de risco. (…)”. - O artigo 304° estabelecia que: “1. Os intermediários financeiros devem orientar a sua actividade no sentido dos legítimos interesses dos seus clientes e da eficiência do mercado. 2. Nas relações com todos os intervenientes no mercado, os intermediários financeiros devem observar os ditames de boa fé, de acordo com elevados padrões de diligência, lealdade e transparência. (…).“ - O artigo 312.º determinava que: “1. O intermediário financeiro deve prestar, relativamente aos serviços que ofereça, que lhe sejam solicitados ou que efetivamente preste, todas as informações necessárias para uma tomada de decisão esclarecida e fundamentada, incluindo nomeadamente a: a) Riscos especiais envolvidos pelas operações a realizar; b) Qualquer interesse que o intermediário financeiro ou as pessoas que em nome dele agem tenham no serviço prestado ou a prestar; c) Existência ou inexistência de qualquer fundo de garantia ou de proteção equivalente que abranja os serviços a prestar; 2. A extensão e a profundidade da informação devem ser tanto maiores quanto menor for o grau de conhecimentos e de experiência do cliente. (…)” Por seu turno, o artigo 4.º do RGICSF estabelecia que: “1 - Os bancos podem efectuar as operações seguintes: (…) e) Transacções, por conta própria ou da clientela, sobre instrumentos do mercado monetário e cambial, instrumentos financeiros a prazo, opções e operações sobre divisas, taxas de juro, mercadorias e valores mobiliários; f) Participações em emissões e colocações de valores mobiliários e prestação de serviços correlativos; (…)” E o artigo 74.º ordenava que: “Nas relações com os clientes, os administradores e os empregados das instituições de crédito devem proceder com diligência, neutralidade, lealdade e discrição e respeito consciencioso dos interesses que lhes estão confiados”. E o artigo 76.º fixava que: “Os membros dos órgãos de administração das instituições de crédito, bem como as pessoas que nelas exerçam cargos de direcção, gerência, chefia ou similares, devem proceder nas suas funções com a diligência de um gestor criterioso e ordenado, de acordo com o princípio da repartição de riscos e da segurança das aplicações, e tendo em conta o interesse dos depositantes, dos investidores e dos demais credores”. Neste domínio, o STJ pronunciou-se no sentido de que: “I - Considerando o âmbito funcional dos deveres de informação (completa, verdadeira, actual, clara e objectiva) que impendem sobre o intermediário financeiro, determinado pelo grau de conhecimentos e experiência do seu cliente – no caso, um investidor conservador e que, afinal, actuou convicto de que estava a colocar o seu dinheiro numa aplicação com as características de um depósito a prazo, sendo, portanto, não familiarizado com o produto financeiro (obrigação subordinada) em causa –, não cumpre tais deveres o banco que, naquela qualidade, fez crer a este que o capital que lhe propôs investir no produto poderia ser recuperado com rapidez e, sobretudo, que era garantido pelo próprio banco e como um depósito a prazo. II - Mostrando-se que o cliente nunca teria adquirido a obrigação referida se o intermediário financeiro o tivesse informado de forma completa e verdadeira, designadamente de que o reembolso do capital investido não era garantido pelo banco, mostra-se preenchida a conditio sine qua non do dano e, por outro lado, em função das circunstâncias conhecidas e cognoscíveis de todo o processo factual e segundo as regras da experiência comum e um critério de verosimilhança e de probabilidade, o facto de este ter violado o bem jurídico tutelado pelo dever de informação a que estava vinculado, não só não se mostra indiferente como foi apto a produzir o não reembolso do capital – a lesão verificada –, independentemente de este ter sido também condicionado pela superveniente insolvência da emitente da obrigação, sendo, pois, razoável impor ao intermediário a responsabilidade por esse resultado”.[18] Em sentido convergente diz também o STJ que: “I - É dever do intermediário financeiro prestar, quanto aos valores mobiliários que disponibiliza para subscrição junto de clientes, informação completa, verdadeira e objetiva sobre o produto e seus riscos, assim como é seu dever pautar-se de acordo com o vetor da boa-fé, nomeadamente em termos de lealdade. II - Não cumpre esses deveres o intermediário financeiro, Banco, que faz crer ao cliente que o produto financeiro que propunha para subscrição tinha a garantia do próprio Banco, que tinha a mesma garantia de um depósito a prazo e que o Banco garantia o capital investido, quando afinal do que se tratava era de obrigações subordinadas emitidas por terceira entidade, que era a devedora do reembolso do capital e do pagamento dos juros, embora fosse a titular da totalidade do capital social do Banco. III - Mostrando-se que se o intermediário financeiro tivesse informado o cliente de forma completa, verdadeira e leal este nunca aceitaria subscrever o produto financeiro em causa, e mostrando-se que o reembolso não foi feito na data da respetiva maturidade nem depois, é o intermediário financeiro responsável pelo prejuízo sofrido pelo investidor. IV - Esse prejuízo corresponde ao montante investido, acrescido de juros de mora. V - A circunstância de ter sido dito ao cliente que o produto proposto tinha a garantia do próprio Banco ou que tinha a mesma garantia de um depósito a prazo ou ainda que o Banco garantia o capital investido, tudo isto apenas significa, dentro da economia da demais factualidade conhecida, que o Banco prestou informações que não eram exatas ou verdadeiras, e é daqui que deve nascer a sua responsabilização. VI - A assunção de dívida alheia, seja no figurino da assunção liberatória, seja no figurino da assunção cumulativa ou co-assunção de dívida, só vale como tal se houver aceitação do credor. VII - Deste modo, mostrando-se que o investidor não representou que estava a adquirir obrigações emitidas por terceiro e que existia um devedor primitivo (a entidade emitente), não faz sentido falar-se numa co-assunção da dívida por parte do Banco, e muito menos numa transmissão da dívida para este”.[19] Para completar a visão interpretativa dos citados preceitos que temos por pertinentes para a decisão do caso, por a ela aderirmos sem reserva, selecionamos algumas passagens do acórdão acabado de citar e que exprimem de forma clara os valores que os mesmos preceitos visam tutelar. Assim, relata-se que: “No acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça de 25 de outubro de 2018 (processo n.º 2581/16.8T8LRA.C2.S1, relator Bernardo Domingos), que recaiu também sobre espécie em tudo igual à presente, aduz-se o seguinte, que, a nosso ver, não pode deixar de ser subscrito: “A exigência da informação no negócio e no contrato é comum aos regimes jurídicos do erro, do dolo, da usura e da boa-fé pré-contratual (artigos 227º, 247º a 254º e 282º e 485º do Código). E o pilar do regime do dever de informação está estabelecido no artigo 227º do Código Civil, que obriga as partes a agirem de acordo com a boa-fé, tanto nos preliminares como na formação do contrato (…). Estamos num território em que as declarações negociais não podem ser desviadas do sentido da ordem jurídica na sua globalidade. Isto é, apesar da legislação específica a que estão sujeitas as operações e os sujeitos bancários, as instituições financeiras e de crédito estão vinculadas às regras de direito positivo relativas à boa-fé e à lealdade e transparência contratuais sediadas no Código Civil. E, por isso, também no domínio da legislação do pretérito, os funcionários bancários dotados de poderes de direção e representativos estavam vinculados a agir com a diligência de um gestor criterioso e ordenado, de acordo com o princípio da repartição de riscos e da segurança das aplicações e ter em conta o interesse dos depositantes, dos investidores, dos demais credores e de todos os clientes em geral – art.º 75º do RGICSF. (…) [P]or via os princípios gerais conformadores do cumprimento obrigacional e da cláusula geral da boa-fé, torna-se imperioso concluir que, desde sempre, a lisura contratual e as regras hermenêuticas no domínio da responsabilidade contratual impunham – e impõem – que o intermediário financeiro seja diligente na prestação de informações que permitam ao cliente ficar consciente dos riscos envolvidos em qualquer operação financeira realizada. A existência de deveres informativos visa essencialmente proteger os investidores e este princípio nuclear tem subjacente a defesa do interesse público, a segurança nos mercados e a igualdade entre os vários agentes de mercado. E, por conseguinte, toda e qualquer avaliação da responsabilidade contratual não pode ficar apartada dessa ideia matricial. No domínio do direito bancário, a relação entre o Banco e o cliente é uma relação particular, em que as partes são levadas a confiar uma na outra[20]. Sobretudo, o sujeito que se encontra na posição de cliente não profissional, e que não tem formação nem experiência na área financeira, baixa as suas defesas naturais por conferir à instituição bancária uma total competência para cuidar dos seus investimentos, depositando nela uma especial confiança, tornando-se, por isso, ainda mais vulnerável, sobretudo, se as primeiras aplicações produziram rendimentos e ele é assim induzido a confiar ainda mais no produto. Gera-se assim uma situação em que os envolvidos descuram a preocupação de obter informações, pelos seus próprios meios. Esta realidade humana deve ser tutelada pelo Direito e, por isso, se cria uma situação que dá azo a obrigações específicas de informar a cargo do Banco, fruto de responsabilidade obrigacional, no caso de inobservância. É uma relação de clientela. Calvão da Silva refere que «a relação de clientela é uma relação obrigacional complexa e duradoura, iniciada nas negociações de um primeiro contrato e desenvolvida continuamente por subsequentes e repetidas ou renovadas operações de negócios firmadas pelas partes, muitas quais novos contratos, em que, a par de prestações primárias (ou secundárias) surgirão obrigações acessórias de cuidado ou deveres de proteção cominados por acordo dos contraentes, pela lei ou pela boa-fé, para satisfação do interesse do credor. A relação de clientela não é um (único) contrato geral, mas uma relação contínua e duradouro de negócios assentem ligações especiais de confiança e lealdade mútua das partes, cuja violação na negociação conclusão, execução ou pós-extinção de uma operação financeira acarreta responsabilidade contratual» (…) O dever contratual de agir de acordo com elevados padrões de diligência, lealdade e transparência, impostos ao intermediário financeiro no interesse legítimo dos seus clientes, não é mais, afinal, que o dever de agir de boa fé, constituindo um dever principal – a prestação propriamente dita no complexo obrigacional a cargo do intermediário financeiro. (…) [O] direito bancário é um direito de informações, diremos que no domínio da intermediação mobiliária o dever de informação, a cargo do intermediário financeiro, é indissociável do dever de prestar. Os juízos do intermediário financeiro acerca da complexidade dos produtos financeiros mobiliários que pretende colocar nos seus clientes não deve ser feito à luz dos seus padrões, mas antes competindo, previamente, conhecer o padrão do seu cliente (know your client) para lhe proporcionar a informação que os conhecimentos dele, adequadamente, demandam.” Gonçalo Castilho dos Santos (A Responsabilidade civil do Intermediário Financeiro Perante o Cliente, p. 76) observa que “A referência ao princípio da boa fé para efeitos de conformação da relação do intermediário financeiro com os restantes intervenientes no mercado é complementada com a indicação do que tem vindo a ser considerado pela doutrina como “vinculações acessórias” daquele princípio: a diligência, a lealdade e a transparência. No entanto, a possível recondução, também pacífica, da boa fé a um sentido ético normativo e, dessa forma, à sua definição como regra de conduta, permite-nos constatar que a conduta diligente, leal e transparente ex bona fide, no âmbito jusmobiliário, surge densificada como dever principal, como efeito principal da relação jurídica de intermediação financeira, no sentido de que essa conduta é, afinal a prestação propriamente dita no complexo obrigacional a cargo do intermediário financeiro”. Mais observa (p. 141) que o dever de informação é um dever de conduta secundário com relevância na relação obrigacional para, em termos de autonomia e de influência sobre a prossecução do interesse do cliente, justificar, por exemplo, a aplicação dos meios de reação perante o não cumprimento da obrigação. E esclarece (pp. 141 e 278) que: “Na esteira das classificações das obrigações apresentadas pela doutrina civilista consideramos que se trata de deveres secundários de prestação, funcionalizados, é certo, à prestação principal (objeto da obrigação decorrente de específico contrato de intermediação financeira), mas ainda assim com relevância na “relação obrigacional” para, em termos de autonomia e de influência sobre a prossecução do interesse do credor (leia-se cliente), justificar, por exemplo, a aplicação dos meios de reação perante o não cumprimento da obrigação. A configuração legal e regulamentar dos deveres secundários de prestação de informação mobiliária no âmbito da relação de intermediação financeira comporta desvios significativos à habitual dogmática em torno destes deveres. (…) Todos os deveres de conduta do intermediário financeiro podem ser reconduzidos à prossecução de uma conduta diligente, leal e transparente perante o cliente. A diligência, a lealdade e a transparência não são deveres acessórios de conduta, mas antes deveres de prestação fundados na boa fé. O dever de assegurar uma conduta diligente desempenha, simultaneamente, uma função integradora, promotora e de imputação em relação à conduta do intermediário financeiro. A regra da adequação do serviço prestado ao perfil do cliente não sofre qualquer desvio em virtude do meio de contratação utilizado. O juízo de adequação deve ser formulado segundo um critério subjetivo (auto-determinação pelo investidor-cliente).” E Menezes Cordeiro aduz, em tema do dever de informação especial que recai sobre os bancos, o seguinte (Direito Bancário, 6ª ed., p. 403 e 404): “O Direito bancário é um Direito de informações. É certo que essa afirmação vale, em grande parte, para todos os sectores sócio-económicos das modernas sociedades pós-industriais: afinal, a extrema divisão do trabalho só é pensável perante uma teia permanente de informações entre todos os intervenientes. Mas no Direito bancário, em face da perfeita predeterminação dos intervenientes – banqueiro e cliente – e tendo em conta o valor das operações e a necessidade extrema da precisão, as informações redobraram de valor e assumem um papel pioneiro, em termos de regulação. Digamos que, no Direito bancário, as informações há muito perderam a sua natureza instrumental e secundária: antes surgem como objecto principal de muitas obrigações, como as derivadas de um contrato de acompanhamento ou de aconselhamento. Mas mesmo acessórias, elas assumem um peso particular pelo sector onde ocorrem. Um banqueiro dá informações inexatas a um cliente que assim, adquire um mau produto e tem prejuízos. Um cliente engana o seu banqueiro quanto às suas possibilidades económicas. Banqueiros emitem informações preliminares ou trocam informações inexatas. Nuns casos houve engano de boa-fé; noutros, negligência; noutros, finalmente, uma vontade direta, necessária ou eventual de enganar. Em suma: temos, aqui, múltiplas hipóteses de responsabilidade, cujos contornos devem ser previamente determinados”.[21] Como se disse, revemo-nos inteiramente nesta reflexão, aliás, respaldada em vasta jurisprudência do STJ [Ac. STJ de 07.02.2019; de 25.10.2018; de 10.04.2018 (proferido na revista 753/16.4TBLSB.L1.S1 relatado pelo Exm.º Cons. Fonseca Ramos); de 18.09.2018 (na revista nº 20403/16.8T8LSB.L1.S1, relatado pela Exm.ª Cons. Maria Olinda Garcia); de 11.12.2018 (na revista 6917/16.3T8GMR.G1.S1, relatado pela Exm.ª Cons. Ana Paula Boularot), sendo ainda referida jurisprudência em que se pressupõe “de certa forma uma espécie de assunção da divida (reembolso do capital investido) por parte do intermediário financeiro”]. Assim sendo, naturalmente, que não podemos aceitar o juízo sobre a não verificação da ilicitude formulado na primeira instância. Pelo contrário, face aos factos provados, não podemos deixar de concluir que estamos perante um caso de ilicitude manifesta. A extensão e a profundidade da informação devem ser tanto maiores quanto menor for o grau de conhecimentos e de experiência do cliente (princípio da proporcionalidade inversa)[22]. Como resulta, o banco deu uma informação incompleta e não verdadeira a uma pessoa que, além da vulnerabilidade da idade avançada estava também sujeita às contingências de uma instrução equivalente à 4ª classe completada quando já tinha mais de trinta anos. Naturalmente que as subtilezas de que sejam obrigações subordinadas escapam aos clientes com o perfil do A.. Isso resulta quer das características pessoais que acabam de se descrever quer através do histórico de cliente - que tinha pulverizado o seu dinheiro em várias contas de depósitos a prazo e à ordem e foi pela insistência do banco (já que foi um dos funcionários do R. que se deslocou a casa do A.) que foi convencido a adquirir o assinalado produto. Ora o banco não teve em conta que quanto menor é a preparação do cliente, maior deve ser o cuidado posto na informação por ele prestada no sentido de o elucidar sobre as características dos produtos a fim de viabilizar que decidam de forma esclarecida e livre. Ora, neste caso o banco omitiu dados de relevo e prestou informações inverídicas a um cliente com várias vulnerabilidades o que do nosso ponto de vista comprova que o banco incorreu na violação do dever de informação imposto por lei. Quanto à questão do nexo de causalidade Ao contrário do alegado pelo recorrido, ficou demonstrado que não fora a garantia dada pelo banco, o cliente não teria anuído na subscrição do produto em causa que, como veio a ser demonstrado, não tinha as características garantidas: total disponibilidade do capital, desde que reclamado pelo cliente. No entanto, essa foi a razão por que o A. subscrevera o produto em nome de ambos os AA. e, por conseguinte, foi essa a razão por que sofreram um abalo económico correspondente à perda do capital e juros contratados, desde que se comprove estarem em dívida. A propósito da demonstração do nexo de causalidade em casos congéneres, vejamos o que nos diz o Ac. TRL de 18.06.2019, cuja orientação aqui acolhemos: “Tendo a informação falsa prestada incidido sobre os aspetos mais decisivos para a determinação da decisão de subscrever um certo produto financeiro, essa informação não se mostrou de todo em todo indiferente para a (eventual) verificação futura do dano, bem pelo contrário. Conforme se refere no Acórdão da Relação do Porto de 2.3.2015, Carlos Gil, 1099/12, a responsabilidade civil por facto ilícito, o nexo causal entre o facto, no caso a informação falsa prestada pelo recorrente sobre a segurança do reembolso do produto financeiro subscrito pelo recorrido e o dano, ou seja, o não reembolso do capital investido, afere-se com recurso à denominada formulação negativa da causalidade, ou seja, o facto que atuou como condição do dano só deixará de ser considerado causa adequada se, dada a sua natureza geral, se mostrar de todo em todo indiferente para a verificação do dano, tendo-o provocado só por virtude das circunstâncias excecionais, anormais, extraordinárias ou anómalas que intercederam no caso concreto. Aplicando-se a formulação negativa do nexo de causalidade, compete ao lesante/réu demonstrar a completa inadequação do facto para a ocorrência (futura) do dano (cf. José Alberto González, Direito da Responsabilidade Civil, Quid Iuris, 2017, p. 219), o que o Réu não logrou fazer. Conforme tem sido enfatizado pelo STJ, o estabelecimento do nexo de causalidade, à luz da formulação negativa da teoria da causalidade adequada, implica que esteja demonstrado que o autor - caso o réu tivesse cumprido, inteira e claramente, os seus deveres de informação (esclarecendo designadamente que a proposta tinha por objeto obrigações subordinadas, sendo o capital garantido não como um depósito a prazo, nem pelo Banco, mas – com sujeição de cláusula de subordinação – por terceira entidade) - não teria investido na aplicação proposta (cf. Acórdãos do STJ de 6.11.2018, Cabral Tavares, 2468/16, de 24.1.2019, Abrantes Geraldes, 2406/16 e de 14.3.2019, Prazeres Beleza, 2547/16). Ora, esse nexo de causalidade está demonstrado no caso, atentos os factos provados designadamente sob N) (“Em momento algum o autor teve intenção de investir em produtos de risco e sem garantias de restituição integral do seu capital”) e U) (“A aquisição das obrigações subordinadas S... 2006 nunca corresponderia à vontade do autor”) [23]. Por similitude de razões, afigura-se-nos demonstrado o nexo causal. Quanto à determinação do quanto indemnizatório Importa ter presente que nada se provou da matéria atinente aos danos não patrimoniais. Por isso, importa ponderar apenas o que vem peticionado a título de danos patrimoniais que o A. compõe como capital (€50.000,00) e juros desde a mora (Maio de 2019) e que em 12.07.2019, computava em €9.000,00. Nos termos do artigo 314º nº 1 do CVM “os intermediários financeiros são obrigados a indemnizar os danos causados a qualquer pessoa em consequência da violação dos deveres respeitantes ao exercício da sua atividade, que lhes sejam impostos por lei ou por regulamento de autoridade pública”. Neste âmbito revemo-nos na orientação do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 5.6.2018[24]. Com efeito, a matéria de facto não nos informa acerca do valor que as obrigações podem ainda alcançar nem quais os juros remuneratórios que o autor auferiu e os que auferiria se tivesse aplicado o capital num depósito a prazo. Na ausência desses elementos, não é possível “determinar o valor da indemnização, pelo que se impõe apenas condenar o Banco Réu a pagar ao Autor a quantia que se vier a liquidar em execução de sentença, tendo em consideração os critérios supra referidos (artigo 609º n.º 2 do Código de Processo Civil”). Nestes termos, o réu deve ser condenado a pagar ao Autor a quantia que se vier a liquidar em execução de sentença assim calculada: o valor investido de € 50.000, acrescido de juros remuneratórios vencidos entre maio de 2015 e 9.5.2016 […] bem como de juros de mora à taxa legal de 4% desde 9.5.2016 [facto 23 e fls. 15]; à soma assim obtida, há que abater o valor que as obrigações ainda representem bem como o valor dos juros remuneratórios que o autor recebeu até maio de 2015 e que excedam o valor dos juros que o autor teria recebido se o capital estivesse aplicado num depósito a prazo no mesmo período. III. DECISÃO Pelo exposto, na procedência parcial da apelação, altera-se a decisão recorrida e, consequentemente, condena-se o R. a pagar ao A. a quantia que se vier a liquidar em execução de sentença, tendo em consideração o valor investido de € 50.000, acrescido de juros remuneratórios vencidos entre maio de 2015 e 9.5.2016 bem como os juros de mora à taxa legal de 4% desde 9.5.2016; à soma obtida, abater-se-á o valor que as obrigações ainda representem bem como o valor dos juros remuneratórios que o A. recebeu até maio de 2015 e que excedam o valor dos juros que o A. teria recebido se o capital estivesse aplicado num depósito a prazo no mesmo período. Custas: as custas de parte serão provisoriamente repartidas em partes iguais entre AA. e R., sem prejuízo dos acertos que resultarem da liquidação em processo executivo (artigos 527º, nºs 1 e 2, 607º, nº6 e 663º, nº2, do Código de Processo Civil)”. LISBOA, 9/3/2021 Amélia Alves Ribeiro Ana Resende Dina Monteiro _______________________________________________________ [1] Factos estes com a correção que resulta do conhecimento do recurso de facto. [2] Era do seguinte teor este facto: “O risco de um depósito a prazo seria semelhante a uma tal subscrição por o risco da SLN ser indexado ao risco do próprio Banco” Este facto foi dado, sem efeito em virtude de, para além de não ter qualquer apoio nos meios de prova, ter um teor conclusivo e não factológico. [3] Facto resultante da apreciação do recurso de facto e correspondente à al. f) dos factos não provados cuja eliminação foi determinada. [4] Conforme adiante resulta da apreciação do recurso de facto e com o seguinte teor original: a) o gestor de conta transmitiu ao Autor marido que tinha um depósito a prazo com excelentes condições para fazerem uma aplicação, com capital garantido pelo BPN e com um juro bom. [5] Conforme adiante resulta da apreciação do recurso de facto e com o seguinte teor original: b) os Autores estavam confiantes que estavam a aplicar o seu dinheiro num depósito a prazo. [6] Conforme adiante resulta da apreciação do recurso de facto e com o seguinte teor original: c) o Autor marido assinou o “Boletim de subscrição” sem entender o conteúdo do mesmo. [7] Conforme adiante resulta da apreciação do recurso de facto e com o seguinte teor original: d) pelo facto do gerente ter informado que se tratava de um depósito a prazo, com o capital garantido pelo Banco Réu; [8] Conforme adiante resulta da apreciação do recurso de facto e com o seguinte teor original: e) os Autores estavam convictos de que estavam a aplicar o seu dinheiro num depósito a prazo, logo num produto sem qualquer risco, à semelhança do que fizeram ao longo da sua vida; [9] Conforme adiante resulta da apreciação do recurso de facto e com o seguinte teor original: f) se em algum momento os Autores se tivessem apercebido que poderiam estar a comprar “obrigações SLN 2006”, produto com risco e sem capital garantido pelo BPN, nunca o fariam [10] Conforme adiante resulta da apreciação do recurso de facto e com o seguinte teor original: desconheciam por completo que tinham adquirido uma aplicação com características diferentes de um depósito a prazo, pois se disso tivessem conhecimento, não o teriam feito [11] Conforme adiante resulta da apreciação do recurso de facto e com o seguinte teor original: os Autores não aceitariam investir em obrigações SLN 2006 ou qualquer outro produto cujo capital não fosse garantido pelo Banco Réu; [12] Conforme adiante resulta da apreciação do recurso de facto e com o seguinte teor original: “a argumentação invocada pela Direção Comercial do B…, repetida pelos funcionários dos balcões do banco Réu, era de que este assegurava o reembolso do capital investido e juros”. [13] Conforme adiante resulta da apreciação do recurso de facto e com o seguinte teor original: “as comunicações existentes no BPN e que este transmitia aos seus comerciais nos respetivos balcões consistiam em assegurar que o Banco garantia o capital investido”. [14] Conforme adiante resulta da apreciação do recurso de facto e com o seguinte teor original: “o Réu pretendia que os seus funcionários passassem a ideia de que a estes produtos não estavam associados quaisquer riscos quanto ao reembolso do capital e juros, garantindo ele próprio a satisfação de tais encargos”. [15] Ac. STJ de 28 de Setembro de 2017, relatado pela Exmª Cons.ª Fernanda Isabel Pereira. [16] Sublinhado acrescentado. [17] Ac. STJ de 28.02.2019, relatado pelo Exm.º Cons. Oliveira Abreu cujo entendimento não seguimos no que tange ao nexo causal, pelas razões que anteriormente referimos e adiante melhor apoiamos do ponto de vista jurídico, inclusive com respaldo na jurisprudência. [18] Ac. STJ, na revista 2259/17.5T8LRA.C1.S1, de 26.03.2019, relatado pelo Exm. Cons. Alexandre Reis. [19] Ac. STJ na revista 3922/16.3T8VIS.C2.S1 de 19.03.2019, relatado pelo Exm.º Cons. José Rainho. [20] Sublinhado acrescentado. [21] Ac. STJ [22] Sublinhado acrescentado. [23] Ac. TRL de 18.06.2019, relatado pelo Exm.º Desemb. Luís Filipe Sousa. [24] Na revista n.º 18331/16, relatado pelo Exm.º Cons. Sousa Lameira, apud Ac. TRL de 18.06.2019, relatado pelo Exm.º Desemb. Luís Filipe Sousa. |